Inglaterra, novamente...

Inglaterra, novamente...



Capítulo 7. Inglaterra, novamente...


Com seu nome falso, Marjory Berkley, Bellatrix esperava pelo trem na plataforma 13 e um oitavo da estação rodoferroviária de Sofia. Redobrando os cuidados por estarem viajando entre bruxos, Bellatrix e Elise, que supostamente se chamava Eva O'Donnel, já haviam decidido que tomariam vagões separados.


Bella se balançava levemente de ansiedade. A estação estava cheia de aurores e há pouco ela avistara Elise ser abordada por um deles. Dias depois, as duas viriam a saber que Elise também estava sendo procurada pelo Ministério da Magia inglês. Na verdade, uma ficha criminal no Departamento de Inteligência da Assembléia Internacional dos Bruxos fora aberta para cada uma delas.


Enfim, Elise conseguira escapar ilesa da abordagem. O trem chegou à plataforma com um barulho ensurdecedor, trazendo consigo um vento que agitou os cabelos escuros de Bellatrix sob o capuz lilás. Ela embarcou no quarto vagão, procurando uma cabine isolada onde pudesse ler as cartas que lhe haviam sido entregues por Elise antes de deixarem Durmstrang. A pressa em fazer as malas e providenciar transporte para a capital fora tanta que a leitura tinha sido adiava até aquele momento.


Ela acomodou a mala e a valise no bagageiro e tomou um lugar junto à janela, puxando um maço de envelopes de grossos pergaminhos de dentro da capa. A primeira carta era de seu tio Eron Malfoy, e trazia instruções para desembarcar em segurança na Inglaterra e seguir imediatamente para a mansão Malfoy. Havia muitos outros bilhetes de Comensais que faziam recomendações similares e ofereciam esconderijos seguros. Bella estranhou aquilo, não sabia que seu retorno era tão arriscado quanto todas aquelas pessoas pareciam supor ser.


Só em um dos últimos envelopes ela achou o motivo para tamanha preocupação: fora nomeada oficialmente chefe da segurança do Movimento Comensal. A escolha unânime de seu nome se dera na Assembléia de Cúpula realizada em junho de 1979.




Ao chegar à centenária mansão bruxa em estilo medieval, Bellatrix foi levada imediatamente a uma sala com as paredes completamente cobertas de cortinas verde-musgo. Um tapete preto cobria toda a extensão do piso. O aspecto era o mais sombrio, mas nada que pudesse intimidá-la — a casa onde passara grande parte da vida não era muito diferente.


 


A única coisa fora do normal fora o sorriso com que sua irmã Narcisa a recebera - um sorriso de pura superioridade e desdém. Exibia orgulhosa sua gravidez de seis meses. Bellatrix apenas revirou os olhos em silêncio, imaginando que orgulho poderia haver em se submeter ao papel de chocadeira de um Malfoy. Com seus quase vinte anos, Bellatrix Black via o casamento como uma humilhação completa.


Percebendo que não conseguia atrair a atenção de Bella, Narcisa apenas se retirou, em seu rosto uma careta de desgosto. A Comensal ficou recolhida junto à porta, observando enquanto uma figura altiva caminhava de um lado a outro, olhando longe. Lord Voldemort parecia se interessar mais no homem pintado num quadro, que naquele momento polia talheres de prata, que no assunto que abordava com o pequeno grupo de Comensais que o ouvia.


Bellatrix sentiu-se gelar por dentro ao perceber que era ele em pessoa que iria falar com ela.


Ele terminou sua preleção aos Comensais e os mandou embora. Só então se voltou para ela. Fez um breve aceno para que a jovem se sentasse, ao que ela obedeceu se sentindo nervosa demais para falar.


Pela segunda vez na vida, Bellatrix estava diante de Lord Voldemort.


Na verdade, ele estava muito diferente do homem que ela conhecera aos dezesseis anos, ao receber sua Marca Negra. Ela ainda guardava consigo a lembrança da surpresa que tivera naquela tarde de agosto.


O que imaginava de Voldemort naquela época era a caricatura de um bruxo das trevas: barba comprida, vestes negras, voz asmática e aquela aura de sabedoria idosa que se imagina que todos os bruxos realmente poderosos possuem. Mas o que encontrou, no suntuoso salão de festas daquela mesma mansão foi um homem elegante, vestido com uma capa cinza e de gravata listrada, os cabelos negros repartidos no meio, botas de camurça escovada. Embora beirasse os cinqüenta anos, tinha um ar muito jovial.


Nem de longe parecia o homem que ela idealizara lutando ao lado de Grindewald, na frustrada tentativa de impor a purificação em 1945. Embora tivesse apenas 19 anos na época, Lord Voldemort liderara a missão responsável pela interceptação e derrota dos comboios de tropas que o Ministério da Magia enviara para tomar uma cidade que havia sido ocupada pelos gigantes de Gales sob as ordens do bruxo das trevas.


A missão havia sido um sucesso, mas o Ministério continuara enviando reforços contra os insurgentes até que, após um mês de resistência com aquele que era pouco mais que um garoto no comando, os gigantes debandaram. Ele perdera a batalha, mas podia se gabar de ter dado cabo de uns tantos aurores e agentes do esquadrão armado do Departamento de Execução das Leis da Magia.


