Manhã de Natal(dela)



Naquela manhã, Serenna não precisou conjurar seu patrono para tirar algum distraído da cama…
Na verdade, todos pareciam ter acordado antes dela e descido esbaforidos para a grande sala de estar, rodeando a grande árvore de Natal ainda vestidos em seus pijamas e usando pantufas engraçadas.
Observava divertida a animação das crianças com seus presentes, quando Leo, pegando um embrulho, correu até ela, dizendo:
- Mãe! Olha, um presente para você! Vou abrir!
- Claro que não! É meu, não seu! – ela o repreendera docemente, ele fizera uma carinha de desculpas, mas Serenna entendia sua ansiedade infantil.
Esperou que ele voltasse a dar atenção a seus próprios presentes, para só então, com uma calma fingida, abrir o pacote. Sabia que era o presente de Sirius, mesmo sem reconhecer a letra do pequeno cartão (ou talvez por isso mesmo).
A caixa de madeira entalhada, notadamente muito antiga, era encantadora. Depois de admirar os detalhes graciosos, abriu a tampa devagar.

“Why do birds suddenly appear
Every time you are near?
Just like me, they long to be
Close to you”


Serenna quase fechou a caixa, tamanho o susto. Correndo os olhos pela sala, viu que nem mesmo Lady Marjorie prestava atenção – pelo menos ostensivamente – e então, permitiu-se ouvir atentamente a música, enquanto as imagens do velho sonho invadiam sua mente. Contudo, estava diferente…Não era mais a garotinha, era ela, a Serenna atual, a dançar com Sirius Black no mesmo salão iluminado por velas suspensas. Salão que ela reconhecia agora ser o de Hogwarts, pois já estivera lá. (1)

“Why do stars fall down from the sky
Every time you walk by?
Just like me, they long to be
Close to you…”


Serenna deixou-se levar pela melodia, esquecida de todos à sua volta. Era tão bom aquele sonho, e ela não queria que ele terminasse.
- Querida…
A voz de lady Marjorie a despertou, e ela fechou a caixinha, instintivamente.
- Desculpe-me – a boa senhora falou – Mas você parecia tão longe, que os meninos se assustaram.
Serenna olhou em volta. Seu filho a fitava com olhar preocupado e até mesmo os adolescentes a observavam de cenho franzido, inquietos. Notou inclusive que Alan sacara discretamente a varinha, provavelmente pronto a lançar um feitiço sobre a caixa, julgando-a em perigo.
- Está tudo bem, gente. Eu só… me emocionei com o presente, só isso.
- É de quem, mamãe? – Aline não conteve a curiosidade.
- É do… Sr. Black. Lembram-se dele? Esteve lá em casa uma vez, com o professor Lupin.
Aline a fitou como se dissesse: “Claro, né?”, enquanto Leo fazia um cara engraçada e perguntava à queima roupa:
- Vocês estão namorando? Ele vai ser nosso pai?
A espontaneidade da pergunta a fez corar e sorrir, enquanto balançava a cabeça, incerta, gesto que o garoto interpretou como negativa.
- Ah, que pena, eu gostei dele. Ia ser legal ele ser nosso pai.
Serenna olhou o filho se afastar, novamente distraído com seus presentes, e olhou para sua madrinha, que continha o riso e comentou:
- As crianças sabem das coisas, mais do que pensamos que sabem.
Serenna se viu forçada a sorrir, mas pediu licença e foi para seu quarto, ante o olhar compreensivo de sua madrinha.

Sozinha e na segurança das quatro paredes, sentou-se na cama e abriu novamente a caixa, ouvindo a canção e permitindo-se sonhar novamente.
Só não conseguia entender porque era tão fácil pensar nele quando estava sozinha, e tão difícil até mesmo falar com ele quando estavam juntos.
Por que seu jeito de ser a incomodava? O que a fazia afastar-se sistematicamente dele?
-Você é uma medrosa! – falou para si mesma, enquanto notava que no fundo da caixa havia um anel e um pequeno pergaminho.

- “Gostaria que aceitasse como um agradecimento por me trazer de volta.” – dizia o bilhete assinado simplesmente “SB”.

