Um passeio quase perdido




13- Um passeio quase perdido


O dia em que o novo professor de defesa contra a arte das trevas se apresentaria à turma de Eva havia finalmente chegado. Ainda era uma quinta-feira ensolarada e pacífica. Aquela semana parecia não ter mais fim. Todos os alunos ansiavam por um pouco de liberdade no passeio a Hogsmead, que seria neste sábado, pois a presença dos aurores começava a irritar plenamente a todos. Estes pareciam se incomodar com o menor pio de corujas distantes que sobrevoavam o castelo. Os próprios fantasmas se mantinham acuados e distantes, inclusive o poltergeist. Todas as manhãs, a direção da escola recebia centenas de correspondências de pais preocupados que tencionavam atualizar-se a respeito da segurança de seus queridos filhos.

— Por que vocês têm que olhar todas estas cartas? — uma vozinha de criança podia ser ouvida pela entrada do corredor do primeiro andar.

— Só para certificarmos de que nada perigoso seja enviado para algum aluno, professor ou funcionário — respondia uma voz idosa e atenciosa.

— Hum... — a vozinha assumia um tom pensativo — Então para um assassino conseguir enviar alguma mensagem para dentro do castelo, ele teria que se passar por um auror?

— Ahn?! — a voz adulta se revelava assustada — Sabe... É... Acho que você tem razão meu jovem... Teria que se passar por um auror... — a voz adulta também denotava meditação — De onde foi que você tirou esta idéia?

— Uma vez eu li um livro, onde um detetive tinha que se colocar no lugar do bandido para poder entende-lo — o menino agora parecia empolgado — O meu maior sonho é ser um grande auror e poder capturar um assassino e trancafia-lo em Azkaban!! Por isso eu costumo exercitar este tipo de pensamento.

Agora Eva tinha certeza. A voz não só era familiar, como era de um membro de sua própria casa. Ela se aproximava de Christopher, sorrindo amarelo para o auror já velho, e tirava-o dali, sem se importar com a etiqueta, ou por estar interrompendo uma conversa alheia.

— Até logo, seu auror — gritava Christopher.

— Até logo, rapazinho — respondia o velho.

Eva empurrava o irmão corredor à frente. Seus longos cabelos soltos balançando conforme a velocidade de seus passos. Christopher, que segurava em sua mão, não entendia o porquê da urgência em tira-lo dali. Acompanhava-a sorrindo sem parar, contente por finalmente ter achado um auror amigo com quem pudesse obter informações precisas sobre a carreira que tanto ambicionava seguir. Os olhos do menino, idênticos aos da irmã, brilhavam de alegria e pareciam saltar das órbitas quando mentalizava todas as perguntas que ainda faria. Seus cabelos eram curtos e muito claros, sua pele era branca, porém levemente bronzeada. O uniforme da lufa-lufa parecia que tinha sido feito sob-medida, a gravata amarela, perfeitamente arrumada, estava em harmonia com o louro de seus cabelos.

— Posso saber o que o senhor estava fazendo ali, batendo papo com aquele auror? — Eva sentava-se no mural que separava o corredor do pátio.

— Estava apenas me informando — ele rascunhava o rosto da irmã, tentando encontrar algum sinal de brincadeira ou zombaria, mas ela parecia estar realmente zangada.

— Você sabe muito bem que papai não simpatiza com aurores. Já não basta o desgosto de você não estar em Sonserina, ainda quer que ele fique sabendo disso? — o tom dela era tenso e irritado.

— Mas eu não entendo! Não entendo porque papai não gosta de aurores. Ele sempre me diz que os aurores fazem parte da ala mais eficiente do Ministério...

— O porquê de papai não simpatizar com eles não me interessa! Só não quero mais pega-lo em uma situação como esta... — ela tirava da bolsa um bolinho e mordia-o .

— Não foi tomar café hoje? — Christopher sentava-se no mural, ao lado da irmã.

— Não... — Eva olhava para o teto, demonstrando não estar disposta a conversar sobre o assunto.

— Você também não gosta de aurores?

— Não gosto deles... — ela parecia distante. Agora, segurava a mochila pela alça e levantava da mureta, com um pulo — Sempre espreitando por ai... Daqui a pouco colocarão um auror em cada sala de aula, para ver se algum professor esta induzindo seus alunos para o lado de... Como é mesmo o nome dele?

