CAPÍTULO 21



CAPÍTULO 21


 


Gina estava de pé diante da janela, olhando para o pátio, com um sorriso no rosto ao lembrar o ocorrido à noite anterior. A julgar pelo ângulo do sol, devia estar no meio da manhã, e fazia apenas uma hora que se levantou, depois de dormir até mais tarde.


Nessa mesma manhã, Harry tinha feito amor novamente, lento e prolongadamente, desta vez com uma gentileza deliciosa e contida que, inclusive agora, fazia com que o pulso acelerasse só de pensar. Não havia lhe dito que a amava, mas estava certa de que a amava, por mais inexperiente que fosse na arte do amor. Gina se voltou para a donzela, que segurava outro vestido apressadamente adaptado ao seu tamanho, nesta ocasião um de suave casimira de cor creme. Apesar da expressão severa e mal-humorada da donzela, Gina estava absolutamente decidida a romper as barreiras e iniciar uma boa relação com seus servos. Se tinha amansado um lobo, não seria tão difícil ganhar a simpatia de seus servos.


Procurou alguma coisa para dizer à donzela, aceitou o vestido e assinalou com um gesto para a banheira situada no quarto. Compreendeu que aquele era um bom tema para iniciar uma conversa.


- Essa banheira é tão grande que cabe de quatro a cinco pessoas. Em minha casa nos banhávamos no lago, ou nos arrumávamos com uma pequena banheira de madeira que só continha água suficiente para cobrir até o seio.


- Estamos na Inglaterra, milady. - replicou Agnes ao mesmo tempo em que recolhia o vestido que sua senhora tinha usado na noite anterior.


Gina lhe dirigiu um olhar de assombro, sem estar muito certa de ter sentido no tom de sua voz um certo matiz de superioridade.


- Em todos os grandes castelos da Inglaterra têm banheiras enormes e lareiras e... coisas como estas? - perguntou fazendo um amplo gesto com o braço que incluía a luxuosa habitação, com seus cortinados de veludo e os macios tapetes que cobriam o chão.


- Não, milady. Mas está em Claymore, e Snape... o mordomo do amo, que foi também do senhor anterior, tem ordens de manter o castelo nas condições adequadas para receber um rei. Toda semana damos brilho na prata, e não permite que se acumule pó nas tapeçarias nem no chão. E se algo se quebra, logo é substituída.


- Deve dar muito trabalho para manter tudo tão perfeito. - comentou Gina.


- Com certeza, mas o novo amo disse a Snape o que tem que fazer, e Snape, apesar de ser um homem duro e orgulhoso, faz o que lhe ordenam, independente do que sinta a pessoa que vai fazer.


Este último e assombroso comentário revelava tal sentimento de amargura e ressentimento, que por um instante Gina acreditou que não tinha escutado corretamente. Franziu o cenho e se voltou para a donzela.


- Agnes, o que quer dizer?


Evidentemente, Agnes se deu conta de que tinha falado muito, porque empalideceu e ficou tensa, e dirigiu a Ginevra um olhar carregado de temor.


- Não quis dizer nada, milady. Nada! Todos nós sentimos orgulho de ter em casa o amo, e se seus inimigos nos atacassem como certamente farão, nos sentiremos orgulhosos de lhe entregar nossas colheitas, nossos homens e inclusive nossos filhos para a batalha. Orgulhosos! - repetiu em voz baixa e desesperada em que, entretanto, detectava-se um matiz de ressentimento. - Somos um povo bom e leal, e não desejamos nenhum mal ao amo pelo que fez. Só confiamos em que não tenha nada contra nós.


- Agnes, - disse Gina com suavidade - não há nenhuma necessidade de que tenham medo de mim. Não trairei suas confidências. O que quer dizer com isso de «pelo que fez»?


A pobre mulher tremia tanto que quando Harry abriu a porta da habitação e colocou a cabeça para lembrar a Gina que a esperava lá embaixo para o almoço, Agnes deixou cair o vestido no chão pelo susto. Recolheu-o rapidamente e saiu correndo do quarto. Mas ao abrir a pesada porta de carvalho, voltou-se para Harry e, desta vez, Gina a viu benzer-se de novo com toda certeza.


Com o vestido de casimira na mão, Gina permaneceu olhando fixamente a porta fechada, perdida em seus pensamentos.


O grande salão mostrava poucos sinais da festa da noite anterior; as mesas montadas sobre cavaletes que tinham enchido a enorme estadia, foram desmontadas e retiradas. De fato, a única coisa que restava da festa era uma dúzia de cavalheiros que dormiam ainda em bancos situados ao longo das paredes, roncando sonoramente. Gina observou com simpatia que os servos embora eficientes, faziam sua tarefa tentando não importunar os que dormiam, e mais de um deles teve que evitar uma pernada de um irado cavalheiro que não desejava ver perturbado seu sonho.


Harry levantou o olhar quando Gina se aproximou da mesa, e ficou de pé com aquela graça natural e felina que ela sempre tinha admirado nele.


- Bom dia. - saudou-a com um tom de voz baixo e íntimo. - Espero que tenha dormido bem.


- Muito bem. - respondeu Gina com certo tom de sobressalto, embora em seus olhos aparecesse um brilho de alegria quando se sentou a seu lado.


- Bom dia, querida! - exclamou tia Elinor com expressão feliz, ao mesmo tempo em que levantava o olhar de uma parte de veado que cortava de uma bandeja em frente a ela. – Tem um aspecto de estar se sentindo muito animada esta manhã.


- Bom dia, tia Elinor. - disse Ginevra com um sorriso tranqüilizador. Depois olhou para a outra mesa, onde os homens silenciosos que também estavam pressentem: Sir Rony, Sir Godfrey, Sir Lionel, Sir Eustace, Hagrid e frei Gregory. Consciente do estranho silêncio e de que os homens mantinham o olhar baixo, saudou-os com um sorriso vacilante. - Bom dia a todos.


Cinco rostos masculinos, pálidos e cansados, levantaram-se para olhá-la, com expressões que foram da dor à confusão.


- Bom dia, milady. - responderam amavelmente em uníssono.


Mas três deles fizeram caretas e os outros dois esconderam os olhos com as mãos. Só Hagrid parecia se sentir normal essa manhã, o que significava que não mostrava nenhuma expressão e que não lhe dizia absolutamente nada a ninguém. Gina fez pouco caso dele e olhou frei Gregory, que não parecia achar-se em melhor estado dos outros, e depois se voltou para seu marido.


- O que acontece hoje com todo mundo? - perguntou.


Harry se serviu de um pedaço de pão e outro de carne e os homens fizeram o mesmo, a contra gosto.


- Não fazem mais que pagar o preço da orgia de ontem à noite, em que beberam muito e foram com muita... bom, embebedaram-se. - disse com um sorriso zombador.


Surpreendida, Gina olhou para frei Gregory, que acabava de levar uma jarra de cerveja aos lábios.


- Você também, frei Gregory? - perguntou, e o pobre homem ficou a ponto de engasgar-se.


- Sou culpado do primeiro, milady, - falou mortificado - mas afirmo minha mais completa inocência quanto ao segundo.


Gina, que não compreendia a que se referia o frade, dirigiu a ele um olhar de estranheza, mas tia Elinor interveio imediatamente.


- Me antecipei a este tipo de reações querida, assim nas primeiras horas da manhã desci para a cozinha para preparar uma boa beberagem restauradora, e descobri que só havia um pouquinho de açafrão.


