Sariaruna



O ruído agudo era completamente angustiante. Ele obstruía a passagem da mente consciente para a inovação dos sonhos, não só isso como não permitia que sentisse algum aroma, ou que emitisse algum som, ou até que abrisse seus olhos. Mas da onde vinha? Quem era o motivador daquele maçante barulho?

O ruído atravessava o lóbulo, atingindo-lhe os tímpanos com tal impacto, que seu cérebro já não conseguia sustentar informação alguma, ele não conseguia pensar, nem abrir os olhos, e caso conseguisse abri-los, não veria imagem alguma, escutar era, para sua total infelicidade, a única coisa que era capaz de fazer.

A dor de cabeça estava cada vez mais dilatada, como se cada pedaço de seu cérebro estivesse com uma afiada agulha fincada, e mais agulhas eram fincadas, agora, pela parte externa de seu corpo, os olhos, o pescoço, e descia, ombros, peito. Um estrondo diferente se mesclou com o chiado interminável. Mas naquela balbúrdia, nem se fizesse algum esforço, ele conseguiria compreender o que diziam.

Mais uma vez o ruído agudo acertava-lhe o tímpano, e cada vez que o fazia com mais força, e mais uma vez, outra, outra, eram como intermináveis vezes. Até que cessou.

- Não deixou que ela saísse durante a noite? Você é muito tonto! – dizia-lhe a voz.

E continuava-lhe a dizer outras tantas coisas, mas não prestava atenção. Sua cabeça doía muito, e só agora notara o quão suado estava. Encontrava-se deitado sobre sua cama, as cobertas jogadas no chão. A dor se amenizava aos poucos, seu cérebro começava a funcionar normalmente. Abriu os olhos. Lá estava seu irmão de pé, olhando, pela janela, a rua lá fora, já não dizia mais nada. A gaiola da coruja encontrava-se aberta, e Hésti não estava mais por ali.

- Se ela voltar, você terá muita sorte. – disse Régulos ainda observando a paisagem da cidade. – Sorte a tua que o papai já saiu para trabalhar, e que a mamãe foi tratar de assuntos fora de casa.

Sirius sentou na cama.

- Como ela se chama? – perguntou Régulos interessado.

- Hésti... – respondeu o garoto ofegante.

Fez-se uma pausa, pensativo, até mudar de assunto:

- Da próxima vez, se houver – disse frisando a ultima parte - cuide bem dela, seu tonto! Como é burro! – concluiu Régulos indignado.

- Fui um tolo, não?

- Quanta vulnerabilidade você emite ao admitir suas fraquezas, Sirius.

- Não se trata disso, se trata de sensatez.

- Pelo que me consta – disse Régulos lançando um olhar a gaiola – Você não é absolutamente nada sensato.

- Pois se vem me atormentar, é melhor que se retire... – e fez um movimento com a mão indicando a porta.

- Da próxima vez vou esperar que a coruja estraçalhe com o seu cérebro, e então, você talvez aprenda a ser mais bem agradecido.

- Se houver a próxima vez. – disse Sirius sarcástico, enfatizando o “se houver”.

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Sirius andara pensando muito no que ocorrera no Beco Diagonal, procurava evitar pensamentos referentes a James Potter, mas era difícil, porque tanto ódio pela sua família? Não há de ser tão ruim. Ou há. Está certo, sim há. Ele tinha razão, estava certo, Sirius concordara, porque ele não acreditara? Não é porque a família no geral pensa de forma cruel, que necessariamente todos os membros pensem da mesma forma, é tolice julgar dessa forma superficial.

- Quer saber, definitivamente, vou deixar que esse acontecimento se escafeda, não vou dar bola a isso.

A tal “Travessa do Tranco” era também algo que ele pensava constantemente, e sua curiosidade não permitia que ele tratasse o assunto da mesma forma que tratara o assunto referente ao que James Potter lhe disse.

Enquanto seu irmão e sua mãe rondassem a casa ele nunca conseguiria sair para ir até lá. Pedir para sua mãe estava completamente fora de cogitação, ela obviamente não deixaria, e vigiaria a lareira constantemente para que eu não fizesse escondido. Resolveu esperar por uma oportunidade.

