Capítulo 2



"Até mais tarde... Sev", a voz murmurou melosa no ouvido dele.

"Ah, cala essa boca", Snape retrucou, enquanto metade da turma da Sonserina caía em gargalhadas maldosas, o autor da frase rindo mais que todos enquanto se afastava para um local a salvo da ira de Snape.

Lily olhou feio para eles, e a situação só não se complicou porque o professor de Defesa Contra as Artes das Trevas expulsou o grupinho Sonserino da sala. E mesmo no meio dos rostos que sorriam sarcásticos eram bastante claros os olhares de condenação e desprezo.

"Que ridículos", Lily resmungou quando ficou a sós com Snape, depois da última aula da tarde.

Não querendo admitir que ela tinha razão, ele tentou desconversar, e disse a primeira coisa que lhe veio à mente:

"É culpa sua."

Ela ergueu uma sobrancelha, boquiaberta, ainda tentando assimilar o que acabara de ouvir.

"É minha culpa eles se comportarem como idiotas? Ou você tá me acusando de atrapalhar sua... preciosa amizade...", ela começou a se alterar, "... e prefere ir com eles? Por que se for..."

"Não, não!"

Severus quis que um buraco se abrisse no chão e o engolisse; tinha dito tudo errado, agido de forma completamente patética. Baixou a cabeça, escondendo-se por trás dos longos cabelos e escondendo o tom púrpura que seu rosto adquiriu. Tentou consertar a bobagem que havia dito, gaguejando e sendo incoerente outra vez:

"Não, não foi isso que eu quis dizer... foi... causa, e não, culpa. Por causa de você. Ouço esse tipo de coisa... e eu... eu não me importo. Porque é você. E não me interessa o que eles pensam", finalizou, querendo desaparecer de vez por ter se revelado tanto.

Por um momento ela não soube se deixava a irritação seguir seu curso natural, e crescer, ou se sensibilizava. Acabou sorrindo. Buscou a mão dele e a pressionou carinhosamente. Deu-se conta de quanto tempo fazia que não existia um contato terno como aquele entre eles. Sentiu uma ponta de culpa.

"Tudo bem, Sev, tudo bem. Entendi", ele a espiou com o canto do olho; e relaxou ao vê-la sorrindo. Mas então, ficou séria outra vez. Uma ponta de raiva transpareceu em sua voz quando disse: "Precisamos conversar."

Seu corpo imediatamente se retesou. Severus sabia o que viria em seguida. A velha ladainha sobre as Artes das Trevas. Era sempre o que acontecia quando ela adotava aquele tom de voz. E ele estava certo.

"Severus, estive pensando. Estou simplesmente cansada das coisas como elas estão."

"Que coisas?", ele perguntou, tentando ganhar tempo enquanto pensava em outra desculpa.

"Você e eu. A gente não é mais como costumava ser", ela fixou os olhos nele, ele desviou os seus. "Por causa dessa... dessa droga de Artes das Trevas."

Ele suspirou, exasperado, e encolheu-se, inconscientemente.

"Lily, outra vez..."

"Eu só quero entender! Por que, Sev? Por quê?"

Era tão idiota confessar que queria que ela prestasse atenção nele. Voltou os olhos para ela. Parecia decepcionada e compreensiva e ansiosa. Mas não se sentia à vontade para se abrir, mesmo com ela. Era tão complicado. E ela o condenara por tantos anos; será que adiantava alguma coisa, ainda, tentar se justificar? O que mudaria, então? E ele precisaria se expôr demais, e tocar em pontos da própria personalidade que nem mesmo sabia compreender ou como expressar. Era uma atração tão intensa, ou até mais do que uma mísera atração, era algo simplesmente enraizado nele. Decidiu que ela não compreenderia, porque era pura e boa demais. Optou pela saída mais fácil:

"Mas eu já te falei, Lily, uma porção de vezes. Não tem nada demais, é como qualquer outra coisa, como Poções..."

