SETE DIAS [segunda parte]



Pink Floyd - Wish You Were Here

"So, So you think you can tell
Heaven from hell
Blue skies from pain
Can you tell a green field
From a cold steel rail?
Smile from a veil?
Do you think you can tell?
Did they get you to trade?
Your heroes for ghosts..."



SETE DIAS [SEGUNDA PARTE]


[26 de outubro de 1981 – 7 h 20 min]


Aquela prometia ser uma bela manhã de outono, com certeza. Dumbledore achava reconfortante perceber que, apesar de todo o caos da guerra, a natureza continuava a oferecer a mesma beleza de sempre. Tendo acabado de tomar seu café da manhã, ele pretendia aproveitar o horário tranqüilo para colocar sua papelada em ordem, quando viu o vulto longilíneo de Sirius, sentado nos primeiros degraus da escada que levava à sua sala. Assim que ouviu passos, o jovem bruxo se adiantou, cumprimentando:

- Bom dia, professor Dumbledore. Desculpe a invasão, e a visita inesperada...

- Sirius! É sempre um prazer! Quando se trata se vocês, eu sempre espero... entradas inesperadas. – Dumbledore sorriu com uma pitada de malícia e completou. - Vamos entrar na minha sala... Podemos conversar mais à vontade lá dentro.

Dumbledore abriu as cortinas e deixou que a manhã ensolarada entrasse, antes de se sentar, oferecendo a cadeira à sua frente a Sirius.

- Sente-se, filho. Você já tomou seu café?

- Não, mas acho que eu aceito um chá.

- Ótimo... ótimo! – Dumbledore imediatamente fez um movimento rápido com sua varinha, e duas xícaras de chá fumegante materializaram-se à frente deles. O diretor pegou uma delas e fez um gesto para Sirius, oferecendo a outra. Deu um pequeno gole e quebrou o silêncio.

- A que devo a sua visita tão cedo, Sirius?

- Bem, professor... Antes de mais nada, eu queria me desculpar por não ter ficado para a reunião da Ordem, ontem. Eu estava... um pouco nervoso. E fiquei meio preocupado com a cara do Pedro, ele parecia tão mal! Bem, eu acabei obedecendo ao impulso de carregá-lo para tomar um chocolate quente, dar uma animada, sabe como é... Quer dizer, me desculpa, professor... Isso não vai se repetir. Eu sei o quanto essas reuniões são importantes e...

- Não tem problema, Sirius, eu entendo. Espero que Pedro esteja se sentindo melhor agora.

- Ah, sim... – antes que a empolgação o levasse a falar mais do que intencionava, Sirius interrompeu-se, respirou fundo e só então voltou a falar. – Mas, bem... a outra questão, professor... Eu vim lhe trazer, a pedido de Thiago e Lílian, o endereço deles, com um convite para que o senhor vá visitá-los assim que for possível. Eles estão ótimos, morrendo de saudades... Bem, pode ler.

Dizendo isso, estendeu o bilhetinho dobrado em seu poder. Dumbledore olhou para o pedaço de pergaminho. A caligrafia irregular de Sirius era fácil de identificar. Ele leu:

“A casa dos Potter encontra-se no final da Bowman Wright Road, sem número, em Godric’s Hollow”.

Um misto de alívio e apreensão cruzou a mente de Dumbledore, mas ele sorriu ao encarar Sirius de novo.

- Ah, finalmente! Fico muito feliz com o convite... E mais ainda por saber que os três estão bem.

Sirius mantinha-se na mesma posição, com a mão estendida, parecendo querer pegar o bilhete de volta. Dumbledore ignorou a insinuação, e dobrou de novo o pedaço de pergaminho, enfiando-o, sem cerimônia, num bolso interno das vestes.

- Perdoe-me se não destruo imediatamente o endereço, Sirius... Mas sou um velho, tenho receio de não decorar direito a informação. Pode ficar tranqüilo... Ninguém tem acesso aos meus bolsos. – E deu um sorriso tão doce que Sirius ficou sem graça e se remexeu na cadeira sem responder nada.

Os dois ficaram mais alguns minutos em silêncio, saboreando o chá.

- Sirius... Embora você tenha ficado um tanto irritado comigo ontem, quero que saiba que considero o que você fez como um ato digno de um verdadeiro amigo. Mais do que isso, uma prova de coragem, digna de um legítimo membro da Grifinória... – Dumbledore deu um sorriso maroto, amenizando a seriedade do que dizia.

Sirius sentiu as bochechas coradas como se tivesse voltado a ser um menino, ali, diante do diretor de Hogwarts. E viu que os olhos azuis de Dumbledore ficavam mais intensos e brilhantes por detrás dos seus oclinhos de meia-lua.

- Tome muito cuidado daqui por diante, filho. Esconda-se... Proteja-se... Não queira correr riscos desnecessários. A segurança dos Potter é mais importante do que qualquer outra missão da Ordem.

Sirius baixou os olhos, um pouco envergonhado por mentir para o diretor, o líder da Ordem da Fênix. Mas, racionalizou, o próprio Dumbledore estava dizendo que a segurança dos Potter era o que mais importava agora. Levantou-se lentamente e despediu-se.

- Muito obrigado, professor... E pode ter certeza de que saberei me cuidar... Agora, se o senhor me der licença, vou encontrar outra pessoa...
- Ah... sim, claro! Espero que Remo tenha tempo de visitar os amigos antes da lua cheia... Mande um abraço a todos!

Surpreso com a perspicácia de Dumbledore, Sirius apenas concordou, antes de sair, quase dando um encontrão em Severo.

- Ah, claro... Eu também espero, professor. Até mais!

- Até mais, Sirius!

~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~


[26 de outubro de 1981 - 7 h 45 min]


Sirius estacionou a moto voadora do lado de fora do apartamento de Remo e respirou fundo. Vamos lá, é só o Aluado. Ele não pode fazer nada agora, não pode revelar o segredo, nem que queira. E você está aqui pra fazer a vontade dos seus amigos, da Lílian e do Thiago. Novo suspiro. OK, vamos lá, não pode ser tão difícil. Na verdade, Sirius estava, de novo, confuso, com medo de ter se precipitado com relação a Remo, com medo da reação do amigo... Desconfiado, ainda. Mas também desconfortável com a situação toda.

Bateu na porta com força, sabendo que, estando às vésperas da lua cheia, o amigo ainda estaria dormindo, para aproveitar a chance de um descanso. E com receio de que, caso Remo demorasse a atender, ele perdesse a coragem e tivesse que se explicar com a Lílian. Aquela ruiva quando ficava nervosa dava medo.

Remo abriu a porta com um ar visivelmente sonolento. Ver o amigo ali parado, pálido, descabelado, de pijamas e com ar meio desorientado pelo sono fez com que Sirius se sentisse um pouco mais à vontade com a situação. Era bem mais fácil achar engraçada a situação, fazer piada, do que se deixar levar pela desconfiança, raiva ou pena.

- Você está uma m#$*a, Aluado. – Sirius diagnosticou, com voz séria, assim que Remo abriu a porta.

- Muito obrigado. Prazer em vê-lo também... – Remo respondeu secamente, ainda com a voz meio rouca de sono.

Sirius foi entrando no apartamento com a velha intimidade de antes. Seguiu direto para a cozinha e com uma sacudida desleixada da varinha conjurou duas canecas fumegantes de chocolate. Uma pilha imensa de louça suja se esparramava pela pia. Com uma careta, Sirius fez mais um gesto rápido com a varinha e a pilha começou a se lavar, com tanta energia que alguns pratos se quebraram ao ser atirados de um lado para o outro no enxágüe.

- Toma. – ofereceu a primeira ao amigo, ainda surpreso com a súbita invasão. – Você está precisando. Eu só vou te acompanhar, porque sou guloso. Tomei chá com Dumbledore agora a pouco…

- Não, obrigado. Acho que vou fazer um café...

- Ah, larga de ser chato, cara. Um chocolate vai te dar uma animada. E eu tenho boas notícias.

- O que? Vai haver um eclipse da lua? – Remo rebateu com ironia.

- Não, Aluado... Quer dizer, não que eu saiba, pelo menos. Notícias interessantes, quero dizer. Trouxe o endereço do Thiago, eles te convidaram pra conhecer a casa nova... – estendeu o pedaço de pergaminho que trouxera para o amigo.

