O Segredo da Lousa



Capítulo 5
O Segredo da Lousa
O sol que entrava pela janela do orfanato aquela manhã podia ser motivo de alegria para qualquer um dos meninos, menos para Tom. Ter voltado para o orfanato fora simplesmente uma tortura para ele, que sentia-se agora um peixe fora d’água naquele mundo de trouxas. Ser obrigado a fazer escondido os deveres de casa, não poder sequer usar magia para se divertir assustando os colegas trouxas... enfim, era aborrecido continuar parecendo um garoto comum. Nem mesmo podia contar com a visita de Ester, que era jovem demais para ir até ali. Aquele estava sendo o pior verão da sua vida. 
Naquela manhã todos os garotos pareciam querer correr pelo pátio ou fazer coisas para escapar do calor infernal do dormitório, menos ele. Ele queria estar longe de todos. Como fazia sempre, pegou a arca que sua mãe deixara e ficou observando o que havia dentro. Já decorara a carta de sua mãe, agora perdera a graça lê-la. Olhou para a lousa que recebera, o tal objeto mágico ao qual não dera ainda muita atenção, nem mesmo ele saberia dizer porque. Ele não sabia como uma lousa poderia ser mágica. 
Subitamente, se deu conta que nunca sentira vontade de escrever nada naquela Lousa. Então pegou distraidamente o bloco de giz que pendia por uma corrente da lousa e riscou seu nome na superfície negra do objeto. Seus olhos se arregalaram quando as letras desapareceram, dando lugar a outra inscrição:


ENFIM...

Ele abriu a boca incrédulo e sentindo-se idiota... como não pensara nisso antes? Também, as recomendações de sua mãe na carta para ocultar o objeto haviam feito que ele quase desprezasse o mesmo. Tom pensou e escreveu:
QUEM É VOCÊ? 

Ele aguardou tenso, praticamente ouvindo a batida do próprio coração. Ele não saberia dizer porque, mas sabia que aquela lousa teria respostas para perguntas que ele sequer ousaria fazer a qualquer bruxo. As letras desapareceram e deram lugar à seguinte frase:
UMA LEMBRANÇA, FILHO. 

Tom franziu a testa pensativo. De quem poderia ser essa lembrança? Escreveu ansioso:
SIM, MAS... QUE ESPÉCIE DE LEMBRANÇA? 

A resposta desta vez demorou menos:
GUARDEI MINHA PERSONALIDADE E MINHAS MEMÓRIAS NESTE OBJETO, PARA MOSTRAR A MEUS FILHOS A FACE DO INIMIGO, TOM. 

Tom hesitou novamente, então escreveu:
E QUAL O SEU NOME? 

As letras desapareceram, então rapidamente e a resposta não tardou:
SE VOCÊ NÃO ESTÁ PREPARADO PARA RECONHECER O MAIOR DOS BRUXOS, O MAIOR DOS FUNDADORES DE HOGWARTS, DEIXE MINHA MEMÓRIA EM PAZ! 

Tom sorriu. Tinha feito a pergunta sabendo a resposta. Sim, era tudo que ele precisava agora, mas surpreendeu-se com as letras, que continuaram surgindo:
CREIO QUE NÃO ÉS DIGNO DE SER CHAMADO DE MEU DESCENDENTE, TOM RIDDLE... COMO PODES TER FICADO UM ANO TÃO PERTO DE MIM, TENDO TODA MINHA MEMÓRIA E MEU CONHECIMENTO PARA TE ENSINAR O QUE REALMENTE IMPORTA, E NÃO TENHA ME TOCADO SEQUER UMA VEZ? 

Tom sentia-se desconcertado. Não era agradável levar uma bronca de um ancestral morto há nove ou dez séculos. 
NA VERDADE, EU ESTAVA ESTUDANDO PARA ME TORNAR UM GRANDE BRUXO. 

Uma interminável gargalhada ocupou toda a superfície da lousa com “ha ha has”. Tom sentiu-se bem irritado. Mas antes de poder escrever qualquer coisa, a lousa novamente estava coberta de inscrições:
O QUE REALMENTE IMPORTA VOCÊ NÃO VAI APRENDER EM ESCOLA ALGUMA, TOM, SE QUISERES REALMENTE PODER, SE QUISERES REALMENTE SER GRANDE, É COMIGO QUE DEVES APRENDER, NÃO COM PROFESSORES CHEIOS DE IDÉIAS IDIOTAS. SEU ANCESTRAL, SEU PAI, SABE MUITO MAIS QUE ELES. 

Pai. Tom jamais tivera um pai, uma figura masculina adulta em quem pudesse se mirar, alguém para admirar. Sabendo que a melhor coisa a fazer sem dúvida era confiar naquela memória, Tom, contrariando sua personalidade, escreveu, submisso:
PERDÃO, PAI. 