"Então, por que é que você não se torna tão obcecado por Poções?", ela sugeriu friamente. "Você é ótimo nisso." Então desabafou, frustrada: "Ah, eu tô tão cansada. Tão decepcionada, Severus."

"Decepcionada?"

"O que foi que aconteceu com você?

"Como assim?", ele perguntou, fazendo-se de desentendido. "Não aconteceu nada, ora."

Ela bufou.

"Você sabe o que quero dizer. Sabe muito bem. Você mudou. Ou talvez, quem sabe, deixou a máscara cair", ela disparou, observando-o corar outra vez, mas controlar-se, o rosto neutro, os olhos evitando-a. Ele a fazia se sentir tão impotente, quase à beira das lágrimas, agora. "Não quero mais brigar, Sev, juro que não quero", ela suplicou, buscando a mão dele outra vez. "Só quero que... que você entenda, de uma vez por todas, que isso é errado. Que faz mal pra você. E que... sinto falta do meu velho amigo. Demais."

Ele apenas suspirou, os olhos ainda pregados na parede. Ela suspirou em resposta. Era aquilo. Por que insistir?

"Estou te dando uma chance pra se explicar, de uma vez por todas. A escolha é sua", ela acrescentou tristemente, alcançando a mochila e caminhando em direção à saída.

Ele permaneceu exatamente no mesmo lugar, ainda olhando para a parede. Mas antes que ela desaparecesse pela porta, a voz dele a alcançou, lembrando-a da redação do Prof. Binns, que haviam combinado de fazer naquela noite, na Biblioteca.

"Ah, claro", ela respondeu, voltando-se por um instante, de forma que ele pôde notar que a face dela era agora tão inexpressiva quanto seu tom de voz. "Vamos fazer, sim."


*


Ela não parecia nem um pouco mais animada algumas horas mais tarde, quando tornaram a se reencontrar. Ainda assim, quando a viu, Severus sentiu a costumeira descarga de excitação se espalhando pelo seu corpo, agora ainda mais intensa. Respirou fundo, passou a mão pelos cabelos, tentando inutilmente ajeitar as mechas descuidadas enquanto ela se aproximava.

"Oi, Sev", Lily deu-lhe abraço rápido, meio distante, mas que foi suficiente para impregná-lo com seu perfume e calor para o resto da noite.

No percurso até a mesa que haviam escolhido, como não podia deixar de ser, Lily foi abordada por três ou quatro pessoas diferentes, esquecendo-se dele por alguns instantes. A expressão dele se fechou, e Severus recordou-se da necessidade, afinal, de voltar a se destacar aos olhos dela. Se havia algo que odiava em Lily, ele pensou, enquanto arrastava de má vontade uma cadeira, era aquilo. Todo mundo, absolutamente todo mundo parecia querer sua dose diária de Lily Evans. E ele não podia ter o suficiente dela, nunca. Ela era incapaz de dizer não a quem quer que fosse; Severus tinha a impressão de que ela conseguiria ser amistosa até mesmo com o Barão Sangrento. Fora o primeiro a descobri-la, o primeiro a ver o fogo e a mágica que ela possuía. Às vezes, gostaria de ter sido o único. E a impossibilidade distorcia as coisas boas que Lily trazia à sua vida, transformando-as em pecado, tornando seu coração sombrio e carregado. Ela finalmente se desvencilhou daquele grupo inconveniente e sentou-se ao lado dele, trazendo consigo uma pilha de livros. Mas o mau humor já havia tomado conta dele. Agora, porque simplesmente não conseguia deixar de pensar nas memórias que vira na segunda vez na penseira. Lily. Amando-o. Beijando-o. E sentindo-a agora, sentada ao lado dele, tão próxima a ponto de aspirar o perfume de seus cabelos e sentir sua respiração, doía e quase o enlouquecia não poder fazer o mesmo. Estava agindo de forma ainda mais retraída e... esquisita, pensou com raiva, do que agiria normalmente.