Remo se sentou, esfregou o rosto com as mãos, pegando a caneca de chocolate com uma das mãos e o bilhete na outra. Estava bem acordado agora. Podia reconhecer a letra de Sirius em qualquer lugar. Deu uma boa olhada no bilhete, enquanto sorvia o chocolate. Então era isso, o fiel do segredo era ele. Uma pequena pontada atravessou seu coração, lembrando da desconfiança que tinha a respeito do amigo. Mas espantou logo esses pensamentos. Estava aliviado, na verdade. Ninguém mais ia poder desconfiar dele, o lobisomem, o suspeito óbvio de traição. E ia finalmente poder rever os amigos.

- Maravilha. Preciso ir vê-los antes… você sabe.

- Claro. – Sirius puxou o bilhete da mão do amigo.

- A confiança que você deposita em mim é comovente... - Remo respondeu sarcástico.

Com peso na consciência pelo gesto, Sirius respondeu:

- Você não precisa do papel. Eu vim pra cá de moto, estou mesmo indo pra lá, levo você...

Remo ergueu a sobrancelha, encarando o outro em dúvida.

- Não precisa se incomodar... Eu decorei o endereço, posso ir por mim mesmo.

- Larga de bobagem... Sei que a gente andou se estranhando ultimamente, mas... Encare isso como um convite oficial da Lílian e do Thiago... Eu sou apenas o mensageiro... e motorista. – fez uma mesura exagerada, tentando manter o clima leve entre os dois.

Bom, ele não tinha mesmo nada a perder com uma carona, pelo contrário.

- Ok, então. Me dá dez minutos, vou tomar uma chuveirada rápida, e a gente vai. – fez uma pequena pausa para completar em seguida, com um sorriso irônico. – Sinta-se em casa, fique à vontade para terminar de arrumar a cozinha, ou espionar minha papelada...

Rumou para o banheiro antes que Sirius tivesse tempo de retrucar.

~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~


[26 de outubro de 1981 - 9 h 45 min]


Thiago estava começando a achar interessante a estranha vida de trouxa. Sentado no quintal de casa, ele desmontava o tal... como é que chamava mesmo? Ralador de grama? E cada pecinha que saia o deixava maravilhado. Como podia caber tanta coisa em tão pouco espaço? E a tal da gasolina, então? Que coisa mais... estranha... era aquela?

- Thiago! Você pegou o cortador de grama novo que eu trouxe da vila?

Ah, então era esse o nome! Sacou a varinha, dando por terminada a sua experiência como trouxa, ele ordenou que o tal... cortador se remontasse. Mas não foi rápido o suficiente.

Lílian já estava perigosamente próxima, com as mãos nos quadris, um ridículo chapéu de palha na cabeça, meio torto, e olhos penetrantes e ameaçadores.

- Thiago Potter!

- O que foi, amor da minha vida? – ele tentou responder com voz sedutora, sorriso inocente, enquanto lutava para que as peças encontrassem os seus lugares dentro da engenhoca um pouco mais rápido.

- Não me venha com essa de “amor da minha vida”, que eu te conheço! Você destruiu o cortador de grama que eu ACABEI de comprar?

- Não! Eu só estava fazendo um... reconhecimento interno... Sabe como é, para ser um bom trouxa, tenho que conhecer melhor os artefatos trouxa... Eu devia ter feito aquela matéria em Hogwarts...

- Não tente me enrolar, senhor meu marido! O que está acontecendo aqui? Parece que a loja de ferragens resolveu dar um baile no meu quintal! – ela apontava furiosa para as peças do cortador que voavam em alta velocidade de um lado para o outro em volta da máquina.

- Loja o quê?

- Ah, deixa pra lá... Eu...

Nesse instante os dois ouviram vozes e barulho na frente da casa.

- Salvo pela chegada das visitas... Mas não pense que você se livrou do assunto, não, ouviu, Senhor Potter?

- Sim, senhora! Ah, aposto que é o Sirius, ou quem sabe o Remo... Sempre se pode contar com um Maroto para salvar a pele... – Thiago respondeu, de um jeito cômico que fez Lílian dar risada a caminho do portão.

Com Harry no colo, Thiago veio logo atrás dela. Ao ver os amigos desmontando da motocicleta que ainda pairava a poucos centímetros do chão, ele teve a certeza de que era um caso perdido. Fungante e emocionado, melodramático, uma vergonha para o Código Maroto. Mas que se danasse o Código! Abriu um imenso sorriso, do tamanho da sua alegria em rever o amigo.

- Aluado!

- Pontas!

Os dois se abraçaram e trocaram tapas nas costas e soquinhos na cabeça um do outro.

- E aí, cara? Que saudades! Você está um lixo!

- Pois é... São fases... – Remo riu ao repetir a antiga brincadeira. E então se voltou para Lílian, que tinha ficado esperando logo atrás. – Também, não tenho a sorte de ter a senhora Olhos Verdes Evans pra cuidar de mim...

Esquivou-se de uma cotovelada brincalhona do Thiago, abrindo os braços para a amiga com um sorriso:

- Li, você não faz idéia da falta que sinto de vocês!

- Nós também! - ela falou, com a voz meio tremida de emoçao ao vê-lo depois de tanto tempo, apertando o abraço. - Eu também, amigão!

Ele estava tão magro, abatido, cheio de olheiras. A roupa velha e puída estava meio larga. Ela apertou o abraço carinhoso ainda mais, antes de soltar.

- Deixa eu dar um boa olhada em você. Remo, faz tempo demais! E aí, como vão as coisas?

Remo agora pegava Harry no colo, e encostava seu nariz no pescoço do bebê, fazendo-o rir às gargalhadas.

- Vamos entrar, moçada. Essa reunião merece uma rodada de cerveja amanteigada pra comemorar... pelo menos uma pra começar... – completou Thiago, rindo, enquanto abria a porta da frente e dava passagem aos amigos.

~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~


[26 de outubro de 1981 – 19 h 27 min]


Muitas cervejas amanteigadas depois, risadas e lembranças, Lílian achou que já estava na hora de fazer alguma coisa mais substanciosa para comerem.

- Vou preparar uma comida do jeito trouxa para vocês experimentarem! Manicotti ao sugo!

- Uau! Só o nome já impressiona...

- A Ruiva está animadíssima com essa coisa de cozinhar à moda trouxa... Até comprou um livro de culinária na vila...

Remo se levantou, dizendo

- Vou te ajudar, Li. Deixa esses dois sangue-puros aí distraindo o Harry... Thiago já te contou a história da batedeira?

Os três marotos caíram na gargalhada. Thiago, então se lembrou e emendou, ainda engasgado com a risada:

- Falta só o Rabicho aqui pra completar...

- Pois é... Eu esperava encontrar o Pedro aqui também... – Remo observou, de passagem para a cozinha.

- Não encontrei com ele hoje... – Sirius rapidamente se esquivou. A verdade é que ele não tinha tido tempo de procurar o amigo desde a noite anterior.

Mas logo o assunto mudou para o quadribol e Pedro foi esquecido.
Na cozinha, Lílian acendeu o fogão, e começou a separar os ingredientes da massa.

- E aí, Remo... como vai a vida? – parou um instante para encarar o amigo, com um olhar carinhoso. – Está muito difícil?

Remo ainda pensou em fazer uma brincadeira e se esquivar de uma resposta. Mas estava tão cansado, que só conseguiu dar um suspiro.

- ‘Tá duro assim, é?

- Digamos que os meus companheiros... os lobisomens... não são exatamente amistosos comigo. Tem sido bem difícil ganhar a confiança deles... pelo fato de ter tentado viver entre os bruxos, ter uma vida normal, entende? – Remo desviou o olhar para a janela e ficou em silêncio.

Lílian largou o que estava fazendo, chegando mais perto dele, passando o braço em volta do seu ombro, com um carinho.

- Mas você é normal, oras! Lembra do que o Thiago sempre diz... você só tem

- “um probleminha peludo”... – os dois falaram ao mesmo tempo, e Remo acabou rindo descontraído.

- Ah, Li... o que eu faria sem vocês?

Lílian resolveu fazer uma pausa na culinária e se sentou em frente a Remo para ouvir seu desabafo.

- Ah, meu amigo! Eu posso só imaginar...

- Eu sinto... Ah, Li, eu sinto tanta falta dos tempos de Hogwarts! Eu nunca fui tão feliz! Eu tive amigos de verdade pela primeira vez na vida...

- Você TEM amigos de verdade...- Lílian cortou, corrigindo.