Serenna riu. Pegou o anel e avaliou-o com cuidado, principalmente a parte interna, onde as mesmas iniciais estavam gravadas. Curioso isso, pensou. Mas gostou da jóia, que entrou perfeitamente em seu dedo e pareceu cintilar quando ergueu a mão para ver o efeito.
- Será que… - pensou, mas deu de ombros.
Se Sirius Black lhe aprontara alguma com aquele anel, ela não poderia reclamar… Afinal, não preparara para ele uma surpresinha também?
Rindo – e pensando que se pareciam mais do que supunha – deitou-se na cama, continuando a admirar o anel e ouvir a música, como se fosse uma adolescente apaixonada.
E este pensamento a fez rir ainda mais de si mesma.

E pensar que há pouco mais de seis meses nem imaginaria uma coisa dessas… receber um presente de Natal de um bruxo com quem estava…
Bem… ela ainda não assimilara aquela história toda, para falar a verdade.
Sua ânsia em aprender magia o mais rápido possível – provocada pelas constantes alfinetadas de Snape quando teimava em fazer as coisas ao modo trouxa e pela iminência de um perigo maior - a tinham feito se esforçar em praticá-las, mas não fizera dela uma “discípula da Granger”, como Draco Malfoy ironizara uma vez ao encontrá-la enfiada num livro de feitiços tarde da noite. (2)
Pensou em Ana Weasley. Sua amiga brasileira era sempre um apoio quando precisava, teria que falar com ela a respeito, assim que fosse possível visitá-la.
As coisas não estavam fáceis para Auror, além de toda aquela confusão com sua amiga Luiza, ela era uma mãe “ainda fresca”, com um pequeno bebê para cuidar.
Sorrindo, Serenna se lembrou do dia em que a pequena Lizzy nascera e que fora também o dia em que ela pisara os chãos de Hogwarts pela primeira vez.
Um dia cheio de sobressaltos, emoções, descobertas…

*******


Serenna caminhava pelos corredores, observando cada detalhe. Os filmes eram bem fiéis, mas nada se comparava a estar ali de verdade, e ela estava muito agradecida por Minerva McGonagall permitir que ela fizesse esse pequeno “tour”.
Alguns dos integrantes dos quadros cumprimentavam-na, outros mal notavam sua passagem. Os alunos que passavam por ela a olhavam com estranheza, e ouviu um pequeno grupo cochichar:
- Dizem que é a irmã do Prof. Snape.
- Mas ela é tão bonita! Será mesmo verdade?
Serenna riu, pensando em quantos pontos seu irmão descontaria da casa de ambos por essa indiscrição, enquanto chegava finalmente às portas do Salão Principal.
Respirando fundo, ela deu um passo à frente e entrou.

O impacto foi maior do que previra. O salão era muito mais do que imaginara ou vira nos filmes, com certeza. A Atmosfera mágica em volta talvez fosse responsável por essa impressão, mas ela não cogitou nisso. Apenas caminhou silenciosa e respeitosamente entre as mesas, fitando uma a uma, indo para em frente à mesa dos professores.
Perguntou-se em qual daquelas cadeiras seu irmão se sentaria em todas as refeições partilhadas com a escola, enquanto contemplava a cadeira que sem dúvida fora ocupada por Dumbledore e agora era usada por McGonagall. Intimamente, lamentou não tê-lo conhecido, alguém que fora capaz de confiar e dar uma chance ao seu irmão, apesar de todos os argumentos que todos tiveram por anos. Claro, apenas aquele homem soubera seus segredos, sua dor, seus sonhos. Snape o via como a um pai, e Serenna sentiu-se reconfortada por pensar que ele também tivera alguém em quem se apoiar, como ela tivera a Martinho Laurent.
Sem disfarçar um suspiro de saudade, ela olhou para o teto. O famoso teto encantado de Hogwarts. E, então, teve um choque: já conhecia aquele teto mágico.
Mas não era dos filmes da Warner, com certeza!
Uma imagem distante pareceu emergir de sua mente. Um sonho infantil, há muito esquecido. Um sonho… e um pesadelo, que frequentemente haviam se misturado, fazendo-a acordar triste ou apavorada, conforme a ordem em que ocorriam.
Viu-se dançando naquele salão, sem mesas ou cadeiras, apenas o teto mostrando o céu e as centenas de velas suspensas, acesas à sua volta.
Viu de novo o sorriso doce do garoto que cantarolava em seus ouvidos a canção que tanto gostava quando não era mais que uma garotinha de 12 anos de idade:

