"Pequenas Confissões"



— Quando foi que chegamos a esse ponto? – Dorothy suspirou com os olhos fechados, deitada ao lado de Midori. As duas estavam sozinhas no quarto enquanto as outras quatro assistiam o pequeno jogo de Quadribol que os meninos organizaram no campo da mansão Malfoy.

— Eu realmente não sei, loirinha. – Midori respondeu. Dorothy riu-se. – O que foi?

— Nada... Eu só estava pensando o quanto eu iria achar absurdo minha situação atual se alguém me contasse um tempo atrás. – ela abriu os olhos e encarou a amiga que fez o mesmo – Nada me abalava.

— Porque você não tinha o que proteger. – a oriental declarou. As duas ficaram em silencio por um momento, encarando o teto.

— Eu era mesmo solitária. – comentou - Costumava pensar que se eu me mantivesse ocupada e ficasse longe das pessoas, não me machucaria. O medo de ser abandonada era maior que o da solidão, já que eu sempre me virei sozinha. Mas... – ela hesitou.

— Mas...?

— De repente eu não me sentia assim. Parecia que a realidade tinha me deixado e eu vivia em um universo paralelo. Eu lia tantos livros sobre o príncipe encantado num cavalo branco que não consegui sair desse conto de fadas que ele me arrastou. Eu sabia que era bom demais pra ser verdade e, com o tempo, ficar sozinha se tornou doloroso, então eu preferi adiar. Descobrir quem ele era e me decepcionar... Eu podia fazer isso outro dia. Afinal, perdi a conta de quantas noites eu já passei naquela biblioteca só pra que a primeira coisa que eu fizesse no dia, fosse ler uma carta dele. – ela respirou fundo por um momento. – Você tá errada sobre não ter o que proteger... Eu só tinha uma coisa. E eu não protegi algo que eu deveria ter colocado numa caixa de ferro. – Dorothy sentiu seus olhos marejarem – Eu estava tão distraída achando que era invisível que o único cara que realmente me viu levou meu coração.

— Não chora... – Midori segurou a mão da amiga. – Você sabe que vai precisar encarar ele uma hora, né? – Dorothy afirmou com a cabeça, limpando as lágrimas que escorregavam pelo seu rosto com a palma da mão, enquanto a outra segurava firmemente a mão da amiga.

— Eu sei. – ela respirou fundo – Eu só não sei por onde começar.

— Eu to sempre aqui, ok? – ela sorriu para a amiga.

— Midi?

— Fala.

— Você nunca vai perdoar o Weasley? – perguntou. Midori encarou o teto por um momento procurando uma forma de responder.

— Nós éramos muito novos quando me apaixonei por ele. – começou – Eu não sabia o que estava fazendo, muito menos ele. – ela sorriu de lado – Eu não era capaz de mentir pra ele nessa época, mas tudo o que ele fez pra mim foi mentir. Nada muito dramático. Ele só não parecia me contar toda a verdade. Ele estava sempre com os meninos e, se eu perguntasse o que faziam, ele só comentava que era coisa de garoto. Então eu brigava com ele e isso o irritava. “Por que você não confia em mim? Você não gosta dos meus amigos! Quer que eu faça o quê? Largue eles por você?”, ele sempre falava esse tipo de coisa. Eu me sentia culpada e ia pedir desculpas. Ele ia aprontar com os meninos, ficava de detenção e, se eu comentasse alguma coisa, ele respondia que só estava por perto, os meninos que aprontavam. – Midori revirou os olhos – Dorothy, eu não estou brava por todas essas coisas, eu realmente não ligo se ele se diverte aprontando com os meninos. Eu estou magoada, ele quebrou meu coração quando nem sequer teve coragem de pedir pra eu ficar. Fui embora porque ele simplesmente me deixou ir. Então eu nem sequer olhei pra trás. Peguei minhas coisas, fui pra França e... Prometi a mim mesma que não deixaria ninguém mexer comigo. – Midori franzia a testa e Dorothy ouvia em silêncio. Era a primeira vez que Midori realmente se abria sobre Wallace com ela. Claro, ela já sabia da história, mas a amiga sempre fora muito vaga sobre o assunto, de fato. – Prometi que iria amadurecer e aprender tudo o que se tinha pra aprender sobre garotos pra que eu soubesse exatamente o que falar quando o visse novamente. Aprendi de tudo um pouco observando as garotas da escola. Você sabe... Veelas. – a garota afirmou com a cabeça e Midori continuou – Até que, no mês anterior a minha volta a Hogwarts, eu conheci esse cara e ele não me deixava em paz. Nessa época eu já sabia bastante e tinha meu grupo de “amigas”. Eu tentava ao máximo ignorar ele porque uma das meninas gostava dele e eu não fazia ideia de que eles estavam ficando quando aquela festa idiota aconteceu. Eu tive tanto medo de voltar pra Inglaterra. Mas eu precisava voltar, precisava encarar o Wallace e mostrar pra ele o quanto ele perdeu por ter me deixado ir e o quanto eu tinha superado ele. – ela se sentou na cama com as pernas cruzadas, encarando a parede e, num suspiro, continuou – Só que, quando eu entrei pelas portas do salão e ele tava bem ali, sentado, meu coração parou. Ele só me encarava e eu fingia não perceber. Engraçado como, dentre todas as pessoas no Salão, o único que eu conseguia enxergar era ele. Pelo canto do olho, andando o mais confiante que eu pude pra longe de onde ele tava, fingindo não ter o visto. Fingindo não ter reparado no quão diferente ele estava.

