Lar, amargo lar



"Se fosse só sentir saudades, mas tem sempre algo mais
Seja como for, é uma dor que dói no peito
Pode rir agora que estou sozinho,
Mas não venha me roubar"
(Angra dos Reis - Legião Urbana)




Do alto de uma colina erguia-se o místico templo dedicado à Deusa. Na verdade, era um altar ao ar livre, rodeado por pedras circulares que eram marcadas por insígnias sagradas. Lugar este, onde sacerdotisas e druidas mantinham as tradições e ensinamentos passados de geração em geração.

Amanhecia, e a Senhora daquele lugar já estava desperta. Ou melhor, havia passado a noite toda em vigília elevando suas preces à Grande Mãe em busca de luz e entendimento. O céu começava a clarear e ela podia distinguir claramente os contornos do lugar que ela chamava de lar. O sacrifício de tantas gerações não havia sido em vão, o lugar ainda estava imaculado da mancha da maldade do mundo e ela se orgulhava de manter a terra abençoada pela Deusa.

Imersa em pensamentos ela quase não nota a companhia silenciosa de uma de suas jovens sacerdotisas atrás de si observando-a cheia de uma profunda reverência.

-A maré dos tempos está mudando, minha jovem. Eu sinto isso na brisa da manhã, no orvalho que sacia a sede da terra, nos sussurros das árvores. Chegou o tempo em que os véus que separam os dois mundos devem ser desfeitos e a entrada para a terra abençoada deve ser aberta!

A Senhora tinha uma voz firme, mas ao mesmo tempo doce e aveludada que ecoava dentro da mente e coração da jovem sacerdotisa. Convivera tempo demais com a Senhora para saber que ela estava tendo a Visão e, apesar de ser comum, ela ainda se espantava com as coisas que a Senhora dizia.

Com sua voz cheia a Senhora prosseguiu:

- O gamo-Rei tem de dar lugar ao jovem gamo. Chegou o momento em que o velho tem de dar lugar ao novo. O ciclo tem de ser renovado!

A Senhora que até então esteve olhando para a floresta densa que se estendia abaixo da colina do Templo, se volta para sua jovem iniciada e lhe sorri de uma maneira melancólica.

-A estrela que brilhou no dia em que você nasceu tem estado muito brilhante ultimamente, minha jovem Morrigan. Creio que o que li nas estrelas esteja para acontecer - suspirou e dizendo mais para si mesma do que para a sua sacerdotisa, concluiu - só espero que eu tenha interpretado alguns fatos de maneira precipitada.

-Minha Senhora, permita que eu pergunte o que o destino me reserva. É relacionado ao tal homem que a Senhora mencionou? - Morrigan olhou intrigada para sua Senhora e como se tivesse decorado cuidadosamente as palavras recitou - Um homem de duas faces, com a alma amaldiçoada pela marca da morte... É ele, não é? O tal homem está próximo, não está?

-Desculpe, minha adorada, mas ainda não é o momento. Quando ele estiver próximo você o reconhecerá...



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Lupin foi buscar Harry na Toca logo cedo. Foram com o Noitibus Andante até a Cidadela de Godric's Hollow.

Notando a ansiedade do seu jovem companheiro, Lupin passou boa parte do caminho contando as traquinagens que os Marotos aprontavam, na tentativa de tranqüiliza-lo. Harry notou que ele próprio estava muito semelhante à Hermione. A todo o momento bombardeando Lupin com perguntas de todos os tipos e, que este, respondia com satisfação e um brilho saudoso no olhar.

Após duas horas de viagem, chegaram à antiga vila, onde os Potter se esconderam à alguns anos atrás. Um lugarzinho esquecido pelo tempo, poucas casas e moradores desconfiados. A vila, era basicamente habitada por troxas, o que tornava tudo um pouco mais complicado.

Tiveram de chegar ao seu destino sem o uso de suas varinhas ou qualquer tipo de magia. Foi uma boa caminhada até avistarem ao longe o cemitério aonde descansavam os corpos dos pais de Harry. Sob a luz da manhã, a visão era melancólica: anjos brancos de mármore guardavam a entrada do cemitério, como dois sentinelas atentos aos visitantes do lugar.

Caminharam silenciosos em busca da sepultura do casal e Harry sentiu a mão de Lupin em seu ombro direito, em sinal de conforto.

Como se uma força invisível o estivesse guiando, Harry se encaminha ao fundo do cemitério onde um frondoso carvalho guardava o que Harry procurava.

Se aproximaram lentamente das lápides brancas e uma lágrima solitária desceu sobre o rosto de Harry.

-Eu nunca tive coragem de visitar o túmulo de seus pais, Harry. - Lupin pigarreou tentando fazer sua voz sair segura.- Quando houve o ataque a eles, eu estive longe e, quando soube, não consegui vir para cá.

Harry mal ouvia o que Lupin dizia. Tudo o que sua mente registrava eram as pedras brancas, o som dos pássaros ali próximos, quase o convidando para que ele se juntasse a eles.