— Não sei! — a resposta de Christopher foi tensa e automática — Digo... Prefiro não dizer.

— Bobagem — ela começava a caminhar, mas parou após alguns passos e olhou para trás — Chris... Você já ouviu falar em Maximillian Flaubert?!

— Mas é claro!!! E você também já ouviu... A Saris é quem adorava estuda-lo...— ele voltava a falar animadamente — Oras... Você deveria saber... Porque a coruja que a Saris deu para você chama-se Max em homenagem a este bruxo das trevas.

O espanto de Eva foi taxativo:

— Ju-jura?! Achei que ela só gostasse do nome... — sua voz parecia sumir — Eu tenho que ir para a aula agora, tchau...

— Eu também tenho... Até logo! — e ele saltava da mureta apressadamente e andava saltitante rumo ao átrio.

Eva, que seguiu o caminho oposto ao de seu irmão, caminhou lentamente até a sala de defesa contra a arte das trevas, onde, de longe, já pôde ouvir a voz firme do novo professor. Ela ficou alguns segundos em frente à porta, tomando coragem para interromper o mestre e chamar a atenção de todos que o ouviam concentrados. Após alguns minutos, quanto pareceu ouvir uma pausa na retórica, ela bateu na porta, receosa.

— Entre... — Os olhos azuis elétrico fixados em Eva — Hum... Deve ser a srta. Rookwood, suponho... Como hoje é o primeiro dia, não me queixarei de seu atraso. Vamos, sente-se, sente-se. — ele parecia ser extremamente intelectual e amigável — Muito bem... Como eu estava dizendo... Já que aurores fizeram questão de que o clube de duelos fosse fechado... Bem... Acredito que nossas aulas terão de ser muito mais práticas do que teóricas, considerando que teremos de suprir o conteúdo do clube... Quem aqui não participava do clube de duelos?

Umas poucas mãos tímidas se erguiam ao ar.

— Hum... Compreendo... Nada mal! —ele fazia sinal para que os alunos abaixassem as mãos — Apenas três... Quero ter uma conversa em particular com os senhores, e com a srta... Law? — ele olhava a aluna, que confirmava com um sorriso — Para quem tem pais professores, acredito que tenha uma boa desculpa, não é?! — ele sorria abertamente, sem tirar os olhos de Judith.

A sala toda parecia estar envolvida na simpatia de Richard Goldsmith. A sala que antes pertencia a Ártemis Garner, e por poucos dias a Otto Candle, assumia agora uma nova aparência: as janelas estavam completamente abertas, havia uma série de objetos coloridos e vidros arredondados e ovais sobre a mesa do professor, e sobre o encosto de sua cadeira havia uma capa branca de plástico, que lembrava grotescamente um avental de açougueiro. Além disso, Richard estava com uma grossa luva negra, que chamava a atenção pelo fato de o tempo não estar propício ao uso deste tipo de acessório, pois ainda era verão.

— Vejamos... — com a mão direita no queixo, os olhos estreitados fixos em um pergaminho, o professor parecia ler algo que exigisse concentração e analise — Hum... Então o tema da aula é elementais... Mas pelo que vejo aqui, o professor Candle estava apenas dando uma pincelada sobre o assunto... Ele citou os conselhos e as características principais... É, exatamente o mesmo que deu para a outra turma do sétimo ano...

Richard empurrava com o braço os objetos espalhados em sua mesa, abrindo espaço para que ele sentasse sobre ela:

— Devo confessar a vocês que a grande maioria dos conselhos é uma grande farsa, mas preciso passar o conteúdo, não é? Talvez eu repita algumas questões que Otto tenha dito... Bem... Vamos lá... — ele jogava o pergaminho na mesa e fitava os rostos atentos dos alunos — Elementais são bruxos especiais que dominam um certo elemento sem o uso da magia. Acredito que a esta altura do campeonato todos já tenham esta noção. Existem os elementos principais, que são a terra, o ar, o fogo e a água. Seus respectivos elementais são os geomagos, os aeromagos, os piromagos e os aquamagos. Mas também temos os lightmagos, os psicomagos, os eletromagos, e muitos outros mais raros, como os gaiamagos, por exemplo. Por terem esta capacidade, que na realidade nasce com eles, estes bruxos podem se tornar seres extremamente poderosos, sendo muito temidos pela sociedade “comum” como bruxos das trevas em potencial. — ele balançava a cabeça afirmativamente — Contudo... A grande maioria dos elementais nem ao menos revela seus poderes ao resto da sociedade, por não acharem necessário...

