O Seletor.



— E se, hipoteticamente, Voldemort não for um bruxo de sangue puro? — Hermione disse à Harry e Ron.


 


As cabeças se viraram na direção dela quase que instantaneamente. Eis que estavam sentados no jardim externo do castelo, aproveitando as últimas horas de sol do dia. Não que Hermione gostasse muito de tomar sol, mas o pretexto era bom.


 


— Por que você sugere isso? — Ron questionou intrigado, apoiando o tronco frontal nos cotovelos que jaziam abarrotados perante a grama.


— Viu em algum livro? — O olhar de Harry brilhou quando ele pronunciou tais palavras. Parecia estar acordando aos poucos para a realidade, se dando conta de que qualquer informação - por menor que fosse - era de extrema ajuda.


— Não, não. — Hermione balançou a cabeça negativamente, se esforçando ao máximo para ser convincente. — Apenas estou tentando trabalhar com hipóteses variadas. Assim, quem sabe, consigo encontrar algo mais rápido.


— Você está certa. — Ron sorriu para ela, dando de ombros. — Aliás, quando não está?


— Acho que devemos considerar isso. Hipótese, não é? — Harry interveio antes que Hermione rebatesse a frase provocativa do amigo ruivo. — Bem, se Voldemort não fosse um bruxo de sangue puro, eu não conseguiria imaginar um motivo pra que ele pregasse a condenação de bruxos similares a ele.


— Talvez ódio por não ser um sangue puro. — Ron considerou, deitado na grama fitando o céu. Parecia raciocinar melhor quando estava assim, Hermione pensou entre risos baixos. — Logo, quis acabar com todos os outros iguais a ele pra que isso não se perpetuasse. Tipo extinção da espécie.


— Talvez faça sentido na cabeça dele. — Hermione ponderou com sabedoria.


 


A questão é que talvez jamais saberia afirmar com precisão. Não fazia sentido que Voldemort fosse um mestiço ou nascido trouxa e, portanto, pregasse a 'extinção' de bruxos dessa mesma classe. Não que devesse fazer sentido. Afinal, alguém que mata pessoas tão cruelmente não deve ter o dom do raciocínio pleno.


 


— Aonde você vai? — Harry questionou.


— Bem... — Hermione disse, levantando-se do lugar em que estivera na grama durante as últimas duas horas. — Não basta ter hipóteses. Preciso checá-las, não é?


 


Tampouco os amigos grifinórios puderam se manifestar, Hermione já estava longe. Rumara entre os corredores de Hogwarts em passos apressados na direção do seu segundo lar no castelo: a biblioteca. Porém, ao chegar à porta, soubera que não encontraria nada sobre Voldemort naqueles livros. Teria de ser mais ousada - e cautelosa - e o foi.


Aparecera diante da sala de Dumbledore sob o falso pretexto de precisar de alguns detalhes à respeito de Voldemort para auxiliar Harry em algumas dúvidas pessoais, assegurando que ele estava em paz de espírito e plena segurança, longe de pormenores. Muito satisfeito, mas ocultamente desconfiado, Dumbledore lhe dissera breves coisas. Na verdade, seus detalhamentos eram longos, mas não traziam novidades diante das coisas que ela já ouvira da boca do professor. Nessas horas, a penseira no canto da sala lhe atraía a atenção como nunca, deixando-a desejosa de que pudesse por meros segundos que fosse observar se ali haveria algo sobre o jovem Tom Riddle. Estava certa de que sim.


 


— Bem, se não se incomoda srta. Granger, eu tenho uma reunião importante no Ministério nesse momento. — Dumbledore dissera em seu usual tom de calmaria, levantando-se da cadeira confortável. — Mas creio que gostará de poder organizar os pensamentos antes de ir. Eu mesmo adoraria fazê-lo, uma vez estando no seu caso.


 


E então ele sumira pela lareira esverdeada. Hermione mantera o olhar fixo ali por alguns segundos, sentindo na pele a sensação da viagem via flu. Só então se levantara da cadeira, rumando para fora da sala. Foi ali que uma idéia vital lhe tomara conta do pensamento: o Chapéu Seletor. Ele jazia ali, esquecido num canto próximo a saída da sala de Dumbledore. Estava sem vida, sutil como um chapéu convencional, ainda que sua aparência imensa, por si só, já fosse extravagante ao extremo. Hermione, por sua vez, se aproximou com cautela dele e mal escutou quando sua voz saiu em baixo tom através dos lábios.


 


— Chapéu? — Ela chamara baixinho. Não sabia se ele possuía vida própria. Talvez fosse despertado apenas com o uso de algum feitiço específico ou por um professor.


— Hm... Hermione Granger. — O Chapéu clamou, estrondoso como sempre. — Nunca me esqueço de um rosto que já vi. Ou seria melhor dizer uma cabeça em que pousei?


 


Hermione sorriu para ele, sentindo-se reconfortada. Sabia que anos de história estavam ali, naquele chapéu velho, existente desde a fundação de Hogwarts. Ele vira tanta coisa inacreditável...


 


— Em que posso te ajudar? — O Seletor questionou, prosseguindo seu diálogo. — Em busca de se certificar sobre minha escolha durante a seleção? Todos os bruxos que me procuram, o querem fazer.


— Eu gostaria de saber algumas coisas sobre uma seleção em especial. — Hermione disse com excitação. — Porém, não é a minha.


— Uh... Algum amigo? Familiar? — A voz do chapéu soava alto pela sala, aquecendo o ambiente. — Talvez um bruxo famoso?


— Tom Marvolo Riddle. — Hermione disse por fim, fazendo o objeto mágico a sua frente parar por um instante.


— Riddle... — Ele suspirou profundamente, como se tudo tivesse ocorrido no dia anterior. — Me lembro bem de sua seleção. Uma mente tão ardilosa!


— Então, você poderia reproduzir exatamente o que disse a ele naquela noite em que o selecionou para a Sonserina? — A essa altura, as palavras da grifa tinham um gosto amargo em sua boca, como se ela já não pudesse esperar mais por respostas.


— Mas é claro! — Lhe sorriu o objeto, soltando um pouco de pó ao redor de si. — Eu lhe sugeri a Corvinal num primeiro momento, visto que Tom Riddle era dono de uma mente incomparável. Talvez eu devesse ter contido meus impulsos posteriores e o despejado naquela Casa de imediato, teria sido um jovem brilhante. Porém, acabei lhe indicando que a Sonserina seria capaz de levá-lo ao máximo de poder e glória.


 


Hermione parou por um momento, estática e temerosa. Então o livro estava certo, a cena que vira não fora inventada pela mente de alguém. Ela se lembrava do que ouvira: O Chapéu Seletor sussurrara ao garoto que ele deveria ir para a Corvinal, a Casa dos sábios. Depois, mudara de idéia e o indicara a Sonserina, onde ele alcançaria a grandeza. Era tudo real.


Hermione agradeceu rapidamente o Seletor, rumando em passos apressados para a Sala Precisa, seu atual dormitório. Nas pesquisas da biblioteca ela lera que era possível apreender memórias reais em livros, criando a visualização de tais cenas por quem o abrisse. Eram requisitos mágicos complicados, antigos, extintos. Portanto, ela não se apegara aos detalhes.Agora lhe restava saber: De quem eram aquelas memórias? Por que elas haviam sido armazenadas no livro? Como tal encadernamento havia ido parar na Floreios & Borrões?


 


* * *


Compartilhe!

anúncio

Comentários (0)

Não há comentários. Seja o primeiro!
Você precisa estar logado para comentar. Faça Login.