Os dias passavam, e o primeiro de setembro já se aproximava, dia qual ele embarcaria a Hogwarts. Resolveu agir de vez. Despertou extremamente cedo na manhã do dia 26 de agosto, se arrumou e desceu as escadas até a sala de estar, onde a lareira se encontrava. Já tinha o saquinho de pó de flú em mãos, entrou na lareira e gritou em voz alta, de forma cautelosa...

- Travessa do Tranco!

Ao abrir os olhos, o garoto se deparou com um lugar extremamente mal iluminado, como esperara que fosse. Estava em uma ruela sombria que parecia totalmente ocupada por lojas que se dedicavam às Artes das Trevas. Havia um portal onde um grupo de bruxos conversava, na realidade, cochichavam entre si.

Observou a vitrine de algumas lojas, em uma havia diversos animais que Sirius nunca vira na vida, e alguns insetos maiores do que o normal, como aranhas negras. Na vitrine d’outra loja Sirius viu uma coleção de cabeças jívaras, caminhou mais um pouco e avistou a maior loja de todas, chamava-se “Borgin & Burkes”, não ousou adentrá-la, ao contrário, se distanciou dali.

Os bruxos que caminhavam por ali eram terrivelmente assombrosos. Sirius daria tudo para encontrar a saída daquele lugar, ou para nunca ter entrado ali.
Um homem idoso se acercou do garoto, tinha em mãos uma garrafa de bebida, e cambaleava.

- Meu jovem – sua voz era rouca, e falha. Ele sussurrou no ouvido de Sirius, assustando-o. – Que tal uma passagem de ida para Sariaruna, hein? - apalpou os bolsos da calça e retirou de lá um papel – Que me diz? Você terá grandiosidade – e deu uma risada debochada – Será o maior bruxo de todos, hã? Que me diz? – e desatou a rir, cambaleou e se segurou em uma parede para não cair de vez, uns bruxos que estavam junto ao idoso começaram a rir.

Sirius recuou apavorado.

- Uma passagem de ida para Sariaruna! – disse um homem, que estava no grupo que cochichava próximo ao portal, se aproximando de Sirius, que por sua vez, continuava a recuar – Que acha? – e sorriu mostrando seus dentes amarelos e caídos.

- Nada mal, meu jovem, nada mal! – disse outro homem dos que estavam junto ao portal, e logo, desatou a rir.

- O que faz um garoto por aqui? – disse uma voz grave que se sobressaiu à pequena balburdia que começava a se formar em torno de Sirius. O garoto olhou para trás e pode ver a forma maciça de um homem enorme. Com certeza três vezes maior do que um homem normal. Que se aproximava em grandes passadas, possuía dois pequenos olhos negros, e parte de seu rosto era encoberto pelo cabelo, barba e bigode.

- Que me diz? Uma passagem de ida para Sariaruna? – perguntou petulante uma bruxa corcunda.

O homem gigante puxou Sirius para perto de si. Guiou-o para longe daqueles bruxos e o garoto deixou-se ir: quanto mais longe estivesse daquelas pessoas, melhor se sentiria. Por fim, quando já estavam bastante distantes, o homem barbudo começou a murmurar:

- Ah, com certeza você não gostaria de ir para Sariaruna, com certeza não! Pelo amor de Merlin! – e balançou a cabeça incomodado – Sim, sim... Trará grandiosidade, mas junto disso muitas outras coisas terríveis acontecerão com você! Ah, pelo que contam essas histórias...

- Eu já ouvi falar sobre essa tal de Sariaruna... – disse Sirius pensativo.

- Mas claro que já! – disse o homem surpreso que continuava a guiar o garoto – Histórias para crianças! Para ensiná-las a não aceitar esse tipo de convite, sabe? – disse olhando o garoto – Você não ia aceitar, não é mesmo?

- Mas claro que não! Então, esse lugar trás grandiosidade...

- Quem chega nesse lugar... – disse o grandalhão.

- Certo... Quem chega nesse lugar terá grandiosidade, porém acontecerão coisas terríveis com essa pessoa... – repassou – É isso?