“Why do stars fall down from the sky
Every time you walk by?
Just like me, they long to be
Close to you…”


Serenna não conseguia acreditar que estava finalmente no mesmo lugar do sonho. O que será que isso significava? Será que o jovem algum dia passara por aquele salão? Será que seu velho sonho era uma conexão com o mundo em que seu irmão vivia, e ao qual também deveria ter pertencido?
Tinha certeza de que aquele rosto emoldurado por cabelos negros e brilhantes olhos claros não era o de seu irmão… Quem seria então?
Seus pensamentos foram interrompidos por uma voz que a chamava, insistente:
- Serenna? – a voz de Ana pareceu um pouco ansiosa – Está tudo bem?
- Hein? – Serenna fitou a amiga, por um minuto esquecida até de porque estava em Hogwarts até aquele momento. – Desculpe. Não estou sendo uma acompanhante vigilante, não é mesmo? Que vergonha!
Elas riram e Ana disse:
- Ah, não se preocupe. Eu e Lizzy estamos bem. Ela mamou bastante e dormiu agora. Então, achei que poderia caminhar um pouco, afinal, não estou inválida só porque tive um parto um pouco mais difícil, não é?
- Não mesmo! – Serenna riu com gosto – Se tivesse sido uma cesariana trouxa…
A frase a fez se lembrar do comentário de Snape sobre sua ignorância quanto às questões bruxas. Ana parecia ter passado por uma transição mais fácil, talvez por já ter pelo menos um conhecimento inicial de tudo, como fã da série criada por JK, ao passo que ela apenas lera os livros para ajudar Severus a se lembrar…
Só percebeu que dissera isso em voz alta, quando Ana lhe respondeu:
- Mas eu tive muita ajuda do bracelete de Helga.(3). Se bem que, depois, tia Agatha teve que me dar umas aulas especiais sobre etiqueta bruxa e essas coisas.
- Mas você pelo menos sabe mais das coisas, eu me sinto uma completa ignorante…
- Está assim por causa do que Snape disse? Esquece isso. Eu sei muito sobre o Mundo Bruxo “daqui”, não sei praticamente nada do Brasil, pois não fui educada como bruxa ”lá”. E você também não, oras! Nem ao menos sabia que era bruxa, como pode conhecer escolas bruxas ou qualquer outra coisa de lá? Além disso, o que eu sei é por causa de minha sobrinha.(1)
- É, você tem razão. – Serenna sorriu. – Mas eu sinto que preciso estudar mais. Desenvolver mais meus poderes de bruxa, afinal de contas. E evitar talvez um novo desastre…
- Você ainda está preocupada com aquela história do Draco?- Ana fitou a outra, perplexa.
- Bem… um pouco. – Serenna olhou em volta, tentando mudar de assunto, pois aquilo ainda a incomodava, principalmente porque Draco Malfoy nunca deixara de chama-la de “trouxa”, e o que antes para ela era motivo de orgulho, agora transformara-se em prova de ignorância.
Claro, continuaria a fazer as coisas que gostava de fazer como aprendera a fazer, manual e prazerosamente. Mas precisava reconhecer que isso não significava ignorar como fazer do modo bruxo. Ainda mais se queria ensinar corretamente às crianças sobre como valorizar os dois lados do conhecimento.
- Você sabe quais são as mesas, não?
- Ah, claro! – Ana sorriu, enquanto indicava cada uma pelo nome, deixando a da Lufa-Lufa por último, acariciando a mesa levemente – Eu teria me sentado aqui… se tivesse estudado em Hogwarts. – ela disse, sonhadora.
- Sua mãe também era Lufa-Lufa, não era? – Serenna perguntou. – E eu? Seria Sonserina como Severus?
- Não, com certeza! – Ana riu com gosto. Serenna podia ser tudo, menos uma Sonserina – quem sabe, você seria da Grifinória ou Lufa-Lufa, e provavelmente amiga de Lílian ou… de minha mãe?
- É… quem sabe… - ela murmurou, perdida de novo em pensamentos, e por um segundo, um quadro diferente veio à sua mente. Via o garoto do sonho, agora sentado ali, na mesa que Ana apontava como sendo a mesa da Grifinória. Confusa por não entender a razão disso, não ouviu o que Ana dizia, até que ela a sacudiu levemente. – Desculpe, o que você dizia?
- Eu dizia que pude experimentar o chapéu. Talvez você também possa.
Serenna a fitou por um momento, depois abanou a cabeça negativamente.
- Não, acho melhor não. Vai alimentar ainda mais caraminholas na minha cabeça… Já tenho muito com que me preocupar.
- Tudo bem. – a auror deu de ombros e começou a caminhar em direção à porta. – Vou lá ver minha garotinha. Você vem?
- Daqui a pouco. Prometo não me perder.
Ana lhe sorriu dizendo um “não seja boba” e saiu, deixando-a só novamente.