- A companhia dos Marotos me fazia enfrentar as transformações quase que numa boa... quase feliz! E você, Li... você foi minha primeira amiga, percebeu tudo e se calou, viu e valorizou coisas boas em mim que nem eu mesmo via...

-Ah, eu adoro você, seu bobão! – sentada bem à frente dele, ela esticou o braço por sobre a mesa, deu um aperto carinhoso em sua mão tensa. – . A melhor coisa que Dumbledore fez por nós foi ter nos chamado para ser monitores juntos... Eu amo você, Remo Lupin! Foi maravilhoso arrumar, mais do que um amigo, um irmão em Hogwarts ...

Ele se remexeu na cadeira, meio desconfortável por se sentir comovido pela óbvia sinceridade do afeto de Lílian. Ela percebeu e achou divertido, e então resolveu completar, erguendo a sobrancelha com o comentário:

- E depois... com seu probleminha peludo... Arrumei um irmão e um bichinho de estimação...

Remo não conseguiu resistir a uma risada gostosa com o comentário. Os dois acabaram caindo na risada, depois ficaram ali, em silêncio, Remo olhando através da janela distraído e Lílian observando-o.

- E você e o Sirius, conversaram no caminho?

- Não.

- Pois eu acho que parte da sua angústia, Remo, é o clima entre vocês dois, um desconfiando do outro. Vocês quatro são amigos há tanto tempo, são mais unidos do que irmãos! Porque você não esclarece logo as coisas? Eu tenho certeza absoluta que você não é um traidor! Nem o Sirius! É teimosia isso... Um mal entendido infeliz... Lembra do que Dumbledore sempre dizia, é isso o que Voldemort quer, desunir as pessoas!

- Ele desconfia de mim porque sou um lobisomem! Vindo de um desconhecido, seria um preconceito abominável. Vindo de um amigo... é uma decepção. Ou uma tentativa de desviar a atenção de todos.

- Pois eu acho que você está sendo orgulhoso... e teimoso! Os dois são duas cabeças duras! Vocês me deixam louca com isso! Thiago tem essa coisa... essa lealdade masculina, sei lá... e não quer se meter... mas eu...

- Você sempre foi enxerida mesmo!- Remo cortou-a, com um sorriso. – Metida era seu nome do meio, não é?

- Pode ser. Mas é porque eu gosto dos dois! Dos três, aliás!

- Eu sei. – Remo deu um suspiro e olhou para Lílian com um sorriso tristonho. - A gente vai ficar bem, Li. – apertou a mão dela, antes de se levantar. – Mas agora, chega de papo, porque todo mundo deve estar morrendo de fome... Você conhece o Thiago, a gente fica de conversa aqui, daqui a pouco ele vai vir querendo me socar, achando que estou dando em cima da mulher dele...

Rindo, Lílian também se levantou e os dois mudaram de assunto, voltando a preparar a massa para o jantar.

~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~

[27 de outubro de 1981 – 5 h 10 min]


Ele parou no portão do jardim, admirando-a. Lílian era um espetáculo e tanto, ele pensou. Sentada displicente ali logo cedo, cercada por flores, cuidando do jardim como se fosse uma trouxa, distraída e feliz. Os cabelos vermelhos esvoaçavam de leve, e ela toda parecia brilhar, iluminada pelos primeiros raios do nascer do sol. Aqueles olhos amendoados incrivelmente verdes, inconfundíveis. Cantarolava uma música indefinida, e sorria.
Então ela o viu. Na verdade, pareceu pressentir sua presença e se virou para encará-lo. Seu sorriso se tornou mais caloroso, alargando-se. Ela se levantou e veio caminhando na sua direção, os braços abertos num convite ao abraço. Uma borboleta azul esvoaçava em torno do seu ombro esquerdo, acompanhando-a num estranho balé.

Com o coração disparado, de amor e contentamento, ele suspirou, antecipando o encontro. Só mais um pouco, e ele já podia sentir seu perfume, antecipar o calor do seu corpo... Quando ela chegou, ele se inclinou, com a intenção de dar nela apenas um beijo de leve. Mas sentiu o clima mais quente, ao perceber que ela correspondia, e o beijo se aprofundou e demorou mais tempo do que o planejado. Sentia o corpo todo queimar, arder, e ele teve que se afastar para bloquear a necessidade urgente que sentia dela.

E foi então, que, ao olhar de novo para ela ali, nos seus braços, ele percebeu. O rosto dela perdia a cor, seus olhos se arregalaram de espanto, para em seguida se tornarem opacos. Ele sentiu que suas mãos estavam ficando molhadas, e viu horrorizado, quando ela levou a mão ao peito, que ela estava sangrando. As suas próprias mãos estavam agora encharcadas do sangue dela. O sangue jorrava, escorria entre os seus dedos, tingia as vestes dos dois, espalhando-se pelos seus corpos, por tudo ao seu redor.
Ele queria correr, precisava correr... Em pânico, sentiu as pernas paralisadas, e ficou ali, parado, impotente, o corpo todo ardendo, vendo-a cair sobre a grama...

NÃO!!!!

Severo acordou com o seu próprio grito na escuridão, o coração disparado querendo sair pela boca, o corpo molhado, empapado de suor. Ele gemeu, torcendo para que ninguém tivesse escutado. Esfregando o rosto e piscando na escuridão, ele tentava encontrar o caminho de volta à realidade. Só então ele se deu conta, completamente, do que tinha sonhado. E grunhiu com desgosto.

Os pesadelos eram seus companheiros noturnos habituais. Mas o que o deixava perturbado, mortificado mesmo, era perceber que não conseguia evitar o papel idiota, sentindo-se quase feliz com aquele pequeno momento romântico. Patético. Mesmo seus sonhos eróticos eram pesadelos, eram ridículos. E infelizes. Por pura mortificação, gemeu mais alto, cobrindo o rosto com as mãos. Ele tinha desistido de lutar contra o sentimento com relação à Lílian Evans. Lílian Potter, ele corrigiu, serrando os dentes com raiva. Mas estava resolvido a transformar tudo aquilo em vontade de protegê-la. Pareceu-lhe que dava muito bem para canalizar sua energia na preocupação com a segurança dela, na sua proteção. Mas, ultimamente, os velhos pensamentos voltavam a atormentá-lo chegando com mais força e freqüência, misturados à culpa, ao medo, ao horror. E aquilo estava ficando muito difícil de controlar.

O sol da manhã começava a surgir, entrando pela janela alta. Severo, sentado na cama, tonto e sonolento, sentiu o corpo queimar. Talvez fosse frustração sexual, ele pensou num esgar de ironia. Não, pensando bem, era o braço que estava ardendo. Focalizou o braço e só aí percebeu o chamado. Era a Marca tatuada em seu braço que queimava mais negra do que nunca. Levantou num pulo e caminhou rapidamente para o banheiro. Jogou uma água gelada no rosto, contemplando de relance a imagem abatida que o encarava do espelho. A convocação era inconfundível, e o Lorde das Trevas não costumava tolerar atraso na resposta.

- Vamos lá, Severo! Hora de trabalhar. Você sabe bem o que fazer...

~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~


[ 27 de outubro de 1981 – 6 h13 minutos]

De volta aos penhascos, Severo notou. O mesmo vento ruidoso e cortante, o mesmo cheiro de morte. Os cabelos compridos de Severo voavam úmidos, cobrindo seu rosto. Era uma daquelas reuniões de grande estilo, o Lorde das Trevas adorava criar o clima apropriado quando reunia o círculo interno de Comensais da Morte.

Os primeiros raios de sol já iluminavam a praia pedregosa bem debaixo do penhasco em que estavam. Os bruxos chegaram praticamente juntos, tomando seus lugares no círculo em silêncio. Havia sempre certa demora inicial nesses encontros, provavelmente para gerar ansiedade antecipatória, tão ao gosto do Lorde das Trevas. Severo olhou discretamente à sua volta. Reconheceu alguns Comensais por detrás da máscara. Lucius, Bellatrix, os irmãos Lestrange... alguém que ele não conhecia, parecendo ser um bruxo jovem e magro, numa capa grande demais... Crabble, Goyle, Nott... Estavam todos ali.

Por alguns longos minutos, ninguém viu nem ouviu nada além da luz tímida dos primeiros raios de sol e o uivo do vento úmido. E então, antes de vê-lo, ouviram sua voz poderosa e rouca, inconfundível:

- Bem vindos, Comensais da Morte! Bem-vindos, seguidores das Trevas, meus servos...