O comentário sobre a cozinha chamou imediatamente a atenção de Harry, que pela primeira vez pareceu estudar tia Elinor com grande interesse.


- Parece que em minhas cozinhas faltam outras coisas... coisas que possa tornar tudo isto muito mais agradável ao paladar? - perguntou ao mesmo tempo em que apontava as insípidas sobras da noite anterior.


- Certamente, sua graça. - replicou ela em seguida. - Fiquei assombrada ao descobrir o quanto sua cozinha está mal abastecida. Encontrei romã e tomilho, mas não presta, não tem raiz de gengibre, canela, orégano ou cravo. E não encontrei um só fruto seco em todo o lugar, exceto uma pobre noz. Os frutos secos são complementos maravilhosos aos delicados molhos e para as deliciosas sobremesas...


Diante apenas da menção de «delicados molhos e deliciosas sobremesas», tia Elinor se transformou de repente no centro da atenção de todos os homens. Só Hagrid não mostrou o menor interesse, preferindo ostensivamente a comida fria que comia aos ricos molhos e sobremesas.


- Continue. - disse Harry, observando-a com encantada fascinação. - Que tipo de coisas teria preparado se tivesse disponível os ingredientes necessários?


- Bom, deixe-me pensar... - respondeu, franzindo o cenho. - Faz décadas que não dirijo uma cozinha, mas... OH, sim, teria preparado empanadas de carne cozida, tão macias e saborosas que se desfazem na boca. E se pensarmos, por exemplo, nesse frango que estão comendo... - acrescentou dirigindo-se a Sir Godfrey, entusiasmada com sua nova posição de perita em culinária - Em vez de assá-lo no espeto e servi-lo tão seco e duro, teria preparado meia porção de caldo e outra de vinho, condimentado com cravo, erva-doce e pimenta, colocado depois sobre uma bandeja para passar o molho no pão o que o tornaria muito mais saboroso. E também podem fazer muitas outras coisas com frutas como maçãs, pêras e marmelo, claro que necessitaria de mel, amêndoas e tâmaras para as massas, e também canela. Mas como já lhe havia dito, em sua cozinha não se encontra virtualmente nada disso.


Harry a olhou fixamente e perguntou:


- Poderia encontrar as coisas de que necessita aqui em Claymore, ou provavelmente no povoado?


- Poderia supor que boa parte disso poderia ser encontrada aqui. - apressou-se a responder tia Elinor.


- Em tal caso, - proclamou Harry com o tom de quem emite um decreto real - a cozinha fica agora em suas mãos, e todos nos esperaremos com ansiedade comidas excelentes no futuro. - Voltou-se para Snape, que nesse momento se aproximava da mesa, levantou-se e lhe informou: - Acabo de colocar a cozinha sob a responsabilidade de Lady Elinor.


O esquálido mordomo manteve o rosto cuidadosamente inexpressivo. Inclinou-se amavelmente, mas apertou com força o punho ao replicar:


- Como já lhe disse, a comida tem pouca importância para mim.


- Pois deveria ser extraordinariamente importante para você, Snape, - informou-lhe tia Elinor em tom autoritário - já que estava ingerindo mantimentos errados. Ninguém que, como você, padece de gota deveria comer nabos, queijo e alimentos gordurosos.


- Eu não padeço de gota, senhora. - respondeu ele com expressão pétrea.


- Padece! - prognosticou alegremente tia Elinor, e ficou de pé, ansiosa por começar a recolher das hortas e dos bosques os ingredientes que necessitava.


- Se está preparado para iniciar nossa visita à propriedade - disse Snape a seu senhor, fazendo pouco caso da senhora - podemos partir imediatamente. - Uma vez que Harry assentiu, acrescentou friamente: - Espero que não encontre nenhum defeito em meu trabalho como mordomo, deixando à parte a cozinha.


Harry lhe dirigiu um olhar penetrante, mas logo se voltou para Ginevra, deu-lhe um beijo na face e sussurrou junto a seu ouvido:


- Sugiro que durma uma longa sesta, pois tenho a intenção de te manter bem acordada durante toda a noite.


Gina notou que um quente rubor se espalhava sobre suas bochechas. Hagrid ficou de pé com a intenção de permanecer ao lado do duque durante a inspeção da propriedade. Mas Harry o deteve.


- Acompanhe Lady Elinor em suas expedições. - disse, e depois, com um tom de voz significativo, acrescentou: - E se ocupe de que não aconteça nada fatal.


O rosto de Hagrid se petrificou ainda mais diante daquela ordem determinante. Afastou-se, ressentido e ofendido, enquanto tia Elinor trotava animadamente atrás dele.


- Comeremos magnificamente, - disse ela entusiasmada - embora neste projeto tenha que empregar vários dias, pois além de especiarias para a comida também necessitamos de ingredientes para meus remédios e ungüentos. Necessitarei de cravo para os nervos, e maças, naturalmente. Maça evita cólica, sabe? Assim como os fluxos relacionados ao corpo, e depois está a noz moscada, que é muito benéfica para o resfriado. E terei um cuidado especial com sua dieta, pois deve saber que não se encontra bem. Têm uma disposição melancólica... me dei conta disso logo que o vi.


Sir Eustace se voltou para os outros cavalheiros e sorriu maliciosamente.


- Lionel, - disse em voz bastante alta para que o gigante que já se ouvisse - eu diria que nosso Hagrid oferece agora um aspecto melancólico? Ou não seria mais certo dizer que parece ofendido?


Sir Lionel deixou de mastigar, observou as rígidas e longas costas de Hagrid e com um brilho de regozijo nos olhos, replicou depois de um instante de reflexão:


- Eu, bem diria que Hagrid se sente vexado.


- Ofendido. - concluiu Sir Godfrey.


- Com cólica. - acrescentou Ronald Potter com um sorriso zombador.


Os homens olharam Ginevra, como a convidando a unir-se a sua diversão, mas não teve necessidade de recusar o convite porque, nesse momento, Hagrid se voltou e dirigiu um olhar sombrio ao grupo, capaz de pulverizar uma rocha e que facilmente teria aterrorizado à maioria dos homens. Desgraçadamente, o olhar causou o efeito contrário sobre os cavalheiros, o eco das gargalhadas acompanhou a Hagrid, até depois da porta pela qual desapareceu.


Só o jovem Gawin, que acabava de chegar, saiu em defesa do gigante. Sentou-se à mesa e olhou os outros com expressão irada.


- Acompanhar uma senhora para recolher ervas e frutos secos não é um trabalho adequado para um cavalheiro e sim para uma donzela.


Lionel deu um tapinha no rapaz e em tom zombador, disse:


- Se continuar pensando assim conseguira a eterna aversão de Lady Anne, rapaz. Se a acompanhasse de vez em quando para recolher flores, teria muito mais oportunidade com a dama do que se mostrando diante dela como um galo de briga e tentando impressioná-la com suas virtudes masculinas.... como fez ontem à noite. - Depois se voltou para Ginevra e acrescentou: - Este meio homem prefere o gesto carrancudo à galanteria. Está convencido de que isso é mais masculino. E enquanto ele a olhar com o cenho franzido, Roderick se dedica a dançar elegantemente com Lady Anne, enche-a de cuidados e ganha seu coração. Se importaria de instruí-lo um pouco a respeito disso?


