Doutor Thomas



Quando Gina acordou, levou alguns segundos para lembrar-se aonde estava. Inicialmente, quando viu uma figura embaçada pairando no alto, e um pano úmido pressionado contra sua face quente, ela pensou que era sua mãe, e que estava em casa. Mas então piscou várias vezes, e o quarto foi se focalizando, o som das vozes tornando-se claras, e ela percebeu que não estava em casa.
Tentou levantar-se rapidamente:
- Mãe? – disse estupidamente, embora mãos gentis a forçassem a deitar – Onde estou?
- A sua mãe está dormindo, querida – veio uma voz familiar, e novamente o pano frio foi pressionado contra sua testa – É de madrugada.
Era Maria. Tudo ocorreu rapidamente para Gina, e com um gemido de desespero ela desabou na cama. Sua cabeça doía, seu corpo estava fervendo de febre e sua pele ardia. Quando tentou falar de novo, foi dominada por um ataque de tosse. Isso acabou com a sua garganta, que já estava incrivelmente ferida, mas não pôde evitar. Ficou muito aliviada quando passou, tirando sua mão da boca, embora parecesse que a força fosse sugada dela toda vez que fazia isso.
- O que eu tenho? – resmungou.
Maria sorriu gentilmente para ela, seus olhos escuros preocupados. Ela parou para embeber o pano em uma bacia de água gelada na mesa ao lado da cama, torceu-o, e retornou-o para a pele de Gina.
- Não temos certeza ainda, querida – respondeu.
Não têm certeza? Gina bocejou por um momento, mas o ar deve ter irritado sua garganta, pois começou a tossir novamente. Um calafrio repentino passou por ela, fazendo-a tremer, mas no segundo seguinte já estava se sentindo fervendo.
“Tosse... calafrios... dor de garganta... febre” Gina repassou em sua mente. Soava quase como resfriado, mas ela já tinha tido gripe antes, e não havia sido assim.
Ela desistiu de se preocupar com isso por algum tempo, e focou seus olhos em Maria:
- Eu vou morrer? – perguntou.
A preocupação desapareceu do rosto de Maria, e ela tornou-se indignada:
- Certamente não! – declarou irritadamente – Eu não a deixarei morrer, Alteza. É uma promessa. – Ela apertou as mãos de Gina brevemente antes de levantar-se e caminhar em direção à porta – Estarei de volta em um minuto, com algo quente para a sua garganta – disse sob seus ombros, e deu a ela um último sorriso cuidadoso antes de ir.
Gina lamentou levemente e deixou sua cabeça descansar no travesseiro. Não queria algo quente – já estava queimando. Tirando os lençóis, sentou-se, e tentou ignorar a miséria em que seu corpo estava.
A promessa de Maria não a fez sentir-se melhor. Era uma atitude gentil, é claro, mas Gina não era idiota. Ela sabia que eles não tinham bons medicamentos no século dezessete. As pessoas podiam morrer de algo simples como gripe, e o que ela tinha era muito pior.
A ruiva fechou os olhos e lambeu seus lábios secos, tentando imaginar-se em casa, na sua própria cama. Sempre que ficava doente, sua mãe permanecia ao seu lado quase todo o tempo, e quando não podia, seu pai ou algum dos seus irmãos vinha. Gina sabia que era mimada em relação à família – muitas vezes, de qualquer forma, isso era irritante, sempre ser cuidada por um irmão mais velho. Mas era sempre agradecida por não ter que ficar deitada sozinha quando estava doente.
Agora, estava só, e o silêncio do castelo ecoava em seus ouvidos. Ela estava desconfortavelmente quente, obviamente com febre, e sua garganta estava seca e ferida. Doía engolir, e é claro que quando se concentrava em não engolir, ela tinha que engolir. Várias vezes teve de tossir, não tão fortemente quando antes, mas ainda assim doía.
Ela estava exausta, mas lutava para manter-se acordada. Não que quisesse ficar acordada para Maria retornar com comida, pois não estava com fome afinal. O motivo era que pretendia perguntar sobre Draco.
Gina conseguia se lembrar de quando estava falando com ele no salão, e então havia caído. Podia vagamente recordar dele tocando sua face, mas mais uma vez, podia ter sido só um sonho.
E ela não tinha certeza se queria que tivesse sido um sonho ou não. Não podia definir qual era mais perturbante – ter um sonho em que Draco a tocava, ou ele realmente a tocar. Não que não tivesse sido bom, pois sentir as mãos frias dele tocando a sua pele havia sido maravilhoso. Mas tinha certeza de que se não estivesse doente, poderia ter sentido algo entre eles. “Ainda bem que eu estava doente” pensou com gratidão.
Mas o que ele havia feito quando ela desmaiou? Tinha deixado-a ali para chamar ajuda, ou tinha a carregado para algum lugar? Ela pegou-se desejando que tivesse sido a segunda alternativa, embora soubesse que ela não era provável. O típico Draco Malfoy teria a deixado ali mesmo se estivesse morrendo para chamar ajuda e não ter que lidar sozinho.

* * *

Draco não sabia porque estava tendo dificuldade em pegar no sono. Esteve virando-se e revirando-se a noite toda, totalmente desperto. Havia um incômodo no seu estômago, e embora seus pensamentos nunca estivessem em Gina, ele sabia que era por causa dela.
Ele estava determinado a pensar em tudo menos ela, mas finalmente teve de desistir e admitir que estava preocupado. Gina estava realmente doente, e quando havia checado com Maria antes de ir para a cama, ela relatou que a pele da princesa estava fervendo. Isso devia significar que ela estava com febre alta. Pelos outros sintomas, Draco supôs que ela estava com pneumonia, doença que ele mesmo já tinha tido duas vezes por ficar trancado nas masmorras geladas várias vezes só de pijama, e sabia como era.
Possuía uma desconfiança, de que essas pessoas não tinham idéia de como tratar pacientes com pneumonia. Eles não eram os mais avançados em ciência medicinal. Gina provavelmente corria risco de vida.
Agora, por quê isso o incomodava tanto ele não conseguia entender. O assunto o manteve rolando na cama até finalmente, com um suspiro alto e irritado, tirar os cobertores de si e se levantar.
“Talvez uma volta” pensou, franzindo as sobrancelhas com raiva por sua incapacidade de pegar no sono. “possa ajudar a clarear minha mente.”
Visto que seus olhos já estavam ajustados à escuridão, ele era capaz de mover-se sem bater em nada. Achou um robe de veludo, que estava organizadamente separado no guarda-roupas por um dos empregados que havia desfeito sua mala, e algumas meias grossas, e os vestiu. Poucos minutos depois deixou o quarto, fechando a porta calmamente.
