Capítulo I



Capítulo I




25 de Maio de 1997


Apressou os passos, tentando alcançar o trem que já havia saído e acelerava a velocidade aos poucos. Xingava-se mentalmente por ter atrasado. Sentia-se a pessoa mais burra do mundo, que planejara uma fuga simples, e agora se tornara uma coisa, que digamos que pra ele era... Estúpida. Tirou os pés do chão, pulando na sacada do trem; agora estava tudo bem. Sem problemas. Estava fugindo de uma guerra que acontecia e que sua família estava envolvida, ninguém sabia quem ele era, pois ele estava na Londres Trouxa rumo à Viena Trouxa. Certo, não podia dizer que a parte “trouxa” o animava muito. Mas era o único jeito de sair imune da guerra. Detestava Potter e Voldemort e isso era um motivo mais do que justo para fugir.


Abriu a porta do vagão, que dentro abrigava algumas pessoas e muitos acentos vazios, seus olhos percorreram por toda sua extensão, até que passou a caminhar em direção a um acento no final do vagão, no canto da janela. Segurava-se nas poltronas, equilibrando-se com apenas uma mão, já que a outra segurava sua mala. Sentia-se ridículo. Já que ele era um Malfoy e nesse exato momento esfregava-se em poltronas de um trem britânico trouxa e nojento.


Merda”. Ela estava na sua frente, à maldita Weasel-fêmea-eu-amo-o-Potter.


Perguntava-se furiosamente o que ela estava fazendo ali, deveria estar com sua família; leia-se: sua mãe gorda e seus trinta irmãos -, lutando junto ao Cicatriz contra o Cara de Cobra. A garota fechou a porta do lavabo, sua expressão era levemente enojada, sentia-se mal por viajar naquele trem, mal começara a andar e o enjôo tomara conta dela. Caminhou pelo corredor em direção a seu acento até ser surpreendida pelo loiro a sua frente, seus olhos arregalaram, soltou um palavrão baixo, antes de se virar de maneira brusca andando rapidamente em direção ao vagão-restaurante.


Correu o máximo que pôde atrás dela. Seus planos foram por água abaixo. A maldita Weasley contaria para sua família onde ele estava e todos ficariam sabendo onde o esperto – ele não era covarde - do Malfoy se meteu. Estava preocupado, óbvio que estaria. Enfim chegou a porta do vagão-restaurante, que ele abriu rapidamente procurando por uma cabeça ruiva no local.


Avistou-a no final do vagão, sentada a uma mesa, com o cardápio tampando a cara, e olhando de esguelha na maneira menos discreta possível, temendo que o loiro a encontrasse.


Tarde demais, ele a viu.


“Weasley!” Gritou, atraindo o olhar de todos do local. “Weasley!” Repetiu um pouco mais baixo, aproximando-se de onde ela estava. “Weasley, já sei que é você. Tira isso da cara.” Sentou-se na mesma mesa que ela, baixando o cardápio do rosto da garota.


“Malfoy!” Tentou falar firmemente, escondendo as mãos por baixo da mesa, que tremiam involuntariamente. “Que surpresa vê-lo aqui!”


“Acho que você sabe muito bem o motivo de eu estar aqui.” Disse, recebendo em resposta um balançar de cabeça negativo e um olhar bastante interessado em saber o porquê.


“Pare com essa encenação.” Cuspiu. “Feche essa maldita boca, certo? Nada de comentar com um dos seus cem irmãos que me viu.” Falou ácido, levando o punho à mesa.


“Não!” Ela desafiou. Quem era o Malfoy para dizer o que ela deveria fazer? Maldito.


“Não me provoque!”


“Não estou escutando.” Levou as mãos às orelhas, tampando-as. “O que, Malfoy? Ahn? Não estou escutando! Fala um pouco mais alto!” Disse, chamando a atenção de todos no local.


“Sua inútil, deixa de ser criança, me escuta!” Segurou-a pelos pulsos, constrangido pela atenção de todos. “Eu quero sigilo, entendeu?”


“Já disse que não.” Encarou-o friamente.


“Qual parte?”


“O quê?”


“Que você não entendeu.”


“O que eu não entendi?”


“Você disse que não entendeu.”


“Disse?” Sorriu.


“WEASLEY!” Gritou, soltando-a e recebendo uma risada abafada da mesma.


Shhh! Não grita, Malfoy.” Colocou o indicador sobre os lábios, divertida com a situação.


“Guarde suas brincadeirinhas para si mesma e me escute! Eu não quero que você comente com ninguém que me viu nesse tr...


