Capítulo VIII



Harry Potter © J.K. Rowling




Capítulo VIII




Wondering if the world would be so beautiful...
Imaginando se o mundo seria tão lindo...
If I had not looked into your eyes.
Se eu não tivesse olhado dentro dos seus olhos.




Amanhecera nevando pela primeira vez. O vento e os flocos de neve batiam nas arvores de copas brancas e deixavam camadas sobre camadas no gelo. Poderia ter parecido uma péssima manhã para qualquer um, mas para Sirius estava ideal. Nada melhor do que um dia de nevasca para ir a Hogsmeade.

-- Onde está Lílian? – Jane chegara a fila onde os alunos esperavam para Filch organizar a saída de todos.

-- Ela não vem. – comentou Lena, enrolada em seu cachecol grifinório. – Diz ela que está frio e que gosta do castelo vazio. Pode organizar os pensamentos.

Sirius riu de leve, os olhos ainda tinham resquícios de sono, o sobretudo negro caindo até os joelhos.

-- Acho mesmo que depois do porre dela, ela está com vergonha.

-- Ora, ela nem deu vexame. – rebateu Lena, pensativa. – Só estava um pouco mal, e Tiago cuidou bem dela.

-- Ela já o agradeceu, alias? Gostaria de ver isso. – comentou Remo.

-- Acho que ainda não. – Lena riu, enquanto partiam para os jardins, o vento frio quase cortando o rosto deles, como facas.

Remo e Jane despediram-se dos amigos, dizendo que dariam um pulo primeira na loja de pergaminhos e que depois eles se encontravam no Três Vassouras. Sirius e Lena se viram sozinhos, e isso parecia absurdamente relaxante.

– Falando nisso, onde está Tiago?

-- Acho que acabei de descobrir. – Sirius ergueu as sobrancelhas, passando a mão pelos cabelos. – Ele veio com um papo de que a festa o cansara muito e que ele preferia não ir. Uma festa cansar Tiago Potter? – ele revirou os olhos. – Poupe-me.

Lena riu, enfiando o braço camarada no de Sirius, enganxando-se a ele.

-- Acho que ele está tramando algo. – Lena sorriu com os olhos enquanto adentravam na rua de Hogsmeade. – Preciso me lembrar de trazer uns doces para Lil.

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Tiago realmente estava tramando alguma coisa. Mas nada demais, nem um plano mirabolante que nos antigos anos ele tramaria. Só pretendia passar o tempo com Evans. Pretendia, porque no momento estava dormindo tranquilamente.

Quando Lílian entrou nos dormitório masculino, o relógio no pulso marcava 7h25, Tiago tinha a cabeça enterrada no travesseiro. Ele praguejou o susto que tomara e abriu os olhos apenas o suficiente para poder enxergar o intruso. Desistindo de ver sem os óculos, arrastou a cabeça para debaixo do travesseiro e murmurou:

-- Sim?

-- Tiago, é Lílian.

Ele sorriu, satisfeito com a visita.

-- E aí, como vai?

-- Bem.. um pouco de dor de cabeça. – uma pausa enquanto ela encarava o emaranhado de cobertas que era o homem. – Acho que acordei você.

-- Está certa. – respondeu, direto. Lílian mordeu o lábio mais uma vez surpresa com o fato de que as palavras na boca dele nunca pareciam grosseiras.

Estava dolorosamente claro que Tiago Potter não era uma pessoa matinal.

-- Sinto muito, sei que é cedo. – ela sorriu de leve, sem saber o motivo. – Para um domingo.

-- Então, ruiva. Duvido muito que seja para isso que está invadindo meu dormitório. Principalmente quando todos os outros alunos foram a Hogsmeade.

-- É... de fato. – ela remexeu nos cabelos, levemente nervosa. – Acho que você ainda não olhou como está lá fora pela janela.

-- Duçura, eu ainda nem olhei além de minhas pálpebras.

-- Está nevando. Temos pelo menos uns 20 centímetros de neve lá fora.

-- Certo. – ele retirou a cabeça de baixo do travesseiro, mas continuou de olhos fechados.

Ela encarou as belas feições do maroto e tomou ar.

