Epílogo



Hogwarts, 3 de março de 1998.

Minha querida Gina,

Eu espero sinceramente que um dia você leia essas minhas palavras e que, quando as ler, você já tenha me perdoado. Tenho a sensação que eu não estarei mais com você quando chegar a ler isso. Mas eu gostaria que você tivesse algo para se lembrar de mim, algo vivo. Algo que a fizesse se lembrar que eu, um dia, fui real, tanto que minhas mãos escreveram essas palavras e as minhas lágrimas molharam esse papel, assim como você foi tão real e especial para mim.
Acho que o que eu mais preciso te pedir é perdão. Por tudo. Perdão por ter sido idiota o suficiente para não notar aquela garotinha que era apaixonada por mim quando era criança. Perdão por notá-la tão tarde, e termos tão pouco tempo... Perdão por todas as vezes que eu te deixei triste ou te fiz chorar. Porque tudo o que menos queria no mundo era te fazer chorar, mas, inexplicavelmente, são as pessoas que mais amamos que mais magoamos durante nossa vida.
Você me perdoa? Perdoa por ter mentido, enganado e te magoado, tanto, que sinto meu coração apertado apenas ao te ver sorrir e seus olhos brilharem e, sem palavras, dizerem o quanto me amam? Será que um dia você ainda vai conseguir pensar em mim sem ressentimentos ou mágoas?
Eu gostaria muito de poder ter tido mais tempo com você. Mais tempo para simplesmente estar ao seu lado... para te abraçar, para te ver sorrir daquele jeito só seu, de ver seus olhos brilharem, de tocar seus cabelos, de sentir seu aroma tão maravilhoso, de te abraçar e te beijar, como se só você existisse no mundo. Por favor, me desculpe por todas as vezes que eu te deixei sozinha, me desculpe por tê-la deixado sozinha... Tudo o que mais queria no mundo era poder ficar com você, viver com você, apreciar todos os momentos junto de você... Mas eu não pude.
Não estou me isentando de culpas. Eu poderia ter feito milhões de coisas diferentes, eu errei tantas vezes que nem me lembro mais, e eu sei que muitas coisas poderiam ter sido melhores se não fosse por meus erros e por meus medos... Eu queria ter tido tempo para poder consertá-los, mas eu sempre soube que não teria esse tempo e, mesmo assim, eu fiz tudo errado. Acho que a única coisa que eu realmente acertei foi em te amar. E eu te amei muito. Eu amo você enquanto escrevo essas palavras. E eu a amarei até o fim.
E eu sei que você me amou, e que me ama... Mas eu quero te pedir que, quando ler essas palavras, continue me amando, mas que esse amor não a faça sofrer mais. Não sei se isso é egoísmo ou não, mas eu realmente ficaria muito triste se soubesse que fui o seu maior sofrimento durante sua vida... Não, eu gostaria que você não me esquecesse, mas que, por favor, lembrasse de mim como alguém que foi especial, mas que passou. Eu gostaria que você se lembrasse de mim com carinho e talvez até saudade, mas não aquela saudade que machuca, mas sim aquela saudade doce, que faz a gente lembrar de tudo de bom que viveu e apenas sentir saudade... Mas não chorar por isso. Não sofrer por isso. Por favor, eu não quero ser lembrado assim...
Você ainda tem tanto para viver, Gina. Eu apenas fui o seu passado. E é lá que eu quero ficar. Você tem seu presente, seu futuro todo pela frente. Não se esqueça de viver... de amar... de ser feliz. Você tem pessoas que te amam imensamente ao seu lado, e eu tenho certeza que aparecerão outras, muitas, porque você é uma pessoa que deve ser amada. Uma pessoa que merece ser amada intensamente, e por pessoas que a mereçam. Eu não era a pessoa certa, Gina, nunca fui, e apesar de amá-la intensamente, não era eu que a merecia.
Por favor, nunca deixe de sorrir. Seu sorriso iluminava os meus dias, e ninguém deve ser privado dele, muito menos por minha causa. A sua felicidade será a minha, se eu ainda existir, em algum lugar.
Vão ter momentos que você irá ter vontade de chorar, eu sei. Não vou me enganar pensando o contrário, e nem você. Então, se você quiser mesmo, e precisar disso, leia essas linhas e lembre-se de mim, lembre-se que eu a amei muito e pense em mim com carinho. Mas assim que terminar de ler essas palavras, você vai se erguer e sorrir, e viver, forte e fantástica como você sempre foi. A pessoa que eu me apaixonei e que amei para sempre.
E por último... não esqueça o amor que tivemos um pelo outro. Eu não acredito que nós possamos amar apenas uma pessoa na vida, não, você vai amar outras pessoas. Talvez mais, talvez menos, talvez de outra maneira. Mas você ainda vai amar muito. Apenas peço que esse amor que tivemos não seja esquecido.
Eu não vou esquecer.

Com amor,

Harry.


