Capítulo II



Pálida e desgostosa, Hermione saiu da residência com uma pequena mala na mão, com Kelly ainda esbravejando contra ela. O motorista, um homem uniformizado e com ar eficiente, os aguardava junto à limusine em silenciosa prontidão.
Hermione ouviu a porta da residência bater com força e levou a mão à fronte latejante. Olhou em torno antes de encaminhar-se para o jardim cercado, onde Theo permanecera durante os minutos angustiantes em que estivera recolhendo seus pertences do quarto ao lado da garagem, com Kelly vigiando-a. A dona da casa recusara-se a permitir que ela levasse qualquer uma das peças de roupa que Theo usava, alegando que eram dos gêmeos e que apenas foram emprestadas ao garoto, não doadas. Kelly manteve a mesma linha quanto aos brinquedos, mesmo estando ciente de que seus filhos haviam passado da idade de brincar com eles.
A visão assustadora de Kelly arrancando as roupas de Theo e deixando-o quase nu, exposto ao vento gelado fez Hermione terminar logo com o que fazia e correr em direção ao tanque de areia onde o garoto brincava e arrancá-lo de lá. Theo fitou a mãe com os olhos verdes arregalados.
— Oh, Theo! — Abraçou-o quase soluçando e enterrou o rosto nos cabelos encaracolados. — Eu devia matar Harry! Ele não podia ter feito isso conosco.
O motorista abriu a porta da limusine quando Hermione se aproximou com Theo no colo. Notando que Kelly saía da residência, Hermione preferiu não arriscar: entrou no veículo antes que o bebê fosse cruelmente despojado do casaco de lã e do macacão, para não mencionar os sapatos.
Tentando recuperar o fôlego, perdido na corrida para proteger Theo da maldade de Kelly, Hermione ergueu os olhos. Harry fitava a criança aconchegada em seu colo com uma expressão intrigada no rosto.
— Engraçado como ele é moreno...
Hermione dissimulou o medo que sentiu, tirando o garoto do colo e colocando-o no assento, e prendeu-o ali com o cinto de segurança.
— Eu imaginava que fosse ruivo como Rony... — continuou Harry, observando com atenção o menininho.
Como se atraído, Theo ergueu a cabecinha, o tom natural da sua pele morena ressaltado pela camiseta branca que usava.
Hermione procurou pensar rápido, sentindo que entrava em pânico.
— Ele se parece com minha mãe... Ela era morena, devido à ascendência celta — informou Hermione, corando.
— Eu não a conheci.
Hermione ficou grata por isso, porque, na verdade, sua mãe era clara e loira. Mas vivera pouco em Godric’s Hollow, apenas quatro meses antes de resolver partir, embora grávida de Hermione, mas preferindo ter a criança sozinha a conviver com um homem a quem aprendera a desprezar devido a sua total falta de ambição.
Hermione respirou fundo, mas isso não serviu para acalmá-la. Concentrou-se em Theo e prometeu a si mesma não levantar a voz, para não assustá-lo.
— Você já pensou nas conseqüências do que fez a mim e a meu filho, Harry? Despojou-nos do único teto que tínhamos para morar — queixou-se, fazendo força para controlar os nervos em frangalhos.
— Estou começando a pensar. Não poderei levá-la para Godric’s Hollow, pelo menos até quinta-feira. Alan está com hóspedes, e não seria apropriado que você fosse para lá agora. Ainda assim, devia me agradecer.
Hermione o fitou, os olhos castanhos soltando faíscas iradas.
— Acha mesmo, Sr. Potter?!
— Como pode pensar em continuar naquela casa, sendo escravizada por aquela harpia? Como pôde suportar essa situação durante tanto tempo?
— Pelo bem de meu filho! Lá eu tinha a chance de ficar o dia inteiro a seu lado... e era onde Theo desfrutava de vantagens que jamais conseguiria lhe proporcionar.
— Aquela mulher é uma megera, Mione. Fui até aquela casa munido das melhores intenções. E no início fui gentil com ela, admita.
— Você interferiu em algo que não lhe dizia respeito e deu a Kelly dois minutos antes de começar a insultá-la, isso apesar de eu ter avisado que seria impossível para mim tirar folga no Natal... e que nada no mundo me faria voltar a Godric’s Hollow! Mas não me ouviu, e agora não tenho emprego, nem onde morar. Estou no meio da rua!