Ela fitou-o intensamente por um ou dois segundos, ele teve um medo tolo e sem fundamento de que ela estivesse lendo sua mente, mas Lily apenas lhe ofereceu um livro para fazer a redação. Ele murmurou qualquer coisa sobre já ter feito umas anotações mais cedo e voltou a rabiscar seu pergaminho. Terrivelmente mal-humorado. Mas a idéia de deixá-la ali e retornar à Sonserina sequer passou por sua mente. Simplesmente precisava aproveitar cada mísero instante com ela, absorvendo a vida que dela se desprendia. Tentou distrair-se pensando na proposta que o homem maluco lhe fizera. Teria tudo para não acreditar no sujeito... não fossem as imagens do Severus que conseguira Lily. A cada toque dos cabelos ruivos em seu braço, da mão dela na sua, a cada rara frase que ela dizia (porque, aparentemente, ainda estava aborrecida com ele), Severus sentia-se caminhando rumo à insanidade ao tentar descobrir, mais uma vez, como fazer para consegui-la, também. Ouviu a voz áspera do homem falando dentro de sua cabeça: "Não responda a mim, se desejar". Respondesse a si próprio, no mais profundo de seu coração. Ele não compreendia. Franziu a testa. O homem lhe dissera para escolher... diabos, escolhera-a há muito tempo. Ardia de desejo por ela. Ardera desde a primeira vez em que a vira, os dois não mais do que crianças, quando ele ainda nem imaginava o que pudesse significar desejar alguém fisicamente. Era algo maior, que preenchia e ultrapassava todo o seu ser, algo que ele também não compreeendia, mas que estava ali.

E era, ainda, a essência do que sentia.

Ela havia crescido. Assim como ele; o que o fazia devanear imaginando como seria o toque dos lábios contra os seus, qual seria a sensação de mergulhar as mãos em seus cabelos, com vontade, trazer para junto de seu corpo o dela, mais próximo do que jamais estiveram, senti-lo por inteiro... morno, suave... ele e Lily na sala vazia, fazendo... Severus ofegou. Lily ergueu a cabeça, examinou-o por algum instante. Ele estava pálido, fitando o nada. A muito custo ele se controlou, voltou a atenção ao pergaminho. Inspirou profundamente, várias vezes, até se acalmar. Se fazia anos que a desejava, por que as coisas aconteceriam justamente agora? Só porque uma figura parecendo saída de um conto de fadas do inferno lhe dissera que sim, que aconteceriam? E se fosse... uma idéia lampejou em sua mente. E se a chave para que a mágica acontecesse fosse justamente pedir só depois que alguém apresentasse a escolha?

Pois bem, pensou decidido. Seria exatamente aquilo o que faria. Respirou fundo e fechou os olhos para se concentrar melhor. E do fundo de seu coração, da forma mais consciente de que foi capaz, como havia desejado poucas vezes em sua vida, Snape acreditou... e pediu.

E então, soaram as nove horas.

"Ah, meu deus, nem vi o tempo passar!", surpreendeu-se uma agitada Lily, começando a recolher suas coisas. Tudo dentro da mochila, ela parou, encarou-o, séria, e disse: "Obrigada, Sev", então, hesitou, e acrescentou: "Pensa sobre o que eu te disse hoje. Por favor. Sinto sua falta", ela sussurrou, e, curvando-se para a frente, roçou os lábios em sua face.

E ela simplesmente correu e desapareceu pela porta, sem sequer se voltar para ele. Por um instante, ele sentiu uma vontade louca e incoerente de rir. Gargalhar. Escolhera-a. E ela lhe dera as costas. Era tudo tão óbvio... sentia-se um idiota por haver acreditado. Desejado, novamente como em um conto de fadas do inferno, esperando, talvez, que aquela aparição coberta por um capuz surgisse outra vez, ou qualquer outro sinal, assegurando-lhe que Lily seria sua para sempre. Por causa da hora, Madame Pince enxotou-o da biblioteca mas ele nem se importou. Jogou a mochila nas costas e pôs-se a caminho da Sonserina. Por que insistia naquilo? Histórias de amor, todas aquelas bobagens românticas, sempre acabavam mal. Ele e Lily eram tão, tão diferentes. Por que se permitira acreditar? Respirou fundo e sacudiu a cabeça, tentando afastar da mente as incômodas imagens de seu pai e sua mãe se digladiando. Eles também eram diferentes entre si. Terrivelmente. Estremeceu. Por que tinha de ter pensado naquelas brigas homéricas bem num momento em que já se encontrava confuso e frustrado o suficiente? Imaginava que as coisas seriam diferentes entre ele e Lily, mas... as imagens de Tobias e Eileen, e o resultado da crença deles no amor, estavam sempre lá, o assombrando.