Respirou fundo, ruidosamente e continuou num brado cavernoso:
- Sintam mais uma vez, mais do que nunca, a magnitude do nosso poder reunido aqui!

Os bruxos, um a um, aproximavam-se, ficando de joelhos para beijar as vestes do Lorde das Trevas, e em seguida recuar e se levantar, mantendo o mesmo círculo silencioso.

Voldemort, depois da saudação do último Comensal, voltou a falar, em voz grave e ainda mais hipnótica:

- Estamos todos unidos sob a Marca Negra?

Imediatamente, todos caíram de joelhos, respondendo num sussurro uníssono:

- Sim, Mestre e Amo!

Para surpresa geral, o que se ouviu em seguida foi uma sonora e horripilante gargalhada. Severo sentiu a nuca arrepiar e imaginou que o efeito sobre o outros deveria ser mais ou menos o mesmo.

- Chamei todos vocês aqui, meus servos mais fiéis, para compartilhar da minha alegria. Tenho ótimas notícias para todos nós. Nossa vitória final, definitiva e esmagadora não tarda, meus amigos!

Fez uma pausa dramática, enquanto todos se mantinham em silêncio, em expectativa:

- Ontem, meu espião veio me trazer a informação mais preciosa que eu vinha aguardando.

Deu uma nova gargalhada, sem que ninguém ainda tivesse conseguido entender muito bem sobre o que ele estava falando.

- Meu espião junto aos Potter... O amigo que se ofereceu para ser o fiel do segredo do Feitiço Fidelius que protege o esconderijo deles... – interrompeu seu discurso com uma nova gargalhada. – Imaginem a suprema ironia... O amigo “fiel” trouxe diretamente a mim o endereço... a informação de que precisávamos para por fim a essa profecia ridícula!

Todos riram juntos em resposta. Severo mal conseguiu fingir uma risada engasgada, sentindo o coração gelar.

- Quero o caos essa semana, senhores! Quero ataques por todo o Reino Unido! Inglaterra, Escócia, Irlanda... Quero o caos espalhado por toda a Europa... e o gran finale no País de Gales, onde está nosso bebezinho... Quero que o Ministério seja derrotado vergonhosamente, que a Ordem da Fênix seja atingida sem saber nem de onde veio o tiro de misericórdia! Hoje começa a lua cheia, os ataques devem ter início nessa noite, com o auxílio precioso dos nossos aliados lobisomens. E, na noite de Halloween, o momento supremo... a morte dos Potter!

Oclumência. Controle emocional, dissociação. Esvazie a mente, ponha de lado suas emoções, concentre-se. Severo ordenava para si mesmo, controlando a respiração.

- Quero ataques a todos os pontos turísticos, a todos os postos-chave da Comunidade bruxa nos próximos dias, a partir da noite de hoje. E no dia 31 de outubro, eu seguirei pessoalmente para matar o pequeno Potter e seus tolos pais.

E completou a ordem com uma nova gargalhada arrepiante. Um murmúrio crescente percorreu o grupo. Alguns riram alto. Outros bateram palmas. Voldemort fez um sinal pedindo silêncio.

- Agora vão, dividam-se e planejem o caos, meus servos... Severo, quero uma palavrinha a sós com você.

Severo já estava impassível, impenetrável. Deu alguns passos à frente e se manteve em silêncio, curvando-se respeitoso diante do Mestre das Trevas.

- Severo, meu servo fiel... Seus relatórios muito têm me agradado. Quero que fique colado a Dumbledore nesses próximos dias, e que me mande relatórios ainda mais detalhados. Quero saber de cada passo, cada pensamento, cada intenção do velho bruxo. Você me entendeu bem?

Ainda não me decidi se quero aquele tolo arrogante morto ainda... mas quero, com certeza, que ele esteja bem vivo para ver a minha vitória! – Deu uma risada sarcástica rápida, para então concluir. – Bem, agora você pode ir. Esteja de sobreaviso... entrarei em contato, muito em breve.

- Sim, Mestre...

Com uma nova reverência, ele se foi, desaparatando rapidamente dali.
Só ao chegar a Hogsmeade, na porta do Cabeça de Javali, é que se deixou cair, apoiando-se na parede, tonto e tremendo, o estômago embrulhado. As emoções estavam todas lá, debaixo da difícil camada que ele tinha conseguido erguer de proteção. Respirou fundo, procurando se recuperar rapidamente. Ele não podia se dar ao luxo de fraquejar agora.

~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~

[ 27 de outubro de 1981 – 7 h 32 min]


Dumbledore já estava acordado há algum tempo, mas ainda não tinha descido para o café da manhã. Ao abrir a janela do quarto, a figura toda de negro, completamente encurvada, caminhando sorrateira pelos jardins do castelo chamou a sua atenção. Ele se deixou ficar ali, observando a aproximação do jovem bruxo, espantado com a sua aparência, mesmo daquela distância. Mesmo de longe, ele podia ver a palidez cadavérica do rapaz, as roupas parecendo meio úmidas, seu rosto abatido tinha uma expressão feroz, seus cabelos compridos esvoaçando de um modo selvagem.

O diretor o viu se aproximar do castelo no seu habitual caminhar desengonçado, encurvado, parecendo uma aranha. Mas havia alguma coisa, alguma coisa estava diferente. Antes de vencer a distância que separava o jardim da entrada do castelo, Severo caiu de joelhos no chão empoeirado, dobrando o corpo com as mãos na altura do estômago e fechando os olhos. Exausto? O garoto era sempre uma pilha de nervos debaixo de uma camada de proteção que, mesmo fina, era dura como aço e poucos conseguiam penetrar. Só mesmo alguma coisa muito grave, realmente sinistra, poderia fazer com que ele se deixasse abalar desse jeito. Ao ver o rapaz atravessar o portão de entrada do prédio, Dumbledore deixou seu quarto, rumando direto para sua sala.

Entrou e abriu as janelas, debaixo dos protestos dos antigos diretores, ainda sonolentos em seus retratos que forravam as paredes da sua sala. Sentou-se à frente da enorme mesa de carvalho, e ficou por alguns instantes olhando, distraído, os seus objetos de prata com seus barulhinhos e pequenas nuvens de fumaça.

Severo não demorou a chegar, silencioso como um gato.

- Bom dia, Severo. Aceita tomar um café comigo aqui mesmo?

- Bom dia, professor. Só um chá, por favor.

Dumbledore serviu os dois, aproveitando para observar o jovem bruxo de perto. O garoto parecia ainda pior visto de perto do que a imagem que Dumbledore tinha ficado observando da janela. As bochechas ainda mais encovadas do que o habitual, os olhos vermelhos circundados por olheiras profundas. Ele só tem 21 anos, Dumbledore pensou, com um peso no peito.

- O que aconteceu, Severo?

- Eu recebi um chamado... Essa manhã, eu acordei com o chamado.
Severo tomou fôlego, fazendo força para se manter calmo e controlado, antes de começar a falar, a voz fria e sem emoção:

- É sobre os Potter.

- Sobre o quê? - Dumbledore encarou o rapaz, erguendo a sobrancelha.
Severo não o encarou, mantendo uma expressão dura.

- Os Potter. Lílian, Thiago e o bebê. O Lorde das Trevas convocou o círculo íntimo de Comensais agora a pouco, para organizar uma escalada de caos e ataques por todo o Reino Unido, devendo culminar com o assassinato dos Potter no Halloween. – Severo então ergueu o rosto, encarando Dumbledore com um misto de raiva, desespero e amargura, e completou. – Sim, porque o espião do Lorde das Trevas foi o fiel do segredo do esconderijo deles, e levou pessoalmente a informação no dia seguinte do Feitiço Fidelius.

Por um instante, fez-se um silêncio mortal na sala. Dumbledore empalideceu, uma sombra de tristeza escurecendo o seu olhar.
Ao ver a reação do diretor, Severo sentiu que uma onde de fúria tomava conta dele, transbordando acima do desespero, de todo o resto, dando a ele energia de novo.

- Eu confiei no senhor! Durante todo esse tempo, eu confiei que o senhor conseguisse protegê-la! Eu nunca disse que confiasse em mim... Eu nunca me senti digno da sua confiança... mas eu CONFIEI NO SENHOR!!
Incapaz de se conter, Severo se levantou e começou a andar de um lado para o outro pela sala.

