Progressão



 


 


progredir


 




  1. Intransitivo




caminhar para a frente; avançar, prosseguir.


 




  1. Intransitivo




tornar-se maior e/ou melhor, incorporando coisas novas ou mais modernas;  desenvolver-se, crescer, modernizar-se.


 


Bordeaux - 2 de Agosto de 1998


 


Três meses. O mundo bruxo estava em festa com os noventa dias do fim da Segunda Guerra. Bellatrix, no entanto, tinha menos motivos para comemorar do que a maioria - por mais que tivesse sido uma das peças fundamentais daquele projeto de paz. Talvez, essa fosse a razão: perto demais, pessoal demais.


- Milady, - ela ouviu alguém chamá-la, quase revirando os olhos ao ouvir a forma de tratamento. Ela entendia que seus empregados nem de longe referiam-se ao passado de Lady das Trevas. - A Princesa está aqui…


Bellatrix repousou a pena sobre a mesa, e ordenou que deixassem Melinda entrar. Organizou os papéis a sua frente, e levantou-se da cadeira do escritório ao ver a filha passar pela porta com um sorriso. Ela tinha uma caixa de presentes na mão, e Bellatrix revirou os olhos. - Desnecessário, alteza.


- O que posso fazer, vossa graça? - Melinda deu de ombros, e estendeu o presente. - Se não está conosco para colher os louros da vitória?


Bellatrix pegou a caixa, e repousou-a na mesa, para abraçar a filha. Era estranho não conviver com ela, por mais que as visitas fossem frequentes. Toda aquela situação era esquisita e demandava uma enorme força de adaptação, mas ela conseguiria. - Foi fingir que seu pai não teve um dedo no presente,


- Qual o problema? Se ele te conhece melhor do que eu… e não é como se ele tivesse tentando te comprar, ou algo do tipo. Ele está em paz com sua decisão, o quanto que ele pode e consegue estar. - Melinda pegou novamente a caixa e a abriu para a mãe, - No caso, é um presente de agradecimento. Todos estão festejando, graças a você.


Bellatrix olhou dentro da caixa e encontrou uma pena e uma adaga de prata, ambas cravejadas em diversas pedras preciosas, e com o brasão dela entalhado.


Uma parte dela questionava-se de onde ele tirava aquelas coisas, mesmo com a fortuna dos Riddle que ele herdara... mas quando parava para pensar, desde a primeira guerra não era incomum que as famílias ricas cedessem parte de seus bens com prazer a ele, apenas por segui-lo. Ela e Rodolphus haviam feito enormes destas doações “à causa”, sabendo sempre que estes fundos iam diretamente a ele - ela imaginava que, àquele ponto, ainda mais famílias tivessem aderido à prática, principalmente as recém chegadas, que podiam ainda ter o luxo de imaginar que isso lhes compraria alguma regalia. Tudo isso somado às incontáveis barras de ouro e joias embaixo daquela casa… terminavam em presentes como aquele.


Ela girou a nova adaga entre os dedos, e sorriu, ele a conhecia incrivelmente bem e isso não era novidade. Esta era um pouco mais leve, e tinha uma bainha que parecia ter sido desenhada para seus dedos—disto, ela não duvidava. - Duendes… - ela sussurrou, e Melinda assentiu.


- Comissionadas para o dia de hoje, - Melinda riu-se, - Por alguma razão que custo a entender, os duendes amam o papai. Provavelmente porque, como eles ainda acreditam que ele é imortal, não passará suas joias para nenhum herdeiro “ladrão”. De qualquer forma, fico feliz que tenha gostado, transmitirei seu recado a ele e…


Melinda foi interrompida por uma coruja negra que invadiu o salão e pousou ao lado de Bellatrix, com uma carta no bico. O selo da carta tinha a marca de Voldemort. Na realidade, o selo do reino: seu pai apenas fechava suas cartas com o mesmo brasão que seus empregados usavam em suas vestes quando se tratava de assuntos de Estado, para os assuntos pessoais e mais confidenciais, ele ainda selava as cartas com a Marca Negra. Era assim que os receptores sabiam diferenciar, afinal ele havia parado de marcar pessoas, mas não prometera a ninguém para de usar a Marca por completo.


- É como se ele soubesse que estamos falando dele, - a jovem reclamou, revirando os olhos. Bellatrix deu risada, e pegou a carta do bico da coruja.


- Vindo dele, não duvido que saiba. Com o tempo, aprendi que não é como se pudéssemos esconder coisas dele, de qualquer forma. - Bellatrix respondeu, enquanto abria a carta. - Vejamos.


 


Domingo, 2 de agosto de 1998.


 


À Bellatrix Lestrange, Duquesa de Bordeaux.


 


Vossa Graça,


 


É com imenso prazer que Vossa Majestade a convida a uma visita à Mansão Slytherin, com o intuito de discutir assuntos referentes ao prisioneiro que sua graça mantém na Mansão Malfoy, o sr. Lucius Malfoy.


 


É de desejo do rei, e o melhor para o reino, que os assuntos pré-guerra sejam resolvidos o mais rápido possível, para que nosso reino possa deixar o passado sombrio para trás.


 


Nossos cumprimentos,


 


Mansão Slytherin.”


 


- Eu não sabia que a Mansão Slytherin assinava cartas agora, - Bellatrix fitou a filha, rindo, e Melinda cruzou os braços.


- Isso só quer dizer que essa é uma carta oficial escrita por um dos puxa-sacos dele, não sei dizer qual pela grafia, uma pena. - Melinda esclareceu, - As cartas que ele mesmo escreve vêm assinadas por ele e não são tão formais.


- Uma parte de mim esperaria que ele escrevesse as cartas direcionadas a mim, - Bellatrix fingiu choque e ofensa, o que apenas causou com que a filha revirasse os olhos. - E não mandasse um de seus lacaios!


- Engraçado que eu, e todo mundo na Mansão, imaginávamos exatamente o contrário? Que você queria que as relações entre vocês fossem estritamente profissionais? - Bellatrix foi pega de surpresa pela resposta da filha, e abriu e fechou a boca algumas vezes para conseguir formular uma resposta.


Melinda, quando queria, conseguia ser extremamente desagradável, como o pai. A princesa deixara claro mais de uma vez o quanto a situação deles a incomodava. Não que ela tivesse opinião no assunto, uma vez que dizia respeito apenas a eles, mas também não fazia questão de esconder suas predileção com a ideia de tê-los juntos novamente. Por mais que Bellatrix insistisse para que ela desistisse, e que Melinda claramente entendesse e respeitasse seus motivos, a jovem era quase tão teimosa e contraditória quanto a mãe.


- Profissionais, não formais. Existe uma diferença, minha cara filha. De qualquer forma, sim, a carta é sobre um assunto oficial. Lucius.


O rosto de Melinda contorceu-se ao pensar no assunto, mas ela não parecia exatamente surpresa. - Ah, isso. Está causando algum alvoroço na capital, - ela rolou os olhos. - Kingsley Shacklebolt não está exatamente feliz conosco tendo um prisioneiro particular… de acordo com ele, havíamos prometido soltar os prisioneiros de guerra.


- Lucius não é um prisioneiro de guerra! - Bellatrix respondeu, exaltada. - Ele cometeu traição, é bastante diferente. E não sei porque diabos Shacklebolt acha que pode se meter nesse assunto.


Bellatrix amassou o papel em suas mãos, furiosa. Ela sabia, desde o começo, que Shacklebolt não seria exatamente fácil de se lidar com, mas enfiar o nariz naquele assunto era um pouco demais.


- Foi o que meu pai disse, e o que está segurando aqueles idiotas. De qualquer forma, precisamos nos livrar disso, antes que arrumem um jeito de soltá-lo, ou de executá-lo eles mesmos via dementador. Porque sim, aquele ser humano idiota sugeriu que ele passasse por um julgamento formal.


- Ela andou até a porta, e ordenou que lhe trouxessem sua capa de viagem. Bellatrix olhou-se no espelho uma última vez enquanto esperava, e guardou a pena dentro de sua gaveta e prendeu a adaga à cintura. Ela não pretendia ver Voldemort tão cedo, mas não havia solução, ela teria de resolver aquela droga de assunto. A bruxa mal pegou a capa quando a mesma chegou, e indicou a porta para Melinda.


No corredor, um bruxo com vestes que ostentavam o brasão oficial de Voldemort as esperava. Melinda rolou os olhos quando ele se curvou a ela, - Mamãe, conheça meu novo carma. Cortesia de meu querido pai. - Melinda disse, quase irritada.


- Vossa graça, é um prazer conhecê-la finalmente. - ele se curvou e beijou o anel de Bellatrix. - Oliver Ashworth, cavaleiro designado para a princesa. O rei me treinou pessoalmente para protegê-la.


- Eu não preciso de proteção! - Melinda cuspiu, - Consigo me proteger muito bem, obrigada, também fui treinada por meu pai.


Oliver engoliu seco, e voltou a ficar de pé. - Eu entendo, princesa, mas minha função é mantê-la viva e, se necessário, ganhar-lhe tempo cedendo minha própria vida. Foi o voto perpétuo que fiz. O fato de que sabe se defender, apenas tornará meu trabalho mais fácil, o que é tranquilizante. Sou uma armadura, sua alteza, apenas isso.


Bellatrix segurou o riso, e lambeu os lábios, - Fico feliz de ter alguém tão empenhado ao lado dela, - a expressão de horror no rosto de Melinda foi quase divertida demais. - O que minha filha logo entenderá é que ter ajuda não é demérito, principalmente na posição em que ela está. Ninguém está dizendo que ela não sabe se defender, apenas lhe dando mais uma arma.


- Não sei o que é pior, os exageros dele com essa coisa toda de descobrindo o amor ou você concordando, francamente. - Melinda suspirou irritada, e andou à frente deles.


Oliver, educadamente, ofereceu o braço à Bellatrix. - Se me permitir, sua graça, seria uma honra.


Bellatrix estudou o garoto, traços finos, cabelos escuros, não devia ter mais do que vinte e três anos. A animação era evidente. Voldemort sempre soubera encantar os jovens, ela sabia bem o que aquele menino sentia, e então aceitou o braço dele. - Então, Sr. Ashworth…


- Oliver, vossa graça, por favor...


- Oliver… o que me conta sobre você? Como chegou aqui?


- Venho de uma família de sangue puro, é claro, sua majestade não faria diferente… não para o cavaleiro da princesa. Somos de uma das famílias menores, mais afastadas dos grandes círculos… De acordo com o rei, ele preferiu alguém que ainda não conhecesse a princesa para o trabalho. - Bellatrix assentiu. - Ele chamou diversos bruxos que tinham se destacado em defesa ou duelos em Hogwarts em algum momento, e nos entrevistou, diversas vezes naquela semana. Depois, quando me escolheu, treinou-me por alguns dias, e fizemos o voto.


- Entendo… interessante como não terminou com alguma pergunta sobre mim. - Bellatrix entendera, pela história, que Voldemort vasculhara a cabeça de todos aqueles meninos, e tinha uma teoria.


- Não, vossa graça, não é o meu lugar. E, também, com todo o respeito… creio saber o suficiente sobre a madame.


- Oh é mesmo? E o que acha que sabe, Oliver?