"Petrificus Totalus!"

Snape tombou no corredor escuro que levava às masmorras, pego de surpresa. Por estar distraído demais devaneando com ela, pela milésima vez apenas naquele dia. E não precisava pensar nem meia vez para saber quem estava por trás daquele feitiço idiota.

"Ora, ora, Pontas, mas quem é que temos aqui?"

"Ora, mas se não é nosso amigo Ranhoso, que acha que tem o direito de se encontrar com a Lily depois da aula!"

Sirius acocorou-se no chão bem ao lado de Snape, curvou-se com um enorme sorriso sobre o rapaz estatelado no piso e disse:

"Achou que a gente não fosse ver, é?"

"Tsc, tsc", acrescentou James, acocorando-se do outro lado. "O que é que a gente faz pra ele aprender, Almofadinhas?"

Snape tentava lutar contra o feitiço, mover-se de alguma forma... mas o esforço se mostrou em vão: continuou exatamente como estava, jazendo de costas sobre o piso duro, uma dor lancinante espalhando-se a partir do ponto onde sua cabeça havia se chocado contra o chão. Instintivamente tentou sentir se a varinha ainda estaria à mão, no bolso interno das vestes... não que aquilo adiantasse muito, mas...

"Quem sabe dar um tempo pra ele pensar resolve?"

"Acho uma excelente idéia, Pontas", então, Sirius curvou-se baixo mais uma vez. "Ouviu, Ranhoso? A gente vai dar um tempo pra você pensar."

"É. Um tempo só pra você. Pra cair na real e ver que enorme estupidez é essa de sonhar que ainda pode olhar pra Lily. Entendeu?"

Snape, obviamente, não pôde manifestar reação alguma a não ser o olhar do mais puro ódio que lançou aos dois. James insistiu, pressionando a varinha contra a garganta do rapaz:

"Responde! Entendeu?"

"Parece que ele não tá querendo colaborar..."

"Isso requer uma medida drástica."

James, com um rápido movimento de varinha, fez Snape pendurar-se no ar, de cabeça para baixo. Então, ele e Sirius riram estrondosamente.

"Agora, vamos, Ranhosinho. Hora de fazer uma auto-análise", disse Sirius, fazendo Snape flutuar pelo ar até chegarem a um armário de vassouras. "Pense, pense, pense. Coloque-se no seu lugar."

"E seu lugar é a pelo menos duzentas milhas de distância dela", concluiu James, o aceno de sua varinha atirando o impotente Snape com tudo dentro do armário, ainda de pernas para o ar.

Então, as portas do armário se fecharam com estrondo, deixando Snape na escuridão total. E ele ainda ouviu as risadas por uns bons minutos, até morrerem na distância, o tempo todo torcendo para que Filch aparecesse e desse uma lição naqueles dois malditos. Mas, para variar, seus desejos não foram atendidos. E Severus perdeu a conta de quanto tempo passou ali, de cabeça para baixo, o sangue acumulando-se desconfortavelmente em sua cabeça, a mente fervilhando do mais puro ódio e ressentimento, tramando as mais dolorosas vinganças. Um dia ainda haveria de criar o plano perfeito... e quanto a afastar-se de Lily... se ele pudesse, teria gargalhado. Até parecia que ia fazer aquilo porque Black e Potter haviam tão educadamente pedido. Agora é que os dois iriam ver. Iriam pagar por aquela peça, ora se iriam. Desgraçados. A cabeça latejava e centenas de imagens desconexas turbilhonavam em sua mente, imagens de ódio, tortura e vingança. A vergonha por mais aquela humilhação queimava em suas faces, e ele sentia-se aliviado por estar ali muito bem escondido... com sorte, ninguém ficaria sabendo... até o café da manhã, quando os quatro malditos fariam questão de aludir, em alto e bom som, às aventuras noturnas do 'Ranhoso'.