Sensível ao sobressalto juvenil do pobre Gawin, Gina comentou:


- Não posso falar em nome de Lady Anne, mas eu não vejo na pessoa de Sir Roderick nada que induza uma mulher a voltar à cabeça para ele.


Uma expressão de gratidão apareceu nos olhos de Gawin, que logo dirigiu um olhar sombrio a seus companheiros antes de prestar atenção a sua insípida comida.


Gina passou o resto da manhã e parte da tarde trancada com as costureiras que Snape tinha recrutado no povoado para ajudá-la a preparar seu vestuário. Sem dúvida o mordomo era eficiente, pensou Gina enquanto registrava o conteúdo das arcas que tinham levado para seu quarto. Eficiente e frio. Não gostava dele absolutamente, embora não soubesse exatamente por que. A julgar pelas palavras de Agnes, todos os servos de Claymore tinham em muita alta estima esse esquálido homem. Estima mesclado com um pouco de temor. Frustrada com suas próprias e estranhas reações emocionais diante de todos os que tinham conhecido em seu novo lar, assim como pelo interminável e incômodo silêncio das mulheres que trabalhavam, estudou o desdobramento dos ricos tecidos estendidos sobre a cama e das cadeiras. Parecia uma brilhante mancha de jóias líquidas: sedas de cor rubi debruadas de ouro, brocados de prata e ouro, veludos de cor ametista e tafetás de cor safira, que reluziam como se estivessem polvilhados com diamantes, e ricos e brilhantes cetins de todas as cores, da pérola e do esmeralda ao preto, junto também havia suaves lãs inglesas de todas as cores e texturas imagináveis, dos mais brilhantes amarelos e vermelhos até as cores cremosas, cinzas, marrons e negros. Havia algodões da Itália, com linhas horizontais e verticais, linhos puros e quase transparentes para camisolas e roupa de baixo; etéreas malhas para véus e flexíveis couros para luvas e sapatilhas.


Embora calculasse a confecção de um guarda-roupa completo para Harry, ela mesma e tia Elinor, Gina apenas podia conceber o modo de empregar tantos tecidos. Atingida pela magnitude da tarefa que lhe esperava, e por sua própria falta de imaginação e conhecimento de moda, voltou-se um tanto aturdida para duas enormes arcas transbordantes de peles.


- Acredito que isto poderia ser utilizado para revestir uma capa feita com esse veludo azul escuro para o duque. - disse dirigindo-se a Agnes ao mesmo tempo em que tomava entre as mãos uma luxuosa peça de escura de Marta.


- O cetim cremoso... - disse Agnes. Mas fechou a boca imediatamente e assumiu de novo seu habitual gesto franzido.


Gina se voltou para ela ao sentir com alívio e surpresa que a mulher tinha lhe devotado voluntariamente uma palavra de conselho, pois acabava de saber que tinha sido a costureira da antiga proprietária de Claymore.


- O cetim cremoso...? - repetiu Ginevra, tentando esconder sua falta de entusiasmo diante da idéia. - Sério? Acha que o duque gostaria disso?


- Deveria ser para você. - disse Agnes, com voz quase abafada, como se uma consciência interior a obrigasse a falar contra do mau uso da Marta zibelina. - Não para ele.


- OH! - exclamou Gina gostando da combinação sugerida. Assinalou outra pele branca, e perguntou: - Mas como?


- O arminho é para utilizar na borda do brocado de cor safira.


- E para o duque? - insistiu Gina satisfeita.


- O veludo azul escuro, o negro, e esse marrom escuro. - respondeu Agnes.


- Possuo poucos conhecimentos sobre moda. - admitiu Gina, que sorriu satisfeita diante das sugestões. - Quando menina era um tema que não me interessava, e mais tarde, durante os últimos anos, vivi em uma abadia, e a única moda que via ali era os hábitos que todas nos usávamos. Mas já me dei conta de que têm um gosto excelente, e aceitarei de bom agrado seus conselhos.


Ao se voltar para Agnes, captou surpreendida um olhar de assombro na mulher, e algo que poderia ter sido um sorriso, embora suspeitasse que se devesse mais ao feito de admitir que tinha estado em uma abadia e não pelo elogio sobre o bom gosto de Agnes. As outras duas costureiras, ambas jovens de rostos pouco agraciados, também pareciam ter-se abrandado ligeiramente com seus comentários. Provavelmente a considerassem menos «intimidade» ao saber que durante os últimos anos tinha vivido como uma piedosa católica.


Agnes se adiantou e começou a recolher os tecidos, incluídos os linhos e algodões, que já tinham sido selecionados para usos específicos.


- Podem se encarregar de fazer o desenho para a capa e o vestido? - perguntou Gina, enquanto observava atentamente o brocado cor creme. - Não tenho muita idéia a respeito de como deve ser cortado, embora vá ajudar, é claro. Temo que saiba manejar melhor a tesoura que a agulha.


Um som abafado, como uma ligeira risada contida, escapou dos lábios de uma das mulheres mais jovens, e Gina se voltou para a costureira chamada Gertrude, que a olhou ruborizada.


- Sorriu? - perguntou Gina com a esperança de que tivesse feito, fosse qual for à razão, pois necessitava desesperadamente de algum tipo de camaradagem feminina. O rubor de Gertrude se tornou mais intenso. - Sorriu, não é verdade? É pelo que disse a respeito de minha destreza com as tesouras?


À mulher começou a tremer os lábios e os olhos quase saíam das órbitas, enquanto se esforçava por conter uma risada nervosa. Gina tentou imaginar o que podiam achar as donzelas de divertido em seu comentário sobre sua habilidade com as tesouras. A idéia lhe ocorreu de repente, e, boquiaberta, perguntou:


- Ouviu falar do que fiz... com as coisas de seu amo, não é verdade?


A pobre mulher se voltou para sua companheira, contendo ainda mais a risada, e depois olhou para Gina.


- É certo então o que se diz milady? - sussurrou.


De repente, aquele ato desesperado também pareceu divertido a Gina, que assentiu alegremente.


- Foi algo terrível de minha parte... muito pior que costurar as mangas das camisas para que não pudesse usar e...


- Também fez isso?


E antes que Gina pudesse responder, as duas costureiras soltaram sonoras gargalhadas e começaram a darem cotoveladas umas na outras, com gesto de aprovação. Inclusive Agnes tremia os lábios com intenção de não rir.


Uma vez que as duas jovens mulheres foram embora, Gina entrou no quarto de Harry em companhia de Agnes para lhe dar alguns objetos de seu marido a fim de que as utilizasse como padrão para as medidas das novas. Havia algo estranhamente íntimo e intenso no ato de entregar seus casacos, capas e camisas.


Tinha costas extraordinariamente largas, pensou Gina com um formigamento de orgulho ao entregar a Agnes a túnica de lã. E, observou com surpresa que para um homem tão rico possuía poucas roupas. As que tinha eram da mais alta qualidade, mas já estavam muito usadas, como testemunha silenciosa de um homem cujas preocupações se dirigiram para questões mais importantes que roupa.


Muitas das camisas estavam desfiadas nos punhos, e em duas delas faltavam botões. Certamente, estava muito necessitado de uma esposa que se ocupasse daquele tipo de detalhes, pensou Gina com um leve sorriso. Agora compreendia por que se mostrou tão contente no acampamento quando ela se ofereceu para cerzir suas roupas. Sentiu uma ponta de culpa ao lembrar o dano deliberado que tinha causado aos poucos objetos que pelo visto possuía. E diferente das donzelas, não lhe parecia mais tão divertido, e o que era motivo de risada a intrigava e preocupava. Parecia-lhe bastante estranho, como tantas coisas em Claymore.


