Fuga



Capítulo 1. Fuga

— Uma foto do meu aniversário de quinze anos... quanta mediocridade!

Bellatrix jogou o jornal na lixeira da cozinha e se preocupou em terminar seu jantar. Queria chegar cedo à reunião de Comensais, saber em primeira mão o que afinal estavam falando sobre sua missão - sua primeira como líder tática do Movimento Comensal.

Ela sorriu discretamente ao pensar na inveja que alguns veteranos teriam dela quando fosse parabenizada por seu sucesso. Afinal, fazia apenas cinco meses que ela deixara a casa dos pais para contatar pessoalmente o homem que diziam ser perigoso até mesmo pronunciar o nome e oferecera a ele sua total dedicação ao que chamava de "nossa causa comum".

Muitos disseram que Voldemort a mataria por exibir tamanha pretensão. Outros disseram que ele a mandaria para casa ou então a usaria para conseguir algum dinheiro para sua campanha.

Mas não foi isso o que aconteceu.

O tão temido Lord Voldemort a colocara na direção do aliciamento de jovens. Assim, Bellatrix passara a ser responsável pela criação de artimanhas com o objetivo de atrair jovens de sangue puro recém-saídos de escolas de magia para as fileiras dos chamados Comensais da Morte. Desde então, virara alvo de investigações de agentes do Departamento de Execução das Leis da Magia e até soubera que tinham aberto um inquérito oficial para apurar acusações de associação ilegal e aliciamento de menores para práticas ilícitas.

Mas nada comparado àquela popularidade recém-adquirida. Quase uma semana depois da invasão ao Ministério, o Profeta Diário continuava publicando sua foto do cartaz de "procurada" no alto da primeira página, sempre anunciando novos fatos estarrecedores sobre aquela jovem que há pouco tempo não passava de um nome que aparecia esporadicamente na Coluna Social, acompanhando os pais a bailes de gala e eventos importantes da alta sociedade bruxa do Reino Unido.

Claro, ninguém ainda a acusara do assassinado de Ernert Brown. Provavelmente demoraria algumas semanas até que encontrassem seu corpo. Isso sim é que eles deveriam estar achando estarrecedor. Não o fato de Bellatrix ter nascido e crescido num dos berços mais dourados da Inglaterra para virar uma procurada da justiça, mas sim o fato de que, logo em sua primeira missão, aquela jovem pretensiosa invadira o mais protegido prédio da Inglaterra e matara aquele que era considerado o primeiro Comensal realmente importante preso pelos aurores.

Mas eles não sabiam que Brown jamais havia sido um Comensal. Era apenas um professorzinho de feitiços mediano que descobrira um meio de detectar a energia usada nas tatuagens que identificavam os Comensais - o que, afinal, poderia lhes trazer grandes problemas.

Por isso a pressa de tirá-lo das mãos do Ministério antes que ele fosse capaz de revelar o que sabia e, mais que isso, eliminar completamente a ameaça ao Movimento que ele representava.

A fuga de Hogsmeade, porém, feita às pressas, acabara de vez com sua carreira de recrutadora. Mas Bellatrix não esperava, nem queria, permanecer muito tempo fazendo aquele serviço enfadonho de ensinar adolescentes cheios de espinhas a verem o óbvio. E sempre soubera que aquilo tudo nada mais fora que um teste.

Terminou de comer e ligou o rádio num volume quase inaudível. Ficou espiando a rua por uma brecha aberta nas pesadas cortinas de veludo verde-musgo. Mudou as estações a esmo sem muita diferença - todas falavam sem parar das "precauções" tomadas pelo Departamento de Execução das Leis da Magia para proteger melhor o prédio do Ministério e das ações de aurores tentando identificar e prender os suspeitos da invasão de dias atrás.

Pelo menos ela podia ter certeza de que, até o momento, a única pessoa identificada pela imprensa e pelo Ministério fora ela mesma. Sobre os outros Comensais havia, no máximo, vagas descrições. Crabbe era apresentado como "o moreno forte e musculoso que nocauteara o Chefe do Departamento de Execução das Leis da Magia". Elise Malfoy era "uma garotinha loira de tranças". Margot Lestrange era "uma jovem ruiva que devia ter no máximo dezesseis anos". Goyle era "o grandalhão de cabelos loiro-palha que levara Victor Bombach como seu refém até o saguão do Ministério". Edward O'Brian era "um moleque que uma das testemunhas afirmava ter falado algo sobre 'marca negra' antes de partir numa lareira rumo a algum lugar de Gales".