Severus tentava ansiosamente contar os segundos para ver-se livre e correr ao dormitório a fim de mergulhar nos bons e velhos livros de Magia Negra, com mais vontade do que nunca. Era sempre assim: uma humilhação dos quatro malditos o levava com mais sede ainda a seus livros; servindo como consolo e promessa de um futuro onde ele deteria o poder. Haveria de se vingar. Era seu único desejo naquele instante. E os minutos escoavam, lentamente, zombando dele e tornando seu coração ainda mais endurecido. Porém, quando por fim o efeito do feitiço passou, sua situação não melhorou em nada: Snape simplesmente desabou com tudo, braços e pernas moles e sem sustentação, escancarando as portas do armário e caindo pesadamente no chão de pedra, sua cabeça chocando-se contra o chão pela segunda vez na noite. Mas isso não foi nada comparado com o que aconteceu quando Filch finalmente surgiu, furioso, do meio das sombras.


*


"Uma detenção, Sev."

"Claro que eles já espalharam... lição no 'Ranhoso'..."

Ela ergueu a mão, interrompendo-o.

"Sim, já espalharam. Por isso mesmo quero a sua versão."

Ele hesitou por um instante. Era aquilo, suspirou. Eram aquelas pequenas atitudes que faziam toda a diferença. Podia parecer estúpido, mas ninguém mais se importaria com sua visão dos fatos, mesmo que fosse a verdadeira; tanto era que ele nem se dera ao trabalho de tentar contá-la a alguém. Mas ela... ela não queria a versão do famoso Potter, mas a do infeliz Severus Snape. E, como se não bastasse, ela ainda era a garota mais bonita da escola. Inteligente. Como podia pensar em outra coisa que não... querê-la, para sempre? Sem esperar resposta, Lily puxou-o pela mão, para dentro da sala de aulas do Prof. Flitwick, desocupada à hora do jantar. Sabendo que aquela seria mais uma oportunidade para destilar seu ódio ao quatro-olhos, com alguém cuja opinião era exatamente a mesma, ele não se fez de rogado e contou em um breve relato o que ocorrera na noite anterior. Uma pequena ruga apareceu entre as sobrancelhas dela.

"Não entendo essas coisas, juro que não entendo. Tão estúpido..."

"Isso não é nenhuma surpresa, vindo daqueles dois", Snape resmungou.

Ela estava de pleno acordo. Como se não tivessem se desentendido há apenas dois dias, perderam alguns minutos proferindo insultos a James e aos outros dois delinqüentes que o acompanhavam - Severus evitava falar de Remus porque sabia da amizade entre ele e Lily.

"Ah, e sabe o quê?", ela perguntou, dando por encerrada a conversa sobre o quatro-olhos, "Tirei dez na redação."

Ele hesitou por um segundo, então, vindo sabia-se lá de onde, um certo atrevimento tomou conta dele e Severus ouviu-se dizer, num jato:

"Isso também não é nada surpreendente."

"Bem, foi culpa sua", ela sorriu, fazendo-o corar levemente ao se lembrar do episódio de alguns dias antes.