- Nascida Bellatrix Black, juntou-se ao exército do Lorde das Trevas no final dos anos sessenta, como a primeira mulher comensal da morte, tornando-se uma poderosa arma na ascensão do Lorde, devido a sua destreza, poder, e intensidade. Alguns dizem que foi a única pessoa que ele instruiu pessoalmente por anos, sua única pupila, e quase como segunda em comando. Durante a primeira guerra, alguns bruxos questionavam se prefeririam cair nas mãos do próprio Lorde ou da madame, devido a sua experiencia e predileção pela maldição cruciatus. Casou-se com Rodolphus Lestrange no final dos anos setenta, quando ambos eram Comensais da Morte experientes e de alta patente, mas… é aí que os boatos começam, me perdoe se errar algo… Na mesma época, seu relacionamento com o Lorde das Trevas mudou drasticamente por assim dizer, e por isso temos a princesa hoje. Algumas fontes garantem que a princesa veio primeiro e o relacionamento depois, mas em geral acredita-se no contrário, ou que ambos foram mútuos. A partir desta época, lutou para provar que a predileção do Lorde tinha a ver com seu trabalho de Comensal, e estava desligado do dito relacionamento.  Após a queda, foi uma das poucas a se manter fiel, e foi presa por isso. Durante seu tempo de prisão, sua fama cresceu, e as histórias se espalharam… na segunda guerra, tornou-se oficialmente a Lady das Trevas, liderando ao lado do Lorde das Trevas como, com todo o respeito a sua majestade e à madame, deveria ter sido desde o começo de acordo com as histórias. Agora, é a general das forças de sua majestade e a nobre de maior patente do reino, além de guardiã da França.


Bellatrix estaria impressionada com sua própria biografia citada tão belamente, mas sua teoria estava certa: o garoto já tinha o desejo de se juntar aos comensais há tempos, havia crescido um fã deles e da causa. - E por que tenho a sensação de que sabe mais do que isso, Oliver? Principalmente sobre o final da história…


O garoto fitou o chão, quase envergonhado, e limpou a garganta. - Eu ouvi dizer que a madame não se agrada de falar deste assunto, depois da, hm… Batalha de Hogwarts.


- E como sabe o que aconteceu lá? Por sua idade… já havia se formado. - ela questionou, mais curiosa do que irritada.


- Eu lutei, madame, nos círculos mais afastados… fora da escola na maioria do tempo, eu mal havia sido recrutado… mas, existem rumores, as pessoas dizem que a senhora nos salvou, terminou com a guerra, mas que… - ele parou de repente. - Que o preço foi alto, e sua majestade pensou que havia traído-o e a machucou. A princesa me disse para nunca tocar neste assunto com a madame, me perdoe.


- Eu quase fui morta, Oliver, se quer saber a versão oficial para os rumores. - ela rebateu, e Oliver franziu o cenho. - Mas sim, não é um assunto confortável, para o rei ou para mim, por isso seria prudente para todos nós deixá-lo aqui.


Oliver assentiu, e eles alcançaram Melinda, que os esperava com os braços cruzados no local em que eles deviam aparatar. - Vamos? - ela questionou, e Bellatrix confirmou com a cabeça.


 


A Mansão Slytherin estava bem menos movimentada do que da última vez que ela estivera ali, mais similar a como ela fora quando ela morava ali. Ela foi informada por Oliver de que Voldemort se encontrava no escritório, e quase engoliu seco com o pensamento - aquele lugar tinha mais lembranças do que ela gostaria de admitir.


Quase como que por costume, ela entrou sem bater, e encontrou-o na escrivaninha - lendo alguns documentos. O cenho estava franzido, e ele passava atentamente de um documento ao outro. Bellatrix aproximou-se e limpou a garganta, - Majestade, - ela disse, com a voz baixa, e curvou-se, chamando a atenção de Voldemort para si.


O bruxo levantou os olhos, e sua expressão suavizou-se ao vê-la, - Bella… - ele respondeu, ignorando qualquer forma de tratamento que seria propícia. - Fico feliz que tenha vindo… sente-se, por favor. - ele ofereceu-a a cadeira a sua frente.


Bellatrix endireitou-se e encaminhou-se até a cadeira, tirando a pesada capa de viagem dos ombros com um feitiço, e guiando-a até o mancebo próximo à porta. Ao voltar a prestar atenção em Voldemort, ele parecia de certa forma paralisado.


 


A visita tão rápida de Bellatrix após receber a carta fora sem dúvida uma surpresa, e naquele momento ele não conseguia esconder o encanto ao ver como ela estava bela. Ele não a via há várias semanas - quase dois meses, se suas contas estavam certas -  e esconder seu contentamento já seria difícil de qualquer forma, mas ela havia tornado seu trabalho ainda mais difícil aparecendo vestida daquela forma. A bruxa estava com um vestido de renda negra que deixava os ombros nus, apesar das mangas longas, e ia apertado no corpete até a cintura, de onde a saia saía, começando próxima ao corpo até ficar levemente rodada próxima ao chão. Apesar da renda escura, o forro era quase do tom da pele dela - o que criava uma ilusão de ótica quase incômoda. Os longos cabelos dela estavam presos, acentuando o efeito do decote do vestido, em um penteado intricado que o fazia pensar se ela estava tendo ajuda dos criados ao se arrumar pela manhã. Ele não pode deixar de notar que além do anel com o brasão, ela ainda estava usando o anel de esmeraldas.


- Como eu não viria? - ela perguntou, limpando a garganta e sentando-se à frente dele. Ela escondera perfeitamente o fato de que havia notado que ele estava com o olhar fixado nela, e ele agradecia por isso. - Depois de uma convocação tão formal… - ela provocou.


- Ah sim, isso. - Voldemort tentou esconder o prazer que sentira ao detectar quase uma nota de incômodo na voz dela. - Imaginei que, por se tratar de uma ocasião oficial, devíamos tratá-la de forma protocolar.


- É só que… - ela parou por um instante e tamborilou os dedos na mesa. - Nunca imaginei que sentiria a necessidade de ser protocolar, não comigo, não como se eu fosse… como os outros. - ela lambeu os lábios. - Digo…


Voldemort sorriu, e deixou os papéis na mesa. - Por se tratar de minha general, praticamente segunda em comando, e a coisa mais próxima que tenho de uma amiga? - ele questionou, e ela fitou o colo, sussurrando algo como “Não sou sua segunda em comando, a Melinda é.” - Não, Bella, você é. Melinda é minha herdeira, está sendo treinada para assumir meu lugar no futuro, são casos diferentes. Não te deixei como guardiã de meu segundo maior país à toa. De qualquer forma, você está certa, e peço que me perdoe. Você merece mais do que receber cartas escritas por meus ‘lacaios’. - Voldemort citara um pensamento que cruzara a cabeça de Bellatrix nos minutos antes, e ela enrubesceu um pouco. - Não se repetirá… daqui pra frente, somente me comunicarei com você diretamente.


Bellatrix não pôde evitar de sorrir, e Voldemort estava provavelmente muito mais satisfeito do que devia com o claro incômodo dela. Nas pequenas coisas, Bellatrix nunca mudaria, e a ideia de ser tratada por ele como todos os outros ainda a aterrorizava, e ele adorava isso. - Obrigada, - ela respondeu. - Acredito ser mais prático assim também… de qualquer forma, sobre Lucius…


- Sim… Imagino que Melinda tenha te atualizado sobre como o Ministro da Magia está querendo ser irritante sobre esse assunto. - Bellatrix assentiu e revirou os olhos. - Aparentemente é a forma dele de me atingir, já que perdeu a guerra. Não que vá conseguir, é claro. Lucius é nosso prisioneiro, e está lá por traição. Você pode não ser mais a Lady das Trevas, mas era na época que Lucius cometeu o ato, mas… não é como se eu fosse divulgar o que aconteceu, nunca faria isso com você. - ele tocou a mão dela, e Bellatrix sorriu tranquila. - De qualquer forma, está sendo bastante desagradável, e precisamos resolver antes que eles nos irritem mais.


- E você quer que eu decida o que fazer, já que tecnicamente ele é meu prisioneiro. - ela concordou, e mordeu o lábio inferior. - Não vou negar que me diverti enormemente com Lucius nos últimos meses, e que não me incomodaria de continuar por anos a fio… mas, se não é possível, creio que podemos chegar a um acordo de qual seria a melhor solução para darmos um fim nele. Em minha opinião, Lucius deve morrer. Acredito que não sofreu o suficiente ainda, mas é melhor do que dar a Kingsley o gostinho de nos irritar. Acabar com Lucius mandaria uma mensagem para eles… e é o que devemos fazer. - Voldemort concordou com a cabeça. - No entanto, eu não fui a única pessoa que Lucius feriu.


Voldemort franziu o cenho e relaxou em sua cadeira, confuso com o final da fala de Bellatrix. Ele não entendia bem o que ela estava querendo dizer, mas confiava no julgamento dela. Meses antes, ele lhe dera carta branca e manteria essa promessa - mesmo que discordasse da opinião dela ao fim, e duvidava que isso seria o caso.


- Além do que… creio que com este caso, podemos desenvolver mais do que apenas uma punição para Lucius. - ela pareceu pensar por um instante. - Venho pensando nisso há alguns dias, e formulei minha decisão no caminho para cá. Eu não tomarei decisão nenhuma quanto ao destino de Lucius: Narcissa tomará.


Voldemort deixou a pena que segurava cair sobre a mesa, e sorriu antes de acenar brevemente com a cabeça. Ele entendia o que Bellatrix estava fazendo, e, se perguntassem sua opinião, ele diria que era genial. Ela não simplesmente acabaria com Lucius, ela resolveria o problema como um todo ao dar uma oportunidade a Narcissa de tomar o rumo de sua vida, e passar por cima do estrago que o marido fizera.


- Não dirá nada? - Bellatrix o acordou de seus pensamentos, e ele deu de ombros.


- Preciso? - ele levantou-se e circundou a mesa, apenas para apoiar-se à mesa do lado dela. Bellatrix relaxou na cadeira, e deixou-se apoiar no encosto atrás de si, para poder olhá-lo nos olhos. - A decisão é sua, eu disseque era. Cumpro minha palavra, achei que já sabia disso.  


A bruxa sorriu, e fitou o próprio colo por um momento, antes de sentir os dedos dele se fecharem delicadamente ao redor de seu pulso esquerdo. Ela não se assustou, ou tremeu, como sua mente quase quis lhe deixar imaginar, apenas o olhou de volta com um olhar questionador.


- Preciso chamá-los, - ele esclareceu, e traçou a marca negra por cima da renda do vestido dela, que suprimiu o arrepio que quis insistentemente percorrer seu corpo. - Pelo menos o círculo íntimo, para que possamos informá-los do que acontecerá. Estou farto de rumores, então vamos garantir que nenhum se iniciará dessa vez.


- Fique à vontade, - ela respondeu, e travou o maxilar para o que estava por vir. Ela quase engoliu seco, pois uma parte de si pensara que ela nunca mais teria aquela sensação. - Contudo… eu tinha ficado com a impressão de que você tinha acordado em não mais usar a Marca Negra.


- Não, - ele tirou a varinha das vestes e virou o pulso dela para expor o antebraço, e puxou-o para um pouco mais perto de seu corpo. - Eu prometi não marcarmais ninguém, pois aparentemente é algo brutal, - ele rolou os olhos, e Bellatrix riu. - e existe um debate imenso sobre marcar o céu com ela em ocasiões especiais, mas acha mesmo que eu concordaria com parar de usar meu meio de comunicação favorito? - ele riu, e Bellatrix negou com a cabeça, com um sorriso no rosto. - Exato. Agora, com licença, vossa graça. - ele tocou a varinha na Marca dela, por cima da renda, e Bellatrix mordeu os lábios para segurar o som que tentou sair de seus lábios.