— Midori... – Dorothy sentou ao lado da amiga ao perceber que a mesma deixava escapar algumas lágrimas.

— Eu não consegui. Passei dias tentando achar uma forma de encarar ele, mas não dava. Então, quando eu percebi que, de alguma forma, nós seis estávamos ligadas aos marotos, eu pensei que seria mais fácil com vocês. Só que ao invés de resolver o meu problema, eu fui me envolvendo nos problemas de vocês e ficou fácil procrastinar essa ideia de “vingança” que eu tinha.

— Eu sei. – Dorothy abraçou a amiga.

— Eu sinto muito que as coisas acabaram desse jeito, Dothy. – ela limpou o rosto e olhou a amiga. Dorothy franziu a testa.

— Como assim, Midori? Você tá falando sério? Se não fosse por você eu ainda estaria brincando de conto de fadas com ele e continuaria sendo só uma rata de biblioteca iludida e sem amigas. – disse a abraçando. Midori riu com o comentário.

— Eu não consigo perdoar que ele tenha me deixado, Dorothy. – ela respirou fundo – Mas ele também não me perdoa por ter ido. Eu consigo sentir cada vez que ele olha pra mim. Eu não sou mais a mesma, ele também mudou. Não adiantaria fingir que nos gostamos porque... Como você pode se apaixonar por alguém que não conhece?

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No pequeno campo ao lado da casa, os meninos se dividiam em dois times de três enquanto Rock arbitrava o jogo. Robbie, Loren e Carly assistiam pela arquibancada e conversavam.

— Então Rock e Joey são um casal agora? – Loren perguntou a Robbie.

— Bom, sim. – ela riu.

— E você tá com o meu irmão? – a ruiva encarou Carly.

— Não tivemos um encontro oficial ainda, mas podemos dizer que sim. – Carly corou sorrindo. Loren parecia resolver uma equação complicada, encarando Robbie.

— E agora você e o Ramon realmente estão namorando... – ela resmungou.

— Vai acabar saindo fumaça dessa cabeça ruiva. – Carly comentou. Robbie arqueou a sobrancelha.

— Loren? Que foi?

— A Dorothy e o Thomas estão brigados e a Midori, com certeza, ainda gosta do Weasley. Você, Rock e Carly estão num relacionamento. Merlin! – exclamou emburrada – Eu definitivamente to solteira nesse mundo.

— Não tão solteira, né? Você namora. – Carly lembrou. Loren empalideceu.

— Ai, meu Merlin. Jerry! – o pensamento do atual namorado a atingiu como um tapa – Esqueci de terminar com ele! – declarou fazendo com que as meninas caíssem na gargalhada. Pararam ao ouvir um apito indicando o fim do jogo e os garotos descendo das vassouras até a arquibancada.

— Bom jogo! – Robbie deu um beijo na bochecha de Ramon que sorriu e a abraçou. O grupo ficou conversando por um tempo até que os meninos decidiram ir tomar banho. James e Carly combinaram de jantarem juntos no jardim, Ramon e Robbie iam assistir um filme na área de cinema trouxa da mansão, Wallace e Thomas foram terminar de ler as HQs que estavam no porão enquanto Daniel tentava compor, Rock e Joey conversavam na varanda da casa e Loren, Midori e Dorothy se reuniam na cozinha.