A insurreição de 45 findara com a derrota de Grindewald por Dumbledore. Voldemort, que na época ainda usava o nome de Tomas Riddle, fora preso pela primeira vez, mas solto poucas semanas depois — ninguém tinha conseguido provar nada sobre seu envolvimento com Grindewald.


Jovem, ainda participaria de alguns movimentos até o início da década de 50, quando desaparecera. Diziam que estivera acumulando poder e conhecimento, aprendendo com mestres em magia negra da Ásia e do Egito. Até que, no início dos anos 70, voltara à Inglaterra para liderar a volta do movimento pela purificação.


Bellatrix se lembrava de, em seu último ano em Hogwarts, ter convencido Lestrange a encaminhar cartas suas a Voldemort, sempre cheias de respeito e vontade de agir. Vez por outra, ele respondia, naquela letra fina, escrita com tinta verde esmeralda.


O Lorde começou a orientar os estudos de Bellatrix e a enviar-lhe, além dos livros e tratados proibidos na Inglaterra pelo Ministério da Magia por tratarem da purificação mágica, jornais e informes de grupos adeptos da causa ao redor do mundo. E ele se surpreendia com a insistência com que ela pedia manuais de técnicas de duelo e estratégias de batalha.


As cartas trocadas por meses revelaram-lhe o homem educado e ambicioso que se escondia por trás do imponente líder do Movimento Comensal. Ela podia se lembrar das horas que passara recordando a imagem daquele homem fantástico, que conseguia unir um sólido conhecimento teórico à brilhante experiência tática, sem contar que era um bocado charmoso. Passar os dias empunhando sua varinha contra aqueles "adoradores de trouxas fracos de espírito" do Ministério e as noites nos braços daquele homem fabuloso era tudo que Bellatrix sonhava para si, naquele tempo em que não era apenas sua convicção que a mandava seguir em frente, mas também seu encanto por aquele que diziam ser o mais poderoso bruxo das trevas de todos os tempos.


Ela se deliciava, apesar de no fundo saber que não passava de uma fantasia, imaginando que era ele em pessoa que empunhava a pena para escrever em verde-esmeralda aquelas palavras tão duras e, ao mesmo tempo, tão atenciosas. Palavras que a levaram a compreender melhor a luta que aquele Movimento travava na Inglaterra e em diversos outros países da Europa.


O homem que lhe dirigiu a palavra naquele dia, porém, não guardava qualquer semelhança com aquele que ela conhecera quatro anos antes. Parecia ter passado por uma enorme seqüência de transformações mágicas. Sua pele estava cinzenta, seus olhos eram fendas com pupilas avermelhadas e o nariz tinha quase desaparecido. Sua voz se tornara mais fina e cortante, perdera completamente barba e cabelos.


Ainda assim, Bellatrix não conseguia olhá-lo com menos que um enorme sentimento de adoração. Ela podia sentir no ar que ele estava mais poderoso que nunca um ser humano jamais fora.


— Não tenha medo — ele sibilou e Bellatrix se repreendeu mentalmente por estar olhando para seu Mestre tão idiotamente. — Está surpresa?


Ela engoliu seco e falou, olhando para o chão:


— Sim, Mestre.


Ele lhe esboçou um sorriso bizarro e fez o barulho como o do chiado de uma cobra. Instantes depois, uma naja entrou na sala, fazendo volteios aos pés de Voldemort.


— Seja bem vinda de volta. Suponho que já saiba de sua promoção.


Bellatrix assentiu, ainda olhando para o chão.


— E você não se pergunta por quê?


Ela ergueu os olhos, encarando Voldemort pela primeira vez desde que chegara. Tinha certeza que fora promovida por merecimento, não podia imaginar outro motivo. Mas não disse nada, apenas aguardou que ele explicasse.


— Sim, você mereceu — ele falou, como se tivesse lido seus pensamentos (o que, Bella lembrou a si mesma, era bem possível). — Mas não foi apenas isso.


Voldemort caminhou até a janela a abriu uma fresta nas cortinas, mirando com os olhos ofídios o céu azul de verão lá fora.


— Há pouco tempo eu soube que uma vidente fez uma profecia sobre mim - ele voltou a olhar para Bellatrix e acrescentou: — Disse que aquele capaz de me vencer vai nascer no fim de julho do próximo ano.


Bellatrix se sacudiu levemente esperando por mais.


— E será filho de um desses adoradores de trouxas com quem lutamos. Imagine isso, um fedelho sangue ruim com poder de me destruir - ele soltou a cortina e voltou a chiar para a cobra, que se recolheu sobre um tapete diante da lareira. - Ela também acha engraçado — apontou para a cobra, que sibilou audivelmente esticando a fina língua duplicada para fora.


Bellatrix forçou um sorriso, ainda sem entender o que Voldemort estava tentando lhe dizer.


— Mas eu não cheguei onde estou achando as coisas engraçadas. Levo tudo muito a sério e não vou brincar com a sorte, mesmo que a vidente esteja tão obviamente enganada. — Voldemort deu alguns passos para se sentar bem diante da poltrona de Bellatrix, observando-a com um ar que lembrava uma serpente preparando o bote. — Você sabe o que significa esse nome que eu escolhi, Bella?

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