A lousa ficou negra como se jamais tivesse recebido uma inscrição, e Tom soube que havia marcado um ponto com aquele ancestral submetendo-se (ou fingindo submeter-se) à sua autoridade. A autoridade de um pai. Era isso que aquele ser invisível seria, seu pai no mundo bruxo, ele iria mostrar a ele tudo que a escola não podia ou não queria ensinar. Tom estava disposto a tudo para ser como seu pai, seu verdadeiro pai, Salazar Slytherin. Escreveu então:
PAI, QUEM SOMOS? 
Após instantes de aparente hesitação, a Lousa começou a respondê-lo. Mas não foi uma resposta escrita. Tom sentiu as pálpebras trêmulas, e sem saber como, repentinamente não estava mais no orfanato, mas no centro de um castelo abandonado. Sobressaltou-se. Um bando de pássaros entrou pela janela. O castelo parecia abandonado. Ele ouviu passos ecoarem e viu entrarem no salão quatro pessoas. Andou na direção delas, e viu que eram duas mulheres e dois homens, balbuciou uma explicação confusa que foi ignorada, pois os quatro passaram por ele como se ele não existisse. Só então viu como eles eram jovens. A mulher mais alta, de cabelos negros, disse, alegremente:
- É perfeito! É lindo... Há quanto tempo está abandonado?
- Cinquenta anos – disse um rapaz de cabelos castanhos e olhos azuis – Houve uma guerra e o rei trouxa que o construiu foi morto aqui, desde então, as pessoas achavam que ele era assombrado. 
- E é- disse um fantasma que surgiu do chão irritado, vindo das masmorras . Era a primeira “pessoa” que Tom reconhecia daquela cena. Era o fantasma da Sonserina, a casa em que ele estudava. – Eu morri defendendo este castelo senhores. Não permito que qualquer um entre aqui... quem são vocês?
- Nós queremos ocupar o castelo – disse uma moça loura baixa e cheinha, com um jeito um tanto invocado – E não vai ser um fantasma à toa que vai impedir...
- Espere – disse o único que estivera calado até então. Era um rapaz, também, mas parecia um pouco mais velho que os outros – ele aproximou-se do fantasma e disse: - Tu eras o bruxo do castelo, não? – o fantasma pareceu um tanto quanto surpreso.
- Sim... eu era. 
- Sabes a força deste lugar... sabes que aqui há muita magia.
- Sei. 
- Fica então, não vamos perseguir-te. Ajuda-nos, queremos transformar este lugar na primeira escola de verdade para bruxos. 
- Uma escola para... bruxos.
- Sim – disse a mulher gordinha – é o nosso sonho, para que possamos ajudar nossos iguais, para que não mais nos persigam. 
O fantasma pareceu hesitar, mas então concordou. Tudo escureceu, algo mudou, mas Tom não saíra do lugar. O salão em escombros era agora parecido com Hogwarts, mas Tom já compreendia que era a Hogwarts de outro tempo, já estava lá o céu encantado, mas ainda não haviam as mesas das casas, nem as bandeiras. Um casal entrou no salão correndo, rindo. Eram a moça de cabelos negros e o homem que parecia mais velho. Tom já intuíra que eram Salazar Slytherin e Rowena Ravenclaw. O homem alcançou a moça, e abraçou-a com força, estreitando-a nos braços e beijando longamente. Tom sentiu-se constrangido, mas não conseguia tirar os olhos do casal.
- Eu te amo, Salazar – ela sussurrou, quando ele parou para olhá-la. Ele olhou-a de forma terna, mas havia algo mais naquele olhar, uma exigência imperativa. Ele então falou:
- Então... concorde comigo, Rowena... não me deixe sozinho nessa questão. Só você concordando pode fazer Godric e Helga.
- Salazar, Godric e Helga estão certos... – o olhar dele endureceu, e ele largou-a de forma brusca.
- Então, pegamos esse castelo arruinado e o transformamos na escola dos nossos sonhos para enchê-la de... trouxas? – ele disse essa última palavra com ódio.
- Não, Salazar... você vê tudo pelo ângulo mais sombrio. Acontece que nem sempre a magia escolhe filhos de magos. Você queria que eu vivesse como trouxa, Godric?
- Não- ele disse olhando para ela – eu não quero ofendê-la... mas não acredito que todos os que tem sangue trouxa sejam como você. Tenho medo da escola servir para que os trouxas acabem sendo como nós, e pior, acabem sendo mais do que nós.
- E para isso, se puderes, afastarás todos os filhos de trouxas, Salazar? Me diga... lembra-te que eu mesma nasci filha de trouxas.
- Eu... Rowena – ele deu dois passos na direção dela e a beijou apaixonadamente, e nesse momento tudo mudou novamente, e Tom viu que agora estavam no centro do salão os quatro fundadores de Hogwarts, reunidos em um círculo, e agora o salão parecia definitivamente pronto, se bem que na penumbra, apenas um círculo de fogo iluminava os três. Cada um dizia o que parecia um juramento:
