Paradoxos.



— Eu não acredito, Hermione! — Ginevra Weasley bufou irritada, cruzando os braços na altura do peito. O olhar transmitia sua real incredulidade, enquanto os lábios esboçavam a decepção com aquilo tudo. — Estamos em Hogsmeade! Você tem mesmo que ser sempre a certinha e passar o dia na livraria?


— Deveria deixar de reclamar e aproveitar o dia ao lado do seu namorado. Eu estou deixando vocês livres por uma tarde inteira. — Hermione respondeu com simplicidade, tentando não demonstrar seu aborrecimento pelo uso da palavra pejorativa. Uma tentativa falha.


— Oh, então é isso, não é? Ciúmes. — Gina revirou os olhos em desdém. — Achei que fosse mais madura e soubesse administrar melhor as coisas, Hermione. Não é porque eu estou namorando com o Harry e meu irmão optou por Lilá que você tem que agir desse jeito.


— Ginevra Molly Weasley! — Hermione berrou realmente furiosa, sem se preocupar com as cabeças que se viraram em sua direção, acompanhando a cena com cautela. — Não me importo com o seu namoro ou em Ronald estar sufocando Lilá Brown com os lábios. Eu gasto meu tempo com coisas úteis e graças a isso, vou estar preparada quando essa guerra estourar diante dos meus olhos. Diferente de você, eu não serei protegida pelos meus pais, trinta e sete irmãos, namorado... Pelo contrário. Eu terei que ajudar a proteger vocês todos de novo, como tenho feito há cinco anos seguidos, além de ter que zelar pelos meus pais trouxas! Essa guerra nem mesmo é minha, uma nascida trouxa!


 


O silêncio tomou conta de todo o ambiente. Ao mesmo tempo em que o alívio veio, após cuspir com fúria todas as palavras no rosto da garota, sentiu também o remorso por ter sido dura demais. Infelizmente, já estava feito. Gina engoliu em seco, abaixando o rosto na direção do chão e derramando as primeiras lágrimas. Hermione, porém, estava sobrecarregada há dias com as pesquisas sobre o passado de Voldemort e não se deixaria sensibilizar naquele momento. Precisava ser fria, estar focada na sua busca. Um consolo sentimental a distrairia do que precisava fazer - ou melhor, encontrar - e isso seria inadmissível.


 


— Eu sinto muito. — Disse, sem realmente ter tais sentimentos em si, coisa que a garota ruiva notou com nitidez.


 


E assim, a grifinória mais velha deixou o restaurante na ala leste de Hogsmeade e caminhou até onde realmente gostaria de estar: a livraria bruxa, Floreios e Borrões. Ao empurrar levemente a porta, abrindo passagem para o corpo delineado pelos anos juvenis, o barulho da sineta tocando lhe trouxe a sensação de estar no melhor lugar do mundo. E estava, na sua opinião.


Alguns poucos bruxos se aventuravam ali, sendo a maioria deles em busca de livros obrigatórios para o ano letivo que não puderam ser comprados outrora, por algum motivo qualquer. Ela, porém, estava ali com um objetivo específico e logo o colocou acima de qualquer outra observação, passeando pelas prateleiras abarrotadas de títulos nas mais diversas línguas. Cautelosamente, apanhou a varinha e mentalizou a figura de Voldemort, sussurrando em baixo tom um feitiço eficaz que a professora Minerva havia lhe ensinado para encontrar facilmente palavras-chave nos grossos livros estudantis. Infelizmente, apenas um livro reluziu à sua frente. Algo sobre bruxos famosos de todos os tempos, que certamente não traria muito sobre o passado de Voldemort, Hermione concluiu. Ainda assim, o apanhou por precaução e passou a procurar então por algum título educacional que pudesse distraí-la nas horas vagas. "Só você consegue se distrair com livros de estudo", dizia Ron com frequência.