“Desejam algo?” Perguntou educadamente um homem, que Gina obviamente julgava ser o garçom pelas vestes e, Draco, o inconveniente, por tê-lo interrompido. Maldito trouxa!


“Não!” Respondeu rude e breve.


“Sim! Uma limonada.” Sorriu a ruiva amigavelmente.


“E você?” Virou-se para Draco, deixando de lado seu primeiro comentário.


“Nada!” Repetiu impaciente.


“Quer sim...” A ruiva revirou os olhos, vendo a irritação do loiro.


“Não quero!” Draco fez um bico que Gina jurou ser hilário. Parecia uma criança de cinco anos de idade. Ela riu.


“Duas limonadas.” Finalizou ainda rindo, vendo o homem sair logo em seguida.


“Odeio limonada.” Comentou, sendo ignorado pela ruiva, que agora admirava a paisagem pela janela.


Ruiva Irritante. Em menos de quinze minutos a garota conseguiu deixá-lo estressado aproximadamente cinco vezes, sendo modesto, é claro.


“Você se faz de burra não é?”


“É.” Respondeu sem ao menos o encarar. “Não tenho medo de você.”


“Deveria...” Ameaçou.


“Lógico que não, Malfoy.” Encarou-o friamente. Depositou naquele olhar o mesmo gelo que Malfoy usava no seu. “Você não seria estúpido o suficiente de fazer algo contra mim na frente de trouxas, o Ministério o localizaria e sua fuga ia para o brejo.” Estralou os dedos, encarando-o de maneira óbvia.


“Então você sabe sobre minha fuga?” Olhou-a incrédulo.


“Não, Malfoy. Claro que não sei. Ficar dentro de um trem trouxa durante sete horas é seu hobbie, não é?” Rolou os olhos. “Acho que é meio óbvio, não é?”


“Como assim ‘óbvio’?”


“Você, Malfoy, fugindo com o rabo entre as pernas, enquanto pessoas morrem na guerra!” Olhou-o de forma inexpressiva. “Seus pais estão na guerra! Sua família! E você fugindo! Deveria lutar!”


“Oh claro, vou me juntar ao Potter e juntos destruiremos Voldemort.” Fingiu vomitar.


“Não importa o lado, Malfoy, desde que você não fuja!” Virou a cara, voltando a encarar a janela.


“E você, Weasley? Fazendo o quê aqui? Dando uma volta de trem para relaxar a cabeça?” Falou ácido. “Claro que também está fugindo!”


“Não estou fugindo, Malfoy!” Corrigiu-o. “Fui afastada da guerra, minha família não quer que eu lute.”


“Resumindo... Fugindo.”


“Não é fugir, seu estúpido!”


“É sim.”


“Não é!”


Draco deu ombros, não iria teimar com ela. Parecia ser mais cabeça-dura do que ele mesmo.


O garçom voltou trazendo a bebida dos dois, que permaneciam em silêncio apenas encarando a vista afora da janela.


Ele era irritante, e estava no mesmo vagão que ela, enchendo seu saco. Pensava em como ele conseguia ser tão idiota e egocêntrico. Ela era afastada obrigatoriamente da guerra, queria lutar, mas sua família não deixava. E ele fugia da guerra pois que não queria lutar, tinha medo. Covarde.


“Vai dizer a alguém que me viu aqui?” Levou as mãos aos cabelos loiros que teimavam em cair em sua face.


“Talvez.”


“Talvez?” Franziu a testa.


“É, talvez. É surdo, Malfoy?”


“Por que talvez?” Revirou os olhos, ignorando a alfinetada da ruiva.


“Porque sim.” O encarou.


O silêncio se apoderou. Os dois continuaram ignorando a existência de um ao outro. Pareciam ter seus próprios medos, arrependimentos e desventuras para se preocuparem.


“Por que você quer lutar?” Perguntou, incomodado pelo silêncio. "Não é meio óbvio que você morreria? Potter-Perfeito está em desvantagem desde a morte de Dumbledore."


“Quero lutar porque eu quero ajudar. Ajudar a minha família, ajudar o Mundo Bruxo, eu não quero ser lembrada como a única Weasley que foi obrigada pelos seis irmãos a “fugir” da guerra, não quero ser lembrada como covarde, não quero ser lembrada como você.”


“Covarde?!” Exasperou-se. “Não sou um covarde!”


“Já disse que é. Você está fugindo da guerra.” Cuspiu as palavras de maneira ácida, encarando o loiro nos olhos.