Ele pegava uma bola de vidro esférica, muito semelhante a um lembrol, e girava-a entre os dedos:

— Ganhei esta reserva de energia de uma aluna piromaga... — ele saltava da mesa, tirava a capa “de açougueiro” do encosto da cadeira e colocava-a — Ela parece uma simples e humilde bola de vidro, mas na verdade é muito mais do que isto... Sr. Irvine Lifford... O que o senhor faria se alguém lhe atirasse um objeto como este de uma grande distância?

O rosto sorridente de Irvine foi contemplado por todos os alunos, que absorviam cada palavra de Richard Goldsmith.

— Uma barreira, senhor. Provavelmente eu criaria uma barreira baseada nos poderes aquáticos.

— Muito bem! Dez pontos para a Lufa-lufa! — uma nota de desaprovação se manifestava no rosto dos monitores da Sonserina que estavam presentes — A propósito, como o senhor sabe que esta é a única forma comum de se proteger de uma bola deste tipo?

— Para ser sincero... Eu não sei... Mas como o senhor disse que havia ganhado a bola de uma piromaga, supus que fosse algum tipo de ataque que envolvesse o fogo — ele falava diplomaticamente, manifestando suas conclusões com perfeita clareza.

— E o senhor acha... Que se eu ataca-lo agora com esta bola... Teria capacidade de se defender?! — seu tom era inquisitivo.

— Sim, senhor — Irvine o desafiava.

Os Sonserinos olhavam-no com um quê de descrença. Eva achava graça, apesar de estar curiosa a respeito daquela bolinha. Richard invocava Irvine para fora de sua carteira, com um sinal de sua mão. O professor empurrava a mesa para perto da parede, abrindo espaço para o duelo que se iniciaria.

— Para fica mais interessante... Pegue o vidro oval que se encontra logo ao lado do pergaminho, por favor. Coloque as luvas de couro que está em baixo do vidro. Pegue sua varinha e posicione-se.

Irvine obedecia-o nos menores detalhes, executava tudo com o maior prazer e atenção. Eva, que havia sentado-se com Ulisses, temia que fosse questionada a respeito das tais reservas de energia, pois nunca havia ouvido falar em tais coisas.

Goldsmith passava a mão enluvada em seus cabelos negros, enquanto Irvine tomava a posição correta e encarava-o, revelando a tranqüilidade em que se encontrava, contrapondo todos os outros alunos, que pareciam estar completamente tensos.

— O vidro que o senhor está segurando é uma reserva de energia eletromágica, ou elétrica, como é mais comumente conhecida. Para me atacar basta aciona-la com o feitiço Libertus, e lança-la em minha direção... — Richard pegava sua varinha castanha com uma mão e, com a outra, continuava a girar a esfera com os dedos — Eu o atacarei com a esfera de fogo, você se defenderá... Se puder... E me atacará de volta, compreendeu?

— Sim, senhor — Irvine balançava a cabeça, enfaticamente.

— Preparado?

— Sim.

Mal deu para ouvir o uso do feitiço de libertação. O que se ouviu foi apenas uma implosão abafada, além de se ter visto uma forte iluminação vermelho-alaranjada, seguida por uma cortina de luz azul. E logo depois, quando Irvine, por sua vez, atacou, podia-se ver na sala dezenas de raios amarelos serem lançados do teto para o chão, acompanhados por um zumbido incomum de descarga elétrica.

Todos ficaram encantados, inclusive o professor, que encarava o aluno com um sorriso de orelha a orelha. Richard ergueu a varinha e os raios cessaram, trazendo de volta os olhares dos alunos que estavam hipnotizados pela visualização da energia elétrica.