-- Adoro neve, sabe. – sentou-se casualmente na borda de sua cama. – E não tenho companhia... estive pensando, você não quer dar uma volta na propriedade?

Ela viu uma das sobrancelhas dele erguer-se.

-- Então, você não tem companhia e eu sou a ultima opção, ou você verdadeiramente quer minha companhia?

-- Eu quero sua companhia. E acho que estou te devendo. – ela pousou a mão sobre o peito dele, e ele sentiu seu coração aquecer com aquele contato inesperado. – Obrigada por ter cuidado tão bem de mim, não costumo beber muito sabe.

Ele sorriu por completo, mostrando os homogêneos dentes brancos. Então, com um impulso, sentou-se na cama (Lílian percebeu desconcertada que ele dormia sem camisa), e pegou seus óculos abrindo os olhos e encarando-a pela primeira vez.

Nem um louco seria capaz de dizer não para aquela mulher. Não naquela manha.

Lílian Evans estava ainda mais maravilhosa que o costume. O sobretudo que caía até os joelhos e levava uma faixa apertada na cintura era negro, e um cachecol verde oliva protegia seu pescoço chegando até seus lábios. O gorro enfiado na cabeça era da mesma cor. Os cabelos dela rugiam soltos e desarrumados e a face estava avermelhada devido ao frio.

-- Você é maravilhosa... – ele comentou sonhador, enquanto passava os nós dos dedos na curva do rosto alvo e delicado dela. Ele viu quando os olhos da mesma cor que o gorro e o cachecol brilharam apreensivos para ele. – Vou me aprontar, espere aqui.


Em vinte minutos, ambos andavam pelos jardins brancos, com um copo de café para viagem nas mãos, cachecóis e sobretudos rugindo ao vento.

Lílian riu dos comentários de Tiago sobre os professores e viu-se se divertindo. Engraçado, ela sempre se divertia quando estava junto dele.

E assim a tarde foi passando, ambos andaram, conversaram, beberam café, almoçaram, conversaram, andaram, riram.

-- Quem está aí? – ouviram a voz ressonante de Hagrid quando bateram a sua porta.

-- Sou eu! – respondeu Tiago, sorrindo.

-- Ora! – exclamou o gigante quando abriu a porta com um sorriso acolhedor no rosto, a barba negra levava indícios de flocos de neve, os mesmos que ainda caiam do céu. – Quando tempo vocês não me visitam. Ah, ora. Vejo que Srta. Evans veio junto. – ele sorriu quando abriu espaço para que os dois passassem.

-- Por que não foram a Hogsmeade?

-- Ah bem, decidimos curtir sozinhos. – sorriu Tiago, sem rodeios enquanto sentava-se em uma das enormes poltronas, o cachorro de Hagrid acostumado com ele, bufando em seu colo.

Lílian jurara ter notado um brilho divertido nos olhos de Hagrid, mas provavelmente fora apenas sua imaginação.

Os dois conversaram com Hagrid por uma hora. Beberam cerveja amanteigada, mas não se arriscaram com os bolinhos. Quando voltaram aos jardins, os flocos ainda caiam incessantes. E a propriedade continuava deserta.

-- Então, pelo visto está realmente divertido por lá. – comentou Lílian, enfiando as mãos nos bolsos e puxando o cachecol mais para cima, deixando apenas os olhos verdes vivos de fora.

-- É, espero que se lembrem de trazer minhas bombas de bosta.

O olhar que ela lhe lançou foi duro, mas ao mesmo tempo divertido. Ele se sentia feliz ao notar que a cada dia que passava com ela, aquele já conhecido brilho de alegria e luz brotava nos olhos dela com mais facilidade.

-- Por que você não foi? – questionou ela, enquanto o vento cortava o que restava de pele descoberta.

-- Não lhe parece obvio? – ele sorriu enquanto andava, as mãos também nos bolsos.

Ela encarou-o de canto de olho, erguendo uma sobrancelha. Percebeu novamente o quão bonito e másculo ele lhe parecia naquele sobretudo creme, masculino. Os botões no peito largo pareciam acolhedores e de repente ela sentiu uma vontade absurda de enfiar a cabeça ali e dormir pra sempre.