Uma vez quebrado aquele muro de reticências, Agnes pareceu disposta a falar mais abertamente a respeito de como proceder com os objetos e antes de partir chegou a dirigir a Gina um tímido sorriso, algo que, entretanto, também lhe preocupou tanto quanto lhe agradou.


Uma vez que a donzela partiu, Gina permaneceu onde estava, no quarto de Harry, intrigada e pensativa. Incapaz de encontrar uma resposta jogou uma capa ligeira sobre os ombros e desceu disposta a encontrar respostas na única pessoa com a qual se sentia perfeitamente livre para falar.


Sir Eustace, Sir Godfrey e Sir Lionel estavam no pátio, sentados em um banco de pedra, com os rostos suados e sustentando flacidamente as espadas com as mãos. Evidentemente, tentavam recuperar sua força depois de uma noite de farra e de uma tarde dedicada a praticar com as espadas.


- Viram frei Gregory? - perguntou Gina.


Sir Eustace disse que achava ter visto o frade indo falar com o carreteiro, e Gina seguiu a direção indicada, sem estar muito segura de saber exatamente em que edifício de pedra dos vários que tinham espalhados pelo vasto perímetro interior do castelo. A cozinha, facilmente identificável pela alta lareira, achava-se ao lado do castelo mesmo. Junto da cozinha estava o armazém, a cervejaria e uma encantadora capela. Do outro lado do pátio, de onde se encontrava, estava a ferraria, onde o ferreiro estava ocupado em pôr ferraduras em um cavalo, e Gawin se dedicava a polir o escudo de Harry, ignorando o monte de armaduras e armas que esperavam serem reparadas por mãos menos exaltadas que as suas. O abrigo das carroças estava ao lado e mais à frente se achavam os estábulos. E também um chiqueiro e um grande pombal, que parecia totalmente vazio.


- Procura alguém, sua graça?


Gina se voltou surpreendida para ouvir a voz do frade.


- Sim, buscava precisamente você. - respondeu, tornando a rir diante do seu próprio sobressalto. - Desejava lhe perguntar... a respeito de certas coisas. - Olhou ao redor e observou às inúmeras pessoas que se encontravam no pátio de treinamentos, ocupadas em diversas atividades. - Mas não aqui.


- Vamos sair então para dar um passeio além dos portões? - sugeriu frei Gregory, ao compreender imediatamente que Gina desejava falar com ele onde não pudessem ser observados ou escutados.


Ao se aproximar dos guardas do portão, entretanto, Gina experimentou uma comoção.


- Sinto muito milady, - disse o guarda com atitude amável, mas decidida - tenho ordens de que não abandone o castelo, exceto em companhia de milorde.


- O que? - perguntou Gina com expressão de incredulidade.


- Não pode sair...


- Ouvi o que disse. - disse Gina, tratando de controlar um acesso de cólera. - Quer dizer que... devo me considerar uma prisioneira?


O guarda, um soldado curtido, com muita experiência nas batalhas, mas nenhuma no trato com as damas nobres, dirigiu um olhar alarmado para o sargento da guarda, que se adiantou, fez uma reverência, e disse a Gina:


- É pelo... seu bem, por sua segurança, milady.


Acreditando que se referia ao que provavelmente não estivesse segura no povoado depois do ocorrido no dia anterior, Gina fez um gesto gracioso com a mão.


- OH, mas não tenho a intenção de passear além dessas árvores e...


- Sinto muito. Mas milorde deu ordens precisas.


- Compreendo. - disse Gina, embora na realidade não compreendesse, e tampouco gostava de se sentir prisioneira. Começou a se afastar, mas se deteve de repente, voltou-se para o desventurado sargento e com voz baixa perguntou: - Me diga uma coisa, afeta esta restrição a todo aquele que deseje abandonar o castelo... ou só a mim?


O homem desviou o olhar.


- Só a você, milady. E a sua tia.


Zangada e humilhada, Gina voltou-se e lhe ocorreu que, indubitavelmente, Harry não tinha enviado Hagrid como escolta de tia Elinor, mas sim como seu guardião.


- Conheço outro lugar onde podemos ficar tranqüilos. - sugeriu frei Gregory ao mesmo tempo em que a tomava pelo braço e a guiava através do espaçoso pátio.


- Não posso acreditar nisto! - sussurrou Gina furiosa. - Sou uma prisioneira, aqui, em meu próprio lar.


Frei Gregory fez um amplo gesto com a mão abrangendo o enorme pátio de treinamentos.


- Ah, mas que gloriosa prisão. - comentou com um sorriso apreciativo. - Jamais vi castelo mais bonito que este.


- Uma prisão sempre é uma prisão! - observou Gina em tom sombrio.


- É possível. - admitiu o sacerdote, sem incomodar-se em discutir com ela a questão - Mas seu marido tem razões, diferente das que pensa, para que a mantenha dentro dos limites de seu mais completo amparo.


Sem se dar conta do que fazia, Gina seguiu o frade até a capela. Ele abriu a porta e se afastou par para o lado para deixá-la passar.


- Que tipo de razões? - perguntou ela assim que se encontraram dentro da fria capela.


Frei Gregory lhe indicou uma cadeira de carvalho e Ginevra se sentou.


- Não sei, é claro. - respondeu finalmente. - Mas o duque não me parece um homem capaz de agir sem ter uma muito boa razão.


Assombrada, Gina o olhou fixamente.


- Simpatiza com ele, não é verdade, frei Gregory?


- Sim, mas é muito mais importante que você goste.


Gina levantou as mãos em um gesto de impotência.


- Essa pergunta eu teria respondido que sim até alguns minutos atrás, quando descobri que não posso sair do castelo.


Frei Gregory cruzou os braços e, arqueando uma sobrancelha, perguntou:


- E agora? Depois de ter descoberto, continua gostando?


Gina esboçou um sorriso triste e, a contra gosto, assentiu com a cabeça.


- Eu diria que isso responde tudo. - disse ele com expressão divertida, ao mesmo tempo em que aproximava uma cadeira e se sentava a seu lado. - E agora, o que desejava me falar de tão grave?


Gina mordeu o labio inferior e tratou de pensar em uma forma adequada de lhe explicar.


- Observou algo estranho na atitude de todos? Não para mim, e sim para com meu marido.


- Estranho, em que sentido?


Gina comentou que tinha visto as donzelas se benzerem cada vez que Harry se encontrava perto delas, e também mencionou que lhe pareceu estranho que no dia anterior ninguém desse amostras de alegria ao vê-lo retornar. Terminou por lhe contar que as donzelas se puseram a rir quando, inadvertidamente, ela confirmou o rumor que circulava sobre o dano que tinha causado às roupas e mantas do duque.


Em vez de mostrar-se escandalizado diante da confissão de Gina, frei Gregory a olhou com um gesto de admiração.


- Chegaram realmente a estraçalhar as mantas? - perguntou. Ao ver que ela assentia, incômoda, acrescentou: - É uma mulher de extraordinária coragem, Ginevra, e creio que irá necessitar em sua convivência com o duque.