— Perfeito! Inacreditável. Mais 25 pontos para a Lufa-lufa! Você foi excepcional, tão rápido quanto eu! — Richard fazia sinal para que Irvine voltasse a se sentar em sua carteira — O que vocês acabaram de ver, foi uma breve demonstração de um ataque de fogo, sendo bloqueado por uma defesa de água, seguido por um ataque elétrico. Naturalmente que estes objetos de vidro são demonstrações didáticas dos poderes elementais, sendo quase que inofensivas para aqueles que sabem como maneja-las... — ele dirigia-se até a mesa de Irvine e recolhia as luvas de couro — Peguem seus livros e façam uma breve leitura sobre os piromagos e os aquamagos, antes que o nosso tempo acabe. Como tarefa quero que façam uma pesquisa sobre os objetos que estão em minha mesa, podem tirar fotos se tiverem máquina, eles estarão expostos na sala de música, no quinto andar. Quero também um relatório conclusivo sobre o que presenciaram aqui... Podem começar a leitura.

— Professor... — Jamile Marks, a monitora da Lufa-lufa, levantava-se da sua cadeira e caminhava até Richard — Se os objetos são inofensíveis , por que a capa plástica?

— Por que eu não me defendi do ataque elétrico. Queria que os raios fossem dispersados pela sala, para que vocês pudessem contemplar a beleza desta energia — ele olhava diretamente para a mochila da aluna, que já estava em suas costas — E antes que me pergunte... Os raios não os atingiram porque já havia perdido parte da energia quando não me atingiu, mas não quero ouvir mais perguntas, quero que pesquisem, se não encontrarem em livros, terão toda a liberdade para me questionar. A senhorita já concluiu sua leitura? Por que já está com a mochila?

— Sim, já conclui a leitura antes... Bem, eu sou monitora, haverá uma reunião daqui a dez minutos e eu gostaria de ir mais cedo. Tenho a sua permissão?

— Se já finalizou a leitura... Claro! — ele sorria, com simpatia.

Impressionados com a quantidade de tarefas que Richard havia passado em sua primeira aula, os alunos finalizaram a leitura e se retiraram, falantes e barulhentos, como era de se esperar. Alguns elogiavam o mestre, outros, os elementais, e ainda havia aqueles que elogiavam os tais objetos que os tinham sido apresentados. Eva nada comentava, apenas se queixava por ter de ficar se preocupando com deveres de uma matéria que nem ao menos a atraía muito.

Pulando para o tão esperado sábado, o tão sonhado dia da liberdade, onde os alunos poderiam respirar ar puro no vilarejo de Hogsmead, Eva esperava em seu salão comunal, até que todos os seus colegas já tivessem deixado os limites do colégio, para finalmente encontrar-se com Kail nos portões:

— Psiu! Hei — uma voz sussurrante emanava de trás de um imenso pilar — Aqui!

Os olhos castanhos e brilhantes de Kail puderam contemplar Eva, escondida a alguns metros de distância. Como ela estava linda! Seus cabelos, que raramente se encontravam presos, estavam agora trançados em um lindo penteado que valorizava seu rosto angelical. Vestia uma calça jeans e uma bata branca, rendada. Para não perder o hábito, estava com uma capa curta, esverdeada, com capuz.

Kail, vestido como um perfeito trouxa, encontrava-se levemente tenso e ansioso. O dia estava lindo! Pequenas nuvens espalhadas pelo céu claro e radiante. Um bando de aves, que mais lembravam patos, migrava em conjunto, desenhando um grande triângulo no ar. Uma ou outra coruja isolada mostrava sua cor em plena luz do dia, talvez para enviar ou receber alguma correspondência. Bem ao longe, nas alturas do vilarejo bruxo, podia-se identificar no horizonte uma vassoura, que parecia policiar o movimento local.

Ele esbanjava seu lindo sorriso contagiante. Apesar de Eva estar meia hora atrasada, ele não se importava. Seus cabelos espessos e volumosos estavam penteados para traz, dando a ele uma certa postura elitista. Ele caminhava até ela, sem perder o brilho do olhar:

— Achei que não viesse mais... — Kail encarava o chão.