- Eu vivo no inferno todo o dia... Dias de agonia, noites de pesadelo... O senhor sabia disso? Eu a vejo… eu vejo o sangue dela em minhas mãos... Eu vim aqui em busca de ajuda para protegê-la... eu aceitei tudo... – ele falava sem parar, aos solavancos, entrecortado pela respiração acelerada. – Pensa que eu ligo a mínima para aquele... idiota do Potter? Não! Eu não sou hipócrita. EU NÃO DOU A MÍNIMA! Ele por mim podia morrer sufocado na própria imbecilidade… na própria... arrogância! Ele não é bom o bastante para Lílian! Nunca foi, nem nunca vai ser!

Respirou fundo, parando para encarar Dumbledore com olhar duro:

-... Ele lhe mandou uma coruja, aquele imbecil... UMA CORUJA! NO MEIO DE UMA P@$$# DE UMA GUERRA!! E o senhor deixou que ele escolhesse o amigo para ser o fiel do segredo! O cretino arrogante foi avisado de que o amigo era um traidor... mas não, ele não acreditou... achou que eu estava brincando, sabe Merlin o que ele achou, aquele cabeça-oca!! E O AMIGO FILHO DA P#%@ DO AMIGO LEVOU A INFORMAÇÃO DIRETO PRO VOLDEMORT!!

Severo estremeceu por ter, pela primeira vez na vida, pronunciado em voz alta o nome do bruxo das Trevas, por ter terminado o desabafo. Caiu sentado na cadeira, exausto. Num fio de voz fria, perguntou:

- Foi o Sirius, não foi? O senhor sabe quem foi, não é?

Dumbledore sentiu como se tivesse envelhecido cem anos naqueles poucos minutos. Com uma tristeza infinita, encarou o rapaz desesperado à sua frente:

- Por favor, Severo, me perdoe. Eu não imaginei... Eu falhei. Falhei com você. Falhei com todos vocês.

- Eu juro ao senhor, professor, que não importa quanto tempo passe, não importa o que aconteça daqui pra frente, eu vou me vingar... eu vou... eu vou pegar o Sirius e vou matá-lo com minhas próprias mãos! – a voz dele ainda era baixa, mas o tom sussurrado era de arrepiar.

- Severo! Pense! Ainda há tempo! Ainda há chance. Agora, pelo menos, nós temos certeza… Se, como você diz, Voldemort só pretende atacar os Potter no dia 31, temos alguns dias para tomar medidas urgentes...

Nesse momento, os dois foram interrompidos por uma barulheira vinda dos instrumentos de prata sobre a mesa. Várias mensagens urgentes de membros da Ordem. Pelo visto, os Comensais tinham decidido não esperar até a noite para iniciar a progressão do caos. Ataques, explosões, assassinatos em massa. Uma coruja atravessou a janela, voando majestosa e vindo pousar logo à frente do diretor. Severo reconheceu o lacre do pergaminho como sendo da Ministra em pessoa. Dumbledore imediatamente assumiu uma expressão firme e decidida.

- Severo, essa é uma questão da máxima importância: a segurança do Potter está ameaçada. Os três estão em grande perigo. Como você pode ver, não posso me deslocar e assumir pessoalmente a correção do meu erro, como deveria... – dizendo isso, tirou um pedaço de pergaminho do bolso da sua veste e entregou ao rapaz. – Tome isso. Vá para lá. Fale em meu nome. Use tudo o que sabe, conte a verdade, para convencê-los a sair de lá e assim que possível eu farei contato.

Foi a vez de Severo se surpreender.

- Eu… eu… Eu não posso. Thiago não confia em mim, não vai escutar o que eu tenho a dizer, mesmo que eu fale em seu nome. E Lílian... ela vai ficar desconfiada.

- A verdade é poderosa, Severo… A verdade é poderosa o suficiente para convencer…

- Eu não sou um herói adequado, professor Dumbledore. Numa hora como essa eu gostaria de ser, até… – Severo conseguiu completar com ironia amargurada. - Por que eu? Por que parece que fui eu o escolhido para proteger pessoalmente esse casal?

- Essas questões eu não sei se eu possa... ou se alguém possa... responder... O destino tem seus mistérios.. – Dumbledore suspirou pensativo. - Você pode ter certeza de que não é pela falta de méritos de outros, como os membros da Ordem da Fênix... Mas parece que quis o destino que coubesse a você essa tarefa, Severo... por isso, você deve usar toda a sua força, a sua inteligência, o seu talento... todo o seu coração. Não desista, não perca a esperança! Não se deixe dominar pelo desespero, Severo! O desespero só serve para aqueles que conseguem enxergar claramente através de toda a incerteza, além de todas as possibilidades. Nós não conseguimos, não sabemos. Sabemos o que precisa ser feito, embora pareça tão difícil que é quase loucura. Mas essa aparente loucura pode ser o elemento surpresa que precisamos diante do inimigo.

Como Severo baixasse a cabeça sem dizer nada, Dumbledore continuou:

- Nós dois sabemos que o inimigo é muito inteligente, e que ele tem uma malícia quase insuperável para planejar as coisas. Mas a única medida que ele conhece é o desejo, desejo de poder, e assim ele julga todos os corações. Dentro do coração dele não entra outra coisa. Assim, ele não consegue nem imaginar que as pessoas possam ser diferentes, possam ser altruístas, amorosas... E essa pode ser a nossa chance.

Severo parecia mais pálido e cansado, muito mais do que de costume, as olheiras escuras em volta dos olhos ainda mais profundas. Não parecia mais enfurecido, nem duro. Era tristeza o que Dumbledore podia enxergar no seu olhar quando se despediu, dizendo:

- Eu vou tentar.

^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^

[27 de outubro de 1981 – 10 h 49 min]


Severo desaparatou bem perto da casa. Caminhou uns poucos passos, até enxergar o portão. E então, simplesmente parou.

A semelhança da cena com a do seu sonho era tão grande que ele se sentiu chocado, fraco e carente. Lá estava ela, sentada no jardim da frente da casa, como no sonho. Tinha um enorme e ridículo chapéu de palha na cabeça, meio tombado de lado, e luvas amarelas. Cercada por flores, cuidando do jardim como se fosse uma trouxa, distraída e feliz. Os cabelos vermelhos esvoaçavam de leve, e alguns fios mais rebeldes cobriram seu rosto. Num gesto suave e descuidado, ela tirou o cabelo dos olhos com as costas das mãos, sujando a bochecha de terra. Não dava para ouvir daquela distância, mas Severo imaginou que ela estava cantando. Ela estava ainda mais bonita! Havia alguma coisa diferente... No olhar, no sorriso, na curva do queixo, na postura... Ela não era mais a linda adolescente, a moça charmosa que destruía os corações em Hogwarts. Não, agora ela era uma mulher. Jovem, mas madura, como uma rosa recém desabrochada. O que teria feito essa mudança? Severo se pegou especulando, enquanto acompanhava a direção do seu olhar. Então, ele viu. Pai e filho, o homem e o bebê. Tão parecidos que ficava óbvio mesmo à distância que era pai e filho. Os dois brincavam e riam, acenando para ela.

Severo sentiu um aperto no peito, e ficou subitamente nervoso, enxugando as palmas das mãos molhadas nas vestes. Chegou a dar um passo para trás, pensando seriamente em fugir dali. Mas parou, na mesma hora, lembrando-se do que viera fazer ali, aproximando-se do portão. E então, ela se virou e o viu.

- SNAPE?? Lílian deixou escapar o grito, arregalando os olhos de espanto.

Não era a recepção dos seus sonhos, mas o tipo de reação que ele mais ou menos esperava com a sua visita.

- Como vai, Lílian? Desculpe a intromissão, e o susto com a visita inesperada. Vim a mando de Dumbledore... – Severo disse, com voz educada e firme.

Thiago veio correndo, a fisionomia transtornada de espanto, raiva e medo, trazendo o bebê no colo e vindo se colocar à frente de Lílian, numa postura protetora.

- SNAPE? O que você está fazendo aqui? O que está acontecendo aqui?
Severo sentiu uma fisgada de raiva e constrangimento, empalidecendo ainda mais. Mas continuou no mesmo lugar, mantendo o olhar duro e firme encarando o outro.

- Posso saber o que você está fazendo aqui? Como conseguiu... – não conseguiu completar a frase, voltando-se para Lílian numa interrogação muda.

Lílian parecia ter recuperado a calma, olhando Severo com curiosidade. Ao perceber o clima, levantou uma mão fazendo sinal para Thiago ficar quieto:

- Ele estava começando a explicar, Thiago, que veio aqui por ordem de Dumbledore...