Não era a sensação de ter seu braço em chamas que causara aquilo, pois depois de tantos anos, ela recebia aquela dor quase como uma velha amiga - no máximo, consideraria um incômodo. Era a conexão que a pegara de surpresa. Ela quase havia se deixado esquecer como era sentir a própria essência dele passando por dentro de si a caminho de atingir a ligação com as outras marcas. Bellatrix sabia, era claro, que ele podia limitar o quanto a pessoa cuja marca ele utilizara sentiria da presença dele, da mentedele dentro de seu corpo - mas em se tratando dela, a bruxa sabia que ele soltara todas as amarras. Ela não saberia descrever se a experiência fora quase espiritual ou sexual, mas todos os fios de cabelo de seu corpo estavam arrepiados, e ela quase sentia vergonha disso. Ela lambeu os lábios e engoliu seco, para então respirar fundo e encará-lo.


Voldemort tinha quase um sorriso divertido formado nos lábios, e ela por um segundo considerou a possibilidade de esganá-lo. Era lógicoque ele estava se divertindo às custas dela, e muito. Ele bruscamente tirou a varinha de sua marca, e Bellatrix sentiu-se respirar novamente, por mais que ainda estivesse levemente inerte.


- Está se sentindo bem, Bella? - ele provocou, recostando-se à mesa com os braços cruzados, enquanto ela voltava a respirar com calma. - Pensei que depois de tantos anos, já estivesse acostumada ao queimar da Marca.- Bellatrix fechou os olhos e deixou o queixo cair, usando toda a força em si para não estapeá-lo.


- O queimar da Marca… é claro. Às vezes, eu te odeio. - ela respondeu, sincera. - Tenho um sentimento que te odiarei mais vezes daqui pra frente. - ela o encarou novamente, para encontrar um sorriso convencido. A bruxa se levantou. - Mas não se preocupe, milorde, na próxima eu lembro de usar Oclumência.


- Mas… qual seria a graça nisso?


- Graça para quem? - ela cruzou os braços, e ele finalmente riu.


- Justo, minha cara.  - ele lambeu os lábios e se afastou da bruxa, dando-lhe espaço para andar até a porta. - Bella…- ela o olhou por cima do ombro, a mão na maçaneta. - Se preferir utilizar o quarto de Melinda, ou um dos quartos de hóspedes, para descansar até a chegada deles, fique à vontade.


Bellatrix sorriu com o canto dos lábios, e assentiu. - Eu gostaria sim… - ela girou a maçaneta, mas parou no lugar, encarando a porta por alguns momentos. Estar ali nunca pareceria natural, não para ela, não daquele jeito. - Obrigada por me dar carta branca, novamente. - ela não o olhou, mas sabia que ele havia sorrido.


- Seu prisioneiro, suas regras. - Voldemort respondeu, e ela ouviu-o se aproximar e para atrás dela. - Eu nunca faria nada, ou lhe forçaria a nada que não quisesse. - a mão dele cobriu a dela na maçaneta, para ajudá-la a girar. - Prefere o quarto de nossa filha, ou posso acompanhá-la ao de hóspedes? - ele hesitou por um momento, - Uma parte de mim quase quis sugerir o meu, por já conhecê-lo e estar acostumada, mas acredito que ficaria mais desconfortável.


- Concordo, - ela respondeu, fitando o chão. - Lembranças demais, se for ser sincera. - ele abriu então a porta, e Bellatrix deu um passo para trás, tomando cuidado de não encostar no corpo dele. - Mesmo assim, acho que prefiro o quarto de Melinda… - o que ela não disse, mesmo que ele soubesse, é que o quarto da filha teria familiaridade o bastante para ela não se sentir uma estranha na casa que um dia fora sua, mas sem confundi-la ou deixá-la desconfortável.


Voldemort educadamente deu um passo para trás e estendeu a mão para fora do escritório, - Como preferir, Bella. Creio então que eu não precise acompanhá-la, já que conhece o caminho.


Bellatrix quase considerou aceitar que ele a guiasse, mas a verdade é que talvez fosse melhor que ela fosse sozinha. Ela fez uma reverência, e passou pela porta, sussurrando um “Até mais tarde”, que Voldemort respondeu com um aceno de cabeça. Ela tinha em torno de uma hora até que todos os Comensais chegassem, e era tempo o suficiente para ela conseguir planejar o que ela queria dizer. O caminho para o quarto de Melinda vinha quase que naturalmente em sua memória, e ela imaginava se a filha estaria lá.


Quando estava no topo da escada, estranhando o fato de que nenhum dos seguranças havia parado-a para questionar, ela se pegou questionando se deveria ir na direção do quarto de Melinda ou na direção do quarto deles… dele. Seus pés a levaram até aquela tão conhecida porta mesmo contra sua vontade e, apenas no momento em que ela tocou a maçaneta, Bellatrix conseguiu se afastar. Aquela era uma má, uma péssima ideia. Ela andou a passos largos até o quarto da filha e bateu na porta, sem resposta. Melinda devia estar ocupada com qualquer coisa, o que era até melhor. A bruxa entrou, e sentou-se na cama da filha, levemente ofegante. Aquilo tudo era louco demais, e ela queria que ele não estivesse sendo tão encantador… o maldito homem sabia ser um santo quando queria, ela bem sabia, e odiá-lo seria mais fácil se ele não tivesse parado de lhe dar motivos para tal.  


- Por Merlin, - ela massageou o pulso que ele havia tocado antes, e respirou fundo. - Pare de ser ridícula, Bellatrix. - ela olhou ao redor, e o quarto de Melinda parecia o mesmo de sempre, ela quase sorriu com a constatação. Ela se levantou e aproximou-se da penteadeira da filha, tocando a tiara que ela havia deixado ali em cima. Aquela era toda feita de diamantes, e o ouro branco formava rosas ao redor dela. Uma fina tira de veludo negro cobria a base da tiara - para camuflá-la ao cabelo de Melinda, ela sabia, dando a ilusão de que a tiara estava apenas pousada sobre o cabelo. Era como se a jovem planejasse usá-la logo… talvez até mesmo naquela noite. Ela não duvidaria disto, é claro.


Mais alguns passos e ela se vira no banheiro da filha, fitando a própria imagem no espelho. Aquela não seria, nem de longe, uma noite fácil para nenhum deles. Parte de sua mente a dizia que, de todos ali, Narcissa teria a pior noite de todas - ou talvez, ela gostava de se enganar, a melhor. Mas ela também sabia que a irmã precisava daquilo, de escolher seu próprio destino.


 


- No meu quarto? - Melinda indagou, cruzando os braços e apoiando-se à mesa do pai. - É quase desapontador. Uma parte de mim, talvez a adolescente sonhadora, esperava ter de lidar com o drama de ela passar a tarde no quarto de vocês.


- No meu quarto, você quer dizer. Ela não mora mais aqui… - Voldemort corrigiu, prestando atenção nos papéis abaixo de si, ou fingindo estar. Melinda rolou os olhos, e ele parou a pena. - Ou consigo ouvir sua decepção, minha cara, mas não se esqueça de não matar o mensageiro…


Melinda lambeu os lábios, impaciente, e por fim deu de ombros. Não era como se ela pudesse lutar contra aquela realidade maldita, mas ela sempre podia negar-se a aceitar completamente. - Sempre será o quarto de vocês, não me importa se ela mora aqui ou não. Lembre-se disso no futuro, aliás.


Voldemort finalmente desistiu dos papéis, e recostou-se à própria cadeira, tentando entender o que fora que acabara de ouvir. Não era possível… - Isso foi uma ameaça? - ele perguntou, quase não conseguindo segurar o riso de deboche, e Melinda engoliu seco. - Está me ameaçando agora, Melinda? Com quem está aprendendo essas maneiras, mocinha? Sua mãe já está te virando contra mim?


A bruxa ficou pálida por um instante, e no outro parecia que ia explodir. - Não tem a mínima graça! - ela protestou, abrindo a boca em completo choque. - E você sabe muito bem o que eu quis dizer! - Voldemort, no entanto, parecia divertir-se com a irritação da filha, mas conhecendo-a também não a levaria ao limite por mais engraçado que fosse.


- Sim, eu sei. - ele respondeu, sério. - Você tentou me ameaçar, de forma brincalhona e quase implícita para que, caso no futuro minhas tentativas de reatar com sua mãe se mostrassem falhas e eu decidisse digamos superá-la, eu não desse acesso àquele quarto para nenhuma outra mulher. - Melinda apenas fitou os próprios sapatos, calada. Não era como se o próprio silêncio não o respondesse, é claro. - Não tem nada com o que se preocupar, Melinda. Neste sentido, estamos completamente alinhados. Não entenda isto como sinal de que suas ameaças não me incomodam. Devo lembrá-la que, apesar das mudanças instauradas, ainda me deve respeito… e vou cobrá-lo.


Melinda assentiu, tentando mascarar um sorriso que insistia em querer povoar seus lábios. Naquele momento, sorrir seria um indicativo de que ela o estava desafiando. Então, por mais que as palavras do pai a fizessem extremamente feliz, ela manteve-se o mais séria que conseguiu. Ela não podia, no entanto, deixar aquela oportunidade tão feliz passar.


- Obrigada… - ela sussurrou, ainda sem encará-lo. - Por estarmos alinhados, por… não desistir dela. Sei como é difícil, como essa situação toda é péssima.


- Não precisa me agradecer, Melinda. - ele voltou a atenção para os papéis na mesa, ou pelo menos fingiu fazê-lo. - Não é como se Bellatrix fosse fácil de esquecer, ou como se eu fosse uma pessoa que desiste das coisas… reconquistá-la tornou-se quase um desafio pessoal. - ele tentava parecer sério, e quase arrogante, mas Melinda sabia, podia ver na mente dele uma história bastante diferente. Ele sofria, muito, muito mais do que se atreveria a admitir para qualquer um incluindo a si próprio.


- Evidente… - a jovem respondeu, mordendo o lábio inferior. - Agora se me dá licença, vou avisar aos guardas que o círculo íntimo é esperado.


- Obrigado, - ele agradeceu, e Melinda se retirou da sala.


Voldemort sabia que a filha conhecia seus reais sentimentos, mas sentia-se muito mais agradecido com o fato de ela ter continuado com a fachada do que com o favor que ela o estava fazendo indo avisar sua guarda sobre os visitantes. Outra sessão de Melinda falando como sua consciência não era o que ele precisava… era como se Nagini nunca tivesse sido morta.


 


A sensação da Marca queimando havia tornado-se quase forasteira para o círculo íntimo naqueles últimos meses. A maioria deles chegou a questionar se não estariam imaginando coisas, mas não era como se alguém tivesse coragem de ignorar o chamado para testar sua veracidade. Logo, todos estavam no salão da Mansão Slytherin, servindo-se de taças de champagne ou doses de whisky de fogo - como preferissem.


Nenhum dos membros da família real havia aparecido ainda, muito menos Bellatrix, o que levantara algumas suspeitas quanto ao conteúdo daquela reunião. Era como nos velhos tempos, antes da paz os trazer uma certa sensação de letargia. Todos começavam a se perguntar e a fazer apostas, quando Melinda finalmente apareceu na porta da sala.


- Boa noite, - a princesa os cumprimentou, utilizando um sorriso quase tão brilhante quanto a tiara que adornava os longos cabelos que ela escolhera usar soltos. Os presentes curvaram-se a ela, e alguns aproximaram-se para beijar-lhe a mão, antes que ela continuasse. - Meus pais logo estarão presentes, pedem desculpas por deixá-los esperando, mas… é como dizem, reis e rainhas nunca estão atrasados. - ela brincou, arrancando risadas de todos. A pergunta era apenas quantas daquelas eram ou não genuínas. - Por enquanto, sirvam-se do que quiserem.


Gabrielle Ceresier aproximou-se da amiga, e a cumprimentou com um abraço apertado. - Bonsoir, - ela sussurrou, enquanto Melinda a abraçava de volta. - Uma pergunta: até quando a obsessão com tiaras vai durar?