Mesmo que quisesse, não tinha mais como ser grossa ou indiferente com Kail Nesbit. Ele era nascido trouxa, não era bonito, vivia no pé dela desde o terceiro ano, era odiado por todos os Sonserinos por ser um apanhador exemplar do time adversário, mas tinha o sorriso mais lindo que ela já vira na vida.

— Ah... Imagina, eu estava me arrumando. Sabe como são as mulheres, não é? — mentia ela.

— Podendo ver você assim... Tão bonita... Eu esperaria o dia inteiro — as palavras dele eram tímidas e humildes.

Começaram a caminhar pelas ruas de pedras que conduziam ao vilarejo. Conversavam sobre assuntos vagos... Sobre o tempo... Sobre o novo professor de defesa contra as artes das trevas... Sobre as incríveis poções que podiam até tornar alguém invisível... Sobre os novos doces que comprariam na Dedosmel ... Conversavam e nem viam que o tempo e o espaço se alteravam... Já estavam chegando perto das casinhas alinhadas de Hogsmead, o movimento dos alunos e também as vozes frenéticas já podiam ser notados.

Não muito longe, no Três Vassouras, um simpático casal de cabelos castanhos estava sentado em uma mesa isolada, em frente a uma janela. O rapaz parecia alegre, enquanto a moça lembrava um gato, arisco e atencioso, preparando-se para mostrar as garras afiadas:

— Acho que não entendi! Você quer dizer que Luciene Christal é a garota mais bonita do sétimo ano?! — falava com uma voz alta e estridente, aparentemente de deboche.

— Não, não, não, não! Você está colocando palavras na minha boa! Eu disse que ela era a ruiva mais bonita, e não a garota mais bonita! — explicava-se o garoto.

— Sei! — Cellin cruzava os braços — Aposto que se eu disser que acho o monitor da Sonserina bonito, você irá dizer que eu estou maluca...!

— Taylor Partinkson?! Hahahahaha!!! — gargalhava Irvine — ele me lembra o mordomo do Batman! — ele bebericava seu copo de cerveja amanteigada — Cellin... Mudando de assunto. Se quer continuar com as investigações sobre Régulo, acho melhor você não me esconder nadinha, ouviu bem? — ele respirava fundo — Se seu tio vier mesmo a Hogwarts, caberá a ele tentar interceptar a correspondência de Black, mas mesmo assim, ele pode estar mais cauteloso, por causa da quantidade de aurores aqui...

— Eu ouvi o que eles disseram! Eles sabem quem matou o professor Garner! Régulo Black e Ulisses Apalache!! Acredito que a monitora também esteja envolvida. Eles estavam escondendo um pergaminho. Não faço idéia do que seja... — Cellin escondia seu rosto entre as mãos — Não vou deixar por isso mesmo! Amanhã eu vou soltar o meu gato nos corredores, deixarei o quadro de meu pai no pescoço dele, assim a imagem pode me contar tudo o que viu depois, o que você acha?

— Um absurdo! Acha que seu gato vai conseguir entrar no salão comunal da Sonserina?! — ele tirava as mãos de Cellin do rosto, olhando dentro dos olhos da garota.

— Acho!! — ela começava a rir — Tenho certeza! Eva vai pegar o Alvo, ela sabe que ele me pertence. Eu vou solta-lo perto dela...

— Cellin... — respiração profunda — Ela ainda está magoada contigo... Ela jamais vai se opor ao Régulo.

— Ela é uma idiota! Não percebe! Vou abrir os olhos dela!!! — Cellin se irritava.

— Okay, okay... Vamos parar de falar sobre Régulo, Eva, professor Garner e etecetera... — ele sorria, gentil.

— Não! Nada mais me interessa, preciso resolver esta situação o mais rápido possível!

Ele segurava a mão de Cellin com doçura, encarava-a com seus olhos azuis celeste. O cabelo castanho caindo-lhe sobre os olhos:

— Quer dizer que nada mais lhe interessa? — parecia mais sério e magoado.

— Exceto... Exceto você.

Irvine soltava a mão de Cellin. Sua mão agora ia até os cabelos da garota, jogando-o para trás do ombro, acariciava sua face com suavidade, deslizava sua mão para os lábios, até que suas bocas se encontravam e selavam a cerimônia em um longo e aconchegante beijo.