-Acho que você precisa desse momento a sós com eles, Harry. Vou espera-lo no portão, ok?

Harry apenas se limitou a acenar afirmativamente com a cabeça.

Com um aceno da varinha, limpou as folhas velhas que cobriam os túmulos e conjurou lírios brancos para enfeitarem o lugar onde sua mãe descansava.

Ficou um longo tempo ali, com o olhar vazio fitando o túmulo de seus pais. Pensou no tempo em que sonhou em conhece-los, nas coisas que poderiam ter acontecido se eles não tivessem sido separados, no quanto ele tinha para contar.

Após quase uma hora em que esteve ali, decidiu que já era o suficiente e decidiu partir. Numa última olhada para os jazigos murmurou: - Eu teria trocado todo o ouro do mundo para que vocês estivessem hoje comigo, mas já que isso não é possível, farei com que o sacrifício não tenha sido em vão!

Lupin o esteve esperando na entrada do cemitério, sentado num banco, a cabeça baixa e imerso em seus próprios pensamentos. Sentindo alguém se aproximar levanta a cabeça e sorri paternalmente ao ver Harry diante de si.

- E então? Podemos ir?

-Ainda não... eu gostaria de conhecer minha antiga casa!

-Você tem certeza, Harry? Eu acho que você já teve o suficiente por um dia e...

-Eu preciso disso, Lupin!

Lupin estudou a expressão determinada do jovem e viu que não adiantava contestar.

Seguiram a estrada que tinham tomado para chegar ao cemitério. Conforme andavam, a paisagem ia se tornando mais arborizada e, também, mais abandonada. Após alguns minutos de caminhada silenciosa se depararam com as ruínas de um chalé. O teto havia desabado, mas algumas paredes ainda estavam de pé, delineando aonde antigamente estavam os cômodos da casa.

Harry conteve o impulso de correr até o lugar. Caminhou com certa dificuldade pelo mato alto que circundava a casa. Um aperto no peito e um nó em sua garganta se instalaram nele lhe dando um sentimento de solidão angustiante.

Harry começou a andar em volta da casa a estudando meticulosamente. Em seu íntimo, se manifestava o desejo de encontrar alguma coisa, uma mínima lembrança que fosse. Passava a mão nas paredes que ainda estavam de pé, como se elas lhe trouxessem conforto.

Chegou, ao que ele supôs ser os fundos do casebre. Afastando algumas madeiras velhas entrou no que ele deduziu ser a cozinha. Foi quando o inesperado aconteceu.

Lembrando um daqueles efeitos de filme troxa que ele assistia escondido na casa de seus tios, a casa gradativamente foi se reconstruindo diante de seus olhos. Paredes se levantavam, o teto retornava ao lugar e os objetos se restauravam voltando ao seu lugar de origem.

Com o rosto entre surpreso e radiante, olhou em volta procurando por Lupin, mas este, pelo visto, devia estar na entrada da casa. De tão aéreo que estava, Harry mal havia lhe dado atenção.

Concentrou-se novamente na casa. A cozinha não era muito grande, mas era arejada e bem iluminada. Pela organização do lugar, Harry percebeu que a mania de limpeza de sua tia era coisa de família. A cozinha era muito limpa e as panelas em cima do fogão ofuscavam sua vista de tão limpas que eram.

Notou que, sentada à uma pequena mesa, estava uma mulher com longos cabelos acaju. Ela cantarolava distraidamente uma canção qualquer enquanto examinava pilhas e mais pilhas de pergaminhos que estavam esparramados sobre a mesa.

Pasmo, Harry parou em frente à mulher, mas esta continuou absorta em seu trabalho e não notou sua presença

"É a mesma coisa quando se visita à lembrança de alguém, deve ser algum tipo de penseira, sei lá" - Harry comentou para si mesmo, mas isso não era o mais importante no momento.

Aproveitou e examinou cada detalhe do rosto da jovem mulher: sua pele alva de aparência macia, os longos cabelos flamejantes que lhe caiam graciosamente até o meio das costas e, o mais impressionante de tudo, o par de olhos verdes que Harry fitava todos os dias quando se olhava no espelho. Estava diante de Lilly Potter!

Imaginem só a supresa do jovem, quando pela porta que dava acesso aos outros cômodos da casa, entra um jovem, poucos anos mais velhos do que Harry e que era a sua cópia viva?!

Quando todos diziam o quanto Harry e seu pai eram parecidos, não era por brincadeira. O mesmo corpo magro, os cabelos rebeldes, os óculos de aro redondo. Tudo muito parecido, exceto pelos olhos verdes que Harry acabara de contestar, eram iguais aos de sua mãe.

James se aproximou de sua jovem esposa, que estava sentada de costas pela porta de onde ele havia entrado.

"Lilly! Trabalhando a essa hora da noite?" - franziu a testa preocupado - "Você não deveria estar se cansando muito. Não nesse estado!"

Lilly levantou-se e olhou carinhosamente para o marido. Apesar do vestido leve e largo que ela usava, era visível a gravidez adiantada em que ela estava. Puxou uma das mãos de James e colocou-a sobre a sua própria barriga.

