Lugar nenhum para se esconder



O quinto ano em Hogwarts foi pontuado de acontecimentos estranhos, dentro e fora da escola, no mundo bruxo e trouxa em geral. Muitas notícias de mortes, esquadrões sinistros sendo formados, tensão e medo. Pessoas fazendo coisas obrigadas, torturas.

Estava sendo um ano difícil para os estudantes que buscavam graduação, também. Provas que mais tarde direcionariam suas escolhas profissionais.

A distância imposta por Severus deixava Heloísa abatida, mais pela frieza dos sentimentos do que, propriamente, pelo afastamento físico. Nada do que ela tentou até então chegou realmente a tocá-lo de alguma forma.

Continuava a encontrar Lupin e Lily, e mantinha amizade estreita com os dois. Mas à simples aproximação do trio grifinório, arrumava um pretexto e saía.

Após as comemorações de Natal, Heloísa e Snape se encontraram no corredor vazio que levava às masmorras. Estava frio, e o dia já estava morrendo. Alguns poucos archotes lançavam uma luz bruxuleante pelas paredes mais atrás, deixando-os na penumbra.

O acaso pegou os dois de surpresa, e a reação imediata foi a mesma. Estancaram por um minuto para, logo em seguida, a raiva dele aparecer. Continuou andando, apressando o passo. Num movimento rápido e automático, ela se pôs a sua frente, impedindo-lhe a passagem. Snape tentou contornar, mas novamente ela o interceptou.

- Fala comigo! – sussurrou a menina. – Fala comigo...

Severus a agarrou pelos braços e a jogou de encontro à parede, fazendo-a cair. Bufando de raiva, ele seguiu pelo corredor.

- Severus... – ela gemeu baixinho, enquanto tentava se levantar.

Ele deu meia volta nos calcanhares e, com a mesma raiva que foi, voltou ao seu encalço, agarrando-a novamente pelos braços e a imprensando de encontro à parede de pedra, usando seu próprio corpo para segurá-la. Seus lábios, seu rosto todo tremia de ódio, a poucos centímetros do dela; podiam sentir o hálito quente um do outro.

- Não fala comigo! Não me chama! Não olha pra mim! Vá ficar com aquele seu cachorro dos infernos! Vocês se merecem, sua sangue-ruim imunda!

- Por q-que você está-tá fazendo isso co-comi...

- Cala a tua boca! Cala a boca! Já mandei você calar a boca e não falar comigo!

Ela já não conseguia mais conter as lágrimas, e tudo o que ele menos queria nesse momento era vê-la chorando. Queria que sofresse, sim, sofresse muito, mas não estava pronto para ver a tristeza que via agora no rosto dela. Segurou o ar por um momento, enquanto observava o rosto dela molhado de lágrimas, os olhos fechados e a boca entreaberta. Teve vontade de esmurrá-la! Fechou o punho com força, concentrando toda a raiva e frustração que sentia, emanando os sentimentos como ondas magnéticas. Heloísa abriu os olhos assustada, surpresa. “Era ele de novo! Podia sentí-lo! Estava sofrendo, mas era ele!”

Snape correu o mais que pôde, o mais rápido que conseguiu, para o lugar mais longe que imaginou.

Nenhum dos dois conseguiu dormir aquela noite. Rolaram em suas camas, aflitos e ansiosos, esperando o dia chegar. Um dia comum, que normalizasse tudo.

Ele continuou se esforçando ao máximo para ignorá-la ao longo do ano. Com os exames de graduação chegando, o tempo era todo gasto em estudos, pesquisas, treinamento. Quase não se viam, e nas poucas vezes que isso acontecia, ele levantava uma muralha de indiferença.

Especialmente após os exames, Severus ficou mais taciturno e irascível. Heloísa ouviu pela escola uma conversa sobre outro atrito muito constrangedor entre ele e os garotos da grifinória, onde até Lily fora envolvida.

- Como você ainda consegue se interessar por ele, Heloísa?! Ele é tão insuportável quanto aqueles três idiotas amigos do Remus! – comentou a ruiva, enquanto caminhavam até a estação de Hogsmeade. Heloísa estava indo se despedir, e as duas seguiam juntas alguns metros atrás de Severus. Ela o olhava caminhar sozinho, cabeça baixa, ombros curvados, parecendo tão cansado de tudo, o olhar no chão e os cabelos esvoaçando pelo rosto. Sorriu-se daquele jeito desengonçado de adolescente andar, e sentia seu próprio peito cheio de um sentimento quente, ansioso. Tinha vontade de correr e abraçá-lo, falar com ele.

O trem já estava se movendo quando ela acenou novamente para Lily, no interior da cabina.

Quando o último vagão passou lentamente pela estação, Heloísa o viu em pé, encostado na janela de vidro, olhando-a lá de dentro. Num gesto mudo, onde palavra nenhuma importa, e o coração promove sozinho, ela levantou a mão num aceno, saudando-o. Sem deixar de olhá-la parada lá fora, oferecendo-lhe o que ela tinha de melhor, de mais puro, Severus levantou a mão lentamente e acenou de volta.

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