“Eu quero ficar imune, mas isso não quer dizer que sou um covarde.” Cruzou os braços e fez novamente um bico. “Sou sagaz. Isso sim!” O silêncio ecoou novamente. Limitaram-se em apenas se encararem de vez ou outra por esguelha.


“Vai morar em Viena?” Mexeu-se incomodada no acento, ajeitando a alça de sua blusa que teimava em cair pelo seu ombro sardento.


“Vou.”


“Pretende morar lá até quando?”


“Até as coisas se estabilizarem, a guerra acab...”


“Você acha que eles não vão te encontrar?” Interrompeu-o.


“Não sou um fugitivo de Azkaban, Weasley, só estou fugindo, não devo nada, não quer dizer que tenha feito algo errado.” Revirou os olhos, enfiando alguns palitinhos de dente em sua limonada intocada.


“Está envolvido na morte de Dumbledore.”


“Todos já sabem que foi Severus Snape!” Olhou-a incrédulo.


“Você estava junto com os Comensais, o que prova que você é um deles.”


“Como sabe disso tudo?”


“Harry.” Disse apenas.


“Ah claro, o Potter. Ele deveria se preocupar mais com a cicatriz discreta em sua testa, do que fofocar.” Revirou os olhos.


Sentia-se inútil por não ter julgado logo que Potter dissera tudo a ela, também se sentia inútil por não descobrir que o maldito Cicatriz estava no local escondido embaixo de uma Capa de Invisibilidade. Metido.


Não podia negar que era melhor conversar com a Weasley fêmea do que ficar dormindo em seu acento, até que não era nada mal irritá-la durante oito horas de viagem, afinal, era ótimo. Sendo que até agora quem mais se irritou fora ele. Ao pensar nisso, cerrou os punhos e crispou os lábios, desviando o olhar para a janela que produzia uma imagem movimentada da paisagem lá fora.


“Você está irritado.”


“Não.” Revirou os olhos, sentindo-se incomodado em seu acento.


“Está sim.” Teimou.


“Não estou.”


“Está sim, você crispou os lábios”


“O que isso quer dizer?”


“Você faz isso quando se irrita.”


“Como você sabe?”


“Consegui te irritar umas quinze vezes em cerca de menos de uma hora...” Mordeu o lábio inferior, divertida, evitando uma risada. “E olha que temos mais sete horas de diversão.” Ironizou.


“Como se eu fosse passar essas sete horas com você, Weasley.” Dizendo isso, calou-se.


“Por que não quer lutar?”


Draco estranhou a mudança repentina de assunto da garota.


“Já disse Weasel, quero ficar imune.”


“Não é isso, é que... Por que você não quer lutar?” Ele franziu o cenho, tentando adivinhar aonde ela queria chegar. “Digo... todos querem ficar imunes, mas é que, para não querer lutar... não é só medo que você tem, não é?”


“Explique.”


“Desculpa, não sou boa nas palavras.” Apoiou os cotovelos na mesa, apoiando o queixo nas costas das mãos. “Qual o outro motivo de não querer lutar? É só medo?”


“Não. Acho que não devo nada a um mestiço que se acha o dono do mundo.”


“Voldemort?”


“Não, Harry.”


“Ah...” Soltou um gemido de apreensão.


“Claro que é Voldemort, sua anta.” Olhou para o rosto da ruiva e estreitou os olhos.


“O que está fazendo?”


“Ahn?” Falou saindo do transe. “Não escutei.”


“Estava contando minhas sardas?” Levou a mão ao rosto na tentativa de tampá-las.


“Só a sujeira do lado direito. Já reparou que possui mais desse lado do que do outro?” Riu.


“Idiota!” Encolheu-se no acento, corando.


“Nesse lado a “sujeira” é proeminente.” Falou, levando o dedo indicador às bochechas salpicadas de sardas da ruiva.


“Pára Malafoy!” Falou batendo na mão dele que aproximava-se de seu rosto, fazendo-o rir.


“Malafoy é?” Disse se levantando, deixando um dinheiro em cima da mesa, sendo acompanhado pela ruiva.


“É sim.” Bocejou, seguindo-o até o vagão onde estava antes. “Mala + Malfoy = Draco Malafoy”


“Também estou com sono.” Disse, ignorando a brincadeira da ruiva.


“Eu não estou com sono.”


“Sei...” Encarou-a por um tempo. “Vai fazer o quê em Viena?” Sentou-se em um acento ao lado da janela.


“Vou passar a noite lá, tenho que pegar o próximo trem para Paris amanhã de manhã, acho que às nove ou dez e meia.” Sentou-se ao lado do loiro, acomodando-se.