Mas Severus acabou, também, dando um de seus sorrisos característicos, que não faziam mais do que curvar para cima os cantos dos lábios. Então, suspirou. Por mais estranha e distante que ela estivesse, por mais que viessem se desentendendo, o que sentiu naquele instante o fez ter certeza de que ela era a única garota que já quisera e quereria. Estava sendo um idiota em escolher o outro caminho, mas... perdeu o fio dos pensamentos quando notou que ela não havia desgrudado os olhos dele, como se tentasse descobrir alguma coisa, algum segredo, e Severus atreveu-se a fazer o mesmo. Conhecia de cor o rosto dela, a pele leitosa e perfeita, os lábios-bem desenhados, os traços perfeitos... os olhos. Indescritíveis. Os cílios ruivos, que sempre o fascinavam. Mas era um mistério como ela sempre parecia muito mais bonita na realidade do que ele se recordava. Queria, oh deus, como queria beijá-la. As imagens da penseira ressurgiram com fora em sua mente mais uma vez, ele retesou-se sem pensar no que fazia, como se tentasse se impedir de ir além, de tentar aquela loucura. Por que ela tinha de estar olhando para ele com os lábios agora entreabertos... exatamente na hora em que ele pensava como seria curvar-se para baixo, fechar os olhos... por que exatamente nessa hora ela tinha de erguer uma mão e afastar os cabelos dele do rosto? Seu coração batia tão acelerado que Snape temeu que ela ouvisse.

"Severus," ela o chamou ternamente enquanto colocava uma mecha do cabelo negro atrás da orelha dele.

"Hmm?"

"Você precisa se cuidar mais."

"O quê?"

"Se cuidar. Já te falei isso uma porção de vezes", ela disse, agora com mais energia.

"Ah, Lily. Pra quê?", ele desviou o olhar.

"Deus. Pra quê. Por que sim, oras. Porque você é tão incrível, Sev."

Ele fez um muxoxo de descrença, ainda apreciando a parede cinzenta. Agora porque não queria que ela o visse corando. 'Tão incrível'. Ele espiou com o canto do olho: ela havia cruzado os braços, e o fitava intensamente. Esperando. Recordou-se de Potter exigindo que se afastasse dela. O sorriso tornou-se maior. Claro, claro que se afastaria.

"Lily."

"O quê?"

"Eu... eu vou mudar. Vou voltar a ser o que era."

A expressão dela se iluminou de tal forma que ele se perguntou porque não havia dito aquilo antes.

"Mesmo? Promete?"

"Uhum", ele respondeu, enquanto afirmava com a cabeça, torcendo para que ela não desconfiasse de que eram apenas palavras.

"Por favor, Sev. Não tem nada que eu queira mais do que isso", ela disse, aproximando-se mais e o abraçando longamente, como não fazia há meses. Vacilante, ele ergueu a mão direita, tocando, meio sem jeito, o cabelo dela. Lily não pareceu se incomodar em absoluto com aquilo, e ele apoiou, então, a mão no ombro dela. Estavam tão próximos, ele podia sentir com clareza o calor do corpo dela e o perfume dos cabelos, da pele. É, queria mesmo aquilo até o fim. Mas antes mesmo, cedo demais, ela se afastou. Ele teve tempo apenas de notar a expressão dela, mais leve, antes que ela se aproximasse e roçasse suavemente os lábios. No rosto dele.

"Você ainda é meu melhor amigo."

Ele mal reagiu, apenas deixou-se ficar ali, sentindo nada, enquanto assistia à garota saindo apressada pela porta, os cabelos vermelhos sacudindo-se enquanto ela corria.

... amigo. Mas também... que burrice. O que esperava? Que ela o beijasse e declarasse seu amor? Logicamente que não. Como ele ousara acreditar sinceramente naquilo, mesmo que por breves segundos? Sentia seu coração se endurecendo outra vez, de ódio puro.

Amigo...

A escolha, e Lily lhe voltando as costas. Era mesmo um perdedor, sempre fora, para que insistir e se frustrar outra vez?


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obrigada à meia-dúzia de gatos pingados que continua lendo a fic. obrigada à morgana por comentar <3

e espero que gostem da nova capa, e do novo capítulo. eu particularmente to adorando a nova versão da fic, tá tão mais concisa, tão parecida com o que eu imaginei da primeira vez... hm, apesar de ter um certo receio em fazer o snape fofo, mas diz se ele não tá adorável trocando as palavras por causa dela? <3

até o próximo sábado _o/

(e comentem! ;D)

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