Ele realmente não podia agüentar o castelo à noite. Velas tremeluzentes dificilmente forneciam calor às paredes frias e ao chão, e pouco clareavam os corredores. Não podia evitar pensar que a qualquer momento um vampiro poderia pular nele, ou um gato preto cruzar o seu caminho. Isso não o assustava, pois a sua própria casa tinha um pouco disso, mas ainda o perturbava levemente.
Draco não tinha certeza de onde estava indo – só uma volta, ele decidiu, mas de alguma forma, achou-se indo em direção ao quarto de Gina.
Ele parou quando se deu conta, praguejando baixinho. O que havia de errado com ele? Gina não estava morta ainda. Podia esperar até de manhã para vê-la. “Além do mais”, lembrou com um recuo aborrecido, “quando eu a vi mais cedo, ela estava horrível. Eu realmente não quero vê-la assim novamente.”
Se tinha algo que Draco não gostava, era desamparo. Não podia suportar ver pessoas parecerem tão perdidas, tão sem saídas, como Gina estava, quando havia ido contra todos os seus instintos para vê-la na tarde anterior. Ela estava dormindo, gemendo baixinho, tremendo em alguns momentos apesar do suor, e então atirando os cobertores lamentavelmente. Ela não estava acordada e ele não conseguiu nem olhar para ela direito.
- Alteza? – veio uma voz tímida.
Draco olhou em volta, assustado, e viu Maria movimentando-se em direção à ele. Ela tinha uma bandeja equilibrada em uma mão, com uma tigela de algo fumegante. Quando se aproximou, ele reparou a exaustão marcada em seu rosto, percebendo que essa mulher esteve provavelmente trabalhando durante todo o dia sem parar.
Ela parou na frente dele, inclinando sua cabeça para trás, para que pudesse encontrar os olhos dele:
- Há algo que deseja, Alteza? – perguntou em um tom cansado.
- Não – respondeu Draco – Só... eu só estava dando uma volta.
Maria pressionou seus lábios em uma linha fina, e então sorriu fracamente:
- Eu não recomendo ficar vagando pelo castelo tão tarde, Alteza. Você precisa descansar.
- E você não? – disse ele, elevando uma sobrancelha.
Ela levou pelo lado errado, pois se apressou em explicar:
- Ah não, Alteza, eu não quis dizer isso. É só que eu não queria que você ficasse cansado amanhã, e eu estava meramente sugerindo que...
- Não, eu acho que você me entendeu mal – interrompeu ele – Eu só estava declarando que parece que você precisa descansar. Só isso.
Por um momento, ela o encarou. Então fechou a boca e pareceu lembrar do que estava determinada a fazer:
- Se me der licença, Alteza, eu preciso levar essa sopa para a Senhorita Gina.
Ela passou por ele e começou a caminhar o restante do corredor que precisava para alcançar o quarto de Gina. Draco perguntou antes que pudesse evitar:
- Ela está acordada?
Maria parou antes de entrar no quarto, olhando por cima dos ombros para ele:
- Sim, ela acordou há alguns minutos.
As pernas de Draco tinham desejos próprios pois um segundo depois ele estava ao lado de Maria na entrada.
- Isso significa que ela está melhorando?
- Eu acho que sim, Alteza – respondeu com um leve franzimento de sobrancelhas em preocupação – Eu nunca vi uma doença como essa antes.
“Faz sentido” percebeu Draco. “Eles provavelmente não sabem o que a pneumonia é hoje... nem o que era antes.” Ele viu que, já que Gina era do futuro, ela tinha o corpo de alguém de quatrocentos anos do futuro, então havia pegado a doença quando ninguém mais podia.
- Você gostaria de visitá-la?
O tom cauteloso de Maria de alguma forma cortou os pensamentos de Draco, e ele fixou seus olhos nela. Ela parecia levemente amedrontada pelo grito que ele daria por ela ter sugerido algo assim.
Mas ele queria vê-la? Sim, ele sabia que queria. Não havia como negar. E de alguma forma, sentia que devia ser a pessoa que ficava ao lado dela. Ele não podia explicar exatamente o sentimento – apesar de desejar desesperadamente que essa sensação não existisse – de que ela precisava dele mais do que qualquer outra pessoa. Talvez porque os dois sabiam que eram do futuro.
Então ele tirou os pensamentos absurdos da cabeça. Ele estava tirando conclusões de algo que não era nada. Gina o odiava – claramente e simplesmente. Ela explodia quase todas as vezes que ele estava por perto. Ela nunca estava feliz quando falava com ele. Suas conversas sempre terminavam com brigas cheias – gritaria, berros. Sem mencionar que Draco vagamente suportava ficar perto de Gina pois ela dava em seus nervos no final. Ela ser bonita não significava nada. Agora ela não estava bonita, pois estava terrivelmente doente.
- Alteza? – perguntou Maria novamente quando Draco não respondeu.
- Eu irei vê-la – respondeu ele antes que ela terminasse a pergunta.

* * *



Gina lutou para manter-se acordada, simplesmente porque viu-se precisando do conforto de saber que alguém estava próximo, e também porque queria esperar por Maria. Suas pálpebras batalhavam contra a sua decisão, fechando várias vezes já que pareciam estar tão pesadas. Ela deixou escapar um pequeno suspiro de gratidão quando a porta do quarto finalmente se abriu.
Maria entrou com uma bandeja e uma sopa fumegante. E Draco estava bem atrás.
Primeiro Gina pensou que estava tendo alucinações. Viu quando Maria atravessou o aposento e ajudou-a a ficar sentada, colocando travesseiros atrás dela e então posicionando a bandeja em seu colo. Draco permaneceu na entrada, seus braços cruzados, observando sem expressão.
A empregada virou-se e dirigiu-se à porta. Então parou ao lado de Draco e disse calmamente:
- Apenas alguns minutos, Alteza. Ela está mais exausta do que eu pensei.
Ele concordou imediatamente, e Maria saiu, fechando a porta firmemente. Gina encontrou os olhos de Draco por um momento, então abaixou sua cabeça para tomar a sopa quente e sem gosto, da qual ela não tinha o mínimo apetite.
A ruiva quase desejou que Draco não tivesse vindo. Sabia que devia estar horrível. Seu cabelo estava grudado na sua úmida testa e pescoço, e a sua grossa camisola de algodão pegava-se ao seu corpo por causa do suor. Lambendo a superfície posterior da sua colher de prata, ela deu uma olhada no seu reflexo por um segundo. A imagem estava levemente inclinada, mas dava para ver os círculos escuros abaixo de seus fundos olhos e a aparência pastosa que sua pele tinha tomado.
Apesar de quão constrangida e envergonhada ela estava se sentindo, uma pequena parte sua não podia evitar sentir-se aliviada. Por que diabos Draco Malfoy seria aquele que a fazia sentir-se aliviada ela não sabia. Olhando para ele novamente, viu que ainda continuava a encarando sem expressão. “Por que ele tem que sempre ser tão bonito?” perguntou-se. “Ele ter uma boa aparência faz eu me sentir dez vezes pior do que realmente estou.”