Gina encostou-se a cadeira de balanço, cansada. Ela fechou os olhos por um momento, e sentiu uma lágrima solitária escorrer por seu rosto já tão frágil com o passar dos anos. O rádio tocava uma música lenta e triste. Ela não soube por quanto tempo ficou ali, apenas escutando, sentindo uma paz inexplicável no peito. Ela nunca tinha se sentido tão em paz lendo aquela mensagem nas últimas folhas de seu velho diário. E tantas vezes ela já tinha lido... E, naquele momento, ela fez exatamente o que Harry tinha pedido naquelas linhas. Ela chorou e pensou nele com carinho. Apenas isso. E agora ela estava em paz.
“...que o tempo que nós perdemos, ficou pra trás também o que nos juntou... ainda lembro que eu estava lendo... só pra saber o que você achou... dos versos que eu fiz, e ainda espero... resposta...”
Gina abriu os olhos, suspirando. Ela observou seu netinho brincando com uma varinha de brinquedo, perto dela. Ele soltou uma exclamação de alegria ao fazer a varinha soltar faíscas vermelhas.
- Vovó, olha o que eu posso fazer!
Ela sorriu para ele e acariciou o topo de seus cabelos vermelhos. Foi nesse momento que sua filha entrou. Ela também tinha os cabelos vermelhos, como todos os descendentes da família Weasley. Ela olhou brava para o filho, com as mãos na cintura.
- Ah, aí está você! – ela exclamou nervosa. – Eu disse para não vir incomodar a vovó, ela está descansando!
- Ah, mãe... – o menininho choramingou. – Vovó não se importa, não é?
Ele tinha os olhos brilhantes para a senhora à sua frente. Gina sorriu.
- Claro que não, querido. Pode deixá-lo aqui, filha.
- Ah, não, mãe, eu o procurei pela casa toda para ele vir comer alguma coisa! Fica brincando o tempo todo e esquece de comer!
- Olha o que eu faço, mamãe! – e ele fez a varinha soltar mais faíscas vermelhas.
A mulher suspirou.
- Deixe isso aí e vá para a cozinha, que tem um prato de comida cheinho lá esperando para ser esvaziado. E ai de você se ele estiver cheio quando eu chegar lá!
Resmungando, o menino beijou Gina e deixou a sala. Gina e sua filha se encararam longamente, e sua filha parecia preocupada.
“...você está vendo o que está acontecendo, nesse caderno sei que ainda estão... os versos seus, tão meus que peço... nos versos meus, tão seus que esperem que os aceite...”
- Mãe, a música não está incomodando? – sua filha perguntou, abaixando o volume. – Não quer que eu desligue?
- Não, filha. Tudo bem, pode deixar.
Sua filha novamente se virou, parecendo ainda mais preocupada. Ela se aproximou, ajoelhando-se perto da mãe.
- Você está bem, mãezinha?
- Estou querida... – Gina murmurou com a voz fraca, acariciando o rosto dela. – Apenas... cansada.
Ela olhou para o diário nas mãos de Gina. Ele estava fechado, e Gina apenas marcava o lugar que tinha lido com a ponta de um dos dedos.
- Estava pensando no papai? Com saudades dele?
Gina sentiu uma dor no peito. Se sentia saudade? Sim, sentia... Ele era um bom homem e um bom companheiro, e a fez muito feliz. Foi difícil dizer adeus quando ele se foi, também, como tantos outros. Mas não era nele que Gina estava pensando agora. Ela estava pensando no seu amor, tão antigo, que ocupava sempre aquele espaço silencioso no seu coração e na sua memória e que ela não contava para ninguém. Gina sorriu e beijou ternamente sua filha.
- Não se preocupe, filha. Eu estou bem.
Ela suspirou, levantando-se.
- Tudo bem, então... Eu vou lá ver o que aquele menino está fazendo, antes que ele destrua sua cozinha, o.k?
Gina riu levemente, assentindo. Ela ainda viu quando sua filha lançou um último olhar para ela da porta, parecendo ainda preocupada.
Recostou-se à cadeira novamente, fechando os olhos por um segundo. E sentiu o diário escorregar lentamente por seus dedos, caindo suavemente no chão. Estava tão cansada... e ainda assim, tão tranqüila e em paz consigo mesma...
“...sem mais, eu fico onde estou, prefiro continuar... distante...”
Ela desejou que pudesse ver o sorriso de Harry mais uma vez. Sentiu saudade, aquela saudade que não doía, mas estava sempre lá, de quando ele estava por perto, da voz dele, do cheiro dele... do seu olhar, do seu toque...
Se ao menos ela pudesse vê-lo sorrir por uma última vez...
Gina abriu os olhos e já não se sentia mais tão cansada. Ela se levantou, um pouco mais facilmente do que o normal, e caminhou até a janela que dava para a varanda. Estava fechada, e ela viu o seu reflexo no vidro. Como estava velha... Sua pele estava pálida e frágil, e havia inúmeras rugas em seu rosto. Seus cabelos, que um dia tinham sido tão vermelhos, hoje estavam brancos como a neve. Parecia que fazia tanto tempo e, ao mesmo tempo, parecia que tinha sido ontem...