-- Na verdade, não. – respondeu por fim, os olhos voltando a fixar-se em frente.

-- Queria passar esse tempo com você. – replicou, parando de andar. Esperou ela parar também e estendeu a mão, amassando seus cabelos e acariciando seu nariz descoberto. – E só com você.

Imediatamente ele viu os olhos dela nublarem um pouco, e ficarem mais distantes. Ela abaixou o cachecol, desviando os olhos.

-- Não se feche para mim, Lílian. – ele pegou seu rosto pelo queixo e fez com que ela o encarasse nos olhos. – Sempre que falo de você, você tende a fazer isso.

Ela não disse nada, apesar mordeu o lábio.

-- Ando achando isso uma loucura. – ela riu. – Estamos nos dando muito bem. Íntimos.

-- Vamos ficar mais ainda.

-- Não tenho bem certeza a respeito disso.

Ele sorriu enviesado.

-- Está brincando. Já está claro! – ele passou a mão do queixo para a nuca, agarrando-lhe delicadamente os cabelos fogo. – Vou te beijar de novo, e ver se as bombas explodem de novo. – uma pausa enquanto ela encarou-o surpresa. – Caso explodirem, eu estou certo. E você vai acabar vendo isso.

Ela começou a responder, mas suas palavras não viraram mais que um suspiro quando sua boca encontrou com a dele. E quando os lábios cheios e macios dela tocaram os seus, ele sentiu como se aquele fosse o primeiro gole de vinho após ter atravessado o deserto.

E as bombas explodiram. Embora aquele estivesse sendo apenas um firme e forte toque de lábios, ela podia jurar que o chão tremera sobre seus pés.

Dessa vez Lílian não o empurrou. Sentiu-se frágil como uma boneca pequenina quando ele acariciou seu rosto e seus cabelos.

Ele não aprofundara o beijo em momento algum, e se assustara ao perceber a intensidade dos sentimentos dos dois.

Lílian decidira: iria deixar-se levar, como ele mesmo sempre dissera que deveria. Seria a Lílian simples que sempre fora com todos. E quem sabe, alguma coisa grande não acontecia?

Quando ela abriu os olhos, ele notou um leve brilho de timidez. Sentiu que ela desviaria os olhos se não fosse a intensidade com que a encarava, proibindo-a de quebrar o contato. Ele suspirou, e ficou encarando-a e absorvendo todas as suas feições, como um desenhista que procura gravar os pontos fortes para depois desenhá-la com perfeição. Enquanto perdia-se nas sardinhas ruivas em seu nariz, percebeu que já chegara o fim da tarde, em qualquer momento os alunos de Hogsmeade chegariam. Como aquele dia passara rápido!

-- Está livre? – perguntou ele.

Meio intrigada, ela inclinou a cabeça.

-- Para um jantar cedo.

-- Bem. – o convite, quase casual, a agradara. – Me parece bom. – ela tomou a mão dele, rindo. – Gosta de costeletas assadas?

-- E quem não gosta?

-- Excelente. – ela riu de novo. – Espero que saiba ligar uma grelha.

-- Como assim? – ele franziu as sobrancelhas. – E os elfos?

-- Na maioria das vezes, prefiro cozinhar a esperar que cozinhem pra mim. – ela sorriu, encarando-o. – Não se preocupe, sou uma cozinheira razoável.

Se julgasse apenas o rosto de porcelana, ele duvidava que ela soubesse distinguir uma ponta do fogão da outra. Mas, ele sabia que Lílian era toda surpresas e delicias.

-- Só razoável? Porque eu sou ótimo.

-- Detesto me gabar, mas eu sou sensacional. – ela ergueu as sobrancelhas. – Não queira me desafiar.

-- Não. – ele abanou a cabeça. – De forma alguma.


Did nobody ever tell you,
Ninguém jamais te falou que
You're the best thing that has ever been?
Você é a melhor coisa que já existiu?


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Para Lena, Hogsmeade sempre fora um lugar de sonhos. Antes mesmo de saber de sua existência, ela já imaginava. Imaginava aquelas casinhas, com telhados cheios de neve. Imaginava os vendedores sorridentes e o barulho de risos e conversa animada. Ouvia em seus sonhos, a caixa registradora abrindo e fechando cheia de galeões e nuques.