- Não foi nada corajoso de minha parte. - disse ela. - Eu não tinha a menor idéia de que me encontraria ali para ver sua reação, visto que Luna e eu tínhamos a intenção de fugir na manhã seguinte.


- De qualquer forma, não deveriam ter destruído as mantas que esses homens necessitavam para se esquentarem. - disse o frade. Fez uma pausa, e acrescentou: - Embora esteja certo de que se deram conta disso. E agora, permita-me responder a sua pergunta a respeito da «estranha» reação dos aldeãos diante do seu novo senhor?


- Sim, por favor. Por acaso é minha imaginação?


Frei Gregory se levantou bruscamente da cadeira, dirigiu-se para as velas que ardiam diante de uma cruz e endireitou uma que estava caindo.


- Não imagina nada. Faz só um dia que estou aqui, mas observei que o povo não conta com um sacerdote há pelo menos um ano, de forma que todos se mostraram mais dispostos a falar comigo. - Franziu o cenho e se voltou para ela. - Está sabendo de que seu marido sitiou este lugar há oito anos? - Ao observar o gesto de assentimento de Ginevra, pareceu ficar aliviado. - Bem, presenciou alguma vez um cerco? Sabe o que acontece?


- Não.


- Não é nada agradável, fique certa disso. Entre os camponeses circula um ditado segundo o qual, «quando dois nobres brigam, incendeiam as cabanas dos pobres», e isso é verdade. Não é só o castelo e seus proprietários os que sofrem, mas também os arrendatários e servos. Suas colheitas são arrasadas tanto pelos defensores como pelos atacantes, seus filhos morrem na batalha, e seus lares ficam destruídos. Não é nada insólito que um atacante incendeie deliberadamente os campos que rodeiam o castelo, destrua as colheitas e as hortas, e inclusive assassine os camponeses para impedir que sejam aliciados pelos defensores.


Embora nada de tudo aquilo fosse completamente novo para Gina, nunca tinha estado no cerco de um castelo nem tinha presenciado suas conseqüências. Agora, entretanto, sentada na pacífica e pequena capela que foi levantava em um local que Harry tinha sitiado em outros tempos, a imagem veio para ela em uma clareza desagradável.


- Não resta dúvida de que seu marido fez algumas dessas coisas quando sitiou Claymore, e embora esteja convencido de que não tinha motivos pessoais e agiu de acordo com os melhores interesses da Coroa, para os camponeses importa muito pouco os motivos nobres quando se vêem empobrecidos por uma guerra que não têm nada a ganhar e tudo a perder.


Gina pensou nos clãs das terras altas, que não paravam de lutar, sem queixar-se das privações, e sacudiu a cabeça, aturdida.


- As coisas são diferentes aqui.


- A diferença dos membros de seus clãs, e especialmente dos habitantes das terras altas, os camponeses ingleses não participam dos despojos da vitória. - explicou frei Gregory ao compreender o dilema em que se encontrava Gina. - Segundo a lei inglesa, todo o território pertence ao rei. O rei outorga parcelas de seu território aos nobres a quem favorece como recompensa por sua lealdade ou algum serviço especial que prestou à Coroa. Os nobres escolhem os lugares que desejam para sua própria herdade e depois concedem ao camponês uma certa quantidade de terreno, em troca do qual se espera que o vassalo trabalhe durante dois ou três dias da semana nos campos do senhor, ou lhe ofereça seus serviços no castelo. Naturalmente, também se espera deles que contribuam de vez em quando com uma quantidade de grão ou de outro produto. Em épocas de guerra ou fome, o senhor está moralmente obrigado, embora não legalmente, a proteger os interesses de seus servos e vassalos. Em algumas ocasiões eles fazem, embora por Deus só porque isso lhes beneficia.


Frei Gregory guardou silêncio e, depois de um instante, Gina perguntou:


- Quer dizer que temem que meu marido não os proteja? Ou que o odeiam porque sitiou Claymore e queimou seus campos?


- Nenhuma das duas coisas. - A contra gosto, frei Gregory acrescentou: - Os camponeses estão resignados de que seus campos sejam incendiados pelo menos uma vez em cada geração, quando seu senhor entrar em uma batalha com outro senhor de terras. Mas no caso de seu marido, é diferente.


- Diferente? - disse Gina. - Em que sentido?


- Ele dedicou sua vida à guerra, e os camponeses temem agora que seus inimigos desçam sobre Claymore um após o outro para cobrar sua vingança. Ou que seja ele mesmo que os convide para vir alimentar seu amor pela guerra.


- Isso é ridículo! - exclamou Gina.


- Certo, mas terá que transcorrer certo tempo antes que eles se dêem conta.


- E eu que acreditava que se sentiam orgulhosos dele porque era... um herói para os ingleses.


- Sentem-se orgulhosos dele. E também confiam que, diferente de seu antecessor, esteja disposto a defendê-los se for necessário. A fortaleza e o poder que possui constituem uma grande vantagem para eles neste caso. Na realidade, temem-lhe.


- Eu diria que se sentem aterrorizados diante dele. - disse Gina ao lembrar a forma como reagiam as donzelas em sua presença.


- Isso também, e por boas razões.


- Não me ocorre nenhuma boa razão para que se sintam aterrorizados. - replicou Gina com uma grande convicção.


- Ah, claro que a têm. Se ponha em seu lugar. Seu novo senhor é um homem que chamam de Lobo, quer dizer, que recebe o nome de um animal maligno, que ataca e devora suas vítimas. Além disso, a lenda repito, a lenda, não os fatos, diz que é cruel com todo aquele que cruza em seu caminho. Como novo senhor, também tem o direito de decidir que impostos aplicará, e, naturalmente, presidirá os julgamentos que se celebrem sobre as disputas, e terá que impor castigos a quem agiu mal, como é seu direito. Agora bem, - acrescentou frei Gregory com um olhar significativo - dada sua fama de homem implacável e malvado, ninguém gostaria de ser julgado por ele, não lhe parece?


- Mas ele não é desumano nem maligno. Se fosse a metade do que dizem, minha irmã e eu teríamos sofrido um destino muito pior do que sofremos em suas mãos.


- Certo. - admitiu o frade com um sorriso de orgulho. - A única coisa agora que falta a seu marido é passar um tempo com seu povo, para que eles mesmos cheguem as suas próprias conclusões.


- Fala como se fosse muito simples. - replicou Gina, que se levantou e sacudiu a saia. - E suponho que seja. Só espero que o povo não demore tanto tempo em se dar conta de...


De repente, a porta da capela se abriu e ambos se voltaram para ver a expressão de alívio no rosto encolerizado de Harry.


- Ninguém sabia onde estava. - disse. Aproximou-se de Ginevra e seus passos ressonaram de modo sinistro sobre o chão de madeira polida da capela. - No futuro, não desapareça sem comunicar a alguém aonde vai.


Frei Gregory dirigiu um olhar ao rosto indignado de Ginevra, desculpou-se amavelmente e saiu da capela. Assim que a porta se fechou atrás dele, Gina falou.


- Não sabia eu que era uma prisioneira em meu próprio lar.


- Por que tentou abandonar o castelo? - perguntou Harry, sem incomodar-se em fingir que não compreendia a que se referia.


- Porque desejava falar em particular com frei Gregory, sem que nenhum servo nos observasse ou escutasse. - respondeu ela com gesto sombrio. - E agora, responda a minha pergunta, por que me proibiu de abandonar este lugar? É meu lar ou minha prisão? Não farei...