Serenna caminhou por cada uma das mesas, sentando-se por alguns minutos e tentando se sentir uma “aluna” e imaginar se teria realmente feito amigas como Lilian ou Elizabeth. E se teria conhecido pessoalmente o rapaz dos seus sonhos…sentado em uma daquelas mesas, olhando para ela e sorrindo todas as manhãs…
Com um longo suspiro, ela decidiu que já era tempo de parar de tolices, e voltou para a enfermaria, ao encontro de Ana e seu lindo bebê.
Mas, intimamente, levara uma certeza: começaria a se dedicar mais aos estudos, e também pesquisaria sobre a Magia em “seu país”. Severus não perdia por esperar…


*****

Serenna sorriu, lembrando-se de quanto tempo dedicara a estudar, mais do que já fazia até então, pois era bem verdade que fizera um julgamento muito rígido de seus progressos, que não eram de modo algum insignificantes. Em pouco mais de um mês Lupin já a considerava apta a praticar feitiços de defesa mais elaborados, ficando bastante satisfeito com seu desempenho.
Ao mesmo tempo que ela se inquietava pela repetição agora sistemática de seu sonho e também do pesadelo – ambos fundidos em um só.
E então, toda aquela confusão de descobrir que sonhava com Sirius Black, e a tentativa de decifrar o ritual do Livro de Fausto, e toda aquela loucura…
E de novo, ela estava no ponto de partida: entender porque não percebera o quanto entrava em um caminho sem volta, assumindo compromisso que não queria.
- Será mesmo?
Uma vozinha insistente lhe perguntou em seu coração. Por quanto tempo negaria para si mesma que sentira mais do que compromisso de fazer o que tinha que fazer para ajudá-lo? Até quando lutaria para negar que aquele homem era sim, importante para ela?
Fitou por um longo tempo o anel, e abriu mais uma vez a caixinha de música, concluindo que tinha o direito de “fazer de conta que estava namorando com Sirius Black”… como quando era apenas uma garota que sonhava com um menino bonito.

“On the day that you were born
The angels got together
And decided to create a dream come true
So they sprinkled moon-dust
In your hair of gold
And starlight in your eyes of blue

That is why all the girls in town
Follow you all around
Just like me, they long to be
Close to you”


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as referências de sempre:

(1) Harry Potter e o Segredo de Corvinal
(2)- Harry Potter e o Retorno das Trevas
(3)- Harry Potter e o Segredo de Sonserina

De novo, obrigada a todos que tem lido e gostado da fic (porque os que não gostam não se manifestam, então, fico sem saber, né?)

Desculpem se não demonstro isso respondendo uma por uma... mas li todos os comentários sim, viu?

e mais uma vez e sempre e sempre, um muito obrigada especial à Belzinha, que acaba sendo mesmo a betha dessa fic... (o que significa que ela sempre sabe primeiro o que acontece... mas não fiquem bravas com ela por isso, tá?)



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