— Então quer dizer que você decidiu conversar com ele? – Loren perguntou de dentro da dispensa da cozinha, Dorthy sentada sobre a bancada com um pote de sorvete e uma colher na mão entregou o pote pra Midori sentada ao seu lado.

— Sim. Quer dizer, é a melhor coisa a se fazer. – a loira respondeu.

— Fora que vamos ficar aqui mais alguns dias, eles não podem se evitar pra sempre. – Midori afirmou. Loren enfiou a cabeça pra fora da dispensa.

— Você quer dizer igual você e o Wallace fingindo que nunca se falaram na vida? – a ruiva argumentou. Midori franziu a testa.

— Isso é diferente, ok? – respondeu enfiando uma colher de sorvete na boca.

— Bom, pra mim parece o mesmo. – Loren saiu da dispensa com um pacote de cookies na mão e se escorou na pia da cozinha, abrindo-o. – Tirando o dia que ele descobriu o que aconteceu na outra escola, você fazendo aquele barraco e tals, vocês, basicamente, ficam em lados opostos de qualquer ambiente e não se falam nem pra dar um bom dia. – Midori revirou os olhos e passou o pote de volta para Dorothy que procurava conter um riso.

— E você, Loren? Como vai sua crush bizarra no Fontaine? – a oriental perguntou, amarga.

— Eu NÃO tenho uma crush bizarra nele! – ela a repreendeu – Eu só... – ela procurava palavras enquanto Midori e Dorothy a encaravam com a sobrancelha erguida, desistiu revirando os olhos – Tenho uma crush bizarra nele. – ela admitiu fazendo as duas sorrirem. – Porém, estou determinada a aposentar esse sentimento, ok?

— Loren, se eu fosse no seu quarto e achasse um pôster dele colado na parede, eu não ficaria surpresa. Vocês praticamente cresceram juntos, ele é o melhor amigo do seu irmão e vive na sua casa. Como você planeja simplesmente parar de gostar dele? – Dorothy pulou da bancada e se dirigiu até Loren, roubando um de seus biscoitos.

— Ei! – ela protestou, mas Dorothy já estava com o cookie de chocolate na boca.

— Você nunca sequer tentou falar pra ele, Loren. – Midori imitou a amiga e roubou um cookie. Loren revirou os olhos.

— Já tentei sim, ok? Diversas vezes. – ela se defendia – Acontece que ele sempre estava ocupado demais enfiando a língua na garganta de alguma menina do ano dele pra sequer perceber que eu estava lá. Sabe, é incrível como ele é fofo comigo uma hora e depois ele volta a ser ele mesmo. – disse frustrada – Ele sempre vai me ver como a irmã mais nova do James, meninas. Isso é um fato e eu estou aceitando esse fato seguindo em frente e fingindo que eu não levo um tiro toda vez que ele fala...

— Oi, ruivinha. – Danny entrou na cozinha fazendo Loren gelar, Dorothy quase derrubar o pote de sorvete e Midori engasgar com o biscoito. – Oi, meninas. – ele entrou na dispensa pegando uma garrafinha de água no freezer da mesma e saiu logo em seguida. As três permaneceram caladas por alguns segundos e Loren parecia absurdamente mais branca do que o normal.

— Ai, meu Deus... – Midori sussurrou e se virou pra ruiva. – Será que... – encarou Dorothy que a encarava de volta.

— Será que ele ouviu alguma coisa? – Dorothy se voltou para a garota que parecia a beira de um colapso. - Loren?

— Amiga, dá um sinal. – Midi pediu e Loren a olhou como um cachorrinho abandonado na chuva.

— Eu vou morrer. – ela declarou chorosa. As duas amigas se encararam enquanto Loren escorregava lentamente em direção ao chão, sentando. – Anotem, meninas. Esse é o trágico fim de Loren Lilian Potter. Azar e vergonha assombrarão meu nome através das próximas gerações até que todos se esqueçam da minha humilde e patética existência. – Midori se sentou do lado dela.

— Para com isso, criatura. – ela acariciou o cabelo da pobre ruiva e Dorothy se sentou do outro lado.

— É. Eu tenho certeza que, se ele tivesse ouvido, ele teria falado alguma coisa. – ela a confortou. Loren a olhou com um pouco de esperança.

— É, ele teria. – Midori afirmou. Loren deu um leve sorriso aliviado. Do lado de fora da cozinha, Daniel sorria de lado, escorado na parede.


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