Como se lendo sua mente, ele abriu sua boca e falou lentamente:
- Você está com um aspecto de merda.
Gina revirou seus olhos em surpresa por um momento. Depois ela riu. Não era realmente uma risada, já que soava estridente e acabava com uma tosse, mas ela sorriu. Isso pareceu descarregar toda a tensão que tinha sentido entre eles, e de repente sentiu-se realmente descansada com ele, apesar do quão terrível seu corpo estava.
- Você gostaria de sentar? – perguntou a princesa, apontando para uma cadeira com sua colher. Odiava como sua voz estava: roca e grossa, como se tivesse tido um resfriado e estivesse sofrendo as conseqüências, mas ela não podia realmente evitar – Pegue uma cadeira.
Draco encarou-a por um longo tempo como se a contemplasse. Então deu de ombros levemente, descruzou seus braços, caminhou para pegar uma cadeira, e trouxe-a para perto da cama como Gina sugerira. Ele recostou-se, descansando seus cotovelos em seus joelhos e colocando o dedo em frente a sua boca, ficando em silêncio antes de dizer:
- Você sabe – disse filosoficamente – essa é a única vez que você foi legal comigo, e é justo quando está doente, e provavelmente, delirante.
- Não estou delirante – respondeu Gina na defensiva, sua voz grossa grunhindo – E eu seria muito mais legal com você se você fosse legal comigo.
- É isso o que você precisa entender, Weasley – disse Draco, olhando-a intensamente. Ela não tinha certeza por que sua forte contemplação fazia seu coração bater estranhamente – Eu não sou uma pessoa legal. Só estou sendo eu mesmo com você.
Gina fitou-o por um longo tempo antes de retornar a sua sopa. O que ela podia responder? Era a verdade. Draco Malfoy era naturalmente uma pessoa malvada e asquerosa, e nada mudaria isso. Entendia que o jeito que ele agia em relação a ela não era só para contar vantagem – ou para deixá-la brava. Era a maneira que ele geralmente reagia com todo mundo.
“Provavelmente ele é extra asqueroso com Weasleys” Mas ela não podia deixar de pensar.
Houve um grande intervalo de silêncio, o único som vindo de Gina soprando sua sopa. Estava realmente muito quente, considerando que o suor estava quase pingando do rosto dela. O que ela não daria por um Feitiço Esfriante naquela hora...
Quando não conseguia mais tomar sopa, removeu a bandeja do seu colo e o pôs na cabeceira. Até que não sabia o que fazer ou dizer. Não se sentia confortável o olhando sem conversar, então ao invés disso, olhou para suas mãos.
Uma pergunta disparou em sua mente, e antes que pudesse pensar duas vezes, revelou:
- Por que você veio? São quase quatro da manhã.
- Eu acordo cedo.
Gina fitou-o quase lentamente, considerando que qualquer movimento mais rápido parecia terrivelmente doloroso e exaustante para ela agora. A expressão dele, mais uma vez, estava indecifrável.
- Já te disseram – perguntou ela com voz rouca – que você é estranho?
Ele deu um sorriso irônico, o divertimento estampado em seus olhos cinzas:
- Não, você é a primeira.
- Eu não te entendo – continuou Gina, encorajada pela resposta leve que recebeu – Uma hora eu acho que você me odeia, e depois você me trata assim.
Isso foi o bastante. A emoção deixou o rosto dele como se alguém tivesse jogado uma cortina em seus sentimentos.
- Assim como? – perguntou sem tom.
Ela franziu as sobrancelhas, sua cabeça latejando. Havia perdido o fio do pensamento. De repente, tudo que queria era dormir novamente.
- Sei lá – resmungou – Me visitar, talvez. Eu não te entendo.
- Você já disse isso.
- Desculpe. Mas eu realmente não entendo.
- Eu não quero que você me entenda – respondeu ele, o canto da sua boca inclinando-se – Você é a última pessoa que eu quero que me entenda.
Se ela não estivesse tão exausta, teria ficado brava. Ao invés disso, disse não muito claramente:
- Está bem. Então não vou tentar.
- Você está cansada?
- Não, estou bem – mentiu. Não sabia porque havia dito isso. Talvez porque não quisesse que ele fosse embora.
Ele sorriu ironicamente:
- Tão bem como estava ontem de manhã, quando desmaiou?
- Eu não desmaiei... – pestanejou ela – Eu só... passei mal. Mais ou menos.
- É a mesma coisa.
- Você acorda cedo mesmo, ou você veio me visitar por um motivo?
Ele claramente não tinha esperado essa pergunta, pois parecia assustado. Gina ordenou que seus olhos se focassem nele e lutou para manter as pálpebras abertas.
- Eu estava só curioso – ele disse finalmente – para saber que doença você tinha. Eu queria ver com meus próprios olhos para descobrir.
- E descobriu?
Ele hesitou.
- Pneumonia – respondeu finalmente.
- Oh. Que bom. As pessoas sobrevivem a pneumonia – disse ela. Sua língua estava muito pesada e lenta, e sabia que estava engolindo palavras.
Draco franziu as sobrancelhas:
- Hum, sim, eu acho – ele deu a ela um olhar oblíquo – Talvez eu deva ir – começou a se levantar.
- Não – Gina viu-se protestando. Estendeu a mão e agarrou o braço dele – Não, não vá. Por favor – sua voz havia se tornado um sussurro.
Surpresa refletiu-se nos olhos dele quando a fitou. Ele olhou para as mãos dela agarradas em seu pulso e de volta a ela, indicando claramente que queria que ela o soltasse. Mas não soltou.
- Fique – implorou ela – até eu pegar no sono.
Ele parecia estar considerando a hipótese, e por um segundo Gina sabia que ele concordaria. Os olhos dele investigaram o rosto dela como se guardasse a resposta. Então ele falou:
- Você não está pensando corretamente. Maria estará de volta daqui a pouco.
Ele tirou os dedos dela de seu braço. Em poucos passos havia alcançado a porta e sem olhar para trás saiu, sem se importar de fechá-la.
Gina fitou a porta aberta por um tempo, tentando entender o que havia acontecido. Ela havia implorado para que ele ficasse, e ele não ficara. E ela estava pensando corretamente... não estava?
“Será que vou me arrepender disso mais tarde?” perguntou-se. Deslizando para uma posição deitada, seus olhos fecharam-se. Mesmo que estivesse quase adormecida na hora em que sua cabeça atingiu o travesseiro, ela ainda teve tempo de pensar no quanto queria que ele ficasse. “Por que?” pensou. “Por que quando tudo que eu fiz na minha vida foi odiá-lo?”
Um segundo depois, ela foi conduzida a um sono benigno.