- Até eu enjoar, provavelmente. E, hey, eu só as uso em ocasiões especiais ou oficiais! Tecnicamente, estamos em uma ocasião oficial. - Gabrielle riu-se e rolou os olhos.


- Como quiser, vossa alteza real. - ela curvou-se de forma irônica, e Melinda deu-lhe um tapa no ombro. - Ouch! Okay, eu talvez tenha merecido.


- Talvez..? Enfim… como está a Bretanha?


- Muita cidra, muita manteiga… - Gabrielle deu de ombros, - Trouxas ainda sem entender que o ingrediente secreto dos produtos da região é magia. O de sempre. Meus pais estão encantados… e eu também, devo dizer. Foi bom pra mim me afastar depois de tudo o que aconteceu…


Melinda segurou a mão da amiga e assentiu, Gabrielle havia passado por muitas decepções nos meses anteriores, e lhe alegrava que a loira estivesse finalmente voltando a seu estado normal - pelo menos o quanto ela podia em tal situação. Ela podia ver, na mente aberta de Gabrielle, que a dor ainda estava lá, mas que começava finalmente a ceder. - Neste caso, fico feliz que tenhamos conseguido ajudar de alguma forma te mandando para a França…


- Falando em França! - Gabrielle desviou o assunto, e Melinda decidiu respeitar. - Onde está aFrança?


- A França? - Melinda franziu o cenho, perguntando-se o quanto Gabrielle havia bebido. - Do outro lado do canal, minha cara.


A loira revirou os olhos, e cruzou os braços. - Sua mãe. Existe essa piada interna agora, não sabia? O círculo íntimo sempre se refere a ela como “A França” ou “A Duquesa”, nunca mais ouvi ninguém chamá-la pelo nome...mas pelo visto não fazem isso na frente de vocês. Não é como se o nome dela tivesse um tabu, mas parece que as pessoas se divertem conversando sobre como todos queremos que a aliança entre a Inglaterra e a França se estabeleça novamente.


- Inglaterra sendo o meu pai, imagino. - Melinda tentou segurar o riso, - Vocês são todos ridículos. Bem, a guardiã da França está lá em cima… fazendo sabe-se lá o que diabos, se for sincera. Meu pai foi tentar tirá-la de lá. Eu ia, mas ele fez questão…


- Oh, será que eu vejo sinais de uma aliança?


 


Dez minutos, ou mais, eles estavam ali na mesma posição. Voldemort sentado na beirada da cama de Melinda, enquanto Bellatrix olhava o próprio reflexo no espelho da penteadeira. O ar no quarto era denso e o silêncio ensurdecedor. Ele não deveria estar ali, mas estava porque ela precisava dele ali - por mais que doesse admitir. Ela o odiava, o amava, o respeitava, o temia, mas também… ele, de alguma forma doentia, ainda era seu único porto seguro.


- Ela me odiará, - ela finalmente falou, lambendo os lábios e respirando pesadamente. - E, da mesma forma, preciso fazer isso. Narcissa…. Narcissa precisa se libertar.


- E você também… - ele adicionou, e Bellatrix olhou por cima do ombro para encará-lo. - Sabe bem disso, minha cara. Narcissa não é a única que precisa se libertar desse pesadelo e, por mais divertida que seja sua vingança, eu e você sabemos que, enquanto uma pedra não for colocada nesta questão, você estará presa a todo esse sofrimento. - ele se levantou, e andou lentamente até ela, que passou a encarar as próprias mãos no colo. - Oh Bella, minha Bella, não percebe? Lucius é uma âncora, ele te segura, te prende… vá para a França, faça o que preferir, mas liberte-se.


Os olhos deles se encontraram através do espelho, e Bellatrix assentiu, lambendo os lábios. A verdade nas palavras dele era quase incômoda, mas ela não podia ignorar que ele estava certo. Tantos anos obcecada com sua dor e sua vingança que ela mal sabia entender como seria estar livre disso, finalmente solta das amarras de seu próprio martírio.


- É como se a dor fosse uma parte de mim, - ela admitiu, soando quase cansada. - Passei tantos anos agarrada ao que ele havia feito comigo, e ao meu desejo de vingança, que agora… a ideia de estar completamente livre de minha vingança, de colocar uma pedra nesse assunto, é quase assustadora. Como se eu não soubesse quem eu sou sem a dor e o ódio…


Voldemort tocou os ombros dela e apertou delicadamente, ele podia ver os pensamentos dela lutando entre si rapidamente, a confusão, e o estresse, toda a tensão de anos a ser finalmente resolvida. Bellatrix era forte e, mais do que isso, gostava de aparentar ser uma fortaleza, mas ela também tinha seus demônios - e precisava lidar com eles, antes cedo do que tarde. E aquele era provavelmente o maior deles…


- E ela é, minha cara. A dor tornou-se parte de ti, mas não precisaSua dor não é sua força, - Voldemort beijou o topo da cabeça de Bellatrix, que involuntariamente fechou os olhos e suspirou. Não importando o quão contraditório pudesse ser, ela sentia-se mais segura do que nunca próxima a ele, ela aindase sentia assim - mesmo que ele também fosse a pessoa que ela mais temia. - Acredito que seja hora de deixar isso tudo para trás, colocar uma pedra… - ele continuou ainda próximo dos cabelos dela.


Bellatrix assentiu e olhou-se no espelho, checando a própria imagem uma última vez antes de se levantar e aceitar o braço que ele lhe estendera - e agarrar-se a ele com mais força do que havia planejado, ou do que seria necessário. Era estranho para ela como ele se dispunha a estar lá quando ela precisava, a confortá-la e dar-lhe força, mesmo quando eles estavam em termos tão desconfortáveis entre si. Bellatrix sentia-se imensamente grata, se fosse dizer a verdade, pois não sabia até que ponto seria capaz de passar por tudo aquilo, pelas mudanças e exposições necessárias para a consolidação da nova ordem.


- Pensei que fôssemos amigos, - Voldemort, como era irritantemente costumeiro, respondeu à pergunta que ela nunca tinha feito. - Certa vez, em uma ocasião de batalha, Potter tentou se gabar ao dizer que eu podia ter todo o poder que quisesse, mas nunca teria quaisquer tipos de afeição, ou do suporte que vem junto à esta, demonstrados a mim. Eu me atrevo a discordar plenamente, pois vocêé a prova viva de que ele estava errado, e eu lhe sou grato por tal gesto. Assim, o mínimo que deve esperar de mim é ter o mesmo em retorno. E, por mais que no passado eu tenha falhado nesta tarefa, pretendo me remediar.


Bellatrix engoliu seco, tentando ignorar as implicações de tal declaração, e os sentimentos dúbios que lhes foram causados - afinal, como haviam sido todos os gestos recentes, essa consideração chegara talvez tarde demais. Sim, ele havia falhado, e ela ainda teria de se acostumar com suas tentativas de remediação. Naquela noite, no entanto, ela aceitaria sem pestanejar. - Obrigada, - ela respondeu, acariciando o braço dele delicadamente em adição ao agradecimento. - E eu sei que ainda hoje precisarei de seu suporte novamente… por isso, te agradeço desde já.


- Sempre que precisar, - Voldemort respondeu, e guiou-a até a porta, para que finalmente pudessem se juntar aos Comensais da Morte.


 


Ver o Lorde e a ex-Lady das Trevas chegarem à sala de braços dados, após tudo o que havia acontecido, causou choque no grupo presente na sala. Melinda engasgou na própria bebida ao ver os pais descendo juntos, pois era quase como um sonho realizado vê-los daquela forma novamente. No entanto, ela não gostava de se iludir, e aquilo era bom demais para ser verdade - pelo menos naquele ponto em que eles estavam.


Os presentes tiraram um momento para superarem os choques iniciais para somente então se recomporem e curvarem-se brevemente aos dois. Após vinte anos, era estranho para todos - até mesmo para os Comensais da Morte que mais haviam odiado Bellatrix - vê-los separados. Era como se relacionar-se com Bellatrix houvesse se tornado uma parte do conceito do Lorde das Trevas e a separação quase levara todos próximo demais ao fim da zona de conforto então, naquele momento, a surpresa de vê-los de braços dados era mais reconfortante do que esquisita e incômoda - não que eles fossem admitir, é claro.


- Boa noite, - Voldemort cumprimentou-os seriamente, e soltou o braço de Bellatrix para pegar sua mão. - Imagino que todos estejam curiosos quanto à razão por trás de suas convocações, e lhes asseguro que logo saberão, mas primeiramente gostaria de agradecer a presença de Sua Graça, que deixou a França para se juntar a nós tão rapidamente, apesar da falta de aviso prévio. - Voldemort beijou o dorso da mão da bruxa, que sorriu. - Bella, obrigado, sei que a França está sentindo imensamente sua falta. - Bellatrix riu-se por um momento e lambeu os lábios.


- É um prazer, vossa majestade. - ela respondeu, educada. - Estamos aqui para servi-lo… - e então, o reconforto momentâneo que a possibilidade de eles estarem juntos novamente causara acabou. Como Melinda havia imaginado, bom demais para ser verdade.


Voldemort dirigiu-se à cabeceira da mesa, e Bellatrix tomou sua direita, à frente de Melinda que sentara-se à esquerda. Os outros Comensais tomaram seus lugares assim que os três estavam sentados, desconfiados sobre qual poderia ser o motivo daquele encontro. Eles estavam em paz, não estavam?


- Tia Bella, é um prazer vê-la aqui. - Draco cumprimentou-a com um sorriso, quase ignorante à clara tensão que Bellatrix não mais conseguia disfarçar. - Como está Bordeaux?


Bellatrix quase queria agradecê-lo por mudar o assunto, e não se atrever a perguntar nada sobre os motivos daquela reunião, pois o impacto em seus pais seria enorme após aquela noite. Ela limpou a garganta, e tentou devolver o sorriso do sobrinho, - Olá Draco, também fico feliz em revê-lo. Bordeaux está linda, principalmente nesta época do ano, e cheia de uvas como sempre. - eles riram por um momento, e Bellatrix continuou. - Quanto a meus novos vassalos, se foi isso que perguntou, parecem estar aceitando bem a nova realidade. Você devia visitar-nos na próxima vez que Melinda for, será imensamente bem vindo.


- Pode ter certeza de que irei, titia. - Draco respondeu, com o sorriso enfraquecido. Ele limpou a garganta e pareceu engolir seco, gesto esse não compreendido por Bellatrix.


- Há algo de errado, Draco?


- Eu… - ele passou a sussurrar, e percebeu que Voldemort estava discutindo algo com Melinda. - Eu teria ido antes, com mamãe ou Melinda, mas… tenho preferido ficar no Reino Unido. Ultimamente… desde que a guerra acabou, tenho a impressão de que O Lorde das Trevas, digo, Sua Majestade não está satisfeito comigo. Ele está distante, não me dando o espaço que costumava me dar, como se eu não mais pertencesse ao círculo íntimo…


Bellatrix franziu o cenho, sem conseguir entender o que poderia ter causado o afastamento. Uma parte dela acreditava que a situação com Lucius talvez tivesse alguma relação com o acontecido, mas não parecia fazer sentido no final das contas, pois Kingsley só começara a falar sobre este caso havia poucas semanas. Pela primeira vez, em muitos anos, ela não conseguia entrar na cabeça de Voldemort, entendê-lo, por mais que o conhecesse. A falta de convivência tinha suas diferenças…


- Novamente, boa noite. - ele tomou a atenção de todos para si, e Bellatrix deixou seus devaneios para encará-lo. Ela não conseguiria dizer aquilo para Draco no momento, mas tentaria descobrir o que estava acontecendo antes de voltar para a França. O que ela pôde fazer foi lançar um olhar de apoio ao sobrinho. - Por mais estranho que possa parecer, esta noite não serei eu que conduzirei a reunião, mas Bellatrix. Como minha general, e parte interessada no caso a seguir, creio que fará mais sentido. Por isso, Bellatrix, te passo a palavra.