Harry a fitou com ar de reprovação.
— Não seja dramática, Mione. Claro que assumirei a responsabilidade por vocês dois, pelo menos até Alan me desobrigar da necessidade.
Hermione estava prestes a explodir. Não confiando em si mesma para falar, optou por nada dizer.
— Você irá para Godric’s Hollow na quinta-feira, goste ou não — informou Harry com intimidante convicção. —Fiz-lhe um grande favor, Mione.
— Acha, é? Neste momento, meu filho tem apenas as roupas do corpo e nenhum brinquedo com que se distrair.
— Waff... — falou Theo pela primeira vez. — Quero Waff...
Hermione sorriu para o garotinho.
— Waff ficou em casa, meu bem. Não pôde vir conosco — disse ela.
Theo cerrou o cenho e tornou-se uma chocante versão em miniatura de seu pai. Por um instante, Hermione não acreditou que Harry ainda não suspeitara da verdade.
— Quero Waff... Ele também gosta de passear de carro...
Hermione engoliu em seco. Olhou para Harry com ar de censura.
— Talvez possa explicar a Theo por que ele não poderá mais contar com o brinquedo com o qual dorme abraçado todas as noites.
— Do que é que você está falando? Ah... Que na pressa da partida acabou deixando-o para trás?
— Nada disso. Todas as suas roupas e quase todos os brinquedos eram dos filhos de Kelly, e ela não permitiu que os trouxesse. Mas não foi nenhuma surpresa, após a forma como a insultou. Como não podia tomar nenhuma atitude contra você, dirigiu sua fúria contra mim!
As feições morenas de Harry endureceram.
— Não se preocupe, providenciarei tudo o que for necessário para vocês dois, inclusive esse brinquedo... Waff.
— Lamento dizer que Waff não poderá ser comprado, nem por todo o dinheiro do mundo. É uma pequena girafa cor-de-rosa, feita pela mãe de Kelly para dar de presente a Sophia.
— Então comprarei uma girafa de verdade. — Harry olhou para fora.
— Não conseguirá enganá-lo, Harry. — Hermione balançou a cabeça dolorida. — Para onde planeja nos levar?
— Para minha casa na cidade. Aonde mais?
— Nunca!
— Waff. Quero ir para casa... — queixou-se Theo.
— Parece que ele é de fato obcecado por esse Waff.
— Theo é apenas um bebê — Hermione defendeu-o. - Como pôde fazer o que fez Harry?
— Fiz apenas o que era direito.
— Direito?
— Queira ou não, seu filho é um Evans, e faz parte do meu círculo familiar. Ele não deve pagar pelo erro dos pais.
Hermione laçou-lhe um olhar amargurado.
— Não fique me acusando, não tolerarei isso, Harry.
— Sugiro que deixemos esse tipo de conversa para quando estivermos a sós.
— Não irei para a sua casa — insistiu Hermione, entre os dentes.
— Irá, sim! Não me arriscarei a deixá-la em um hotel. Pode tornar a desaparecer, e já perdi tempo demais tentando localizá-la.
— Julguei ter sido Alan quem esteve a minha procura.
— Meu avô está com mais de oitenta anos e me encarregou de contratar alguém para achá-la. E não foi fácil.
— Eu não queria ser encontrada.
O silêncio então aflorou. Durante um minuto ou dois, ela olhou para a rua sem nada ver. Em seguida, devagar, voltou-se para Harry, que parecia bastante relaxado. Sua atitude diminuiu a tensão de Hermione.
De repente, ele voltou-se. Os brilhantes olhos verdes percorram o rosto de Hermione, que corou. Sentia a garganta seca e gotas de suor na testa.
Harry se manifestou:
— O que eu mais temia é que você pudesse estar nas ruas. Acreditava que acabasse sendo forçada a contar com sua boa aparência para sobreviver.
Os olhos de Hermione arregalaram-se, ultrajados.
— Relaxe, Mione! Foi um temor natural.
— Está enganado. — Hermione sentia-se cada vez mais frustrada. Apertou as mãos, num gesto de impotência. — Sobrevivi até agora sem ser preciso contar com... isso.
— Só espero que a experiência tenha servido como lição. Rony estava fascinado por você, mas seu plano sempre foi casar-se por dinheiro. Só uma rica herdeira poderá proporcionar a meu primo o estilo de vida que ele acredita merecer — Harry observou, com visível desprezo.
