O Retorno



II – O Retorno



Talvez fosse mais fácil se tivesse decidido ir voando, mas o trem lhe trazia tantas memórias maravilhosas que não se importava com o pequeno atraso, até porque tinha pavor de vassouras. Observou através da janela tão perfeitamente limpa e pôde reconhecer algumas das paisagens pelas quais passavam.

Recostou-se na cadeira, lembrando de como o trem de Hogwarts sempre estava tão lotado quando iam ou voltavam, como sempre algo de muita grandiosidade acontecia ali. Viu-se, então, como uma garotinha de onze anos atravessando a porta da cabine fechada, encontrando aqueles dois garotos que se tornariam seus melhores amigos.



A respiração terna e quente atingia seu pescoço, de modo a aquecê-lo agradavelmente. Esticou os braços lentamente e entreabriu os olhos. Estavam na cabana ainda e todas os livros de estudos do 6oano continuavam jogados sobre a mesinha. Mirou a menina que dormia serenamente ao seu lado, sorriu com os lábios roxos de frio e acariciou seus longos cabelos.

Adorava admirá-la, mesmo que em segredo. Tinha como maior passatempo imaginar as diversas maneiras de como poderia se declarar, mesmo que nenhuma nunca tivesse se tornado realidade. Fechou os olhos e respirou fundo para voltar a visualizar aquele rosto jovem a sua frente. Baixou a boca até mais próximo da dela e, levemente, deixou seus lábios se tocarem...

O gesto fez com que ela acordasse. Abriram os olhos ao mesmo tempo e ao se encararem, poucos centímetros um do outro, o único gesto de Hermione foi colocar a mão no rosto de Rony, enquanto ele tornava a beijá-la, dessa vez mais apaixonadamente.




Rony agora entrava no trem, sem saber que Hermione estava no vagão ao lado. Apesar de terem começado a namorar depois daquele beijo, ele não deixou de pensar no namoro conturbado que prosseguiu durante seu sexto ano.

Quando fizeram a promessa, no sétimo ano, já não namoravam e ele nem se lembrava por que, mas ele se lembra bem daquele beijo...



O dia não poderia estar mais frio, e era exatamente por isso que os dois insistiam em permanecer em frente à lareira. Encolheram-se mais entre as almofadas, era ótimo ter o salão comunal vazio durante a época de natal.

– Harry já foi dormir, Rony? – perguntou Hermione.

– Acho que já – respondeu distraidamente, deixando de admirá-la – Ele e Gina tinham ido até Hogsmeade comprar um presente para a Sra. Weasley – o garoto riu do modo como chamara a própria mãe e a morena o seguiu. – Acho que poderemos dominar esse pedaço do salão, então... – concluiu se esticando, ao invés de se encolher. Observou o teto divinamente enfeitado.

Silêncio. Talvez fosse esta a palavra que mais os importunasse, já que toda vez esta reinava sobre os dois, ambos os corações saltavam para que contivessem os impulsos tão fortes.

– Sabe o que eu estava pensando, Rony? – sua voz ecoou pela sala quase como se ela fosse uma caverna. O ruivo olhou para ela – Tivemos tantos momentos ótimos aqui... E eu tenho medo de perdê-los, entende? Eu pensei que talvez pudéssemos guardar nossas memórias.

Rony arqueou as sobrancelhas e deixou um sorriso maroto aparecer nos seus lábios.

– Me explique melhor essa idéia, Mione – ele pediu em tom interessado.

– Uma caixa... É uma caixa para guardarmos o que fosse mais importante para nós em Hogwarts!

Rony coçou a cabeça, pensativo. Olhava para o fogo da lareira e ela acompanhava cada gesto, vendo as chamas refletidas em seus olhos.

– Certo! Podemos falar com o Harry também, acho que ele ia gostar – porém parou de falar quando viu a expressão de Hermione, o sorriso se desfazendo – Bem, talvez seja melhor não falar com ele, afinal, está todo preocupado com esses ataques e a guerra...

Mione sorriu timidamente e concordou. Haviam terminado o namoro já há algum tempo e ambos cuidavam de manter uma distância cautelosa entre eles, então sentou-se na poltrona defronte ao garoto. Por uma fração de segundos, Rony evitou seu olhar.

– Mas o que teria dentro dessa caixa, exatamente? – perguntou ele, depois de um certo tempo – Eu posso guardar o que eu quiser, ou só memórias, algo escrito?...

Hermione começou, então, a explicar com mais detalhes sua idéia.




Rony acordou de um salto quando o trem deu um solavanco. Chovia fino do lado de fora, uma mistura de neve e granizo que o incomodou. Foi num dia assim que eles brigaram – de novo.

Finalmente o trem parara na estação que desembarcaria. Rony pegou sua maleta e saiu do vagão distraído. Se não tivesse relembrando tanto do passado, teria percebido que sua querida havia passado por ele, apressada como sempre.

Ficaria contente em saber que agora ela estava mais bonita do que nunca, finalmente seus cabelos havia acentado e ela tinha um corpo de mulher.

Ele também estava diferente, usava os cabelos para trás, só usava os suéteres Weasley quando visitava sua mãe e agora já não tinha tantas sardas.

Hermione entrou em um restaurante simples e pediu um suco de laranja e um filé de frango grelhado com salada. Estava faminta, ou o embrulho no estômago que sentia era porque a cada dia ficava mais próximo o retorno a Hogwarts. Veria Rony de novo e ele descobriria o que ela havia guardado naquela caixa, saberia do amor que ela sentia por ele na época e que, mesmo adormecido, ainda era presente nela.

Em meio a um gole de cerveja amanteigada que Rony saboreava no bar defronte ao restaurante, ele avistou um grupinho de jovens, estudantes provavelmente, conversando animadamente entre eles.

Sorriu saudoso dos tempos das visitas a Hogsmeade e das idas ao Três Vassouras. E pensar que foi no Três Vassouras que começou e que tudo terminou...



– Mione, quer parar com isso? Não vejo nada demais...

– Você com certeza não vê, Rony, mas o modo com que você tem reagido ao Malfoy está se tornando até infantil.

– Ele é que nos provoca, Hermione! – Rony se ofendeu – Você sabe disso, sabe que ele não faz isso só comigo, é com você também, e principalmente com o Harry!

Harry não tomava partido na briga, parecia olhar para os lados, procurando ajuda para escapar de mais uma discussão dos dois. Até que em meio a um gole de cerveja amanteigada, ele se levantou, assustando Rony e Hermione.

– Aonde você vai, cara? – perguntou Rony.

– Vou deixar vocês mais á vontade – Harry piscou e Rony ficou com as orelhas vermelhas, enquanto Mione corava – Falando sério, vocês nem perceberam que eu estava aqui, então é melhor vocês dois se entenderem de uma vez, quem sabe não acabam namorando, como já deviam ter feito há muito tempo?– e saiu sem dar tempo de nenhum dos dois impedir.

E durante o dia inteiro eles conversaram, até que aconteceu o tão esperado beijo, quando Hermione adormeceu em seu ombro e ele a despertou com um afago.




Rony suspirou e tomou mais um gole. Para ele, valia a pena lembrar de momentos eternos como aquele, apesar do sofrimento que vinha junto. Sentia que fora por sua culpa que terminaram tão drasticamente, ambos fingindo aceitar continuar como amigos.


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