“Ah...” Suspirou cansado. “Vai ficar onde?”


“Não sei, em algum albergue ou hotelzinho perto da estação.”


Dizendo isso, o assunto morrera, não se falaram durante as próximas horas da viagem. Draco ficou a observar a paisagem durante um bom tempo, pensando se estava fazendo a coisa certa. Depois das palavras da ruiva, ficara bastante indeciso. Valia a pena mesmo fugir da guerra? Pensando nesse assunto, e com as palavras de Gina martelando em sua mente, adormeceu junto a ela, que já dormia a um bom tempo, sorrindo levemente, como se estivesse sonhando. As horas passaram-se rapidamente enquanto dormiam. Gina acordou com Draco dormindo apoiando sua cabeça em seu ombro. Ajeitou-se com medo de acordá-lo e o ignorou ate a chegada em Viena.


“Draco...” Sussurrou, balançando-o de leve. “Draco...”


“Hum?” Gemeu, ainda de olhos fechados.


“Chegamos.” Falou, percebendo que o trem parava.


“Ahn?”


“Chegamos a Viena, Malfoy, se dormir mais, vai voltar para Londres.”


“Ah!” Levantou-se rapidamente, ainda meio sonolento. Acompanhou Gina que pegava suas malas e a seguiu para fora a estação.


“E agora, Malfoy? Qual seu destino?” Perguntou, enquanto seus olhos percorriam por toda estação movimentada.


“Ficar longe de você.”


“Nossa, pensei que estávamos progredindo.”


“Estou brincando, Weasel”. Riu. “Você não me asfixiou ainda.” Brincou, recebendo em resposta um empurrão leve. “Então... Para onde vamos?”


“Como assim “Para onde vamos”?” Perguntou, ainda caminhando.


“Eu preciso de um lugar para dormir, você também. Então podemos unir o útil ao agradável.” Sorriu debochado, rindo ao ver a ruiva corar.


“Malfoy!” Bateu em suas costas, repreendendo-o.


“Estou brincando, Weasel!”


“Então vamos procurar um hotel, aí deixamos as coisas lá e vamos conhecer Viena!”


“Eu disse que estava brincando, Weasel.”


“Não vai ser tão ruim, Malfoy.”


Gina persistiu durante mais alguns segundos. Draco deu-se por vencido ao notar divertido as orelhas vermelhas de Gina. Estava irritada.


“Sei que está desesperada para passar uma noite comigo.”


“Nossa, que ótima aventura” Bufou, entrando no táxi, sendo acompanhada pelo loiro. “Fala inglês?” Perguntou ao taxista.


“Sim, senhora.” Respondeu em um inglês carregado por um forte sotaque francês.


“Tem algum hotelzinho aqui perto? Que não seja muito ruim, é claro.” Disse a ruiva, recebendo um olhar incrédulo de Draco.


“Sí, sí. A cinco quadras daqui.” Sorriu.


“Certo, leve-nos lá, por favor.” Finalizou, voltando a olhar Draco.


Hotelzinho, Weasel?”


“Cala a boca. Nós vamos sair hoje, não vamos? Mal iremos ficar no hotel.”


“Certo. Mas não me agarre.”


“Como se eu estivesse tão desesperada.” Revirou os olhos.


A curta viagem de táxi correu silenciosamente, com os dois apenas apreciando a paisagem. Chegando ao hotel, Gina pôde ver que não era tão ruim. Era rústico, com um aspecto vitoriano; havia gostado, ao contrario de Draco.


“Pronto, pedi dois quartos.” Falou, caminhando em direção a um corredor cheio de portas.


Caminhou durante um tempo a procura de seu quarto. Onde estava com a cabeça? Amaldiçoou-se. Passar uma noite em Viena com Draco Malfoy, fugitivo da guerra? Mas ninguém saberia quem eles eram ali. Eram apenas Draco e Gina e eles não eram os únicos Draco e Gina da terra.


Checou-se mais uma vez no espelho e sorriu, estava feliz com o resultado, algo básico. Um vestido curto branco, sandálias sem salto (rasteiras) e um sobretudo branco por cima. Os cabelos ruivos presos em um rabo de cavalo e o rosto maquiado levemente. Abriu a porta de seu quarto e deu de cara com Draco Malfoy trajando uma calça social preta, acompanhada por uma blusa também social, sendo que branca que combinava perfeitamente com seu cabelo loiro molhado que teimava em cair em seus olhos.


“Vamos à Viena então, Weasel.” Sorriu. “Mas, por favor, não me agarre.” Brincou.

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