Mas a doçura foi apenas momentânea. Apesar de uma paz aconchegante e colorida ter dominado o casal, o tema que atormentava constantemente a mente de Irvine recomeçava a vir a tona:

— Já chega disso! — dizia ele, virando o rosto para o lado, manifestando sua ira — Não agüento mais ter que ficar seguindo Régulo e Ulisses. Os únicos assuntos que ocupam nossos diálogos são Medaline, Régulo, Eva e até mesmo os livros e as matérias estranhas que ela anda estudando! Quero falar sobre nós dois, sobre você!

— Irvie, não fique assim! Isso tudo vai acabar, eu prometo... — ela parecia mais pacífica.

— Cellin, eu te amo. Te amo a muito tempo, desde que você namorava com aquele monitor da Corvinal. Aceite meu pedido, namore comigo!

— Quer namorar comigo mesmo sabendo que não terei muito tempo para me dedicar a você? — ela parecia derretida.

— Mesmo que você morasse na Nova Zelândia, meu amor. — ele sorria tristemente, encarando-a com um olhar suplicante.

— Bem... Eu preciso muito de você agora... Agora que meus pais se foram... Eu aceito, Irvie — e se beijavam novamente...

Mas desta vez o beijo não pôde ser longo, pois foram interrompidos por uma estranha visão que podia ser contemplada pelo vidro empoeirado da janela: uma densa fumaça verde se alastrava, derrubando alguns transeuntes quase que instantaneamente. Pessoas corriam de um lado para o outro, alguns buscavam refúgio em lojas, outros corriam para fora delas e a fumaça cada vez mais dominava as ruas e envenenava civis.

Kail e Eva acabaram por escolher não ir até as lojas, eles subiram uma colina próxima e ficaram sobre uma fresca sombra de árvore. O local era singelo, podia-se visualizar o telhado das casinhas distantes, chaminés vermelhas e alguns ninhos de pássaros sobre a fachada. Um coruja familiar voava em círculos logo acima dos dois, ela parecia estar cada vez mais baixo, suas asas planando com leveza e perfeição.

— Vênus, minha coruja. Lembra-se dela? — Kail apontava.

— Claro. É muito bonita... — Eva vislumbrava a ave.

—Adoro corujas, são a minha paixão. Além de vassouras, é claro! Vênus é muito nova ainda, mas é rápida e confiável.

— Você tem alguma outra?! — Eva colocava a mão na testa, para proteger seus olhos do sol. Kail posicionava-se a sua frente, emendando a sombra da árvore.

— Minha querida Isis... Atual coruja de Jamile... Foi a minha primeira coruja... — ele parecia paternal ao falar de seu antigo animal de estimação.

— Perdeu ela em uma aposta ou coisa assim?! — Eva arrancava algumas folhas da árvore, sem deixar de prestar atenção em Kail.

— Ah... Não! — Kail segurava o riso — Vocês sonserinos são tão engraçados... Eu dei minha coruja a Jamile, porque ela havia sofrido muito quando perdeu sua coruja, ela era muito velha, a corujinha da Jan. Eu sabia que sentiria falta da Isis, mas Jamile toma conta direitinho dela. — ele parecia estar nervoso e confuso.

Eva nada respondia, estava analisando o jeito espontâneo e assustado de Kail. Notando a falta de palavras da menina, ele tomou coragem e se aproximou lentamente. O sol irradiava uma iluminação intensa e quente, ele olhava cada vez mais dentro dos olhos de Eva, até que não mais deixou seus olhos abertos. Olhava-a agora com os lábios, que tocavam os dela com uma certa vergonha. Um certo receio. Ele passava os braços em volta da cintura delgada de Eva, acariciando suas costas. Após alguns segundos, buscando recuperar a firmeza anterior, Eva tentava retomar a conversa:

— Bem... —Eva olhava sem jeito para a coruja distante — Minha coruja já é adulta, foi da minha irmã Saris... O nome dela é... Maximillian... Quero dizer, é Max, apenas Max...

No Três Vassouras, alguns bruxos buscavam meios de bloquear portas e janelas para impedir a entrada da fumaça venenosa. Alunos assustados começavam a se desesperar. O calor parecia estar muito mais intenso. Cellin suava como nunca e Irvine rasgava sua própria camisa, entregando um pedaço de tecido a Cellin:

— Vá até o banheiro feminino e molhe este pano, rápido!! — gritava ele.