- Dumbledore? Dumbledore mandou o Snape aqui? – perplexo, ele perguntou, ainda olhando para Lílian. Em seguida, dirigindo-se para Snape. - Mas... mas que história é essa? Por quê? Por que Dumbledore mandaria você aqui? Justo você? – Thiago tinha abaixado o volume, mas mantinha o tom agressivo na voz.

- Porque suponho que seja prerrogativa do diretor escolher a pessoa que ele julga mais adequada para cada função... – Severo respondia com voz baixa e suave.

Perceber a irritação crescente de Thiago, a sua reação agressiva e descontrolada, tinha o poder de acalmar Severo, deixando-o quase satisfeito.

- Posso lhe garantir que não pedi esse encargo. – lançou um olhar de puro desdém na direção de Thiago, para em seguida se dirigir a Lílian, como se o ignorasse. – Dumbledore me mandou aqui com urgência para avisá-los que vocês correm perigo.

- Háháhá! -Thiago imitou uma risada debochada. – Conta aí uma novidade que a gente não saiba. Que tipo de piada doentia é essa?

- Bem, Potter... Por mais que eu pudesse apreciar o seu duvidoso senso de humor, o que eu tenho pra falar é sério. O amigo de vocês, aquele que vocês escolheram para ser o fiel do segredo... ao invés de escolher Dumbledore, como qualquer pessoa de bom senso faria... aquele que você, Thiago teve a brilhante idéia de confiar... – Severo dizia tudo isso com uma voz baixa e mansa, carregada de ironia. – Ele é, na verdade, espião do Lorde das Trevas, e revelou o segredo. Os Comensais estão de prontidão para atacar vocês dentro de, no máximo, 4 dias...

- MENTIROSO! SEU FILHO DA MÂE MENTIROSO DE UMA FIGA! – Thiago berrou, vermelho e espumando de raiva, pulando para agarrar Severo.

- NÃO! – Lílian gritou também, erguendo-se e pulando para se interpor aos dois. – Thiago, não!

- Quem você pensa que é para falar dos meus amigos, ranhoso? Lave a sua boca imunda antes de se referir a qualquer um deles! – Thiago ainda gritava, seu rosto a menos de meio metro do de Severo. – Como você ficou sabendo dessa sua história, hein? Foi o próprio Lorde Voldemort quem te contou, numa reuniãozinha amistosa, tete-a-tete? Mas não foi ele quem deu o endereço a você, não é, Snape?

Severo perdeu um pouco mais da cor, mas não respondeu. Thiago, transtornado, passava as mãos pelos cabelos eternamente despenteados.

- Não me interessa se Dumbledore, que tem um coração mole, acha que você se regenerou, eu não acredito, não consigo acreditar... Por que você se importaria conosco, com a nossa segurança ou não? Por que você se importaria comigo? Por que você faria alguma coisa, qualquer coisa, para me salvar? Eu sei que você me detesta tanto quanto eu detesto você!

- Não me importo. – Severo respondeu, simplesmente, a voz quase um sussurro. – Mas digamos que eu tenho uma dívida com você, Potter. Estou em dívida com você.

- Como é?

- Você salvou minha vida uma vez, não foi? Eu devo isso a você. Mesmo sabendo que você também armou para me matar e só desistiu na última hora...

- Ah, Snape... não me diga que você ainda... isso é ridículo, Snape. Depois de tanto tempo, de tudo o que estamos passando, não é possível que você ainda pense naquela brincadeira idiota na escola! Vê se cresce! É isso, então? É uma espécie de vingança, de revanche por ter feito papel de bobo? Você quer inventar essa mentirada toda pra se vingar de nós quatro?

- Você não está me ouvindo, Potter...

- Você está querendo se vingar de uma brincadeira boba de escola, envolvendo a Lílian, o Harry, nessa sua... historiazinha ridícula?

Severo lançou-lhe um olhar de ódio, respondendo apenas:

- Se a sua arrogância não permite que você enxergue a verdade do que estou dizendo, Potter, eu não posso fazer nada. Mas eu tenho o encargo de proteger vocês, quer você acredite ou não. Então, volto depois...
Fez uma mesura para Lílian e saiu, desaparatando dali.

- Mas é o fim do mundo! O fim da picada! O cara ter a coragem de vir aqui, na minha casa, falar na minha cara que meu amigo é um traidor ... e ele ouviu isso... DA BOCA NOJENTA DO PRÒPRIO VOLDEMORT!

Harry começou a chorar alto, e Lílian tomou-o do colo de Thiago. Estava pálida e assustada, e apertava o bebê no colo de um jeito protetor e possessivo. Ao ver a cena, Thiago caiu em si e a abraçou:

- Calma, meu amor! Isso não foi nada, me desculpa! É tudo mentira... me abraça.
Os dois ficaram assim, abraçados, com o bebê no meio, por longos minutos.


XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX

[28 de outubro de 1981 – 10 horas]


O dia anterior tinha inaugurado uma onda de violência e terror sem precedentes desde o início da guerra. Durante o dia, vários assassinatos tinham ocorrido. Bruxos do leste europeu tinham causado a perda de direção de um submarino nuclear soviético trouxa, que tinha ido bater em território inimigo, na costa da Suécia. O incidente diplomático era gravíssimo, poderia desencadear uma guerra mundial entre os trouxas.

Mas isso tinha sido só o começo. À noite, com a mudança da lua, os lobisomens atacaram. Chefiados por Greyback, eles se posicionaram próximos a lugares cheios de crianças, antes da transformação, fazendo com que ficasse mais fácil atacar o maior número possível de vítimas. Tinha sido uma longa noite para os membros da Ordem, lutando para proteger lugares e pessoas dos ataques dos Comensais.

Dumbledore batalhou a noite toda, depois compareceu a uma reunião atrás da outra, como membros da Ordem, com aliados de outros países, com espiões espalhados pelo mundo todo, com a Ministra da Magia... Muitos alunos em Hogwarts foram chamados as pressas para voltar para casa. As famílias estavam assustadas. As festividades para o Halloween foram canceladas. No meio de tudo isso, Dumbledore se preocupava por ainda não ter nenhuma notícia de Severo. Pelo menos imaginava que, enquanto nada chegasse era sinal de que todos estavam vivos.

Severo tinha escolhido dormir numa hospedaria bruxa da cidade vizinha a Godric’s Hollow. Tinha bebido praticamente todo o estoque de uísque de fogo do lugar e apagado. Sabia que sua missão não tinha terminado, mas precisava de um tempo, recuperar energias e pensar no que fazer em seguida.

Acordou com o sol forte no rosto. Tinha dormido vestido, apagado sobre a cama simples da hospedaria. Com um suspiro resignado e levantou da cama e foi tomar um banho. Tinha mais um dia longo e penoso pela frente.

~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~

[28 de outubro de 1981 – 10 horas 27 min]

Sirius não pensou muito para onde ia quando se pôs de pé e subiu na motocicleta pela manhã. Precisava de alguma coisa que o fizesse sentir mais calmo e relaxado, longe do horror da noite anterior. Precisava de casa. E há muitos anos tinha muito claro na cabeça onde era sua casa. Por isso, tomou a direção de Godric’s Hollow e voou para casa.
Thiago brincava com Harry no quintal. Fazia sol, e o bebê estava com um daqueles chapéus esquisitos de trouxa que Lílian chamava de boné. Harry foi o primeiro a avistar o padrinho ainda no ar e imediatamente começou a bater palminhas, todo feliz.

- E aí, cara?

- Fala!

Os dois trocaram tapas nas costas e socaram os punhos, naquela demonstração típica e corriqueira de carinho masculino. Sirius levantou o boné de Harry e descabelou o menino, fazendo os três rirem.

- E a Lily?

- Está lá dentro, entretida com alguma dessas coisas de trouxa... – Thiago riu. Em seguida, um pouco ansioso, perguntou: - E aí, conta, como vão as coisas na civilização?

Sirius assumiu uma expressão sombria. Puxou o ar e respondeu, tentando parecer displicente, mas sem encarar o amigo.

- Difíceis. Horríveis, pra ser sincero... Passei a noite em claro, teve luta pra tudo quanto foi lado! Ataques de lobisomem na ala infantil do St. Mungus, cara! – soltou o ar de uma vez, arrependendo-se imediatamente de ter contado isso.

Thiago empalideceu.

- E... e você viu o Remo?

- Não vi. Parece que os outros, a mando de Greyback, prenderam alguns lobisomens menos... dispostos a cometer essas atrocidades, em algum lugar nos subúrbios de Londres. Tinha um pessoal da Ordem investigando isso hoje de manhã quando eu sai...