Foi então que, por algum motivo desconhecido, um livro simples e abarrotado chamou a atenção dela, jogado às traças no fundo de uma prateleira, como que esquecido ali. Não haviam exemplares semelhantes ao seu lado, como se ele fosse único, escrito à mão. Hermione logo sorriu diante de tal hipótese. Ter um livro único no mundo, para os seus estudos, seria uma excelente vantagem. Ao apanhá-lo, sentiu a textura da capa de couro cinza sobre os dedos, um ritual de realização que gostava de fazer a cada nova leitura. Não havia título nem autor na capa e isso a fez sorrir internamente, lembrando que nos primórdios da sociedade bruxa, os autores simplesmente não assinavam suas obras para não serem acusados de impropérios pelo ministério bruxo ou trouxa. Talvez ambos.


As páginas amareladas deslizaram com facilidade pelos dedos ávidos, mas nenhuma palavra surgiu. As sobrancelhas de Hermione se elevaram em estranheza e ela tornou a folhear o livro, sem nenhum sucesso. Quando estava pronta para voltá-lo à prateleira, questionando-se por que um caderno vazio de anotações estaria em meio a tudo aquilo, sentiu a cabeça girar ao mesmo tempo em que a visão ficou turva, fechando os olhos para não sucumbir.


Quando os abriu novamente, viu uma imensa porta luxuosa com o emblema da Sonserina diante de si. Sorriu aliviada por estar em Hogwarts, independente de não entender a razão daquilo, mas sua tranquilidade foi embora ao escutar passos e vozes se aproximando. Procurou se esconder como fosse possível atrás de uma estátua mediana, sendo ocultada pelas sombras, para o caso de Snape avistá-la ali. Parecia muito tarde.


 


— A cerimônia de seleção foi cansativa. — Disse uma pequena garota para o colega sonserino ao seu lado. — Achei que jamais acabaria.


 


Enquanto ela sorria divertida, ele nada dissera. Estava rígido, indiferente a tudo aquilo. Com a proximidade crescente de ambos, Hermione pôde ver que a menina era espetacularmente bela. Quase que uma veela de tão encantadora com seus cabelos louros que desciam encaracolados até o meio das costas, contrastando com os belos olhos azuis. Porém, o garoto era totalmente oposto a ela. Tinha os cabelos escuros e muito lisos, levemente bagunçados no topo da cabeça, além dos olhos negros. Era um pouco assustador, mesmo sendo apenas um garoto.


 


— Tom, por que você é tão seco comigo? — A menina questionou, em tom choroso.


— Eu não tenho por que agir de compaixão com você, Gaunt. — Foi a resposta dada. — Me chame de Riddle, se não se importa. Não temos tamanha intimidade.


— Você não a tem com ninguém! — Ela vociferou irritada, caminhando na direção dele. — Nunca permite que alguém te estenda a mão, que admire o quão incrível você é, Tom. Deixe-se ser feliz.


— Ninguém quer me estender a mão, a não ser para me atirar no fundo do abismo. Eu sou filho de um sangue-ruim, Gaunt! Um descendente de Salazar com o sangue de um trouxa correndo pelas veias! — Ele bufou nervoso e por um minuto Hermione julgou que ele a mataria com as próprias mãos, mas ele apenas partiu em direção à porta, sumindo dali.


 


Hermione caminhou devagar na direção da garota que ficara esquecida, chorosa. Não sabia se era o certo a fazer, visto que os Sonserinos eram muito orgulhosos nesses casos, mas sua compaixão clamava mais alto.


 


— Sua ambição cega te tornará um monstro, Tom. — Gaunt disse, em meio as lágrimas.


 


Ao tocá-la, porém, Hermione percebeu que era como se não fosse notada. Estava invisível naquela cena. E então a visão tornou a turvar-se, levando-a de volta à livraria, com as páginas abertas em mãos. Hermione sentiu-se mal, sem ar. Lutou para normalizar os batimentos cardíacos enquanto se perguntava sobre o que seria aquilo que segurava entre os dedos.


Caminhando com certa dificuldade até o balcão da loja, retirou alguns galeões da bolsa à tira-colo e pagou pelos dois livros, saindo quase que imediatamente. Estava certa de que voltaria à Hogwarts mais cedo naquele dia, com uma missão e um mistério em mãos.




NOTA: Suponho que a esta altura já tenham percebido que o curioso livro encontrado por Hermione foi o 'escrito' por Morgana Gaunt há anos atrás. O que acharam da primeira memória vista por ela? Mais esclarecimentos no próximo capítulo!

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