- Não são apenas coisas horríveis! São coisas extremamente horríveis, tragédias deploráveis, morte de entes queridos, por exemplo! Mas muitos bruxos pouco se importam! Desde que tenham a tal “grandiosidade” e que sejam o “maior bruxo de todos os tempos”, ficam satisfeitos! – disse o homem com um certo desespero na voz.

- Entendo... Mas alguém, por acaso, já alcançou esse lugar? – perguntou Sirius interessado.

- Não se sabe ao certo... – disse o homem pensativo. – Não há provas de que esse lugar existe, se é que me entende... É um mito...

- Sei...

O homem o guiou por um corredor estreito. Sirius reconheceu o lugar de primeira. Ao fundo havia uma luz. Logo, se via no Beco Diagonal, e havia um grande edifício de mármore muito branco: o Banco de Gringotes.

- Porque tanto interesse no lugar? – perguntou o homem desconfiado.

- Não, nada! – disse Sirius sinceramente – Só que queria me lembrar onde foi que ouvi falar dessa tal de Sariaruna...

- E o que você fazia por lá? Na Travessa do Tranco? Não é a primeira vez, e tenho certeza que não será a última, em que vou ter de resgatar crianças de lá...

- Err, fui parar lá por engano... – disse tentando distorcer um pouco a história pra que ele parecesse um garoto ingênuo que não tinha culpa alguma de estar por lá.

- Sou Rúbeo Hagrid! – disse o homem estendendo a mão, e a outra, Sirius notara, estava segurando um caixote com diversos furos.

- Ah! Sou Sirius Black... – e retribuiu o aperto de mão, que foi um pouco apertado de mais, pois a mão do homem era três vezes maior do que a mão de Sirius, e ele era também muito mais forte, apesar de que aparentava estar tomando cuidado para não machucá-lo.

- Sou Guarda-Caças de Hogwarts... – disse estufando o peito orgulhoso.

- Eu vou entrar no primeiro-ano...

- Ah, o meu primeiro-ano! Eu bem me lembro, sabe? Em nenhum momento passei despercebido por lá, se é que me entende...

Sirius riu.

- Fui selecionado para a Grifinória – disse Hagrid se lembrando.

- Me parece uma boa casa, mas toda a minha família foi da Sonserina...

- Sonserina... – disse Hagrid mirando o garoto – É, é... Não é tão mal, assim... Mas acho que você tem potencial para, quem sabe, entrar na Grifinória! É uma casa da qual me orgulho! Grandes bruxos passaram por lá...

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Os últimos dias de férias foram iguais a todos os outros. Um tanto maçante, e cansativos por conta de sua família, nada que Sirius não fosse capaz de suportar. Há cada momento que se via cara-a-cara com seu irmão ou com sua mãe tinha mais vontade de ir a Hogwarts, apesar de que a ultima citada estava com um humor melhor, depois que Sirius recebera a carta de Hogwarts.

– É, agora ela só implica comigo, Monstro já não sofre tanto...

Ele lia uma vez ou outra o livro de “Transfiguração”, qual achara o mais interessante de todos. Perguntas diversas surgiam sobre Hogwarts, e se arrependia profundamente de não tê-las feito ao guarda-caças. Mesmo assim, a curiosidade o deixava mais ansioso, e essa era uma sensação extremamente confortável.

Hésti já estava há dois dias desaparecida, mas as janelas estavam sempre abertas, caso ela voltasse. Sirius se preocupava, e Régulos também sempre o perguntava se ela já voltara.

Até que certa manhã, ela voltou.

Régulos e Sirius passaram o dia junto cuidando da coruja. A recepção por parte dos irmãos foi calorosa, encheram-na de comida, conforto e atenção. Porém, ela recusava tudo que eles a ofereciam.

- Ela não é tola, sabe? – comentava Sirius – Podemos estar mimando-a toda hoje, mas nada prova que amanhã faremos o mesmo... Ela não confia, todavia.

- Pois é, você agiu como um idiota. – respondeu Régulos rispidamente.

A coruja estava no parapeito da janela, olhando o pôr-do-sol.

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