- Obrigada, majestade. - ela respondeu, não surpreendida pela atitude do bruxo. Depois de tanto pensar, ela finalmente se sentia preparada para a tarefa à sua frente, mas ela nunca estaria preparada para o que ele faria a seguir.


- Uma vez que conduzirá a reunião, - Voldemort se levantou, fazendo com que todos se levantassem imediatamente, - Por gentileza. - ele circundou a cadeira e indicou-a com um aceno de cabeça.


Bellatrix congelou no mesmo lugar, fitando Voldemort e a cadeira como se estivesse tentando decifrar uma língua antiga. E não era como se não houvesse um motivo: aquilo simplesmente não fazia sentido, ele nunca havia oferecido seu lugar a ninguém e oferecê-lo não era de seu feitio, devia ter alguma coisa ali que ela não havia notado.


- Majestade, por mais que agradeça, não posso aceitar tomar seu lugar, sentar-me nele seria um desrespeito. Esta noite sou apenas sua porta voz, uma vez que posso ter o poder de decisão, mas… sou somente uma serva. - ela respondeu, com a voz trêmula e ainda extremamente confusa.


- Vossa Graça, eu gostaria de lembrá-la que sou euquem decide o que é desrespeitoso ou não e, se não me recordo erroneamente, fui eu quem lhe ofereci a cabeceira da mesa. Hoje à noite, minha cara, esta reunião é sua, não minha, e eu estou apenas cedendo-lhe a Mansão Slytherin como base para tal. Agora, por gentileza, poderia aceitar minha oferta para continuarmos? - ele respondeu, quase impaciente com a mania que Bellatrix tinha de lhe ser tão leal em momentos inoportunos.


Bellatrix engoliu seco e respirou fundo, tentando convencer-se de que aquela sugestão não carregava nenhuma intenção implícita e que, talvez, ela estivesse apenas imaginando coisas. A verdade era que, provavelmente, Voldemort queria apenas ser cortês e ela estava dando significados demais a coisas simples. Ele não era culpado do fato de que aproximar-se da cadeira dele, após assentir com um murmuro de “Como preferir, Majestade”, lhe fazia imaginar coisas que não queria relacionadas a uma vida que ela escolhera não ter. Quando ela finalmente sentou-se e observou-o tomar sua direita, ela foi inundada por lembranças de um passado não tão distante, e incomodou-se com todos os sentimentos que insistiam em lhe atormentar. Seu pulso estava ridiculamente acelerado e a respiração queria falhar, mas ela não permitiria, mesmo porque não tinha certeza se todas as alterações haviam ocorrido apenas devido à menção que a situação fizera a um mundo em que ela reinaria ao lado de Voldemort, ou se a situação que ela iniciaria era a grande responsável.


- Como o Lorde das Trevas, perdão, Vossa Majestade falou o tema que venho lhes trazer hoje é, para mim, de cunho pessoal por diversas razões. - Bellatrix não conseguia entender o que lhe incomodava mais: ter que dividir aquele assunto tão pessoal, ou o fato de que nenhum dos Comensais da Morte havia ao menos piscado ou questionado o fato de vê-la sentada ali. Estariam eles tão habituados com a ideia a ponto de sentirem-se confortáveis de uma maneira que ela não conseguia? Ou tão certos de que aquele seria o futuro próximo? Seriam os motivos e protestos dela tão subestimados, ou seria ela tão transparente para todos a ponto de perceberem coisas que ela mesma não queria acreditar? Fosse como fosse, ela precisava continuar. - Todos aqui sabem, em algum grau, que Lucius Malfoy foi detido durante a guerra. O que vocês não sabem, é a razão por trás de sua detenção: Lucius foi preso por Traição.


O silêncio anterior da sala foi quebrado por uma série de murmúrios e comentários dos Comensais da Morte, alguns impressionados e outros nem tanto, todos tentando entender como e porque Lucius os teria traído, cometido um crime ruim o suficiente para que fosse preso às pressas, sendo ele parte do círculo íntimo por anos. Todos comentavam sobre os rumores que haviam ouvido, e cobravam apostas dos colegas, enquanto Bellatrix aproveitava a oportunidade para pensar em suas próximas palavras. Draco e Narcissa eram os únicos que fitavam os próprios colos, e tentavam não pensar no que estava por vir e na vergonha que teriam de suportar nos próximos dias.


- Silêncio, - Voldemort interviu a um ponto, quando todos já falavam alto o suficiente para encher a sala com o som, e todos imediatamente ficaram calados Suas curiosidades eram enormes, mas nunca maiores do que seu respeito ou temor em relação a Voldemort. - Bella, continue por favor.


Bellatrix trocou um olhar de agradecimento com Voldemort, suprimindo uma estranha vontade de tocá-lo por suporte debaixo da mesa e, novamente sem dizer nenhuma palavra, Voldemort tomou a liberdade de tocar o joelho dela e apertar com delicadeza, sem que ninguém visse e, após aquele acontecimento, Bellatrix entendeu que ele sabia o que ela pretendia fazer. Você não precisa fazer isso, Bella”, ele dizia em sua mente, Sabe que não é necessário”. Ela, no entanto, discordava. Os Comensais da Morte nunca se dariam por satisfeitos com meias respostas, e ela queria enterrar aquele assunto o mais rápido possível, por mais que isso significasse trair seu próprio orgulho.


- Eu entendo que o conceito de Traiçãopode ser aplicado a diversos crimes, e percebo a confusão e suspeita nos rostos de todos vocês. Este é um novo mundo, e não podemos ter segredos entre nós, não tão sérios como este, não mais. Estamos em paz, mas esta paz nos é custosa, e precisamos que confiem em nós. - Bellatrix mal percebia que estava não somente falando como uma General, mas como a rainha que eles não tinham e ela se recusava a ser. Alguns hábitos, naturalmente, são difíceis de matar. - E, em nome desta confiança, estamos aqui. Lucius cometeu traição, sim, mas o crime dele não foi contra o Lorde das Trevas, por mais que o afetasse, e sim contra a Lady das Trevas.


- Quer dizer contra você mesma, vossa graça. - Alecto Carrow se pronunciou, e Bellatrix assentiu. - Podemos perguntar de qual crime estamos falando? - a pergunta de Alecto trouxe à tona os receios de Bellatrix sobre meias verdades, pois ela não era inocente, a pergunta “Ou esta é a extensão de sua sinceridade que teremos?” estava implícita. - Peço que entenda, milady, que Lucius foi um colega por anos e, tê-lo condenado por traição de forma tão secreta nos deixou um tanto desconfortáveis pois, em todos os outros casos, fomos informados do que ocorreu e neste… estávamos às cegas. Não digo que nos devam qualquer tipo de satisfação, apenas… o Lorde da Trevas sempre tratara este tipo de caso com a mais absoluta transparência no passado e não conseguimos entender porque neste caso específico---.


- Estupro. - Bellatrix finalmente respondeu, e a mão de Voldemort apertou seu joelho com mais força, enquanto Alecto calou-se e abriu e fechou a boca algumas vezes antes de desistir continuar com a própria fala. Os outros Comensais da Morte, à exemplo de Alecto, pareciam tentar fazer algum comentário, falhando sempre.


Rodolphus Lestrange encarava Bellatrix horrorizado com a verdade que preferia não ter ouvido, assim como o irmão que parecia não querer acreditar. O silêncio na sala, então, tornou-se praticamente sepulcral, e o ar pesou, tornando aquele lugar praticamente insuportável. Evidentemente, uma notícia daquelas não teria reações diferentes daquelas. Felizmente, ninguém estava encarando Bellatrix com qualquer tipo de pena.


- Bella, você não quer dizer que… - Rodolphus se pronunciou, ainda sem conseguir processar aquelas informações.


- Lucius Malfoy  foi condenado porque me estuprou enquanto era Lady das Trevas, caso eu não tenha sido clara o suficiente. - Bellatrix dirigiu-se ao grupo como um todo, e Rodolphus levantou-se, socando a mesa..


- O que diabos aconteceu? Eu vou matar aquele desgraçado!


- Não, não vai. - foi Voldemort quem respondeu, em tom de reprovação, e Rodolphus fez menção de responder algumas vezes, antes de sentar-se novamente. - Acredite, Rodolphus, eu tive o mesmo desejo diversas vezes nos últimos meses, e, se for sincero, precisei esgotar todas as minhas forças mentais para não despedaçá-lo no mesmo dia em que o fato ocorreu, mas o fato é que se alguém fará algo, ou decidirá o que vai acontecer com Lucius, esse alguém será a Bellatrix. Ela pode não mais ser a minha consorte, mas era quando o fato ocorreu, e por isso ela continua tendo carta branca neste caso para julgá-lo.


- Obrigada, majestade. - Bellatrix respondeu com um sorriso, aliviada por não estar sozinha tendo que enfrentar as reações de todos, principalmente daqueles mais próximos a ela. - Quanto à sua pergunta, Rodolphus, creio que precisarei voltar alguma décadas no tempo: Lucius e eu tivemos um caso, há muitos anos, quando ambos estávamos em Hogwarts, muito antes de eu te conhecer ou ao Lorde das Trevas ou Lucius sequer ter considerado se relacionar com minha irmã… um caso adolescente que Lucius fez questão de não esquecer quando eu decidi terminar. Este não esquecimento causou raiva, e uma obsessão que ele cultivou por anos sem poder agir, devido a meu relacionamento com o Lorde das Trevas, mesmo quando ainda éramos apenas amantes… todos aqui sabem que, muito antes de eu sequer cogitar a ideia de ser a Lady das Trevas, nenhum homem se atreveria a chegar perto de mim, pois mesmo quando desejávamos esconder, todos sabiam. - Rodolphus assentiu, ele sabia como ninguém que depois de um tempo ele mesmo desistira. - Mas o Lorde das Trevas caiu eventualmente, e eu fui presa, tornando-me a presa perfeita. Eu não percebi, na época, que os esforços de meu cunhado para me libertar não eram sinceros, e que ele pretendia se aproveitar da proximidade. No começo, Lucius tentou me “reconquistar”, tentando me convencer a ser sua amante por muito tempo, o que eu nunca aceitei. Até que eu, alguns anos após minha libertação e consequentemente evitando Lucius, fiz uma visita à Mansão Black…lá encontrei meu primo, Sirius Black, que embebedou-me para poder dormir comigo. - Ela viu alguns Comensais da Morte fecharem os olhos e suspirarem, pois aquela história ficava pior e pior. - Ao descobrir que meu primo me estuprara e, na cabeça deturpada de Lucius, “tivera a chance de dormir comigo que eu lhe negava”, mais tarde naquele dia, meu cunhado veio a meu quarto quando sabia que eu estava sozinha e me atacou da maneira mais violenta que ele conseguia imaginar em meio a sua raiva. Aquela foi a primeira vez. - Bellatrix expôs o pescoço a todos, e apontou para a cicatriz que ali estava. - Esta é a prova que tenho daquela ocasião e, também, a causa da segunda visita de Lucius. Na noite de Natal de 1994, ele viu que eu deixara a cicatriz e, raivoso, me fez mais uma visita. Um presente de Natal para si mesmo, é claro. - Bellatrix riu-se, irônica e amargurada, e respirou fundo, fitando o próprio colo por um momento. A mão de Voldemort ainda estava ali, acariciando seu joelho calmamente, enquanto ela se recompunha. Toda vez que aquela história era contada, ele ficava mais estupefato com os desdobramentos daqueles acontecimentos e com o que ela havia sofrido em tão pouco tempo. - O que Lucius não contava com era que o Lorde das Trevas, - ela olhou rapidamente para Voldemort, que fitava a mesa. - voltaria poucos meses depois, como eu mesma sempre dissera que ocorreria, e ficaria sabendo do que aconteceu. Evidentemente, eu não teria como esconder. Naquela ocasião, eu tive minha primeira vingança. Torturei-o em conjunto com o Lorde das Trevas, e eu nunca havia tido permissão para atacar outro colega, mas naquela vez… O Lorde fez uma exceção e, após as torturas, ordenou que Lucius deveria se manter afastado de mim… E ele se manteve, - ela engoliu seco, e escondeu a mão trêmula embaixo da mesa. - Até que Lucius entendeu que o Lorde das Trevas havia tirado minha proteção. - a voz dela tremeu por um momento e ela percebeu que ninguém na sala lhe olhava nos olhos e que Narcissa chorava em silêncio. Ah, a irmã, pobre irmã… logo saberia que poderia ter também sua vingança. - Durante o período em que fui condenada a ficar presa na Mansão Malfoy, o Lorde das Trevas e eu… não estávamos em nosso auge, por assim dizer, exatamente pois ele havia me condenado a ficar presa em uma casa com meu estuprador. - ela não conseguiu esconder o ressentimento na voz, e Voldemort não se deu ao trabalho de dizer uma palavra. No fim das contas, ela estava certa. - E, a partir daí, Lucius criou a coragem dentro de si para, mais uma vez, me atacar. Eu estava fraca, mentalmente afetada por tudo aquilo, sentindo-me traída e machucada, e fui decaindo até ficar mais uma vez semelhante àquela Bellatrix dos tempos da queda do Lorde. Quando cheguei ao que eu imaginei ser o fundo do poço, a coragem de Lucius retornou… e a visita ocorreu. Neste dia… ele não teve a sorte das vezes anteriores, e foi surpreendido por Narcissa e pelo Lorde das Trevas, que invadiram o quarto. - ela parou para que todos pudessem digerir por um momento, mesmo que soubesse que eles não o fariam tão facilmente.