Agora, já cheia de sacolas de doces e ao lado de um Sirius carregado de materiais da Zoonko’s, ela sorria.

-- Onde será que foram Remo e Jane ein?

-- Ora, Lena. Deixe-os passear um pouco.

Ela riu, assentindo.

O fluxo de pessoas era contínuo, o farfalhar de vestes pesadas contra o frio invadia toda a rua. Ela encarou o homem alto ao seu lado e sorriu por dentro, ela o estava amando. Como será que ele lidaria com isso?

De fato, Lena nunca quisera nada em troca de seus sentimentos. Sempre amara as suas pessoas cegamente, sem esperar nada em troca. O chamado amor incondicional. E agora sentia aquilo por Sirius.

-- Ah. – ela encarou-o. – Venha até aqui, quero te mostrar um lugar.

Pegou sua mão e saiu em disparada, os cabelos e as sacolas balançando.

Em menos de cinco minutos, Sirius se viu num lugar desconhecido de Hogsmeade. E ele julgara que isso fosse impossível.

-- Nossa, nunca vim aqui.

-- Costumo vir sozinha, pra pensar e claro... ir no balanço!

-- Ir aonde? – mas foi em vão, ela já tinha disparado morro acima, e ele seguiu-a correndo.

No topo do monte nevado, ele encontrou dois balanços, solitários e cobertos de neve. Eram típicos balanços trouxas e ele se surpreendeu ao encontrá-los ali. Mas não pôde pensar em mais nada, por Lena já se acomodara em um deles e berrara para ele.

-- Venha me impulsionar!

Ele sorriu e obedeceu, empurrando-a alto. Os cabelos castanhos estavam milagrosamente soltos e balançavam para frente e para trás, conforme o ritmo do balanço. Ele observava a fumaça sair de sua boca quente no ar frio, ela ajudava com as pernas para ir ainda mais alto. E de repente, ele se sentiu completo.

-- Mais alto!

-- Se você for mais alto, caíra de nariz no chão.

-- Eu caio de pé! – riu ela de volta.

Ela absorvia todos os sons do local. Ao longe ainda ouvia a conversa e o burburinho dos estudantes, ouvia ainda o vento que uivava de leve, ouvia galhos quebrando e os sons característicos dos animais do campo. Mas, acima de todos esses sons ouvia a respiração tranqüila de Sirius atrás dela.

Então, fechando os olhos e aproveitando o vento, ela jogou a cabeça para trás e Sirius viu-se quase ofegando com a beleza prazerosa daquele rosto. Os lábios estavam curvados num sorriso sonhador e os olhos fechados. O rosto emoldurado pelos cabelos escuros.

Cinco minutos depois, eles estavam sentados em plena neve e ela sorriu, feliz.

-- Ah! Isso é muito bom! Lembra-me minha infância, a você não?

Ele riu e arrumou os cabelos, abanando a cabeça.

-- Na minha família era questão de pouca classe e desorganização ter crianças rindo alto e se embalando abobadamente.

-- Oh. – exclamou, erguendo as sobrancelhas. – Que terrível.

Que homem estranho era ele, pensou Lena beijando-lhe delicadamente os lábios. Tão calmo, despreocupado e brincalhão de um lado, tão impelido por demônios do outro.

-- É – concordou, sorrindo ao retribuir o pequeno beijo. – Por isso depois acabei me esbaldando nos Marotos. – ele riu. – Você nos acha criança, Lena?

Ela encarou-o, olhos cerrados.

-- De forma alguma, são mais maduros do que metade do colégio.

-- Agradeço imensamente, senhorita.

Ela sorriu e ergueu-se, pensando no homem bom que Sirius tinha se tornado, contrariando toda a família. Foi quando eles estavam descendo de volta a estradinha, que duas garotas sorridentes e de cabelos ao vento passaram por eles. Ela notou que Sirius espichara o olhar em direção a elas.

-- Retiro o que disse.

-- O que? – respondeu ele, confuso.