- É seu lar. - interrompeu-a ele e, para surpresa de Gina, sorriu e acrescentou: - Tem os olhos mais azuis que jamais vi. Quando se zanga, adquirem a cor do veludo azul molhado.


Gina fez uma careta de desgosto, embora momentaneamente apaziguada para ouvir que aquele era seu lar.


- Veludo molhado? - repetiu muito asperamente, enrugando o nariz. - Veludo molhado, eca!


- Por acaso não é assim? - perguntou Harry com um sedutor sorriso. - Que deveria ter dito?


O sorriso era, com certeza, tão irresistível, que Gina sentiu que sua ira se desvanecia.


- Bom, poderia ter dito que são da cor de... - observou a grande safira que havia no centro do crucifixo - Das safiras. Isso soa melhor.


- Ah, mas as safiras são frias, - disse - enquanto que seus olhos são quentes e expressivos. O que lhe parece? Foi melhor? - Soltou uma gargalhada ao sentir que ela não encontrava nenhum outro argumento que se opor ao do veludo molhado.


- Bastante. - respondeu Gina. - Agora, se importaria de continuar?


- Quer por acaso que continue com meus elogios?


- Certamente.


- Muito bem. Suas pestanas me lembram uma vassoura coberta de fuligem.


Uma risada musical brotou dos lábios de Gina, que sacudiu a cabeça e exclamou alegremente:


- Uma vassoura!


- Exatamente. E sua pele é branca e suave. Faz-me pensar em...


- Sim? - animou-o ela com um sorriso.


- Em um ovo. Quer que continue?


- OH, não, por favor. - murmurou Gina, sem deixar de sorrir.


- Imagino que não tenho feito muito bem, não é verdade? - perguntou Harry em tom zombador.


- Eu achava que até na corte inglesa se exigia um certo comportamento cortesão. - zombou. - Suponho que não passou muito tempo na corte, não é verdade?


- O menos que me foi possível. - respondeu ele com suavidade, e a seguir a tomou nos braços e depositou um beijo apaixonado sobre seus lábios.


Gina sentiu que se afundava na doce e sensual voragem do desejo de seu marido, e, se valendo de todas suas forças, afastou a boca.


- Não me disse por que me proibiu de abandonar o castelo. - sussurrou ela, tremula.


Harry acariciou seus braços e se inclinou de novo para beijá-la.


- Só será... por uns poucos dias... - respondeu, beijando-a entre cada frase - Até que esteja seguro... de que não existe nenhum problema.


Satisfeita, Gina se entregou ao incrível prazer de beijá-lo e notar como o desejo endurecia cada um de seus músculos.


O sol já começava a descer quando cruzaram o pátio em direção ao salão.


- Pergunto-me o que terá ocorrido a tia Elinor preparar para o jantar. - disse Gina.


- Devo admitir que estou com fome, - replicou Harry ao mesmo tempo em que lhe dirigia um olhar significativo - mas não precisamente de comida. Além disso, agora que expôs o tema, é tão hábil sua tia em questões de cozinha como parece?


- Se quiser que lhe diga a verdade, - respondeu Gina - não lembro de ninguém de minha família que a elogiasse por isso. Sempre a elogiaram por suas infusões curativas... Estava acostumada a ver várias pessoas de toda a Escócia ir ao castelo para lhe pedir todo tipo de ungüentos e preparados. Tia Elinor está convencida de que a comida adequada e bem preparada evita as enfermidades, e que certos mantimentos têm poderes curativos especiais.


- Comidas medicinais? - disse Harry com cenho franzido. - Não era isso precisamente no que eu pensava. - Fez uma pausa, e como se acabasse de ocorrer-se o uma brilhante idéia, acrescentou: - E você é mestre em questões de cozinha?


- Absolutamente. - respondeu ela alegremente. - Minha especialidade é o manejo das tesouras.


Harry soltou uma sonora gargalhada, mas ao ver que Snape se aproximava deles, seu rosto adotou uma expressão mais severa que a habitual, o que pôs fim à alegria de Gina. Os frios olhos do mordomo, seu corpo esquálido e os magros lábios faziam que oferecesse uma imagem de arrogante crueldade que inquietou Gina.


- Sua graça, - disse o mordomo - acabam de trazer o menino que protagonizou o incidente de ontem, com o barro. - Fez um gesto para a ferraria, do outro lado extremo do pátio, onde dois guardas seguravam o garoto, que horrorizado, via que em torno dele se reunia uma multidão de servos. - Deseja que me ocupe disto?


- Não! - exclamou Gina, incapaz de vencer a aversão que lhe causava aquele homem.


Com uma expressão de desprezo apenas velada, o mordomo se voltou para o Harry.


- Sua graça? - perguntou, fazendo pouco caso da nova senhora.


- Não tenho experiência em medidas ou procedimentos disciplinadores quando se trata de servos. - disse Harry olhando para Ginevra, sem querer comprometer-se.


A multidão que rodeava o garoto aumentava rapidamente, e Gina olhou com expressão de súplica para seu marido, sem deixar de pensar em tudo o que havia lhe dito frei Gregory.


- Se não desejar se ocupar do assunto, eu poderia fazer em seu nome. - se ofereceu ela, angustiada. - Vi meu pai atuar em julgamentos, e sei como se faz.


Harry se voltou para o mordomo.


- Se ocupe das formalidades, da forma habitual, e minha esposa decidirá o castigo a aplicar.


Snape apertou as mandíbulas, mas se inclinou, com um gesto de aceitação.


- Como sua graça desejar.


A multidão se afastou para deixá-los passar, e Gina observou que todos aqueles que se encontravam perto de Harry se afastavam um pouco mais do que o necessário, como se tentassem ficar fora de seu alcance.


Ao chegar ao centro do amplo círculo, Snape não perdeu tempo em preparar-se para impor justiça. Olhando fixamente o assustado menino, a quem dois fortes guardas seguravam pelos braços, disse:


- É culpado de ter atacado à senhora de Claymore, um delito da mais grave natureza segundo as leis da Inglaterra... pelo qual ontem mesmo deveria ter recebido seu justo castigo. Teria sido mais fácil para você em vez de ter que esperar até hoje para confrontá-lo. - concluiu com dureza, o que fez com que Gina pensasse que o alívio temporário que Harry lhe concedeu não tinha sido mais que uma tortura deliberada.


As lágrimas escorriam pelo rosto do menino, uma mulher, que Gina imaginou devia ser a mãe do garoto, cobriu o rosto com as mãos e pôs-se a chorar. Seu marido estava de pé a seu lado, com o rosto pétreo, mas os olhos frágeis pela dor do que aconteceria a seu filho.


- Nega menino? - falou Snape.


O menino, chorando amargamente, negou com a cabeça, em silêncio.


- Fale!


O menino enxugou as lágrimas com o ombro e disse com voz tremula:


- Não.


- É melhor que não negue, - continuou o mordomo, quase com amabilidade - pois morrer com uma mentira em sua alma lhe condenaria para toda a eternidade.


Diante daquelas palavras, a mãe do menino começou a soluçar, se soltou da mão do marido e se aproximou de seu filho, que rodeou com os braços e cuja cabeça embalou contra seu peito.


- Faça então, e termine de uma vez! - gritou com a voz alquebrada, olhando os guardas que empunhavam as espadas. - Não prolonguem seu sofrimento. Não vê o quanto está assustado...? - Sua voz se transformou em um sussurro abafado pelas lágrimas. – Por favor... Não suporto vê-lo tão... aterrorizado.