Ele suspirou, virando o rosto para olhar o horizonte, pensativo.

- Acho que nem devia ficar te contando essas coisas, Pontas... Mas a verdade é que eu fiquei mal. Nunca me senti tão sozinho como ontem... Nunca senti tanta falta... falta de nós, dos Marotos, sabe? Daquela besta do Remo... – deu uma risada amarga. – O Pedro não deu as caras, sumiu... deve estar se c@&@#!* de medo, o coitado...

Deu um novo suspiro, sacudindo a cabeça, como se quisesse espantar aquelas imagens da cabeça, e sorriu:

- Ei, mas não vim pra falar disso. Vamos mudar de assunto! Conta aí, já começou a ensinar meu afilhado a jogar quadribol?

Thiago olhou para o bebê que bamboleava tentado andar no terreno acidentado do quintal e riu:

- Ah, sim, estamos treinando uns movimentos avançados... Chamo essa manobra de “caminhar na grama”...

E os dois amigos riram abertamente, olhando para o garotinho.

- Ah, Almofadinhas, isso é uma das coisas que eu sinto realmente falta.

- Do que? Dar risada?

- Quadribol... – Thiago respondeu, ainda rindo. – Uma boa partida de quadribol! Jogar, voando feito louco atrás do pomo... Ou assistir uma partida dos Cannons no estádio! – fez um ar sonhador, olhando ainda o filho. – Quando será que essa loucura vai acabar e a gente vai poder fazer essas coisas de novo, não?

- Bom, espero que quando a guerra acabar o Cannons consiga arrumar um time melhor do que antes... Meu coração não vai agüentar mais emoções fortes, depois dessa guerra toda... Lembra aquele jogo contra os Tornados que seu pai levou a gente pra assistir no estádio, que derrubaram o apanhador e o cara se arrebentou nas arquibancadas? Teve que ficar um tempo no St Mungus pra reconstituir todos os ossos do corpo? Depois ainda descobriram que o cara tinha engolido o pomo, lembra? – os dois riram muito, lembrando com saudades do passado. – Como é que era o nome do coitado?

- Acho que era o Stuart Quigley... Quem bateu nele foi o Roderick Plumpton, lembra dele? O apanhador dos Tornados? Já estava velho pra caramba na época.. Mas era um craque.

- E o nosso time era uma piada, cara... Fala sério! Quando o Quigley caiu todo mundo até ficou aliviado por terminar logo o tormento... Lembra do nosso lema? “Vamos todos cruzar os dedos e esperar pelo melhor”...

Os dois engasgaram de tanto rir, agora às gargalhadas, acompanhados por Harry que, mesmo sem entender nada, também ria e batia palmas.

- Ai, ai... Bons tempos... mas não sei se eu agüento mais tanto sofrimento... – Sirius voltou a falr, fingindo drama, com a mão no peito.

Thiago, então, encarou o amigo, subitamente sério.

- Sirius, eu sei que já te fiz prometer mil vezes antes... Mas dessa vez, quero pedir a sério.

- Hã? Prometer o que, figura?

- Se por acaso acontecer alguma coisa comigo... se eu morrer... Eu quero que você me prometa que você vai cuidar da Lílian e do Harry pra mim.
- Ah, vai, cara...que papo é esse?


- Vamos lá, Almofadinhas, eu estou falando sério. Se alguma coisa acontecer...

- Nâo vai acontecer nada com você.

Thiago sorriu.

- Sirius! Calma, cara,olha pra mim. Eu não estou falando que vai acontecer. Nem muito menos estou dizendo que eu quero que aconteça. Mas, você sabe, com tudo o que a gente tem enfrentado nesse último ano...

- Mas passou, vocês estão aqui, em segurança, pronto. Chega!

Thiago ficou mais sério, um pressentimento vago cruzou sua mente, mas não disse nada. Só voltou a insistir, sorrindo:

- OK, eu sei, não vai acontecer nada. E nós juramos viver pra sempre, lembra? Mas só por garantia... Eu quero de verdade que você me prometa isso.
- Ah, para com isso, cara. Que coisa! Não quero pensar nisso. Eu realmente não quero pensar nisso. Nâo depois da noite que eu tive. NÂO VAI ACONTECER NADA!

- Mas o que você quer que eu faça? – Thiago perguntou, perdendo finalmente a paciência. – É da possibilidade da minha morte que estamos falando, não é? Não é mais confortável pra mim do que pra você falar sobre isso... Mas por isso mesmo eu preciso que você me prometa..Você se lembra... Você lembra como a Lílian ficou quando os pais dela morreram, não é?

Sirius concordou com um aceno de cabeça, sem dizer nada.

- Então. Pensa bem, se acontecer alguma coisa comigo... ela vai ficar arrasada, vai precisar de ajuda. Nem que seja alguém que a leve um pouco pra passear, tire ela de casa... brinque com o Harry... Você, o Remo e o Pedro podem ajudar. Pelo menos por um tempo…

Fez uma pequena pausa, os olhos brilhando com lágrimas e sorriu, sonhador.

- Pelo menos no começo. Eu conheço a Ruiva, ela é forte, é dura na queda. Ela vai conseguir dar a volta por cima, se reerguer, criar o Harry. Mas o Harry...

- Pára com isso, Thiago, por favor! Que papo mais mórbido, cara! E depois, eu sou o padrinho do Harry, não sou? É claro que eu vou sempre cuidar dele.

- Eu sei. – Thiago mantinha o mesmo sorriso emocionado. – E além disso, é o melhor amigo do pai dele. e, por mais que eu ame a Lil, tem coisas que ela nunca faria.

- Tipo?

- Tipo levar o garoto no estádio pra assistir um jogo dos Cannons, comentar as jogadas, comer porcaria e roer as unhas de aflição... Eu quero que a vida dele seja o mais normal possível, Sirius. E, se ele não tiver o pai pra levá-lo a um jogo de quadribol... Tem que ser você, né?

Percebendo o quanto aquilo era importante para Thiago, Sirius se esforçou para tornar o assunto um pouco mais leve e finalemten respondeu.

- OK. É claro que eu juro! Eu, Sirius Black, padrinho de Harry Potter, juro solenemente que, se você morrer... Na verdade, mesmo se você não morrer, eu vou levar o Harry aos estádios, pra assistir todos os jogos de quadribol, vou garantir que ele seja torcedor dos Cannons, comer montes de porcarias com ele - não vou dar uísque de fogo pra ele antes dos... hmmm... 13 anos - e nós vamos entrar em montes de brigas junto, falando palavrão e dando p*$$@#@. Lembra daquela vez que nós resolvemos encarar a torcida dos Winbourne Wasps?

E os dois acabaram rindo de novo, voltando a relembrar o passado.

~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~


[28 de outubro de 1981 - 10 h 52 min]

Severo desaparatou dessa vez na parte de trás da casa. Ao ver que Lílian estava na cozinha, tomou fôlego e considerou que estava na hora de colocar todas as cartas na mesa. Bateu discretamente na porta.

- Como vai, Lílian? – Ele não pôde deixar de notar que ela não parecia surpresa dessa vez.

- Como vai, Severo? Eu imaginei que você voltaria...

- Sério? – ele levantou uma sobrancelha.

- Se você veio mesmo a mando de Dumbledore, não iria desistir por causa de mais uma discussão com Thiago, não é? – ela sorriu discretamente ao dizer isso. – Nenhum de vocês dois nunca se deixou abater por causa disso durante todos esses anos, não ia ser agora...

Ele lhe devolveu um sorriso irônico.

- Isso prova que você conhece a nós dois muito bem, Lílian. Você não se deixa influenciar pelas desconfianças que o seu marido tem de mim?

- Eu já disse a você uma vez, Severo. Se Dumbledore confia em você, eu também confio. Ele tem coração mole, com certeza, mas é o bruxo mais inteligente que eu conheço, não se deixaria enganar... Eu sempre disse que você era melhor do que aqueles nojentos que se tornaram Comensais, que eram seus amigos nos tempos de escola.. Que você era um bruxo brilhante. E capaz de atos de coragem, de bondade.... Eu estava certa, porque Dumbledore, que é o mais inteligente dos bruxos, confia em você. Agora só tem uma coisa que eu não entendo...

- O quê?

- Por que, Severo? Por que tudo isso? Por que vir aqui, enfrentar mais uma discussão com Thiago... eu sei que vocês dois se detestam...