-- Eu estava pensando em como você é um homem gentil, gentil até demais, mas evidentemente você é também um crápula repulsivo.

-- Ora, o que é isso? Um crápula até simpático.

Ela riu junto dele enquanto enfiava seu braço no dele, para seguirem juntos.

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A cozinha era antiga conhecida dos dois, principalmente de Tiago. Mas após sete anos estudando ali, eram poucos os alunos que nunca a tinham visitado. Eles fizeram cócegas na pêra e entraram no aposento. Aposento? Lílian ergueu a sobrancelha, sempre assombrada com o tamanho. Salas e mais salas com tudo o que se pode imaginar, desde fogão elétrico, até fogão a lenha. Três tipos de grelhas, aparelhos enormes, o aço inoxidável brilhando para eles. Tudo era muito branco, inclusive os aventais, luvas anti-queimaduras e chapéus de cheff que ficavam a disposição do visitante.

Em menos de cinco minutos eles dispensaram os elfos, que sumiram com rapidez e eficiência. E se viram sozinhos em meio à enorme cozinha. Eles retiraram os casacões e cachecóis e Lílian também despiu o gorro. Ela tentou não olhar enquanto Tiago arregaçava as mangas da camisa branca até o cotovelo, e tentou não pensar em como seus antebraços eram fortes.

-- E então? – foi ele quem falou primeiro. – Por onde começamos?

-- Procurando comida, quem sabe? – ela riu e se encaminhou para uma das varias portas presentes ali naquela primeira ala. Abriu-a e encontrou algo muito parecido com um mercado sem as caixas registradoras. Apenas um dos mercadinhos-abastecedores. – Ei, porque não procura algo para beber enquanto eu pego o que preciso aqui?

Ele sorriu para si mesmo, porque ela parecia tão confortável escolhendo legumes e carnes, o agasalho verde parecia quase tão macio ao toque quanto seus cabelos. Ele suspirou, e partiu para realizar o que ela sugerira.

Quando voltou, encontrou uma cozinheira. Lílian já vestira o avental maravilhosamente branco, e o enorme chapéu de cheff lhe subira a cabeça. Os cabelos foram rapidamente presos em um coque displicente, e ela estava radiante.

-- Você tem potencial. – comentou ele.

Ela virou a cabeça para encará-lo e sorriu com os olhos.

-- Ora, obrigada. Que bom que assume. Não é mau perdedor.

-- Isso é porque eu nunca perco. – aproximou-se.

Ela riu e pousou a mão sobre o peito másculo dele, descansando a mão sobre seu coração. E pareceu um gesto tão casual que quase foi capaz de deixá-los sem jeito, isso se os dois não tivessem sorrido um para o outro.

Eles rumaram até a outra ala, a ala de grelhas, churrasqueiras e utilidades. Ela sorriu para a grelha modesta e indagou.

-- Por que não acende isso, que vou preparar uma salada?

Em seguida, rumou para a ala do inicio e postou-se de frente para a pia, o sorriso incessante ainda nos lábios.

Tiago não era nem de longe um chato e detestável como ela pensara que fosse, pensou ela. Com um meio sorriso, começou a lavar alguns legumes frescos. Adorava o riso dele, aquecia-a toda. Imaginava se ele sabia. Cantando com a boca fechada, começou a cortar o tomate.

Ele a olhava da entrada. Podia ver que Lílian tinha um sorriso nos lábios, e perguntava-se se os olhos emanavam aquela luz que ele já se acostumara. Usava a faca com a descuidada confiança de alguém habituada a afazeres domésticos. Num fácil movimento, jogou os cabelos já soltos para trás, que ondularam feito labaredas.

Por que uma cena tão simples o atraia tanto? Só de olhar aquela cena estranhamente domestica, só de olhar para ela parada diante da pia da enorme e brilhante cozinha, as mãos ocupadas, a voz cantarolando, a água correndo da torneira, ele já se sentia relaxado.

O que havia nela que o fazia querer levantar os pés e encostar a cabeça? Nesse momento, via-se passando os braços em torno dela, e cheirando a curva de seu pescoço.