* * *

Quando Draco deu passadas pesadas pelo corredor, sentindo-se como se não conseguisse sair do quarto de Gina rápido o bastante, quase colidiu com Maria. Ela estava parada perto da porta, e, Draco tinha uma leve suspeita, estivera ouvindo a conversa.
Isso o perturbou, mas não o suficiente a ponto de parar e perguntar. Em vez disso, ele passou rápido por ela, ouviu a sua respiração profunda, e dobrou a esquina, sentindo os olhos negros dela o acompanhando.
Qual era o seu problema? Parecia que ele não tinha conseguido sair do quarto de Gina rápido o bastante. É isso que ele não conseguia entender. O que o fez querer sair tão depressa?
“Estou sendo um completo idiota” pensou, apesar de que se pudesse voltar no tempo, para a cena entre os dois, ele não conseguiria ter feito outra coisa. Exceto talvez sair antes, para que ela não tivesse a chance de pedir para ele ficar.
Ela realmente não pensou no que havia pedido, Draco sabia. Estava tão desesperada para que alguém ficasse com ela, que não se importava que fosse ele. Quando recuperasse os sentidos certamente ficaria completamente constrangida, e então ela é que estaria se sentindo como uma idiota.
Mas isso ainda não explicava por que ele havia corrido do quarto dela como se estivesse sendo caçando por um bando de lobisomens. E sabia o motivo exato por ter feito isso.
Ele queria ter ficado com ela.
Não tinha como negar. Ele tinha quase dito sim para ela, e era isso que o assustava. Seus sentimentos estavam todos misturados pois eles mudavam muito perto dela. A maioria das vezes ela o irritava e o zangava. A maioria. Mas havia outras vezes em que ele se pegava a olhando, cheio de algum tipo de saudades que não podia descrever. Recusava-se a acreditar nisso pois ele queria, e ao mesmo tempo não queria Gina Weasley. Devia ser algum tipo de ânsia, algum sentimento de que ela era a única que realmente entendia o que era estar nessa droga de mundo, a única pessoa que ele conhecia nessa época.
Draco caminhou vagarosamente de volta ao seu quarto e podia sentir uma dor de cabeça forte se aproximando. Deve ter sido toda a confusão do que ele sentia por Gina e falta de sono combinado.

Ainda assim, ele queria descobrir tudo. O que ele sentia por ela? Não exatamente a odiava mais, isso era certo. Estava se sentindo culpado por ela estar doente, embora porquê ele devia se sentir culpado, ele não sabia.
“Não se sinta mal”, ele disse a si mesmo, sorrindo ironicamente, “porque assim que ela se recuperar, ela vai estar de volta com a sua personalidade irritante e vai começar a gritar com você de novo.”
Isso o animou levemente. Talvez estivesse levando tudo pelo lado errado. Talvez não sentisse nada por Gina exceto culpa – a culpa por tanta dor que ela estava passando e pela possibilidade dela morrer. Provavelmente por isso que quisera ficar com ela.
Mas isso ainda não dizia por que diabos ele se sentia mal por ela, quando nunca havia se sentido mal por ninguém em sua vida. Quando ouviu sobre Cedrico Diggory e sua morte prematura, sentiu nada. Quando ouviu sobre a maneira perigosa por qual Harry havia derrotado Voldemort no sétimo ano e quase havia perdido a vida, sentiu nada. Ele nunca sentiu algo por ninguém antes, e agora, de repente estava sentindo-se culpado, tipo ‘é-como-se-fosse-minha-culpa’, por Gina Weasley?
Draco alcançou seu quarto e entrou. Dessa vez dificilmente teve problemas em pegar no sono, pois a exaustão estabelecia-se. Ele adormeceu logo que sua cabeça atingiu o travesseiro, silenciando qualquer pensamento futuro.

* * *

- Gina – uma voz distante ecoou – Gina querida, acorde!
A princesa desejava dormir, e não levantar-se e sentir a dor da doença. Lamentou levemente e abraçou seu travesseiro mais forte:
- Vá embora, Rony – resmungou.
- Rony?! – veio a mesmo voz, dessa vez confusa. Então a ruiva foi sacudida nos ombros – Virgínia, acorde agora. Eu serei obrigada a jogar a água fria de Thomas na sua cabeça?
“Humm” pensou Gina, sentindo o suor que cobria seu corpo “isso seria perfeito.”
Mas a agitação continuou, e ela ficou mais e mais acordada. Finalmente, abriu suas pálpebras pesadas para não ver Maria, e sim a rainha sentada na cama tentando acordá-la.
De alguma forma Gina lembrou-se, apesar da sua doença e cansaço, do que essa mulher havia feito para a mãe de Harry. E tudo que podia pensar quando vagarosamente virou-se de barriga para cima, era como ela era uma má, má pessoa e merecia morrer pelo o que tinha feito.
- Finalmente – disse a rainha, pressionando seus lábios em uma linha fina – Thomas está aqui para vê-la. Ele está lá fora.
- Thomas? – resmungou Gina.
- Sim - quando a ruiva a encarou, pálida, sua mãe suspirou e continuou – Thomas, um dos melhores médicos do mundo. Nós conseguimos trazê-lo para examiná-la. Felizmente ele estava em Londres nos últimos dias.
- Ah – Gina não tinha certeza do que dizer.
A rainha franziu as sobrancelhas:
- Eu espero que você não esteja com algo contagioso. Uma epidemia seria muito inconveniente nesse momento...
“Sua filha única corre risco de vida” pensou Gina, bocejando “e tudo que ela pode pensar é em como o momento seria inconveniente?”
- Pare de me olhar assim – retrucou para a princesa. Houve uma pequena pausa antes dela se levantar e começar a caminhar em direção a porta – Eu vou mandar Thomas entrar, então – De repente, ela parou diante da porta e se virou – Quem é Rony, você poderia me esclarecer?
Gina teve certeza de que seu rosto já suado e vermelho tornou-se várias vezes mais cor-de-rosa. Ela estivera meio adormecida e não pensara no que dizia quando revelou o nome dele.
- Quem? – ela perguntou fracamente.
A rainha franziu seus lábios e revirou seus olhos para o teto:
- Às vezes – disse de modo nojento – Eu me surpreendo com você.
Gina não pôde resistir ao mostrar o dedo do meio para as costas da rainha. Ela se sentou e deixou a cabeça cair para trás, ouvindo as vozes do médico e sua mãe no corredor. Não conseguia entender as palavras, mas tinha a impressão de que a rainha estava falando mal dela.
Thomas entrou tão silenciosamente que Gina não notou sua presença até que estivesse ao lado da cama. Ele devia ter se movido mais silenciosamente que um gato para ela não ter ouvido nada. Seus olhos estavam fechados, esperando e imaginando a barriga de cerveja dele, os cabelos grisalhos e tudo o mais, carregando uma maleta preta de couro cheia de coisas que precisaria, quando de repente uma voz estranhamente familiar chegou aos seus ouvidos:
- Virgínia.