- Tragam um sacerdote. - ordenou Snape.


- Não vejo nenhuma razão para que se celebre uma missa em uma hora tão inoportuna. - interveio Harry com um tom gélido que fez com que a mãe apertasse ainda mais forte seu filho, e soluçasse mais ruidosamente.


- Não se trata de uma missa, milorde, mas sim de uma confissão. - indicou o mordomo, sem se dar conta de que o duque tinha interpretado mal deliberadamente suas razões para enviar uma busca a frei Gregory. Snape se voltou para a mãe do rapaz, e disse: - Suponho que seu mal educado filho preferirá receber os últimos sacramentos.


Incapaz de falar, a mulher assentiu com um gesto de impotência.


- Não! - falou Harry.


- Sim! - exclamou a mãe, histérica. - É seu direito! Tem direito a receber os últimos sacramentos antes de morrer.


- Se morrer, - disse Harry friamente - será porque o terá sufocado com seus braços. Se retire e deixe o menino respirar!


Um olhar iludido cruzou pelo rosto da mulher, que logo vacilou ao ver os rostos carrancudos da multidão e compreender que ninguém mais compartilhava de sua fugaz esperança.


- O que vai fazer com ele, milorde?


- Não me compete decidir. - replicou Harry com ira contida ao lembrar dos insultos que tinham dirigido a Ginevra no dia anterior. - Na medida em que foi minha esposa quem sofreu por sua causa, será ela que irá resolver que fazer com ele.


Em vez de se apaziguar, a mãe levou uma mão à boca e olhou aterrorizada para Gina, que já não pôde suportar por mais tempo ver perdida na incerteza à torturada mulher, e, voltando-se para o rapaz, perguntou-lhe com serenidade, e com amabilidade:


- Como se chama?


Ele a olhou, tremendo e sem deixar de chorar.


- Jake, milady.


- Entendo. - disse Gina ao mesmo tempo em que fazia um esforço desesperado em pensar como teria agido seu pai em uma situação como essa. Sabia que o delito não podia ficar sem castigo, pois tal atitude não faria a mais que gerar mais delitos e fazer com que seu marido parecesse fraco.


Por outro lado, tampouco cabia agir com dureza, sobre tudo se levasse em conta a idade do menino.


- Às vezes, - disse com suavidade, tratando de lhe oferecer uma desculpa - quando nos sentimos muito excitados por algo, fazemos coisas que não temos a intenção de fazer. Foi isso o que aconteceu quando jogou o barro? Provavelmente sua intenção não foi me alcançar...


Jake engoliu saliva com dificuldade e ao olhar o rosto impenetrável do duque, preferiu não mentir.


- Eu... eu... sempre acerto para onde aponto. - admitiu desconsoladamente.


- Sério? - perguntou Gina, que tentava ganhar tempo enquanto procurava desesperadamente outra solução.


- Sim, milady. - admitiu o menino em tom vacilante. - Posso alcançar um coelho entre os olhos com uma pedra e deixá-lo morto se estiver bastante perto. Nunca falho.


- Sério? - repetiu Gina impressionada. - Em certa ocasião tentei alcançar um rato a quarenta passos de distância e a matei.


- Verdade? - perguntou Jake, impressionado.


- Sim... bom, não importa. - disse ela ao perceber o olhar de reprovação que lhe dirigia Harry. - Mas não tinha intenção de me matar, não é verdade? - perguntou, e para que o estúpido menino não admitisse, apressou-se a acrescentar: - Quero dizer que não queria se condenar eternamente por assassinar alguém não é verdade? - Ao ver que o rapaz negava enfaticamente com a cabeça acrescentou: - Portanto, agiu guiado pela excitação do momento, não é verdade? - animou-o a responder e, diante do seu imenso alívio, o menino assentiu finalmente com um gesto. - E, naturalmente, imagino que se sente orgulhoso de sua pontaria e provavelmente quis dar uma prova dela acima de tudo o mundo, não é verdade?


O menino vacilou e voltou a assentir.


- Estão vendo? - exclamou Gina voltando-se para a espectadora multidão, e em tom de convicção, prosseguiu: - Este menino não pretendia causar nenhum dano grave, e a intencionalidade é tão importante como o delito. - voltou-se de novo para Jake e disse severamente: - É evidente, entretanto, que devo aplicar algum tipo de castigo, e visto que tem tão boa pontaria, acredito que deveria utilizar melhor essa habilidade. Em conseqüência, Jake, durante os dois próximos meses dedicará cada manhã para sair para caçar com cada homem que lhe pedir. E se não houver necessidade de carne fresca, irá ao castelo para me ajudar. Exceto aos domingos, naturalmente. E no caso de você... - deteve-se na metade da frase, emocionada ao ver que a soluçante mãe do rapaz se jogava a seus pés e, entre soluços, dizia:


- Obrigado, milady, obrigado. É uma Santa. Que Deus lhe abençoe, obrigado...


- Não, não faça isso. - pediu-lhe Gina desesperadamente quando a aflita mulher tomou a barra da saia e a beijou.


Seu marido, com o chapéu na mão, aproximou-se para afastá-la, e ao olhar para Gina sentiu que tinha os olhos cheios de lágrimas.


- Se necessitarem de seu filho para que ajude nas tarefas do campo, - disse Ginevra - pode cumprir com este... castigo a tarde.


- Eu... - falou o homem. Depois, clareou a garganta, endireitou os ombros e disse com uma comovedora dignidade: - Estará presente em minhas orações a cada dia de minha vida, milady.


- E espero que também esteja presente meu marido. - disse Gina com um sorriso.


O homem empalideceu, mas reuniu forças suficientes para olhar nos olhos do feroz homem de aspecto sombrio que estava ao lado de Gina e dizer com total sinceridade:


- Sim, e a você também, milorde.


A multidão se desfez em um silêncio estranho, e vários dirigiram olhares por cima do ombro para Gina, que se perguntou se provavelmente o castigo que tinha imposto ao rapaz tinha sido excessivo. No caminho de volta para o salão, Harry permanecia tão silencioso, que lhe dirigiu um olhar de ansiedade e disse receosa:


- Pareceu surpreso quando lhe impus dois meses de castigo.


- Com certeza, surpreendeu-me. - admitiu ele em tom irônico. - Por um instante pensei que o felicitaria por sua excelente pontaria e o convidaria para jantar conosco.


- Acha que fui muito benevolente? - perguntou ela com alívio enquanto ele abria a pesada porta de carvalho que dava acesso ao salão, e se afastava para o lado para que ela passasse.


- Não sei. A verdade é que não tenho experiência em tratar os camponeses e manter a ordem. Além disso, Snape deveria tê-lo feito muito melhor, em vez de dedicar-se a falar de justiçar ao rapaz. Não teria permitido.


- Eu não gosto desse homem.


- Eu tampouco. Foi mordomo dos antigos senhores e decidi mantê-lo em seu lugar. Acredito que já é hora de substituí-lo por outro.


- Espero que encontre um logo. - animou-o Gina.


- No momento, entretanto, devo pensar em coisas mais importantes. - disse Harry com um brilho malicioso nos olhos, que Gina não sentiu.


- Sério? E quais são?


- Te levar a cama e depois jantar... nessa mesma ordem.