Rodolphus e Rabastan pareciam que iam explodir a qualquer momento, cada um de seu jeito, é claro. O mais velho agarrava a mesa fortemente, em uma tentativa óbvia de manter-se sentado por mais que fosse difícil - tudo o que ele menos precisava naquele momento era de mais uma bronca do Lorde das Trevas, mas… era quase impossível. Lucius teria sorte se Bellatrix o matasse ainda aquela noite. Rabastan, por outro lado, fitava o próprio colo quase imóvel, mas era a tensão em seu maxilar que o deletava. O mais jovem dos Lestrange tentava não passar a impressão de seu ódio, mas Bellatrix não era apenas sua cunhada como também amiga, e ele não tinha muitos desses. Ele nunca exatamente gostara de Lucius, ou desgostara, no entanto agora tinha todos os motivos para odiá-lo. Rabastan não acreditava em coisas como honra, mas respeito àqueles a seu redor, principalmente a seus superiores, era um de seus valores - e comoBellatrix era superior a Lucius em sua visão. Ele atreveu-se a olhar para ela de canto de olho, tentando ver por detrás da máscara sem expressão que ela usava no momento. Ela era forte, tão forte, e ao mesmo tempo tão vulnerável, que era difícil entender tamanha dualidade. Talvez fosse por isso que ela causasse o fascínio que causava, porque aquele não era seu único aspecto de natureza dúbia. Como Lucius se atrevera? Ele se perguntava, sabendo ele que ela só não tinha mais inimigos do que aqueles que morreriam por ela - o que lhe consolava era que, nos meses anteriores, os últimos vinham aumentando em uma velocidade que os primeiros não conseguiriam alcançar.


Voldemort permanecia a maior incógnita daquela mesa enquanto ela falava, e atraia mais atenção do que teria desejado. Ele não transparecia qualquer tipo de emoção em seu rosto, mas aquele era o Lorde das Trevas, não? Sempre reservado, sempre misterioso. Os Comensais da Morte, contudo, eram inteligentes demais para acreditar naquilo, e sabiam muito bem que ele escondia a verdade: a julgar pelo envolvimento com Bellatrix, pela forma como perdera os eixos na batalha de Hogwarts por causa dela, e pelas medidas extremas que ele parecia estar tomando para tê-la de volta, todos imaginavam que deixar o destino de Lucius na mão de outra pessoa, em vez de destroçá-lo pessoalmente, provavelmente fora uma das decisões mais difíceis da história do Lorde das Trevas - e, se pudessem ver a mente de Voldemort naquela noite, saberiam que estavam corretos.


Manter a compostura, para o Lorde das Trevas, tornava-se mais trabalhoso a cada frase que Bellatrix pronunciava. Não importava quantos anos iriam passar, ou por quanto tempo Lucius estaria morto no futuro, ele nunca conseguiria esquecer a visão que tivera naquele quarto, ou na mente dela sobre as ocasiões anteriores. A coisa que ele havia descoberto sobre Legilimência era que, por muitas vezes, o Legilimente podia sentir o que o dono da mente sentira: e ele havia percebido, há pouco tempo, que no caso em questão ele desejava que não pudesse sentir.


A mão de Voldemort, confortavelmente repousando sobre o joelho dela, não estava completamente escondida pela mesa, e os Comensais da Morte que a viam eram educados o suficiente para ignorá-la, mesmo porque estavam tão absortos no que estava ocorrendo que aquela era a menor de suas preocupações.


Melinda, Draco e Narcissa não precisavam dizer a ninguém que já sabiam: as expressões deles não haviam se alterado por sequer um segundo e, do ponto de vista dos outros, era admirável que conseguissem se manter assim, uma vez que todos ali não conseguiam conceber o que havia acontecido e, nem muito menos, o fato de Bellatrix estava dividindo aquilo com eles.


Os demais, mantinham-se calados, em geral fitando o próprio colo, ou a mesa embaixo de seus dedos que insistiam em batucar a madeira contra quaisquer ordens de seus cérebros. Aquela situação era singular demais, inesperada além daquilo que eles podiam aceitar.


- Esta noite, - Bellatrix finalmente continuou, tirando todos os presentes do agoniante silêncio que havia se prolongado por muito mais tempo do que podiam suportar, apesar de apenas alguns segundos terem se passado. - Colocamos um fim a esta história ou, pelo menos, damos um início a seu fim. Kingsley e o Ministério… eles descobriram que ainda temos um “prisioneiro de guerra” e, como todos podem imaginar, isso em um tempo de paz seria inaceitável. O problema, meus caros, é que agora todos vocês sabem que Lucius não é um prisioneiro de guerra e que, além disso, eu nunca o deixarei cair nas mãos do Ministério. No entanto, - ela pausou por um instante, dando a impressão aos outros de que estava acumulando coragem para dizer as próximas palavras. - por mais que deseje de toda minha alma ter o prazer de matar Lucius pedaço por pedaço, ou ser aquela que o entrega aos dementadores, mas… nesta situação eu percebo que, por mais que tenha sido a grande vítima dos acontecimentos, não fui a única afetada. Lucius Malfoy machucou a mim, mas a muitos outros no processo, e seus rostos essa noite denunciam a veracidade do que eu lhes digo: não sou a única nesta mesa que precisa dar um fim a este pesadelo. O Lorde das Trevas, - ninguém se deu ao trabalho de corrigi-la, pois sabiam que ele sempre seria o seu Lorde, não importando o que acontecesse, e Voldemort não se importaria, não vindo dela. - foi gentil o suficiente para, apesar de seus próprios desejos quanto a este assunto, me dar carta branca quanto ao destino de Lucius e, refletindo sobre tudo o que eu lhes acabei de dizer, cheguei a conclusão de que não cabe mais a mim decidir a pena de meu cunhado.


Bellatrix, quando imaginando aquele momento, esperava uma explosão de reações, mas novamente os Comensais da Morte lhe surpreendiam: todos a encaravam, calados. Lívidos com o que haviam acabado de ouvir, parecendo mais bonecos de cera do que seres humanos, eles mal piscavam ao estudar cada movimento do rosto de Bellatrix. Todos, menos um: Narcissa também a encarava, mas era como se ela já soubesse o que lhe esperava a seguir, se as lágrimas que começavam a encher seus olhos, a tensão em seu maxilar e o olhar de completa descrença fossem qualquer indício.


- Sem mais delongas, - mais uma vez a mão de Voldemort em seu joelho se moveu, lembrando-a de que estava lá, confortando-a para o que estava para vir. - Devido ao grande efeito que os atos de Lucius tiveram em sua vida e na vida de seu filho, além dos outros danos já citados, minha irmã Narcissa será responsável por julgar o caso e definir a pena de seu marido. -  Bellatrix encarou firmemente a irmã, que claramente tentava segurar as lágrimas e apertava a borda da mesa como se fosse cair a qualquer momento. Draco estava completamente abismado, olhando da tia para a mãe e de volta sem parar. - Uma semana, Narcissa, é o seu prazo neste caso. Imagino que tenha tido mais do que tempo suficiente para julgar a culpa ou não de seu marido, portanto este tempo deve ser mais do que suficiente para tomar uma decisão acertada sobre o que faremos quanto a ele. Em relação a penas, quero deixar claro que não interferirei ou modificarei a pena, mesmo que minha irmã escolha por perdoá-lo ao fim de tudo. Está livre, Cissy, para fazer o que quiser, doa a quem doer. Em uma semana, nos encontraremos novamente aqui para ouvir sua resposta. - Bellatrix se levantou, quase lamentando a perda do toque de Voldemort e do apoio que ele provia, por mais que nunca fosse admitir, e todos a seguiram, menos Narcissa que passara a encarar as próprias mãos e permanecia sentada.


- Não temos nenhum outro assunto urgente a ser discutido, - Voldemort tomou a palavra, para o alívio de todos, - portanto, nos despedimos aqui, boa noite a todos.


Os Comensais responderam com suas próprias variações de “Boa noite, majestade” e “Obrigado, majestade” e, com uma apressada reverência, fizeram menção de sair imediatamente da sala, quando Narcissa finalmente os interrompeu.


- Como se atreve? - não seria um exagero dizer que os presentes naquela sala nunca haviam ouvido a voz de Narcissa Malfoy tão alterada. Draco tocou o braço dela, tentando acalmá-la, apenas para ser fuzilado com os olhos pela mãe. A loira tornou o olhar de volta à irmã, que parecia ter deixado de lado toda a vulnerabilidade anterior, e se erguia alta como uma muralha na cabeceira da mesa. Ah, aquela era a Bellatrix que eles conheciam e amavam odiar. - Não sofremos o suficiente, Bellatrix? Meu filho e eu… não fomos expostos e degradados o suficiente para agora precisarmos suportar sua vingancinha barata? Ou será que você não tem os culhões ou o estômago para acabar com isso? - Narcissa cuspia as palavras, tremendo no lugar em que estava, completamente fora de si.