Ele não a chamava de Alteza ou nada. Só o seu nome. Gina pensou que devia ter imaginado isso, pois não tinha o ouvido entrar, então abriu os olhos. Ele estava parado ali, sorrindo levemente para ela, alto e magro. Seus cabelos eram pretos, tornando sua pela já pálida mais branca. Seus olhos eram uma sombra de azul brilhante, a cor de safiras, e eles pareciam tremeluzir com algo profundo, negro, sabendo dos segredos que possuía. Tinha os braços cruzados, seus dedos brancos segurando seus cotovelos e contrastando com sua roupa escura. A boca de Gina tinha ficado seca, e ela fitou aqueles dedos... aquelas mãos de aranha, com incomuns dedos longos...
Então ela conseguiu olhar para cima para encontrar os olhos dele, e eles se encararam. “Meu Deus” ela pensou “isso não pode estar acontecendo... não pode estar, eu devo estar alucinando ou sonhando...”
Mas ela não estava. Não importa o quanto rezasse e desejasse, esse homem não desaparecia.
Tom Riddle continuava parado ao seu lado, e ainda sorria friamente. Ele estava ali, e não estava de saída.
- Olá, Virgínia – disse ele – Como está se sentindo?
Aquela voz... ela trouxe uma avalanche de memórias. Seu horrível primeiro ano, sendo controlada por ele, sendo forçada a fazer coisas que nunca teria feito se não fosse por ele. E era uma voz tão bonita, profunda e rouca. Mas se você ouvisse com bastante atenção, poderia perceber a malícia fria nela, o mau propósito que era muito sutil.
Gina sentiu como se seu coração tivesse subido à garganta. Ela não estava mais com calor – seu sangue parecia ter congelado em suas veias. A única coisa que o encorajava era seu coração batendo, tão alto, golpeando como um tambor.
Ele ainda estava sorrindo para ela. Sorrindo como se não notasse como Gina estava petrificada, ou como a cor havia desaparecido de seu rosto. Sorrindo como se tudo estivesse certo no mundo, como se tudo ocorresse como deveria.
Gina mal podia respirar, muito menos falar. Tantas coisas passaram pela sua mente naquele momento. Será que Tom havia trazido ela e Draco para cá? Será que foi ele quem matou a família de dez pessoas? Será que ele a mataria agora? Será que ele sabia muito bem que ela era do futuro?
- Não me olhe assim, Virgínia – riu Tom Riddle, obviamente se divertindo – Eu não sou tão famoso assim... não deixe que eu a intimide.
Se ela não estivesse tão terrivelmente assustada, tão terrivelmente com medo de se mover ou soltar um cuidadoso grito, ela teria rido. Ele pensava que ele simplesmente a intimidava! E só porque era um “médico” famoso! Só podia ter uma interpretação. Ele tinha que saber a reação que estava causando nela. Tinha que saber como era mau.
Gina o estudou. Ele não parecia mais velho que vinte anos – como ele podia ser um médico, e famoso nessa área? A semelhança de seus traços e os de Harry eram misteriosos: os olhos guardavam o mesmo brilho cintilante, o cabelo era o mesmo preto escuro... até mesmo o jeito que mexiam a boca era similar.
“Ele se tornou Voldemort bem depois da adolescência” percebeu Gina. Mas isso não significava que ele não era perigoso. Tom Riddle estivera cheio de raiva reprimida desde muito pequeno, e tinha contido ela através de seus anos adolescentes até finalmente, quando se tornou adulto, fazer justiça com as suas próprias mãos e usar sua zanga de uma maneira horrível.
“Ele é perigoso agora. Talvez me mate aqui e nesse exato momento.”
Ela viu-se querendo chamar ajuda. Mas não conseguia fazer seus lábios se mexerem para formar as palavras. Não conseguia achar sua voz. Então começou a tremer, temendo o que aconteceria com ela.
Quando olhou para Tom Riddle novamente, seu rosto estava envolvido em preocupação:
- Você está tremendo por causa da doença? – indagou gentilmente. E descruzou seus braços, estendendo-os para ela. Gina encolheu-se para longe dele, incapaz de tirar os olhos de seus dedos. Como odiava aqueles dedos... – Eu não vou te machucar. Estou aqui para ajudá-la, Virgínia – disse suavemente e de modo assegurador.
- Não me toque – murmurou Gina. Não saiu muito como ela esperava: soou simplesmente como se ela estivesse com medo ser tocada enquanto estava doente. E não era isso, definitivamente estava longe da verdade.
- Virgínia, eu tenho que tocar – respondeu ele – Se espera viver com essa doença incomum, deve deixar eu te tocar.
“Nunca” Gina jurou mentalmente. Mas ao invés de dizer isso alto, ela falou roucamente:
- É pneumonia.
- Desculpe...?
Gina havia se encolhido em uma bola, deitando de lado, tentando não olhá-lo:
- Pneumonia – repetiu ela, apertando seus olhos numa tentativa de não chorar – Eu estou com pneumonia.
- É mesmo? – novamente ele soava divertido, e ela teve que olhá-lo. Estava sorrindo de novo, apesar de ser um sorriso normal – Nunca ouvi falar dessa doença. Você inventou?
Gina mordeu forte seu lábio superior. Ele tinha que saber que ela era do futuro – simplesmente tinha de saber. Devia ter sido ele que trouxe Draco e ela de volta ao passado. Ele era o único capaz de tanto poder. De alguma forma, seu espírito devia sobreviver, talvez em outro diário. Só porque ele havia sido derrotado no futuro, quase a quatrocentos anos daqui, não significava que não poderia ter os trazido. Ele devia ter provavelmente um milhão de planos reserva, só para garantir, se ele morresse algum dia.
“Isso é obra dele. Ele é razão por qual estamos aqui nesse mundo alternativo. Só pode ser ele.”
- Minha queria, eu prometo que não irei machucá-la – O tom bondoso e gentil de sua voz parecia atrair os olhos de Gina para os dele, e por um momento ela ficou perdidas nas órbitas azuis. Sua mente se esvaziou, e quando ela finalmente pareceu ter se recuperado, ficou brava consigo mesmo.
“Ele está brincando com você” ela contou para si mesma. “Você sabe que tem que ser cuidadosa perto dele. Ele é perigoso e poderoso. Só porque estamos no século dezessete não quer dizer que...”
O corpo inteiro de Gina ficou rígido quando sentiu ele tocá-la. Tom havia segurado suas mãos, que estavam presas ao lado de suas pernas e juntas ao peito, e estava gentilmente apalpando. O toque era gelado, mas parecia tão bom contra sua pele em chamas que ela não lutou – ao invés disso, seu corpo ficou mole e ela permitiu que ele a posicionasse como quisesse. Deve ter sido o minuto mais longo da sua vida. Ela estava apavorada, e isso combinando com o quão cagada estava, fê-la querer vomitar. Apesar de não ter comido nada sólido nas últimas horas, ela conseguiu manter o que sobrava em seu estômago no lugar certo.