 


- Acorda preguiçosa. - A indolente risada de Harry despertou Gina. - Esta é uma noite gloriosa. - acrescentou ele enquanto ela girava sobre suas costas e sorria languidamente. - Uma noite feita para o amor e para comer. - concluiu e a beliscou na orelha.


Quando Harry e Gina desceram ao salão, muitos dos cavalheiros já tinham terminado de jantar, e tinham levantado a maior parte das mesas montadas sobre cavaletes contra a parede. Só aqueles cavalheiros que tinham o privilégio de jantar na mesa principal pareciam desejosos de fazer durar cada prato.


- Onde está minha tia? - perguntou Gina uma vez que Harry tenha se sentado a seu lado.


Sir Eustace apareceu com a cabeça pelo arco de sua esquerda.


- Foi à cozinha para dar instruções aos cozinheiros, de forma que preparem uma maior quantidade de comida para amanhã. Não acredito que se desse conta do quanto comeríamos se nos oferecesse comida saborosa. - acrescentou com um sorriso zombador.


Gina observou os pratos que havia sobre a mesa, a maior parte dos quais já estavam vazios, e deixou escapar um suspiro de alívio.


- É... saborosa, então?


- Digna dos deuses. - exagerou o cavalheiro com um sorriso. - Pergunte a quem quiser.


- Exceto ao Hagrid. - interveio Sir Godfrey voltando-se para o gigante, que acabava de comer um pato inteiro.


Nesse momento, tia Elinor entrou precipitadamente no salão, com um luminoso sorriso no rosto.


- Boa noite, sua graça. - disse a Harry. - Boa noite, Gina, querida. - Depois permaneceu de pé diante da mesa, observando com um gesto de aprovação os pratos vazios que os servos retiravam. - Todo mundo parece ter desfrutado de uma verdadeira comemoração.


- Se tivéssemos sabido que tinha a intenção de vir para animar nosso jantar com sua presença, teríamos guardado algo. - disse Rony dirigindo-se a seu irmão.


- Sério? - perguntou Harry com um olhar irônico.


- Não. - disse Rony alegremente. - Toma, aqui tem um bolo. Isso melhorará seu ânimo.


- Estou certa de que ficou algo saboroso na cozinha. - disse tia Elinor, que aplaudiu com suas pequenas mãos, totalmente satisfeita pelo modo como reconheceram seus esforços. - Darei uma olhada enquanto preparo meu cataplasma. Os bolos melhoram o ânimo de qualquer um, exceto o do Hagrid.


- Não há nada que possa melhorar seu ânimo, - comentou Rony, olhando seus companheiros com expressão zombadora - nem sequer os ramos dos pinheiros.


O comentário sobre os ramos dos pinheiros fez com que todos sorrissem, como se compartilhassem alguma anedota graciosa que mantinham em segredo, mas quando Gina olhou para Harry, este pareceu se sentir tão perplexo quanto ela. Foi à própria tia Elinor quem lhe ofereceu uma resposta quando apareceu acompanhada de um servo, trazendo bandejas de comida quente, assim como uma pequena terrina e um pano.


- OH, sim, hoje mesmo Hagrid e eu trouxemos de todos os tipos. Quando retornamos, estava com os braços completamente carregados de bonitos ramos, não é verdade? - perguntou com entusiasmo.


A senhora dirigiu um olhar inquisitivo aos cavalheiros, que já não podiam reprimir a risada por mais tempo. Depois, agarrou o pano e a terrina da bandeja que o servo levava e, diante do olhar atônito de Gina, dirigiu-se para onde estava Hagrid, com seu cataplasma.


- Não passou um dia muito agradável, não é verdade? - perguntou-lhe em voz baixa, ao mesmo tempo em que deixava a terrina junto ao gigante e introduzia o pano nele. - E quem pode lhe culpar? - Com expressão de compaixão e culpa ao mesmo tempo, olhou para Gina e disse com tristeza: - Hagrid e eu nos encontramos com a aranha mais maligna que tenha tido a desgraça de ver.


Hagrid olhou com a extremidade do olho o pano submerso na terrina, mas tia Elinor seguiu falando, imperturbável.


- Essa vil criatura mordeu Hagrid, apesar dele não a ter provocado, mas porque simplesmente se encontrava sob a árvore onde tinha sua teia. Embora acredite que foi muito ruim de sua parte se vingar como fez. - acrescentou voltando o olhar furioso para o gigante apontando-o com o dedo como se tratasse de um menino pequeno. Molhou o pano com o conteúdo da terrina e depois disse com severidade: - Compreendo que esmagasse a teia com o punho, Hagrid, mas não acredito que foi nada sensato jogar a culpa na árvore e derrubá-la com seu machado.


Tia Elinor olhou com expressão desconsertada Sir Godfrey, cujos ombros estremeciam pela risada, e depois Sir Eustace, que estava inclinado sobre a bandeja com intenção de esconder a risada. Só Gawin pareceu realmente alarmado quando tia Elinor disse:


- Venha aqui, rapaz, deixe que eu umedeça isto em...


- Não!


Hagrid golpeou com seu poderoso punho a pesada mesa de carvalho, o que fez balançar os pratos. Afastou-se da mesa e saiu do salão, com o corpo rígido pela ira.


Assombrada, tia Elinor o contemplou se afastar e logo se voltou para os ocupantes da mesa e, em tom causar pena, disse:


- Estou certa de que não seria tão suscetível se comesse de acordo com minhas sugestões. Isso solucionaria seus problemas intest... quero dizer digestivos. - corrigiu-se - Algo que acreditava ter explicado a ele muito claramente ao longo do dia.


Depois do jantar, Harry se cercou de seus cavalheiros em uma conversa sobre temas masculinos, os quais eram desde quantos ajudantes adicionais necessitava o armeiro do castelo, muito ocupado com a tarefa de reparar os cascos e cotas de malha dos homens que tinham retornado com Harry, até determinar se a grande catapulta situada sobre as ameias contava ou não com o fornecimento adequado de pedras.


Gina escutou com atenção, desfrutando da serena autoridade com que Harry falava e, em geral do inesperado prazer de sentir que tomava parte de uma família.


Pensava no quanto era estranho que isso lhe parecia quando Harry impôs um basta na discussão sobre as catapultas e se voltou para ela com um sorriso culpado.


- Que tal sair para dar um passeio? Para o mês de outubro, faz uma noite muito agradável, para dedicá-la a discutir sobre coisas que sem dúvida deve te aborrecer.


- Não me aborreci. - disse Gina com um sorriso.


- Quem teria imaginado - brincou ele - que a mesma mulher que tratou de gravar suas iniciais sobre meu rosto com minha própria adaga, chegaria a ser uma esposa tão agradável.


Sem esperar resposta, Harry se voltou para os cavalheiros e ajudou amavelmente sua esposa a ficar de pé. Depois de lembrar que se reunissem no pátio depois do café da manhã para uma sessão de exercício, ele e Ginevra abandonaram o salão.


Uma vez que haviam saído, Sir Eustace se voltou para outros e perguntou com um sorriso zombador:


- Viram alguma vez Harry desfrutar de um passeio à luz da lua?


- Não, a menos que esperasse uma visita noturna do inimigo. - respondeu Sir Lionel, e soltou uma gargalhada.


Sir Godfrey, entretanto, o mais velho do grupo, não sorriu.


- Está esperando-a desde que chegamos aqui.


 


 


 


 


 

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