- Porque eu tenho que proteger vocês.

- Eu não entendo... por quê?

Severo deu um suspiro. Tinha se prometido dizer a verdade, até o fim. O momento era decisivo demais para que ele pudesse se preocupar com coisas como a sua dignidade ou orgulho.

- Porque eu tenho que proteger vocês... não... você. Eu tenho que proteger você, Lílian. Porque a verdade... pode parecer ridículo... patético, mesmo...

- Severo, você está tremendo.

– Não, eu estou bem. – Ele enxugou as palmas das mãos suadas nas vestes, num gesto automático, passou as mãos pelo rosto. Então, puxou o ar com esforço e disse finalmente. – A verdade é que eu amo você, Lílian. Eu acho que eu sempre te amei. Jamais amei outra mulher assim em toda a minha vida. Tenho essa grande paixão por você há mais de dez anos, e acho que todo esse tempo ainda é pouco. Não sei se consegue acreditar numa coisa dessas, mas é a pura verdade.

Ele estava encarando-a enquanto dizia aquilo, esperando a sua reação. Temia que ela demonstrasse nojo, desgosto, descrença. Podia esperar pelo desconforto. Mas o pior seria se ela risse. O ridículo, era disso que ele tinha mais medo. Ficou estudando a fisionomia dela enquanto falava, e depois, quando ficaram em silêncio. Pôde perceber notar o espanto inicial.

- Eu não disse isso para embaraçar qualquer de nós dois, por favor. E nem pense que tenho alguma pretensão... eu sei o quanto você ama aquele... Potter.

Deu um sorriso irônico e complementou, tentando aliviar o clima estranho:

- Infelizmente, você tem um péssimo gosto para homens...

Ela riu, e então fez algo que o surpreendeu completamente. Segurou suavemente o rosto dele com as duas mãos e deu um beijo leve nos seus lábios.

- Eu acredito. É claro que acredito. Basta olhar nos seus olhos. E fico lisonjeada, Severo. De verdade. – Ela ainda sorria, observando aquele rosto masculino, sofrido e feio à sua frente. – Não sei se você tem razão em achar que tenho mau gosto... mas tem toda a razão quando diz que eu amo Thiago. Amo muito, loucamente... acho que sempre amei. Acho que nuca houve outro no meu coração, na verdade. Por isso consigo entender um pouco o que você me diz. E sinto muito que tenha que ser assim...
Severo não pôde evitar um suspiro de alívio.

- Então você acredita em mim? Acredita no que eu disse a respeito do perigo... de tudo mais?

- Acredito em você, Severo. Eu já confiava em você por conhecer um outro lado seu que talvez só Dumbledore conheça. Lembra do tempo em que fomos parceiros nas aulas de Poções? – ela sorriu com a lembrança. Depois encarou-o, com seriedade. – E confio ainda mais depois do que você me disse agora.

Quase como se ela adivinhasse o que ele estava pensando, ela completou:

- Pode ficar tranqüilo, ninguém nunca vai saber de nada do que falamos aqui.

- Então... então...Você sabe que precisa fugir. Vocês precisam sair daqui. Eu ouvi... você tem acreditar no que eu ouvi...

- Severo... – ela respondeu, segurando a mão dele de um jeito carinhoso. - Eu disse que acredito em você. Eu vou falar com Thiago.

Os dois ouviram, nesse instante, uma grande algazarra se aproximando.

- Agora eu acho melhor você ir... Deve ser o Thiago e o Sirius, mortos de fome, vindo almoçar. E eu não estou disposta a assistir mais uma cena entre vocês... Vá!

Sem dizer nada, Severo se afastou, e assim que atravessou a porta da cozinha, desaparatou.

XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX


E aií, moçada? Dei muito susto em vocês? Hihihi... serviu pra dar uma desestressada, pensar no alvoroço do povo achando que eu estava ficando louca...
Sobre aquela figura que eu postei no trailer, que eu achei tão linda que merecia arrumar um lugar pra ela... Está no devianart : http://severus-hermione.deviantart.com/. Autoria de http://azraelgeffen.deviantart.com/azrael
Eu só montei o título e as observações...

Esse capítulo foi feroz, deu o maior trabalho! Foi meio desgastante emocionalmente, e ficou muito grande, eu queria cortar alguma coisa não consegui... Espero que gostem. A solução que eu encontrei foi tirar o dia 30 e colocar no próximo, junto com... O FIM DA GUERRA.
Caíram na história do sonho do Snape? De novo? Tadinho dele... era só um sonho... Espero surpreender vocês um pouquinho ainda, mesmo sendo uma história que a gente já sabe como é que termina...
Bom falando sério, alguns coments:
1. reação do Snape: lembram-se do ódio do Snape pelo Sirius, principalmente no PA? Pois é...
2. Sentimento do Remo pela Lílian: há um tempo atrás, a JKR deu uma entrevista dizendo que o filme 3 tinha falado umas coisas que não estavam nos livros, mas que eram uma espécie de transmissão de pensamento de coisas que ela pensava, e que ainda iam aparecer. Uma dessas coisas era uma fala do Remo para o Harry, falando sobre a mãe dele: como eles tinham sido amigos, como ela era capaz de enxergar a beleza onde ninguém mais enxergava... Saiu um boato na internet que Lupin era apaixonado pela Lílian. A JKR desmentiu, mas confirmou que eles tinham um relacionamento especial.

3. Severo em Godric's Hollow? Acho que muita gente já desconfia que nosso amigo seboso esteve lá... Mas eu pincei uma fala dele no Prisineiro de Azkaban, quando ele enfurecido diz a Harry: "Teria sido bem feito que Sirius o tivesse matado! Você teria morrido como seu pai, arrogante demais para acrditar que poderia ter se enganado com um amigo..." e pensei: como ele sabe que Thiago foi avisado sobre a traição do amigo e não acreditou? E quem mais seria a pessoa a avisar Thiago se não ele mesmo? E, é claro que Thiago não ia acreditar num aviso do Snape... Snape não sabia que o aviso era sobre Pedro, pensou que era Sirius o traidor (o que mostra que ninguém soube mesmo quem era o verdadeiro fiel do segredo, e que Voldemort sabia bem guardar segredo sobre a identidade dos seus espiões)

4. Quadribol: numa discretíssima homenagem ao Bernardo, nossos heróis são torcedores do Cannons que, na década de 70, segundo o livro Quadribol através dos Séculos, era tão ruim que mudaram o lema para “Vamos todos cruzar os dedos e esperar pelo melhor”. Tadinhos... eu sou corintiana, sei como eles se sentem...hehehehe...

5. O caso do submarino soviético: de novo, foi verdade, nesse dia mesmo. Está na Wikipedia: http://en.wikipedia.org/wiki/U_137. É, os Comensais estavam à solta...

6. A reação da Lílian à declaração de amor do Severo... Forcei a barra? Hmm...talvez, porque eu adoro o Severo. Mas tem precedentes... Alguém aí assistiu "Simplesmente Amor"? Lembram do cara apaixonado pela mulher do melhor amigo? A cena do filme me "inspirou" um pouco a criar essa cena Severo e Lílian... E aí, ficou tudo explicado? Lilian ama Thiago que ama Lílian... Severo ama Lílian que ama Thiago que ama Lílian... hihihi...E Remo e Lílian são apenas bons amigos...

Bom, eu queria agradecer de montão os comentários, todos cheios de elogios, que eu adorei! Fiquei super feliz em saber que a Belzinha e a Sally curtiram as homenagens! A vocês que comentaram, em especial
Sally
Belzinha,
Morgana Black

Bernardo
Meu MUITO OBRIGADA! Que bom que gostaram, que acharam que está verossímil, que curtiram alguns detalhes que coloquei ao longo do capítulo! Espero que continuem curtindo!
A quem deixa um recadinho pequenininho, super obrigada! E a todo mundo que veio ler e ficou quietinho, obrigada também!!

Quanto à capa nova??? CADÊ ? Sorcerer, cadê você? Achei que o tempo estava passando, era melhor postar o cap. assim mesmo...
Bom, galera, A M O VOCÊS! Até a próxima, em breve com...


CAPÍTULO 18: O FIM DA GUERRA...

E preparem-se, porque ainda muita coisa vai acontecer antes de Vocês-sabem-quem fazer vocês sabem o quê....

Beijos!











Compartilhe!

anúncio

Comentários (0)

Não há comentários. Seja o primeiro!
Você precisa estar logado para comentar. Faça Login.