Ela saiu para a varanda. Sua casa dava para um jardim que, naquela época, era florido. Era primavera, e o cair da tarde era agradável, com uma brisa leve e gostosa. A varanda estava avermelhada pela luz do sol poente. Gina se sentou em um banco de madeira, apreciando aquela vista, apenas sentindo o vento gostoso em seu rosto cansado.
Ela pensou em Harry novamente, e em como ela tinha cumprido sua promessa. Ela nunca tinha esquecido o amor que eles tiveram um pelo outro. Não, o amor ainda estava ali, dentro dela, por mais que estivesse num canto escondido de seu coração.
Então ela viu uma pessoa subindo os degraus de madeira da varanda. Era um senhor, tão velho quanto ela, que andava com dificuldade. Ele tinha os cabelos todos brancos também, mas com a aparência que não viam um pente há muito tempo. Os óculos dele emolduravam olhos claros, mas com a luz fraca do sol poente, Gina não podia dizer ainda a cor deles.
- Com licença... – ele disse com a voz fraca, em um tom familiar.
- Fique à vontade, senhor. – Gina disse calmamente. – Em que posso ajudá-lo?
- A senhora mora aqui, não é? – ele perguntou, mas já parecia saber a resposta.
- Sim, essa é minha casa. E o senhor?
- Eu estava apenas passando e... pensei em pedir um copo de água.
- Ah, claro. – Gina sorriu. – O senhor pode se sentar, eu vou pegar.
Ela viu o homem se sentar ao seu lado no banco, sorrindo timidamente, enquanto ela apanhou um copo de água da jarra na mesinha ao lado, e deu para ele. Suas mãos se tocaram, e Gina sentiu um inexplicável calor no peito.
- Muito obrigado.
Gina se sentou ao lado dele, ainda com aquele sentimento sem explicação. Ela o observou por uns instantes, e era como se o conhecesse há muito tempo...
Ele devolveu o copo para ela, agradecendo novamente. Gina colocou o copo de lado e voltou a olhá-lo. Ele sorriu para ela, e ela conhecia aquele sorriso.
- Obrigado, Gina. – ele falou abruptamente, e não parecia estar agradecendo apenas pelo copo de água, mas por toda uma vida.
Ela sentiu um nó na garganta que, também, não sabia explicar.
- Como o senhor sabe meu...?
Ele segurou as mãos dela entre as suas e se levantou. Ela também o fez e, nesse momento, ela reparou que os óculos que ele usava eram redondos e a cor de seus olhos era de um verde intenso e brilhante. Ela sentiu um calor aquecendo seu corpo, um calor que vinha das mãos dele e a envolvia por inteiro, e vinha daquele sorriso também. Aquele sorriso que ela sentia tanta falta, que ela queria tanto rever...
E foi nesse momento que ela soube quem ele era.
E o nó na garganta se tornou tão intenso, que ela não conseguia mais falar. Ela não sabia nem se conseguia respirar.
- Eu também nunca esqueci, Gina.
- Eu senti tanta saudade, Harry...
E agora ele não parecia mais aquele velhinho que entrara pela sua varanda minutos antes. Ele era o mesmo Harry que ela conhecia, aquele Harry de dezessete anos que tinha cantado em seu ouvido e dançado com ela, aquele Harry que mergulhara com ela na cachoeira e abraçara forte para que ela não tivesse medo...
Aquele Harry que ela amou.
E ele sorriu e mostrou para ela o reflexo deles no vidro da janela, e Gina viu a si mesma. Aquela Gina de dezesseis anos, com cabelos vermelhos e olhos brilhantes, que Harry amou...
- Eu disse que não era uma adeus de verdade...
Ela sorriu. E finalmente estava em paz.
E o sol se punha devagarzinho no horizonte avermelhado. E o calor dele envolvia aquela casa, aquelas paredes, aquecendo tudo ao seu redor. E, dentro daquela casa, um menininho agitava insistentemente a mão enrugada de sua avó, que estava de olhos fechados e um sorriso feliz no rosto cansado. E ele insistiu, até que sua mãe entrou pela porta.
- Mamãe, acho que a vovó está dormindo!
E a mulher correu até sua mãe, preocupada e, segurando seu pulso, ela entendeu. Lágrimas brotaram em seus olhos, mas ela fez força para manter a voz firme e não chorar. Ela se virou para o filho, forçando-se a sorrir.
- Ela está sim... Não acorde a vovó.
Ele assentiu, beijou a mãe e a avó, e saiu correndo da sala. Então a mulher voltou-se para sua mãe, tocou seu rosto carinhosamente, beijou-a com ternura na testa e murmurou:
- Seja finalmente feliz, mamãe.

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