— Prefiro não falar a esse respeito, se não se importa... — A fúria crescia dentro dela. — Nesse momento, estou tentando chegar a um bom termo com o que você fez com as nossas vidas.
Harry esboçou um sorriso astuto.
— Em breve você estará me agradecendo.
— Nunca, Harry! Você não pode brincar com as vidas alheias como fez!
Estava sem dinheiro, sem ter onde morar e sem trabalho. Harry os despojara de tudo o que possuíam. Era imperdoável colocá-la na posição degradante de precisar depender de sua generosidade. Aquilo devastava seu orgulho e era difícil de engolir. No entanto, com uma criança pequena para considerar, Hermione não podia sequer pensar em fugir dele. Para onde iria?
A limusine entrou em uma rua arborizada e parou diante de um elegante casarão em estilo vitoriano. Hermione saiu do veículo e voltou-se para pegar Theo, mas ele soltou-se sozinho, evitando suas mãos. Sua independência a alertava para o fato de que aos poucos deixava de ser um bebê.
Uma mulher de meia-idade abriu a porta da casa antes de terem alcançado o primeiro degrau da entrada. Inclinou a cabeça, num gesto respeitoso, e em seguida se pôs a observar Theo.
— Esta é Minerva, minha governanta. Ela cuidará do garoto — Harry informou a Hermione.
— Pode deixar que eu mesma cuido.
— Minerva já trabalhou como babá, Mione. Asseguro que cuidará bem do garoto.
Minerva desviou os olhos de Theo, pousou-os em Hermione e tomou a desviá-los para o patrão, atenta às suas instruções.
Hermione suspeitou que ela fora babá de Harry. Aquele não era o seu dia, reconheceu. A mulher, pelo visto também grega, na certa notaria a semelhança, sobretudo se conheceu Harry naquela mesma idade. Mas ela não se arriscaria a fazer nenhum comentário sobre o assunto e ofender o dono da casa. Por enquanto, seu segredo estava seguro, tranqüilizou-se Hermione.
Jamais revelaria a Harry à verdade sobre Theo. Isso significaria expor a própria mentira e o fato de ter tirado vantagem da situação, já que se arriscara a engravidar.
Era difícil não se lembrar desse fato sem se constranger. Na verdade, quando fez amor com Harry, desejava dar um filho a ele para que substituísse a filha amada que perdera. E, naquele momento louco, Hermione não parara para pensar. Ou teria pensado? Bem no fundo do coração, acreditara que Harry não seria tão insensível a ponto de afastar-se da mãe de seu filho.
Amava-o com loucura, e só no momento em que fora rejeitada se deu conta do quanto tinha sido tola. Harry jamais entenderia, jamais perdoaria seu gesto. Na certa, assumiria que ela mentira para enredá-lo, por causa de seu dinheiro e sua posição social. Com uma confissão de roubo pairando sobre sua cabeça, o que mais ele poderia pensar? Harry não atribuiria um motivo mais nobre para a tão desejada gravidez.
Após ter dado algumas instruções a Minerva, que já tomara Theo no colo, Harry dirigiu-se a Hermione.
— Agora nós podemos conversar... — murmurou, com suavidade. No entanto, as palavras soaram como uma ameaça.
Hermione o precedeu, entrando na biblioteca, um aposento decorado com extremo bom gosto. Mobília sóbria, cortinas discretas, tapetes persas e vasos com flores frescas e viçosas. Olhou em torno do aposento e estremeceu a se ver diante da própria imagem refletida no espelho da parede. Tinha os cabelos em desalinho e o rosto lavado, já que os cosméticos estavam entre os vários itens que para ela eram considerados supérfluos. Usava um suéter preto, calça jeans e uma jaqueta surrada, tudo adquirido de segunda mão em um bazar de caridade. Sua aparência pobre e desgastada contrastava sobremaneira com a elegância sóbria do aposento.
Hermione enfiou as mãos nos bolsos e olhou para Harry, indecisa.
Recostado à mesa de mogno, ele a fitava. Era como se seus olhos a tocassem.
Hermione ficou tensa.
Harry em seguida endireitou o corpo e caminhou em sua direção, como um predador. Confusa e ciente de que outra vez corava, ela o fitou desconcertada.
— Enfim, a sós. — Harry esboçava um sorriso misterioso, que suavizou os ângulos de seu rosto.