- Você sempre teve o coração batendo tão rápido assim durante a doença – começou Tom Riddle, e ela podia sentir os olhos dele tentando achar os dela, embora ela os mantesse fechados – ou é só porque estou te tocando?
Ela não podia responder. Não podia. Seu coração pareceu bater mais rápido ainda com isso, e teve dificuldade em respirar propriamente.
- Eu vou te tocar bastante – disse ele gentilmente – Eu preciso sentir qualquer coisa incomum. Tudo bem para você?
Se estava tudo bem para ela? Não, não estava! Ele não iria botar suas mãos ‘aranhentas’ nela para senti-la. Ele não iria botar seus dedos longos anormais em sua pele e dar a ela protuberâncias. Não importa o que acontecesse, ela não iria deixar ele...
Mas ele já estava a tocando. Nem ao menos esperou que ela respondesse. Primeiro pressionou suas palmas nas bochechas dela, sua pele gelada parecendo surpreendentemente refrescante contra a carne quente dela. Então ele sentiu sua testa. Os olhos de Gina abriram de repente e viu que ele estava inclinando-se sobre ela, seu rosto surpreendentemente perto do dela. Mas ele não pareceu notar, pois tinha uma expressão profissional. Ele aparentava estar absorvido no que estava fazendo, e não nela.
Ele realmente era bonito. Quase tanto quanto Draco. Ela de alguma forma conseguiu engolir o grande nó da sua garganta.
- Você está com febre alta – murmurou ele, franzindo as sobrancelhas e olhando-a nos olhos. Tom estava olhando para as orelhas dela quando disse – Tem tido calafrios ultimamente?
“Sim, mas desde que você chegou eu pareço estar tendo bem mais” pensou ela. Mas abriu sua boca seca e resmungou:
- Sim.
- Abra a boca – disse ele, e colocou a ponta dos dedos nos lábios dela. Ela quase pulou para o teto, mas Tom fingiu não ter notado. Depois de um tempo, quando não obedeceu, ele suspirou – Você pode tornar isso fácil ou difícil, Virgínia. Não quero força-la, mas você está muito doente, talvez até perto da morte, então vou fazer o que devo.
“Mentiroso” pensou ela. “Você quer me matar. Você adoraria me forçar a fazer isso – afinal, não pareceu ter problemas ao forçar-me a abrir a Câmara Secreta, pareceu?”
Quando não obteve resposta, ele suspirou novamente, então agarrou o queixo de Gina e abriu a mandíbula a força. Tinha uma força extraordinária, somada com o fato de que ela não esperava por isso. Inclinando sua cabeça para que pudesse ver dentro da boca, ele mais uma vez tinha uma expressão profissional. Ela permaneceu absolutamente parada, tentando ignorar as mãos que seguravam o seu queixo e a raiz de seu cabelo, para que pudesse conduzir a cabeça para a direção que desejasse. O toque era frio, e ela viu-se odiando isso dessa vez.
“Meu Deus, eu tenho que parar de pensar” pensou ela, maluca pois não estava cem por cento horrorizada com a pele dele tocando a sua.
- A sua garganta está bem vermelha – declarou depois de um momento, libertado a mandíbula dela e removendo sua mão da cabeça – Você está tossindo bastante, não é?
Gina concordou com a cabeça.
Ele concordou também, e pareceu perturbado. “Nossa, ele é um bom ator. Se eu não soubesse quem ele era, eu teria mesmo acreditado que está preocupado comigo.”
- Bem – disse Tom, suspirando de novo – Eu não tenho certeza do que você tem. Vou ter que examiná-la mais um pouco, certo?
Ele sentou-se de modo que não ficasse mais inclinado sobre ela, e já que estava olhando para o lado, não viu-a negar com a cabeça em protesto. ‘Não, de novo não, me deixe sozinha’ ela queria dizer, mas de alguma forma, não conseguia formar as palavras.
Então, sem avisar, ele colocou as duas mãos nas costelas dela. A ruiva soltou um grito surpreso, sentindo o frio da pele dele mesmo com a camisola grossa, e contorceu-se. Ele segurou firme, mas deu a ela um olhar como se estivesse culpado pelo o que fez.
- Me deixe sozinha – insistiu ela, agarrando cada pulso dele e tentando tirá-los – Não ouse me tocar, seu...
Ele recuou e levantou suas mãos com uma expressão chocada, então suavizando-se em um olhar defensivo:
- Desculpe, Virgínia – disse irritado, seus olhos escurecendo – Sua mãe insistiu para que eu a inspecionasse para descobrir o que há de errado.
Inspecioná-la? O que ela era, uma vassoura? Não precisava ser “inspecionada” – sabia muito bem o que havia de errado!
- Eu tenho. A droga da pneumonia – disse ela em voz alta e vagarosamente.
Ele franziu as sobrancelhas, ainda parecendo levemente bravo:
- Isso não existe – explodiu ele, apesar de ter um tom de paciência – Eu sou o médico aqui, não você, Virgínia. Então deite e...
- E deixar você colocar suas mãos de aranha em mim? Nunca! – rebateu Gina. De alguma forma, ela havia encontrado a coragem para falar com ele assim, mas logo que as palavras saíram da sua boca, arrependeu-se. Se o enfurecesse, poderia dar tchau a sua vida maravilhosa como princesa. Ou como nada.
Tom fitou suas mãos por um minuto, como se ofendido por ela tê-las chamado de ‘mãos de aranha’ e então levantou a cabeça para olhá-la iradamente:
- Sinto muito se você se sente assim – disse friamente, apesar de não soar tão pesaroso assim – Mas eu vou fazer o que sua mãe pediu. E você vai me deixar.
Gina sentiu uma onda de ar frio passar por ela, e engoliu em seco. Estava numa situação difícil. Agora sentia-se tão terrivelmente cansada e exausta, sabendo que não tinha outra alternativa. Se tentasse correr, ele a pegaria antes que alcançasse a porta e a jogaria de volta para a cama, ou ela rondaria pelo castelo antes de logo desmaiar.
Mas não podia simplesmente deixar que ele a tocasse! Já não se sentiria confortável tendo um médico real a tocando, imagine Tom Riddle.
O que ela iria fazer? Nada. Engolindo em seco novamente, concordou e fechou seus olhos, rezando para que não demorasse.
Não foi tão ruim assim afinal. Ele só pôs pressão em seu estômago e apertou suas laterais, o que normalmente a dava cócegas, mas por alguma razão, dessa vez só causou uma contração nela. Então ele viu o seu pulso, arregaçou suas mangas e inspecionou seus braços com atenção. “Como se houvesse algo de errado com meus braços” pensou secamente.