Ela sabia que ele estava ali. Tinha os sentidos aguçados, e mais ainda quando se tratava de Tiago. Mantendo-se de costas, questionou:

-- Algum problema com a grelha? – a voz dela parecia café com leite, do tipo que só se encontra no norte da Inglaterra.

Ele sorriu e ergueu as sobrancelhas.

-- Não.

-- Bem, demora um pouco para esquentar, acredito eu. Está com fome?

Ele aproximou-se, parando ao seu lado, as costas para a pia. Encarando-a nos olhos.

-- Você parece de porcelana, ou cristal. – uma pausa, ele sorriu. – De qualquer forma, algo frágil e lindo.

-- Bem. – ela riu. – Sou um pouco mais resistente.

-- Eu sei.

-- O que quer, Tiago?

-- No momento, apenas uma companhia para o jantar.

-- Bem, parece simples. – ela lavou as mãos e enxugou no avental branco que levava preso ao corpo macio.

Eles se encararam, e ele puxou de leve as pontas dos cabelos dela. Agradando-a.

-- Algumas coisas mudaram esse ano, não? – questionou ela, a testa levemente franzida.

Ele sorriu, aproximando-se mais.

-- Para melhor.

-- Para mim, ou para você?

-- Diria que para os dois, mas não acho que você acreditaria.

-- Quem sabe você não se surpreenderia?

Ele enfiou a mão nos bolsos, mas alguma coisa – talvez o brilho nos olhos dela – o fez mudar de idéia. Tomou-a pela nuca e levou a boca ao encontro da dela.

Sentia o cheiro dela. A fragrância doce como baunilha que parecia desprender de sua pele. Quantas vezes esse cheiro já não lhe viera toda vez que pensava nela? Ele precisava daquele cheiro. Precisava da textura daquela boca. Precisava da pele macia, do corpo esguio e cálido. Suspirou de leve quando ela jogou os braços em seu pescoço e enterrou os dedos nos cabelos negros, retribuindo a pressão quando o sentiu esmagá-la contra ele.

Precisava dela. E achava que ela estava começando a perceber isso. Ele a amava. Demais. Desesperadamente demais.

E foi isso que o fez recuar quando queria mais e mais.

Ela abriu os olhos devagar quando sentiu sua boca livre. Olhou-o direto e dessa vez sem piscar, sem um registro de timidez, de apreensão. Viu nos olhos castanho-esverdeados dele, o próprio reflexo e um turbilhão de emoções. Como se a única coisa que Tiago enxergasse fosse ela.

Ele se surpreendeu ao vê-la sorrir de leve enquanto afastava-se dele. Ela sentia como se seu coração fosse saltar do peito a qualquer momento, ou ainda pior, parar de bater.

-- Isso também não é comum. – comentou ela.

-- Que isso, vivo por ai saindo e te beijando!

Ela riu da piada.

-- Você me entendeu. – ele sorriu, demonstrando que entendera.

-- Não. – concordou ele. – Eu não funciono com coisas comuns. – ela riu, porque sabia que era verdade. – Eu adoro estar com você, me sinto em paz.

Os olhos dela sorriram para ele.

-- Faça um favor para si mesma. – aconselhou, puxando-a para mais perto. – Não se preocupe conosco por alguns dias, e veja o que acontece.

Ela suspirou, levantando-se na ponta dos pés e quase lhe roçando a boca. Num gesto que para ela pareceu estranhamente amistoso e intimo.

-- Já estou fazendo isso. – sorriu com os olhos. -- Por que não prepara os drinques? – disse ela, rindo por uma piada que parecia ser interna. – Porque eu estou queimando as costeletas.

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Nota da Autora:

É certo, um capitulo todo romântico, mas gosto dele. Assim resumi bastante enrolação da velha fic e do meu ponto de vista, deu pra perceber o que eu gostaria de mostrar. O amor brotando. (:

Bem, é bem provável que no próximo capitulo teremos detenção ou algo assim bem maroto, porque esses garotos não podem perder sua essência, né? :D

Beijos, garotas. E obrigada de coração pelos comentários. Eu juro que ainda os respondo.

Stay beautiful,

P.


P.S: Nanda, você faz falta!

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