Nem um minuto depois, Cellin já estava com o pano molhado em mãos, aguardando Irvine retornar com seu tecido também molhado. Ele saia de uma porta, subia em cima de uma mesa, assobiava estridentemente, buscando a atenção de todos que se encontravam no bar:

— Atenção, por favor!!! — ele gritava o mais alto que podia — Eu não sei o que está acontecendo lá fora, mas me parece que esta fumaça é muito prejudicial a todos, tenho certeza de que não conseguiremos impedir a entrada dela por muito tempo! Acho que o mais seguro a fazer é munir-se com um pano úmido, respirando através dele, e buscar sair do vilarejo o mais rápido possível — ele saltava da mesa e corria para Cellin — Vamos!

Imediatamente as pessoas encontravam panos e lenços, molhavam-nos com água da torneira do balcão e rumavam para a saída. Mas Cellin e Irvine não puderam ver se o recado de Irvine fizera efeito, pois, com seus panos sobre o nariz e a boca, eles corriam de mãos dadas o mais rápido possível.

— Meu Deus, Irvie!! Kail e Eva devem estar por lá! — Cellin parara de correr, puxava o namorado para a fumaça — Vamos, temos que encontra-los.

Ainda na colina, o casal mal tinha reparado no estranho fato que ocorria logo abaixo de seus olhos, eles pareciam dominados pelo prazer da companhia um do outro, pelo papo amigável e descontraído. O sorriso atraente de Kail... Os cabelos trançados de Eva...

Alguém parecia andar rapidamente no terreno plano, ao final da colina. O casal foi despertado pelo barulho de passos, e precipitaram-se para verificar quem poderia estar perturbando a paz e o silêncio do local. De fato, a paz fora perturbada... Instantaneamente o coração de Eva começara a bater como um alarme que notificava-a de sua ação.

Era Régulo.

Ele avistara Eva e Kail, mas parecia nem ligar, continuava a andar rapidamente para seu destino, sem ao menos cumprimentar, xingar ou desprezar...

— Mas o que é aquilo?! — Kail perguntava, espantado, apontando para uma nuvem verde que se formava logo acima do povoado.

— Não fa-faço idéia — Eva estava tremendo.

— Está acontecendo alguma coisa! Irvine e Cellin, eles... Estão lá embaixo! Precisamos correr... — Kail descia a colina aos solavancos. Eva ia logo atrás, a mente ainda congelada.

Antes mesmo de conseguirem adentrar na rua principal, eles puderam ver uma dúzia de aurores com varinhas empunhadas. Homens de preto encapuzados corriam desesperados, aumentando cada vez mais a fumaça verde. Os aurores e os comensais da morte travavam uma batalha árdua, envolta por uma camada venenosa que derrubava uma pessoa a cada segundo.

No alto, alguns hipogrifos buscavam em vão tentar afastar a fumaça com a batida de suas asas. Aurores lançavam contra feitiços que nada adiantavam. Alguma magia negra devia estar envolvida. A equipe de desfazedores de feitiços havia chegado. Estavam vestidos de azul claro, com chapéus pontudos e varinha a vista, em cerca de segundos eles dominavam a situação, controlando a fumaça e deixando bem a vista a batalha que feria aurores e comensais. Suas faces concentradas e ao mesmo tempo distantes.

Mas...Mas... Não podia ser!! Aquele comensal cuja capa havia sido rasgada por um feitiço... Era...Era... O sr. Gallo! Eva tinha certeza. O mesmo cabelo escuro, a mesma postura arrogante, era ele!

E aquele ao lado dele... “Irei para a Inglaterra jogar no final de Setembro, se der, passo em Hogsmead”... Aquele só podia ser Mítchel!!! Os Gallo... Comensais?! Eva estava encostada na loja de logros, Kail não estava mais a vista, ela não sabia se procurava pelo garoto, ou se dirigia-se ao amigo de seu pai... Luzes saiam das dezenas de varinhas em ação. Eva estava acuada, em um canto, quando sentiu uma mão apertada em seu ombro;

— Vamos sair daqui — a voz de Cellin era fraca e incisiva.