"É tudo culpa desse rapazinho aqui! Ele não me deixa dormir mais" - James sorriu alegre quando sentiu o bebê se mexer dentro da barriga da mãe.

"Com certeza ele vai jogar quadribol, igual a você, James!"

Harry nunca pensou que um casal pudesse ser tão feliz como os seus pais eram naquele momento. Viu os seus pais se desvanecendo e com um pouco de tristeza guardou aquela última imagem para si. Olhou em volta, mas a casa ainda estava intacta.

Prosseguiu com a sua excursão pela casa. Pela mesma porta por onde vira seu pai entrando na cozinha ele chegou à sala de estar. A sala era um cômodo aconchegante com várias poltronas e um grande sofá fofo. Na lareira o fogo já estava se extinguindo, sinal de que já era tarde da noite. Vários quadros de bruxos e bruxas parecidos com seu pai espiavam ansiosos os dois homens sentados no sofá confortável em frente à lareira.

O homem de cabelos rebeldes torcia as mãos em sinal de nervosismo, enquanto o outro tentava acalmá-lo em vão.

"Calma Pontas! Fica quieto aí, que você não pode fazer nada lá dentro! Se a Lilly vê você chegando lá, é bem capaz de te lançar um cruciatus bem no meio das fuças" -

Um Sirius muito jovem, diferente daquele que Harry conhecera, dava palmadinhas nas costas do amigo.

"Almofadinhas, é a minha mulher que tá lá dentro. Ela precisa de mim e ..."

Sirius Black e James Potter interromperam a conversa quando uma mulher de rosto redondo e olhar simpático vinha de um corredor oposto à porta de onde Harry observava a cena, acompanhada de um choro de criança.

"Parabéns! O senhor é pai de um belo menino!"

James emocionado deu um longo abraço no amigo que o estivera aturando durante aquela noite inteira. Sem esperar uma resposta da curandeira ele saiu desabalado em direção ao quarto, com Harry em seus calcanhares.

Entrou ofegante no quarto e observou extasiado. Lilly segurava um pequeno embrulho de cabelos escuros e lágrimas de felicidade rolavam por seu rosto. Levantou os olhos até encontrarem os de seu marido "Venha ver o nosso bebê. Ele é a sua cara!"

James sentou-se ao lado da esposa na cama e lhe deu um beijo carinhoso na testa. Um pouco contrariado, desviou os olhos da mulher e do bebê e começou a remexer num dos bolsos internos de suas vestes. Tirou de lá uma corrente prateada com um pingente em forma de meia-lua. A mesma corrente que anos mais tarde a irmã de Lilly iria dar ao herdeiro dos Potter.

"Isso aqui Lilly" - disse James enquanto colocava a corrente ao redor do pescoço da esposa - "é uma herança de família. Meu pai a deu à minha mãe quando eles se casaram e eu espero que um dia, esse rapazinho aqui possa fazer o mesmo..."

Com lágrimas nos olhos, Harry se afastou do quarto e entrou num outro aposento. Este era decorado com vários dragõezinhos voando num papel de parede azul. Do lado direito da porta havia um berço branco e nas prateleiras que ficavam no alto tinham vários bichinhos de pelúcia: hipogrifos, unicórnios e pégasus. Próximo a janela, Lilly ninava um bebê de aproximadamente um ano, acariciando os rebeldes cabelos negros dele.

Foi tudo muito rápido. Um estrondo, a voz de James gritando para Lilly fugir, vozes que discutiam e o barulho de um corpo caindo no chão.

Com lágrimas teimando em fugir de seus olhos, Lilly deixou o bebê no berço e começa a procurar freneticamente por sua varinha. Com a varinha em mãos ela sela a porta com um feitiço, mas este foi em vão. Novamente um estrondo se fez. A porta se abriu abrupta e um homem de vestes negras e olhos vermelho entrou pela porta. Sua voz fria e sua gargalhada se emoção ecoaram pelo quarto e assustaram o bebê que estava no berço.

Os pedidos de clemência vindos da mãe não foram eficientes. Um jorro de luz verde e o corpo de Lilly jazia sem vida no chão. Agora o caminho estava desbloqueado para Lord Voldemort. Nada poderia detê-lo. Pelo menos foi isso o que ele pensou.

Horrorizado, Harry observava toda a cena. Quando Voldemort ergueu a varinha contra o bebê, sua cicatriz explodiu em dor. Aos poucos tudo foi escurecendo e a casa se transformou em escombros. Sua última visão foi Lupin indo ao seu encontro com um olhar assombrado.



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N/A: Bem... aqui está o novo capítulo... espero que vocês tenham gostado. Para as meninas que estão ansiosas em saber se o Lupin vai aparecer mais, podem ter certeza que vai.
D. Sônia, vc estava reclamando que estava roendo as unhas de curiosidade, não é? pois então, a culpa é toda sua. aprendi com vc a fazer suspense...rs
Brincadeiras a parte, quero agradecer mais uma vez a paciência de vocês em ler essa humilde fic...
bjos no coração

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