- Eu, Helga Hufflepuff, juro mostrar a meus alunos o valor da lealdade e do trabalho, de resistir a tudo com fortaleza de caráter, de ser sempre amigo. Juro também jamais usar qualquer feitiço que provoque dor ou dano, ou qualquer encantamento ligado às artes negras – ela estendeu sua varinha em direção ao fogo e uma chama amarela voou em direção ao teto, transformado-se numa grande bandeira com um símbolo da casa da Lufa Lufa, que aderiu a uma das paredes.
- Eu, Rowena Ravenclaw, juro ensinar sempre buscando despertar a inteligência de meus escolhidos, valorizando a razão, levando-os através de seus pensamentos aonde apenas as idéias poderiam chegar. Juro ainda jamais usar qualquer expediente das artes das trevas em meus objetivos.- Ela repetiu o gesto de Helga, e a chama tomou a forma de um pássaro, voando antes de se transformar na grande bandeira da Corvinal na parede em frente.
- Eu, Godric Grifndor, juro mostrar a meus alunos o caminho da coragem, que eu mesmo trilhei anteriormente, juro ensiná-los a jamais esmorecer ante as dificuldades, e nunca correr diante do perigo. Juro ainda jamais usar nenhum recurso ligado às artes negras para isso. – Quando ele tocou as chamas com a varinha, ouviu-se um forte rugido, como de um leão, quando as chamas elevaram-se até o teto vermelhas, tornando-se a bandeira da Grifnória, que peregou-se à terceira parede do salão.
- Eu, Salazar Slytehrin, prometo fazer grandes os meus alunos, acendendo em seus corações a sede de ambição, prometo fazer com que eles desenvolvam ao máximo seus poderes. Juro não... juro não usar as artes das trevas para isso. – ele estendeu a varinha para as chamas, mas ao invés de uma explosão, ou de uma grande elevação das chamas, estas tornaram-se verdes intensamente verdes, e delas começou a evolar uma espessa fumaça prateada que tomou a forma de uma serpente, e depois transformou-se na bandeira da sonserina. 
Tom observava atentamente o rosto do seu ancestral, e sabia que ele havia com certeza quebrado aquela promessa, ele mesmo sabia muito pouco de artes das trevas, mas não acreditava que elas fossem tão ruins assim, o mais provável é que os outros que tivessem medo. Novamente, diante dos seus olhos, tudo mudou, e ele passou a ver Salazar sozinho diante do que parecia um portal com duas serpentes entrelaçadas. Ele disse uma palavra em outra língua, mas surpreendentemente, Tom compreendeu-a: ele havia dito “Abram”.
Tom viu o lugar, cheio de serpentes esculpidas, e viu quando Salazar parou diante de uma enorme estátua dele mesmo, e gritou:
- Venha, meu servo. – a boca da estátua se abriu, e dela saiu uma enorme serpente, que mantinha os olhos fechados. Tom surpreendeu-se: ele podia distinguir claramente palavras do que a serpente dizia, e repentinamente ele soube que esse era o tal dom... aquilo que o fazia diferente. Ele podia entendê-las... ele quase ouvira o que a serpente dizia naquele dia na loja de corujas. Quase não prestava atenção no que o ancestral dizia, até que algo chamou a atenção:
- Vais ficar aqui, meu servo... adormecido e esperando que meus herdeiros venham te despertar – Salazar silvava para a grande serpente – um dia você vai ser a minha vingança... um dia vais afastar daqui os inimigos, os inimigos de Salazar Slytherin e seu herdeiro...
Tom então concluiu o que a lousa queria mostrar-lhe: havia em algum lugar de Hogwarts um ser adormecido que acordaria para ser comandado por ele, prestando atenção no que Slytherin dizia, ele soube que a criatura podia matar quem olhasse para seus olhos, por isso mantinha as pálpebras cerradas diante de seu mestre. Ele observou bem a grande cobra enroscando-se no chão, sibilando, falando em morte e dor, ele sabia que comandar um monstro como aquele não devia ser fácil, mas envolvia muito poder, um poder que poderia ser dele. Repentinamente, ele viu-se novamente no dormitório, diante da lousa, onde estava escrito, simplesmente:
JÁ SABES QUEM EU SOU... DO QUE EU SOU CAPAZ. SE CONFIARES EM MIM, DESCOBRIRÁS DO QUE TU ÉS CAPAZ. SEJA UM SLYTHERIN. NÃO TE DIREI ONDE ESTÁ A CÂMARA, TERÁS QUE DESCOBRIR SOZINHO, MAS TE AJUDAREI A SER GRANDE, COMIGO, SERÁS O MAIOR DE TODOS. 
Tom sorriu. E foi um sorriso como ele jamais dera. Naquele instante, aquele menido de apenas 12 anos começou a mudar definitivamente. Naquele instante ele começou a se tornar o que seria mais tarde.

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