Irvine e Kail surgiam logo atrás, os cabelos balançando devido ao vento provocado pelos hipogrifos acima. Os quatro começavam a correr para longe da tormenta, quando uma forte faísca amarela atingia Kail pelas costas, derrubando-o, inerte, no chão.

Um comensal encapuzado aproximava-se dos quatro. Irvine pegava a sua varinha e preparava-se para proteger as garotas e seu amigo ferido. O comensal tirava o capuz, revelando cabelos negros e compridos.

Realmente era Mítchel.

O jovem sr. Gallo abaixava os braços, revelando a Irvine que não iria ataca-lo. Aproximou-se de Kail, agachando-se logo ao lado. Apontou sua varinha para o pescoço do rapaz. Uma fraca fumaça branca parecia penetrar em sua garganta... Os olhos de Kail começaram a piscar compulsivamente. Ele tossia e recuperava a consciência.

— Seu amigo ficará bem — dizia Mítchel a Eva, balançando a cabeça afirmativamente — Ele inalou um pouco do veneno também... Vão embora antes que algum de vocês acabe morrendo como os outros... Eu tenho que terminar meu trabalho — ele levantava-se e corria, a capa negra balançado com a ventania.

Eva nem ao menos se propunha a pensar a respeito. Ela agora estava sendo puxada por Cellin e Irvine. Seu corpo seguia em direção ao castelo, mas seu rosto continuava a visualizar os movimentos de Mítchel, que agora trocava feitiços com o auror eficiente que esteve conversando com Dumbledore quando Cellin desmaiara no lago. Ele gingava de um lado para o outro, esquivando-se dos feitiços com habilidade. Seus cabelos pareciam cegar seus olhos, mas mesmo assim ele não se mostrava prejudicado.

A fumaça verde agora já estava dispersa, tomava os céus, fundindo-se com as nuvens que antes eram brancas. Não havia mais pássaros no ar... Dezenas de corpos esparramados pela rua principal minavam a batalha entre o Ministério e a entidade das trevas que pretendia ocupar seu lugar. A entidade se chamava Voldemort. Os comensais... Suas ferramentas. O mundo bruxo... O ambicionado império. E os sangues-ruins e trouxas: os futuros escravos .Uma nuvem escurecida, não muito longe, lembrava o formato da rosa negra, Eva Rookwood piscava os olhos, mas a cada vez que os abria, a imagem parecia estar mais definida e mais presente. Já não era mais uma nuvem, apenas a imagem exata da lágrima de Maximillian, a cor negra tomava destaque diante do verde da fumaça venenosa... O verde de Sonserina... O verde da capa que Eva vestia... Ela nem ao menos conseguiu perguntar aos seus amigos se eles estavam vendo o mesmo que ela, pois na ultima vez que piscara, a rosa não mais enfeitava o céu macabro do dia da liberdade ... Poderia ter sido apenas sua imaginação... Mais uma vez...

Os quatro chegaram praticamente ilesos ao castelo. A ala hospitalar estava com seus leitos todos ocupados. A quantidade de aurores, funcionários do Ministério, desfazedores de feitiços parecia ter triplicado. Não havia um único corredor com menos de cinco pessoas.

Eva agora estava sentada em sua cama, os olhos avermelhados pela irritação provocada pela fumaça. Tentava manter sua mão por alguns minutos sem tremer, para que pudesse finalizar a carta que escrevia para seu pai:

“Querido papai,

Estou muito assustada, acaba de acontecer algo muito estranho no vilarejo de Hogsmead. Dezenas de homens vestidos de preto espalhavam veneno pelas ruas e em algumas lojas... Acho que muitas pessoas morreram... Com certeza sairá no Profeta Diário.

Mas o motivo pelo qual lhe escrevo é outro: No meio dos homens de negro eu vi o Sr. Michelangelo Gallo e seu filho. Eles pareciam estar atacando também. Papai, o que está acontecendo?! Será que os aurores estavam atacando a pessoa errada?! Mas não era possível!!

Por favor, me responda o mais rápido que puder, não sei se conseguirei dormir. Mas não se preocupe, ficará tudo bem comigo..

Te amo,
Eva A. Rookwood”







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