O pior foi quando ele desabotoou a parte de baixo da sua camisola para ver as suas pernas. Não foi mais alto que a metade da coxa, mas ainda assim devia ter sido o momento mais humilhante de toda a sua vida.
Finalmente, ele abaixou a camisola e levantou-se com outro suspiro;
- Eu não sei o que lhe dizer, Virgínia – disse, toda a raiva anterior esquecida e o “médico” de volta ao seu devido lugar – Nunca vi algo como isso.
Gina abriu os olhos para encará-lo. Ela conseguiu morder a língua para evitar dizer novamente que tinha pneumonia. Ele percebeu essa alteração e sorriu.
“Como ele consegue esconder sua maldade tão bem?” perguntou-se ela, incapaz de desviar o olhar. “Como, quando queima tanto sua alma, e contamina-o como uma poção?”
O sorriso dele era assegurador e gentil, mas Gina podia ter jurado que por um segundo, algo brilhou em seus olhos. Algo negro e perigoso, algo que indicava quem ele realmente era, e no quê se tornaria. Mas logo já havia sumido, e se ela não o conhecesse, teria pensado que havia imaginado. “Isso aconteceu” pensou. “Eu sei que aconteceu”.
- Talvez eu tenha algo que possa ajudá-la – disse Tom depois do longo minuto em que eles se encararam – Vou mandar sua empregada trazê-lo logo. Beba e descanse mais um pouco.
Ele deu as costas e parecia que ia embora. Mas quando deu o primeiro passo, parou e girou nos calcanhares. A respiração de Gina prendeu-se na garganta quando percebeu que ele estava baixando a mão para tocá-la novamente.
Ela fechou os olhos bem apertado, que parecia ser o que mais andava fazendo na última meia hora com ele por perto. Então sentiu os dedos gelados e macios dele encostando-se em sua testa, limpando uma gota úmida de suor. Surpresa, as pálpebras dela se abriram, e viu ele olhando-a da mesma maneira com que um animal vê a sua presa. Custou toda a força dela para não gritar por ajuda. Mordendo seu lábio superior, fechou os olhos novamente, desejando que ele fosse embora.
“Me deixe sozinha!” ela berrou em sua mente. “Eu sei quem você é e o que vai fazer. É tudo que preciso saber. Então apenas vá embora!”
Vários minutos se passaram e Gina manteve os olhos fechados. Então sentiu uma brisa fria em seu rosto e lentamente abriu as pálpebras, levando-se em seus cotovelos. A porta estava aberta, deixando entrar um vento gelado do corredor, e o quarto estava vazio. Tom Riddle havia ido embora.
Ela suspirou em alívio, ainda um pouco trêmula, e jogou-se de volta aos travesseiros. Agora que ele havia ido, podia pensar claramente. Todas as dores da doença voltaram, já que não tinha mais o medo para se preocupar, e quase imediatamente pôde sentir gotas de suor escorrer pelo seu rosto.
Ela repassou a visita mentalmente. Oh Deus, havia agido como uma criança! Pensou em milhões de coisas que poderia ter feito diferente, em como poderia ter suportado a situação como uma adulta. Mas ela tinha se comportado como um animal assustado. Ele devia achá-la fraca – provavelmente pensava que poderia obrigá-la a fazer o que quisesse. Ela teria lutado mais quando ele havia dito que iria examiná-la. Não devia ter simplesmente deitado e permitido.
“É claro, só estou pensando nisso agora que o perigo passou” pensou, invadindo-se por um ataque de tosse. “Tenho certeza que sempre agirei assim quando ele estiver por perto.”
E honestamente, apesar de estar envergonhada, ela não podia culpar-se por ter ficado tão apavorada. Sempre sentira um frio na barriga quando alguém mencionava Voldemort, mesmo que o chamassem de Você-sabe-quem. E não tinha sido Voldemort que a ameaçara – tinha sido Tom Riddle. O jovem Tom Riddle, antes de ter se transformado e se tornado o horrível Lorde das Trevas.
Mesmo antes de ter se transformado, de qualquer forma, ele havia sido poderoso o bastante para eternizar-se em um diário, guardando-se o tempo suficiente para usar o corpo de Gina e fazer dela o que quisesse. Isso mostrava quanto poder possuía, e como era mau até quando mais novo.
Então só porque não tinha a aparência de Voldemort, e claramente não era Voldemort ainda, não queria dizer que ele não era capaz de machucá-la.
Quanto mais pensava nisso, mais perguntas ela tinha. A sua melhor parte, a parte mais esperançosa, continuou perguntando-se se ele era realmente perigoso ou não. Afinal, esse era um mundo alternativo. Harry, que era próprio um bruxo muito poderoso, não era totalmente o mesmo. Ele não tinha seus poderes e não tinha sua personalidade. É claro, isso acontecia pois sua mãe havia sido assassinada bem mais brutalmente que tinha sido por Voldemort, e ele ainda tinha seu pai.
Então isso significava que Tom Riddle era apenas um médico normal e comum? Ele certamente tinha agido como tal.
Exceto por alguns pontos, quando ele havia mostrado um pouco da sua raiva. Daí ela tinha ficado absolutamente apavorada com ele.
A outra parte, a mais realista dela, sentia fortemente que ele era o mesmo Tom Riddle que existia no futuro. Durante o primeiro ano, quando estava começando a suspeitar que talvez fosse ele quem estava a controlando e obrigando-a a fazer aquelas coisas horríveis, havia se sentido estranha quando escreveu para ele no diário. Sentiu-se como se alguém estivesse repetidamente escorregando um cubo de gelo pela sua coluna, e seu estômago ficou incômodo. Era exatamente assim se sentiu quando ele entrou no quarto hoje, exceto por mais alguns efeitos colaterais, como sua garganta fechando e a vontade de vomitar.
Gina deixou seus olhos fecharem e tentou apagar seus pensamentos, querendo mais do que nunca dormir e esquecer tudo. Mas Maria chegou alguns minutos depois, trazendo um cálice prateado. Ela gentilmente sacudiu a princesa e acordou-a.
- Apenas beba isso, querida, e então pode dormir – disse a empregada de modo tranqüilizador. Gina deixou escapar um lamento, selando seus lábios e lutando para levantar-se. Maria ajudou-a e esperou que se acomodasse, então deu a ela o cálice.
A ruiva levou-o a sua boca para começar a beber, mas apenas cheirou no líquido. Faz uma careta, e rapidamente levantou o cálice:
- Arght – murmurou – O que é isso?
Maria deu um sorriso pequeno:
- Thomas preparou para você. Ele disse que a ajudaria a melhorar.
Gina estava incrivelmente lenta, pois levou um minuto para perceber quem Thomas era. Então disse:
- Você quis dizer Tom Riddle?