— E então? Não vai me dizer, Mione? — continuou ele, naquele tom hipnotizante que a fazia arrepiar-se.
— Dizer o quê? - Harry prendeu entre os dedos uma mecha castanha.
Harry chegou ainda mais perto, encurralando-a contra a estante.
— Estou pedindo uma resposta honesta para uma pergunta muito simples. Você me usou como isca para causar ciúme em Rony? Ou... acabou na cama dele com a pretensão me ferir?
— Nenhum dos dois!
— Certeza? Tem de ser uma dessas opções, a não ser que fosse uma mulher sem moral, mas eu relutaria em pensar isso de uma garota de apenas dezenove anos. Talvez sentisse algo por um de nós!
— Você não tem o direito de perguntar isso!
— Dois homens e uma linda mulher, a receita perfeita para um desastre, ainda mais quando essa linda mulher além de rebelde é impulsiva e passional.
— Não sei por que está dizendo essas coisas... Não estou gostando.
Harry deu de ombros.
— Goste ou não, preciso saber. Rony sempre a desejou, mas nunca a desejou mais do que quando julgou que você fosse minha.
Hermione deu-lhe as costas, constrangida com a insistência. Harry não dissera nada que ela não soubesse. Por ironia, jamais se sentira atraída por Rony. Comparado a Harry, ele era como uma jóia falsa ao lado do ouro, sempre à sombra do primo. Mas, após ter sido rejeitada por Harry, a atenção que Rony lhe dispensara fora como um bálsamo para seu ego ferido.
Durante alguns dias, Hermione passeou com Rony e os amigos dele, comparecendo a festas, clubes e danceterias, para desespero do Sr. Granger.
Será que fora desse modo que surgira a crença de que Rony era o pai de Theo? Ou em sua aflição, quando Alan a encontrara com a miniatura na mão, ela se tornara tão incoerente que o confundira?
Harry prendeu entre os dedos outra mecha.
— Mione...
Ela arrepiou-se quando deparou com seu olhar intenso. Um divertimento cruel brilhava nos olhos dele.
— Pare com isso, Harry.
— Com o que? Você jogou o quanto quis comigo naquele verão.
A cor desapareceu do rosto de Hermione, deixando-a pálida como papel.
— Tal como Diana, a deusa da caça, você me perseguiu e me atacou. Eu precisaria ser bem mais forte do que sou para resistir à tentação.
Hermione desejou desaparecer. Incapaz de defender-se, procurou por um jeito de escapar.
— É melhor eu ir ver o Theo.
Comum movimento rápido, Harry a segurou antes que se afastasse.
— Mas, primeiro, terá de responder a minha pergunta.
Hermione teve a sensação de ser o rato pego pelo gato. Ergueu o queixo, para se tornar mais firme.
— Bem, talvez exista uma outra possibilidade que não lhe ocorreu.
— E qual seria?
— Talvez, se for paciente, até o final do dia, eu lhe diga qual é a diferença entre você e seu primo — desafiou-o, com o único intuito de insultá-lo.
— Então é isso. Deixe-me então mostrar-lhe a diferença. — Harry puxou-a, tentando alcançar-lhe a boca cor seus lábios ávidos.
Hermione balançava a cabeça de um lado para o outro para escapar.
— Largue-me! Que tipo de mulher pensa que sou?
— Do tipo muito sensual que sente a necessidade feroz de ter um homem, e esse homem serei eu!
Hermione debatia-se, presa por emoções conflitantes. Não esperava, porém, o tremor que a percorreu, surpreendendo-a, fazendo-a entreabrir os lábios e entregar-se num suspiro. Harry não perdeu tempo. Tomou-os de assalto e aprofundou o beijo com ousadia. Hermione recuou, com uma exclamação abafada.
— A diferença entre mim e meu primo, Mione, é que eu fiquei transtornado depois do que houve entre nós dois, e ele continuou o mesmo safado!
— Você? Transtornado?
— E como mais deveria ter ficado? O que esperava? Minha esposa havia morrido fazia apenas sete meses... e você tinha só dezenove anos! Julga que me senti orgulhoso da conquista que fiz? A filha adolescente de nosso mais fiel empregado, e o pior: virgem?!

----->Bom gente segundo capítulo postado. A fic ganhou capa \o/ Os créditos vão todos para a Jessy Potter. Brigadão guria. Próximo cap. na terça. Bjaum galera e comentem<-----

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