- Vingança? - Bellatrix riu-se, parecendo tão fora de si como a irmã por um instante, até se recompor novamente.  - Poupe-me de seu drama, Narcissa! Não tenho desejo ou prazer algum em me vingar de você ou de Draco pelos pecados de Lucius: pois amá-lo como você ama, ou amou, deve ser punição o suficiente. O que Lucius fez conosconos castigou o suficiente por uma vida, minha irmã, e sua reação é a prova disso! Ele nos marcou, nos transformou, e a pergunta que fica é: conseguiu, ao fim, nos colocar uma contra a outra? Espero que não, Cissy, pois pode achar que fiz isso para lhe ferir se isso trouxer sentido à coisa toda em sua mente, mas a verdade, minha cara, é que lhe estou dando a liberdade. Ou, ao menos, a chance dela… de livrar-se da âncora que Lucius é em sua vida. Livrar-se por si própria, em seus termos, não nos meus. Não seria cômodo, querida irmã, que eu pegasse minha varinha, adentrasse aquela masmorra, e acabasse com o problema por nós duas? Para que, no futuro, quando você tivesse dúvidas, pudesse apontar o dedo a mim e dizer que fui e juíza e carrasca de sua desgraça? Não, Cissy, eu já me diverti com a dor de Lucius… não diria o suficiente, pois nunca seria, mas tempo adequado para ao menos apaziguar minha sede de vingança contra ele. O destino de seu marido, e de sua família, está em suas mãos. Faça o que bem entender, somente não venha pedir a mim que lide com seus demônios. Hora de crescer, irmãzinha. Odeie-me, chore por dias se quiser, mas resolva: não como Bellatrix resolveria, ou como o Lorde resolveria, como vocêdeseja que isso tudo termine. Agora, se me dão licença, estou cansada.


Bellatrix dirigiu-se à porta da sala, e foi seguida de perto por Voldemort, que sabia o que estava por trás da armadura que ela reerguera. Ela precisaria dele novamente, ele sabia, e estaria lá, quando todo o aço e gelo caíssem novamente por terra. Oh sim, como seria mais fácil se Bellatrix tivesse resolvido tudo impulsivamente… mas tão mais doloroso no futuro. Ao passarem por Narcissa, em meio a mais despedidas e mesuras, a loira agarrou fortemente o braço da irmã e encarou com um ódio que Bellatrix nunca havia visto.


- Eu nunca vou lhe perdoar, minha irmã, por fazer isso comigo! Eu não pedi para estar aqui, e nem tenho desejo de me tornar…. Você!


- Oh, mas vai, minha cara… quando perceber que toda esta dor lhe livrará no futuro da necessidade de me usar como um escudo… de usar minha frieza e, até, crueldade, como moedas de segurança, mas também como desculpas para se sentir melhor sobre si mesma. Examine-se, Cissy, e nos falamos em uma semana. Boa noite. - e, com um grande puxão para se livrar do agarro da irmã, Bellatrix deixou a sala e colocou fim àquela reunião.    


 


Os pés de Bellatrix a haviam levado automaticamente para o quarto que um dia fora seu, sem dar à bruxa qualquer escolha consciente de para onde ela iria após aquela reunião infernal. Ela podia ouvir os passos de Voldemort atrás de si e, por mais que a surpreendesse, ela não estava incomodada. E, mesmo que estivesse, aquele era o quarto dele no fim das contas.


Aquele lugar era familiar e confortável demais, e Bellatrix chegou a girar nos calcanhares para sair dali, apenas para dar de encontro a Voldemort - que, como ela bem sabia, estivera ali o tempo todo. A bruxa fitou os próprios pés e suspirou profundamente, tentando colocar os próprios pensamentos no lugar, após todos os acontecimentos.


Sua mente, Voldemort podia ver, estava uma bagunça interminável. Ela se expusera não somente a si como a irmã e o sobrinho em frente aos Comensais da Morte, colocara Narcissa na linha de fogo e, por mais que ela soubesse que devia, não conseguia sentir uma pontada de remorso que fosse.


- Às vezes, - Bellatrix quebrou o silêncio e sentou-se na ponta da cama, seus olhos ainda se recusavam a encontrar os de Voldemort, mas ele respeitaria aquele limite assim como se retirara da confusa mente dela. Naquele momento, Bellatrix queria espaço, explicar a si mesma, e ele lhe daria este luxo. - Pergunto-me o que acontecerá ao final… se você e Melinda serão tudo o que eu terei… Somos muito similares, eu e você, mas creio que a este ponto saiba disso melhor do que eu. Ela não está completamente errada, minha irmã… talvez uma parte de mim tenha feito isso por covardia, ou como uma vingança mesquinha que ela não merece, e eu nem mesmo consigo sentir remorso. Sabe por quê? Porque essa sou eu, não sou, milorde? Eu não me arrependo… não importa a quantos eu ferir, ou o quanto eu me importe com eles, eu simplesmente faço. Meios para um fim e tudo o mais… talvez Narcissa não quisesse se libertar de Lucius dessa forma, ou da vida que ela havia adorado, mas eu a forço a fazer isso agora. Ela nunca teve escolhas na vida e, dando-lhe uma escolha, eu lhe tiro outra… Provavelmente ela falou a verdade, e nunca me perdoará.


- Ou ela estava magoada e, agora, atingiu o impressionante feito de entrar em sua cabeça, minha cara. - A resposta de Voldemort lhe atingiu com tamanha calma e frieza frente ao desespero e confusão em que sua mente se encontravam, que Bellatrix não resistiu a olhar para cima, encontrando-o tão sereno como só ela podia esperar. - Essa não é você, Bella. Provavelmente, você está certa: você é uma pessoa fria, calculista, que utilizará todos os meios possíveis. O que me intriga é: desde quanto isso começou a lhe incomodar? A lhe tirar do foco? Bella, por Merlin, Narcissa não vai lhe odiar para sempre porque você lhe deu a chance de dar o rumo que preferir à própria vida. Não se martirize por ter feito por sua irmã a única coisa que ninguém fez: dar-lhe uma chance. Você foi a primeira a tratar Narcissa como dona do próprio destino e, sim, ela te odeia nesse momento por isso, acredita fazer parte de uma vingança tola e todas as sandices que ela quiser inventar nos próximos dias, mas no fim eu e você sabemos a verdade. Não importa o que Narcissa diga: você não precisa se vingar dela, ou atacá-la para feri-la, você precisa que sua irmã se liberte da vida que sempre amou e que não mais pode lhe pertencer. A tarefa que impusemos a ela é cruel, sem dúvida, mas necessária. O que eu não esperava e, preciso me confessar decepcionado, é que o show dela fosse ao fim entrar na sua cabeça, te atingir. Você é mais forte do que isso. - Voldemort andou até a bruxa e sentou-se ao lado dela na cama, - Podemos nos fazer o favor de não dar este gosto a Narcissa? Esse prospecto é extremamente irritante.


Contra todas as possibilidades que ele havia imaginado para o que viria a seguir, Bellatrix começou a rir até que estivesse gargalhando. Ele sabia que aquela risada demonstrava mais desespero do que felicidade e que aquilo tudo era mais confuso do que engraçado, mas no fim das contas… não era como se toda a vida deles não tivesse sido uma sandice sem fim. Vê-la dar risada era, sem dúvida, melhor do que vê-la se afogar nos próprios pensamentos. A mão dela, em meio às histéricas risadas, encontrou a dele e ela imediatamente parou de rir. Quase como se não tivesse percebido o que havia feito, ela fez menção de retirar a própria mão, mas não o fez. Ela permaneceu ali, com a mão sobre a dele, calada, por alguns segundos.


- Obrigada, - ela finalmente quebrou o silêncio, e o encarou. - Por ser a pessoa capaz de me trazer de volta à razão em meio a esse furação… - a única resposta que ela recebeu foi um beijo no dorso da mão.


 


A madeira que antes queimara na lareira já estava em cinzas, e todos os convidados daquela maldita reunião haviam se dirigido às suas casas, mas ela continuava ali. Não que muito tempo houvesse passado, ou pelo menos era o que ela acreditava. Pouco antes, todo o seu mundo havia mais uma vez desmoronado em sua cabeça graças a Bellatrix. Mais uma vez, sua irmã havia se tornado a causa de seu desespero e, àquele ponto, ela provavelmente estava mais uma vez nos braços de Voldemort enquanto ela estava ali, afogando-se em suas próprias mágoas. Meses antes, ela desejara que a irmã pudesse finalmente ser feliz, mas aquela noite mudara tudo. Bellatrix talvez não merecesse ser feliz, uma vez que ela parecia não suportar que os outros fossem. Ou talvez ela estivesse errada por completo e o melhor para todos fosse que a irmã tivesse de fato se atirado novamente nos braços de Voldemort, para que deixasse o resto deles em paz.


- Ela acha que está fazendo o melhor para você… - Narcissa foi acordada por uma voz familiar e olhou por cima do ombro. Rodolphus Lestrange estava apoiado ao portal, com dois copos de uísque de fogo nas mãos. Ele se aproximou e deixou um dos copos na frente dela, que revirava os olhos frente ao comentário do cunhado. - E, se me permite, da maneira deturpada de sempre, ela está.


- Por mais que eu agradeça pela bebida, - Narcissa segurou o copo firmemente, quase o bastante para recear quebrá-lo. - Poupe-me de sua lealdade doente a minha irmã, Lestrange. Você devia odiá-la muito mais do que eu a odeio agora e, mais do que ninguém, entender que Bellatrix é uma vadia sem coração que só faz as coisas para atingir os próprios objetivos. Ela não quer o que é melhor para mim, por mais que queira convencer a todos vocês disso. Tudo o que importa a minha adorada irmã é se livrar do meu marido da maneira mais sem rastros o possível e, desse jeito, ela conseguiu tirar até o meu futuro ódio da equação. No fundo, preciso admitir que é genial. - Ela bebeu do uísque de fogo em suas mãos, e resistiu ao impulso de tossir ao perceber que havia virado um gole grande demais. Pelo menos aquela dignidade ela teria. - Obviamente, meu caro ex-cunhado, você não consegue ver isso porque está cego pelo irritante e eterno charme de minha irmã. Queria realmente entender o que diabos acontece com vocês homens perto dela, nem mesmo o Lorde das Trevas escapou e agora anda por aí fazendo todos os desejos dela, esperando que um dia ela volte pra ele. Chega a ser patético como ela dobra todos vocês!


- Como ela dobrou seu marido? - Rodolphus, como se tivesse ignorado todas as ofensas da loira, perguntou. Narcissa o fuzilou com os olhos, horrorizada com a audácia que ele acabara de demonstrar. Quem ele pensava que era para falar daquele jeito com ela? - Como ela forçou o seu marido a… fazer tudo o que fez, e destruiu sua família? Perdoe-me a sinceridade, Narcissa, mas dessa vez sou eu quem vai precisar pedir que vocême poupe de toda essa hipocrisia. É tão fácil culpar Bellatrix, não é? Odiá-la por tudo isso, por ter que formar uma opinião quanto ao que aconteceu? Uma que não seja baseada no irritante e eterno charme”dela, é claro. Sei que é difícil, Narcissa, acredite ou não eu já estive no seu lugar. Não exatamente na mesma situação, mas eu já estive numa posição em que eu amava e odiava a mesma pessoa profundamente e, por isso, acabei culpando-a por todas as desgraças de minha vida sem perceber que eu precisava ter uma visão mais ampla. E, no seu caso, não falo apenas da sua irmã. Inclusive, Bellatrix é o que menos importa aqui. Você está perdendo seu tempo com ela, quando precisa primeiro decidir o que vai fazer com ele. Essa é a tarefa que te deram e que você tanto odeia, não é? Decidir o que acontece ao real vilão dessa história toda. - Rodolphus levantou o próprio copo de uísque, como se estivesse brindando a algo, e tomou toda a bebida em um gole só. - Eu vim aqui essa noite não para te provocar, e muito menos para ouvir você me insultar, eu estou sentado aqui e agora porque acredito que posso te ajudar nesse dilema, cara ex-cunhada. A questão é: você vai me deixar te ajudar, ou continuar com os insultos?