Ela, porém, os aurores já conheciam muito bem. Por isso todo o cuidado em sua viagem de Hogsmeade a Londres. Ela sempre soubera do risco que corria defendendo aquela causa. Os aurores já tinham arrombado sua casa alugada em Hogsmeade e agora estavam caçando-a por todo o país. Bellatrix não temia. Repetindo sempre para si mesma que, se tivesse que morrer, que fosse lutando pela causa, aquela jovem que mal saíra da escola estava disposta a tudo.

Mas, aparentemente, seus superiores não estavam. Naquele dia, Bellatrix receberia instruções para sua saída do país.

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— Você vale 30.000 galeões? — O jovem mirou Bellatrix por cima do jornal.

Da pequena janela de vidro manchado que havia ao lado da porta do bar, Bellatrix havia visto, ainda naquela noite, agentes do Departamento de Execução das Leis da Magia pregando em muros e vitrines cartazes com sua foto. Abaixo estava escrito em grandes letras: "Procura-se, suspeita de comandar a invasão ao Ministério da Magia". Todos já haviam sido devidamente arrancados por jovens recrutas às suas ordens.

Apesar do dinheiro e da influência dos Comensais mais graduados dentro do Ministério, o cerco dos aurores se apertava em torno da jovem Comensal. Há algumas semanas os jornais tinham anunciado uma recompensa, prometida pelo Ministério a quem desse qualquer informação que levasse à sua captura. Em cada local freqüentado por bruxos havia dezenas de cartazes com a sua fotografia, sorrindo num vestido de gala. Antes de cada jogo de quadribol, o telão mostrava sua imagem e o valor da recompensa e mesmo a TV trouxa já a anunciara como "criminosa perigosa, procurada pela polícia".

— Pouco, não acha? — resmungou Bellatrix sem muito interesse.

Lúcio Malfoy sorriu para ela e voltou a ler o jornal.

Estavam num bar sujo e de aspecto sombrio. As janelas empoeiradas davam pouquíssima visão da rua lá fora e a luz provinha de tocos de velas. Bellatrix procurava manter as mãos junto ao corpo e não encostar sequer um dedo em nada ali, especialmente no balcão cheio de manchas suspeitas. Sacudia a varinha impaciente, ansiosa pelo que Lúcio tinha a dizer. Mas ele apenas lia o jornal calmamente, produzindo luz com a varinha.

A mente da garota estava a mil, imaginando o que afinal Lúcio estava querendo com ela. Há semanas lhe fora avisado que deixaria o país, mas até aquele dia nada mais lhe fora dito sobre o assunto. Já estavam em meados de maio de 1978 e, desde que deixara sua casa alugada em Hogsmeade, Bellatrix já se mudara um sem número de vezes, indo do centro de Londres ao subúrbio mais distante, nunca passando mais de duas semanas no mesmo lugar.

Foi quando a porta do bar foi aberta, tocando a sineta, e por ela entrou uma figura envolta dos pés à cabeça numa capa preta. Ela o observou enquanto ele andava até o bar e tomava o lugar vago à sua esquerda. Pediu um chá de erva-da-criméria e se pôs a batucar com longos e finos dedos no balcão de madeira tosca.

— Vocês podem parar com a palhaçada e me dizer de uma vez para onde eu vou? — perguntou Bellatrix.

O homem que acabara de chegar meramente levantou o capuz da capa e Bellatrix pôde ver, na penumbra, seus olhos brilhando e seu nariz adunco, comprido e curvo como um gancho.

— Sou Severo Snape — ele falou calmamente. — E vim para dizer que a senhorita está de viagem marcada para a Romênia.

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Dias depois, o Ministério da Magia anunciou a retirada da recompensa pois, "segundo as informações do Departamento dos Inomináveis, a mesma não se encontra mais no Reino Unido".

No momento em que o Ministro da Magia em pessoa fazia esse pronunciamento ao povo bruxo da Inglaterra, Bellatrix embarcava num trem em Paris com destino à Romênia, exibindo documentos trouxas falsificados com perfeição, na companhia de seu mais novo subordinado, Severo Snape.

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