Maria pareceu levemente confusa e respondeu lentamente:
- Sim, Tom Riddle.
- O nome dele é Tom – murmurou Gina sem fôlego, fitando o líquido rosa do cálice. Então lembrou-se de quando Harry havia dito uma vez que quando ele reuniu o nome Tom Servoleo Riddle, ele se tornou Eis Lord Voldemort. Se o nome fosse Thomas, isso não funcionaria corretamente.
Maria abriu a boca como se quisesse contradizer, mas depois pensou melhor.
Gina começou a dar o cálice de volta à ela. Nunca que ela iria beber algo que Tom Riddle havia feito. Devia estar envenenado. De qualquer forma, não importa o quanto se esforçasse para lembrar todas as informações que havia aprendido sobre poções envenenadas na aula do professor Snape, não conseguia se recordar de ter ouvido falar de uma poção que parecia com a que estava no cálice.
“Esse é um mundo alternativo” ela lembrou a si mesma. “E mais: Tom Riddle é mais poderoso que um bruxo normal. Ele pode fazer qualquer poção que quiser. Além do mais, nem precisa ser uma poção – ele pode ter simplesmente colocado um veneno de rato aqui ou algo que se dissolvesse com mágica.”
Então outro pensamento a ocorreu. Tom era mágico? Ela não tinha idéia, mas sua única suposição era que sim, ele provavelmente era.
- Beba, Alteza – insistiu Maria gentilmente, ignorando o braço estendido de Gina com o cálice.
- Eu não vou beber – Então Gina começou a tossir de repente, e o seu corpo chacoalhou-se. Um pouco do líquido rosa espirrou para fora do cálice e escorreu pela sua mão e cobertor.
Maria correu para pegar um pano para limpar. Quando pegou, olhou de cara feia. Gina percebeu que havia de alguma forma a aborrecido.
“Eu pensei que ela não fosse ficar brava com uma coisa tão simples como derramar o... qualquer que seja essa coisa.” Pensou ela, surpresa.
- Thomas nos contou como você agiu com ele – começou Maria, concentrando-se demais em secar o cobertor. Ela esfregou vigorosamente – Disse que você retrucou e não queria deixar ele tocá-la.
Os olhos de Gina umedeceram:
- Eu não retruquei. E além do mais, eu não queria que ele me tocasse...
- Ele é um médico, pelo amor de Deus, Gina – disse Maria, levantando a cabeça para encontrar os olhos de Gina - Ele é um dos melhores médicos que o mundo já conheceu. Você devia agradecer por receber tanto cuidado. Se existe um jeito de você melhorar, Thomas vai descobrir.
Gina engoliu em seco, pegada de surpresa pelo tom duro da empregada.
- Desculpe-me por dizer isso, Alteza – continuou ela – e eu sei que vou me arrepender de ter dito isso um dia, pois pode custar o meu emprego. Mas você é a pessoa mais mimada que eu já conheci em toda a minha vida. Você começou a agir normalmente nos últimos dias, e eu pensei que talvez você estivesse mudando, mas daí você faz um escândalo na frente de um dos médicos mais respeitados e qualificados do mundo. Você vai e grita com ele, diz para ele não tocá-la, insulta as suas mãos!
Gina não pôde conter a risada amarga que escapou de seus lábios.
- Suas mãos? – repetiu ela incrédula – Você está brava comigo porque eu insultei as malditas mãos dele? Não acredito que ele contou até isso!
Algo relampejou através dos olhos de Maria antes que ela olhasse para baixo e começasse a esfregar a cama novamente.
- Ele não me contou – disse ela levemente, claramente envergonhada – Eu estava ouvido atrás da porta.
Gina piscou, incerta de que havia ouvido corretamente. Maria podia ser demitida por isso! E ela ainda contou à princesa?
A ruiva engoliu em seco, tentando livrar-se do nó na garganta.
- Está bem – disse simplesmente, incerta do que dizer mais.
- Por favor, me perdoe, Alteza – sussurrou Maria – Mas sua mãe pediu. Ela queria ter certeza de que você não a constrangeria na frente de um convidado tão importante.
- Bem, acho que a constrangi – disse Gina diretamente – Então você foi e denunciou para ela tudo o que eu disse para Thomas?
A cabeça da empregada levantou-se novamente:
- Não, eu não contei. Não tive chance.
- Pare com isso – disse Gina irritadamente, gentilmente empurrando a mão de Maria para longe da coberta. Então ela suspirou pesadamente – Bem, estou exausta. Vou dormir para que eu tenha pelo menos alguns minutos de paz antes que a raí... hum, minha mãe venha e brigue comigo.
Ela estendeu o cálice de novo para que a empregada pegasse, mas Maria ainda se recusou a pegá-lo.
- Beba, por favor – disse firmemente – Eu confio em Thomas: isso vai deixá-la melhor.
A velha faísca confortante estava de volta aos olhos de Maria, e Gina sentiu-se aliviada por ela não estar mais brava. Mas ainda estava levemente perturbada pois a empregada sairia e contaria à sua mãe todas as coisas que havia dito para Tom Riddle.
- Não vou sair até você beber – disse, cruzando as mãos e fingindo preparar-se para uma longa espera.
Gina pensou por um momento. Ela realmente queria dormir e não ser perturbada, pois não teria que se preocupar com nada.
Além do mais, ela estava quase passando mal. Estava sendo muito agitada para alguém com pneumonia.
- Que tal assim – propôs Gina de olhos fechados – Eu bebo isso e você não conta para a mãe as coisas que eu disse para o médico.
Maria piscou os olhos.
- É claro que não vou contar a ela – prometeu.
Gina concordou, satisfeita. Agora iria apenas beber o maldito líquido para que pudesse dormir. E daí se ela nunca acordasse novamente? Seria um alívio tão grande. Tudo estava dando errado nessa vida...
Ela inclinou o cálice para os lábios e bebeu, cuidadosamente e lentamente no início. A substância era deliciosamente fria e tinha gosto de cereja – ou morango, ela não sabia dizer a diferença. O remédio deslizou por sua garganta maravilhosamente e instantaneamente ela sentiu-se um pouco mais fria, como se não estivesse suando tanto.
Ela bebeu tudo e estendeu o cálice vazio para Maria. Então descansou sua cabeça no travesseiro, dificilmente ouvindo a empregada deixar o quarto.
“Bem, se era veneno” pensou “então eu provavelmente nunca vá acordar.”
Esse pensando não a manteve acordada. Ao invés disso, ela caiu em um sono profundo e sem sonhos.

No próximo capítulo: Quais são os efeitos da poção de Tom Riddle? Gina melhorará da doença? E finalmente, haverá um pouco de “romance” entre Draco e Gina? Descubra tudo isso e mais no capítulo 6!

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