A sós



Draco a encarava divertido, talvez um pouco surpreso.
- Do que você está falando?
Hermione jogou-se em uma poltrona, observando a ponta dos dedos, entre ansiosa, triste e confusa.
Ah, meu Merlin! – Draco pensava...- A garota endoideceu.
Hermione continuava olhando para a própria mão. Havia ensaiado o que diria enquanto esperava a resposta dele... Mas as palavras faziam uma dança louca em sua cabeça, talvez acompanhando seu estômago, que parecia ensaiar uma rumba. A senhorita-sabe-tudo estava sem palavras, sem respostas.
Draco deixou o ar escapar devagarzinho pelos lábios. Jogou a franja para o lado com um movimento de cabeça, sem desviar os olhos dela. Não entendia porque aquela maldita sangue-ruim estava ali, roubando-lhe preciosos minutos de solidão. Entendia apenas que algo de errado acontecera com os planos dela em relação ao fim de semana com o Cicatriz... O garoto-maravilha aprontara alguma, de novo. E lá estava ela, na sua frente, pedindo ajuda. Como se ele fosse um step desses carros trouxas. Era sempre Harry para cá, Harry para lá. Todos só sabiam suspirar de orgulho pelo garoto que derrotou Voldemort. Mas ninguém, ninguém mesmo, pensava nele, Draco. Ninguém imaginava como fora crescer à sombra daquele homem, que se dizia seu pai. Ninguém imaginava como era ter o fantasma dele, bafejando em suas costas em todos os cantos daquela maldita casa. Ninguém nunca perguntara se ele sentia falta da mãe, se não se sentia sozinho. Até mesmo aquela garota à sua frente, com os cabelos desgrenhados caindo pelos ombros, sem coragem de encará-lo, estava pensando em Harry Potter. Que fossem todos para o inferno!
O rapaz a deixou ali, contemplando seus dedos e saiu com passos largos e decididos do hall. Assim que dobrou o corredor, encostou-se na parede, rangendo os dentes. Por que diabos a sombra do Cicatriz não o abandonava?

Os olhos de Mione ainda focavam suas mãos, mas sua visão periférica, seus ouvidos, seu olfato, lhe diziam que Draco já não estava ali. Definitivamente, não havia sido daquela forma que ela imaginou aquele momento. Havia se imaginado madura, muito segura de si, dizendo com todas as letras a Draco o que esperava dele. Em sua mente até ensaiou algumas respostas às ironias que certamente ele lhe diria a princípio. Mas ele mesmo havia dito que se sentia atraído por ela. Afinal, ele era um homem, e ela uma mulher.
Ela tentava se convencer com este argumento, mas uma vozinha bem chata ainda a incomodava. Isso basta, Hermione? O fato dele ser um homem e você uma mulher, basta? Ela sacudiu a cabeça, tentando fazer o pensamento escorregar pelas orelhas. Não queria mais pensar a respeito. Passou tempo demais idealizando coisas, tentando fazer tudo de uma forma perfeita. Jamais admitiu para si mesma que estava apaixonada pelo Harry, porque isso estragaria uma amizade perfeita. Sempre estudava demais, porque tinha de ser uma aluna perfeita. Nunca permitiu que um homem tivesse um contato mais íntimo com ela, porque queria uma experiência perfeita. Estava cansada de esperar por essas perfeições, essas esperas só lhe causavam decepções, então ela queria livrar-se daquilo tudo. Achou que indo até ali, agindo como achava que uma adulta agiria, estaria provando para si mesma que não era a mesma. Talvez porque achasse, que aquela Hermione era incapaz de esquecer Harry. Aquela Hermione não podia deixar de amar os olhos verdes profundos, os cabelos negros desengonçados, não podia perder o amor por todos os momentos maravilhosos que passaram juntos. Para esquecê-lo, para deixar de amá-lo, ela precisava mudar, tornar-se outra Hermione. Uma Hermione mais forte, melhor, mais madura.
E fora por isso que ela tinha ido até ali. Sentia-se atraída por Draco, e imaginou que era isso que a nova Hermione deveria fazer. Viver a vida, sem medos, sem arrependimentos. Se ela o queria, que assim fosse, que o tivesse! Queria ser mais livre, dentro de si mesma. Talvez assim, sendo uma nova pessoa, ela deixasse os sentimentos da antiga para trás.
Hermione ergueu a cabeça, tomando fôlego. Precisou dessa conversa interna para lembrar a razão pela qual decidiu ir até ali, e agora se sentia mais confiante. Precisava achar o Draco, e levar o plano até o final. Precisava de libertar de seu “eu” medroso.
Seus olhos se encontraram com a névoa dos olhos dele, que a observavam. Ele estava encostado na parede, próximo da porta pela qual saíra poucos minutos atrás. O sorriso de lado estava ali, cristalizado, e ele parecia divertir-se muito com alguma coisa.
- Tomando coragem para algo, Granger?
Ela se ergueu e o encarou. Estava recomposta e já esperava pela ironia dele, naquele irritante sotaque arrastado.
- Estava apenas testando sua paciência, Malfoy.- ela sorriu, o que foi um erro. Ao contrário de toda a segurança da fala, o sorriso traiu seu nervosismo.
- Muito bem, já testou o suficiente? – o loiro retomou a conversa. – Vai me dizer porquê veio até aqui, ou vai ficar olhando para seus cabelos agora?
- Eu já disse. Eu vim porque preciso da sua ajuda. Não se faça de inocente, não combina com você.
- Ok, então você quer ser direta? Por mim tudo bem.

Draco se aproximou dela, o sorriso congelado. Os olhos estavam turvos, com uma luz estranha. Mágoa talvez?
Hermione ficou estática, esperando para ver o que ele faria. Para sua surpresa, ele não a procurou com os lábios, como já fizera outras vezes. Seus dedos foram direto até sua blusa, e começaram a desabotoá-la. Espantada, Hermione deu um passo para trás, empurrando as mãos dele.
- O quê, o quê você está fazendo?
Draco ajeitou o cabelo, a encarando divertido.
- Ué, o que você me pediu. Você não pediu para que eu a ajudasse a crescer? Estou te tratando como um homem adulto trata uma mulher adulta que vai até a sua casa se oferecer a ele.
Hermione o encarava estupefata. Os olhos se encheram de lágrimas, que ela não podia controlar. Esperava ironia, gracejos, até zombaria por parte dele. Mas não aquela frieza, o desprezo que ele estava demonstrando. Toda a sua coragem se foi, e ela só conseguia pensar que ter ido até ali fora um erro. No fundo, ele nunca havia deixado de ser o nojento desprezível que ela conhecera no colégio. Devia ser um machista chovinista, que não podia aceitar que uma mulher pudesse escolher quando e com quem fazer sexo.
Juntando o que restava da sua dignidade, ela passou por ele, com a coluna ereta. Não ia ficar nem mais um minuto ali. Aquele seria seu primeiro ato como uma mulher madura: não precisar de um homem para nada.

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