Narcissa encarou Rodolphus por alguns segundos, sem saber com segurança o que faria ou não. Muito do que ele dissera doía, mas era verdade. E, após a reunião, até mesmo seu filho a havia deixado ali sozinha após incontáveis tentativas de fazê-la ouvir. Era como se Rodolphus fosse a única pessoa que ela conhecia com paciência e vontade o suficiente de ouvi-la, provavelmente porque havia chegado naquela confusão toda há pouco menos de duas horas, e ela não podia exatamente desperdiçar aquilo.


- Agora eu entendo como você consegue ser amigo dela hoje… - Narcissa respondeu, antes de beber o resto do uísque de fogo. - Preciso lhe parabenizar pela paciência, Lestrange.


- Não é a primeira irmã Black raivosa com quem eu lido, nós dois sabemos disso, nem a primeira que escolhe me insultar incessantemente. - ele deu de ombros, - O que eu tenho a perder?


Narcissa respirou fundo e empurrou o próprio copo na direção de Rodolphus, pois ele estava certo: o que ambos tinham a perder? - Acho que vamos precisar de mais uísque, então…


- Considere feito. - ele pegou os dois copos e se levantou, mas parou logo depois, franzindo o cenho. - Antes, eu só tenho uma dúvida: roubar uísque de fogo do Lorde das Trevas, na quantidade que será necessária para essa conversa, não vai acabar matando a nós dois?


- Eu realmente não acho que Sua Majestade vai notar a falta do uísque de fogo. - Narcissa não conseguiu resistir a dar risada, - No entanto, se ele notar, colocamos na conta da Bellatrix. Acho que faz todo o sentido…


- Ótimo, eu também. Ok.. Eu volto em dois minutos, não saia daqui… Você pode muito bem achar que tem um plano de fuga perfeito, mas não se esqueça que eu sei onde você mora, Narcissa. Não vai fugir assim tão fácil. - Rodolphus brincou, e Narcissa riu um pouco mais. Ele sabia que ela não tinha intenção alguma de fugir para a Mansão Malfoy, já que suspeitava que ela estava ainda estava ali porque a própria casa a lembrava demais de tudo o que acontecera, mas precisava quebrar o gelo. A loira assentiu, e ele foi buscar o uísque.


- Rodolphus, - Narcissa chamou, pouco antes de Rodolphus alcançar a porta. - Obrigada.


- Agradeça-me depois que eu conseguir roubar o uísque, - ele sabia muito bem que não era aquilo que ela estava agradecendo, assim como Narcissa agradecia a maneira como ele estava lidando com tudo.


 


Bellatrix não sabia ao certo o que ainda estava fazendo naquele quarto. Ela já havia se acalmado, Voldemort tinha tido sucesso em convencê-la a não deixar o ódio de Narcissa e suas palavras a atingirem, tudo parecia calmo e, mesmo assim, ali estava ela: sentada na cama que costumava ser sua, ao lado do homem que amava e deixara, falando sobre uma das noites mais desconfortáveis de sua vida. Amigos, eles gostavam de se lembrar, era o que eles eram… e tudo aquilo era perfeitamente normal, já que é para isso que pessoas normais tinham amigos. Àquele ponto, eles de certa forma se divertiam com algumas reações inesperadas de Comensais que não tinham nada a ver com o que estava acontecendo e, claramente, preferiam não terem sido convocados. Era a forma dele de amenizar a ferida que a exposição causara em seu ego.


- Pode ter certeza, minha cara Bella, que a maioria deles preferia ter todas aquelas informações apagadas da própria mente… - Voldemort comentou, com um tom quase divertido demais. - Talvez você devesse pensar nisso como um tipo de vingança: a noite em que você deixou os Comensais desconfortáveis a um nível que nunca esquecerão.


- Ou talvez nós devamos de fato Obliviar a todos! - Bellatrix deu risada, e Voldemort revirou os olhos.


- Minha cara, não acha que isso tornaria inútil todo o trabalho e estresse que teve até agora? O ponto era deixar todos a par… para o que está por vir.


- Infelizmente, mais uma vez está certo… - Bellatrix respondeu, mordendo o lábio inferior. - Agradeço a tentativa de me fazer esquecer que agora todos sabem, ou de amenizar o fato, mas… acredito que seja hora de eu voltar a meu quarto.


- Esse é exatamente o problema, Bella. Você não tem um… - ele respondeu, levantando-se da cama. - Na verdade… este é o seu quarto, ou pelo menos era. - Voldemort pareceu engolir seco, antes de respirar fundo e se recompor. - E, como minha convidada, é aqui que devia ficar.


- Milorde, por favor, isso é absurdo! - ela se levantou, parecendo quase ofendida. - Não vou expulsá-lo de seu quarto, posso muito bem ir a algum dos quartos de hóspedes ou, até mesmo, retornar à França.


- Agora, no meio da noite? Bella, por favor pense melhor. Pode muito bem se defender, eu bem sei, mas agora nós viramos alvos. Quanto ao quarto, eu estou oferecendo. A esta hora, Melinda está de volta ao quarto dela, e eu… como você sabe, não durmo muito e vou ficar bem no meu escritório. Eu insisto. - Bellatrix suspirou, irritada com tamanha teimosia, e assentiu. Não tinha como discutir com ele, de qualquer forma. Ele se aproximou e tocou o rosto dela, - Tudo o que eu quero é o seu conforto, pelo tempo em que estiver aqui. E que tipo de anfitrião eu seria se fizesse qualquer outra coisa?


- Já que eu claramente não tenho como recusar, por favor pelo menos tome a liberdade de se banhar, e levar o tempo que precisar para se aprontar e pegar tudo o que precisa… - ela respondeu, e Voldemort assentiu. - Devíamos ter pensado nisso mais cedo, os preparativos para a noite. Estávamos tão ocupados mais cedo que escolhi o quarto de Melinda para me preparar, mas inevitavelmente acabei aqui.


- Algumas coisas, por mais que possamos planejar, são inevitáveis. E é apenas um quarto, Bellatrix, o que pode ter demais nisso? Afinal, eu estarei no escritório…


- Assim que estiver pronto, - ela relembrou, e Voldemort riu-se ao concordar com ela. - E está certo… é apenas um quarto. Quanto a mim… eu posso garantir que os livros neste quarto são extremamente interessantes. Aposto dez galeões de que são todos de magia negra. - Bellatrix se aproximou dos ditos livros e começou a folhear o primeiro que alcançou, enquanto sentava-se no divã - ignorando sua mente, que continuava fazendo-a se lembrar de que aquele divã fora uma das primeiras coisas que ela notara quando conhecera o quarto.


- Eu não faço apostas que vou perder, minha cara Bellatrix. - Voldemort respondeu, enquanto fazia um aceno de varinha que, segundos depois, fez com que vários objetos levitassem pelo quarto e se movessem até dentro do banheiro. - Sinta-se em casa…


- Sempre. - ela respondeu, um pouco mais ousada do que gostaria, e ele fechou a porta atrás de si. A bruxa podia ouvir a água da banheira começando a correr enquanto tentava se concentrar no livro em suas mãos. Uma parte de sua mente não conseguia evitar viajar para dentro daquele banheiro, imaginar o que estava acontecendo, a banheira enchendo, ele tirando as vestes… ela fechou o livro abruptamente, quase com raiva de si mesma. É só um quarto”,eles haviam concordado, mas ah como se provariam errados. Era proximidade demais naquele momento delicado, e ela não conseguiria se concentrar. Se perguntava porque diabos se metia naquele tipo de situação, mas já que estava lá, precisava conseguir lidar com aquilo.


Bellatrix então se lembrou de que Voldemort teria bebida em algum lugar daquele quarto, e não precisou procurar por muito tempo para encontrar uma garrafa de absinto e uma de uísque de fogo próximas ao piano. Aquele quarto não havia mudado uma coisa sequer, e aquela seria uma longa noite. Contra seu melhor julgamento, ela se serviu do absinto em vez do uísque de fogo, afinal era impensável que uma bebida fosse tirada de seu cardápio porque a lembrava dele. Quais seriam os próximos? Vinho e uísque de fogo?  A diferença, é claro, é que ela estava bebendo absinto no quarto dele. Não era como se a situação conseguisse ficar mais nostálgica.


O primeiro gole, enquanto ela se sentava no banco em frente ao piano, fora uma deliciosa mistura de ardência e doçura, quase reconfortante demais. Ela precisaria de mais daquilo para ficar completamente confortável pois, para aquilo, precisaria afastar os pensamentos que a atormentavam sobre Voldemort naquele banheiro.


- O que diabos está acontecendo comigo, - a bruxa bateu nas teclas do piano, tendo certeza de que ele havia ouvido. Sutil, como sempre. Ela bebeu mais do absinto e se focou no piano a sua frente, dedilhando as teclas delicadamente para emitir os primeiros sons… combinado com o absinto, aquilo se tornava quase relaxante. Finalmente, encontrara sua distração.


 


Pandora havia finalmente dormido. Com a paz, ela podia ficar cada vez mais com Melinda na Mansão Slytherin, e portanto Draco também estava passando a maioria de seu tempo lá. Narcissa reclamava, evidentemente e com razão, mas eles imaginavam que ela tinha problemas maiores para resolver naquele dia do que como fariam com seu filho e sua neta. Exatamente por aquela razão, aquela seria uma noite em que definitivamente Pandora teria de dormir na Mansão Slytherin, mas era como se a pequena conseguisse sentir a tensão que rondava todos eles, pois demorara um tempo muito maior do que o normal para finalmente pegar no sono.


- Pobre criança, - Draco comentou, acariciando o rosto da filha. Era inacreditável que, em pouco mais de dois meses, Pandora teria dois anos de idade. Ele se perguntava se ela crescera rápido demais, ou se a guerra os roubara daquela parte da infância da filha. - A tensão está tão forte que nem mesmo ela consegue escapar.


- Não vou negar, - Melinda respondeu do sofá, parecendo exausta. - Eu estava a ponto de dar uma poção a ela…


- E eu não lhe julgaria, alteza. - Draco sentou-se ao lado dela, e segurou sua mão. - A nossaprincesa não foi muito encantadora essa noite, mas vamos ficar bem. - ele entrelaçou os dedos com os dela, que sorriu.


Melinda tinha certeza que Draco estava certo e, também, que ele não falava apenas do comportamento de Pandora, ou de seu sono. Ele falava da situação com suas mães, e da nova paz sendo forjada… este era um novo mundo, o mundo em que Pandora viveria, e tudo o que eles menos precisavam era de uma guerra particular entre as irmãs Black.


- Como você está? - Melinda perguntou, mesmo que pudesse conseguir a resposta com muito menos esforço. - Com toda a coisa entre as nossas mães… e o seu pai.


Draco suspirou e relaxou mais no sofá, - O que posso dizer? Sei que a sua mãe está tentando fazer o melhor, por mais que a minha não consiga ver.


- Essa deve ser a primeira vez que Bellatrix Lestrange tem tantos apontando o dedo para atestar sua inocência. - Melinda brincou, e Draco forçou o ombro contra o dela em protesto. - Desculpe, continue…


- É evidente que minha mãe precisa superar tudo o que aconteceu, assim como a sua, mas conhecendo a mamãe… ela ia encontrar uma forma de entrar em negação e colocar a culpa da morte de meu pai na tia Bella no fim das contas, como se ela fosse a razão de toda a sua infelicidade. Talvez minha mãe tenha razão e a tia Bella esteja mais interessada em se preservar disso do que em ajudá-la, mas no fim dá no mesmo. Ela está ajudando. Minha mãe precisa disso, desse poder de escolha.


- Eu bem sei, - Melinda respondeu, deitando a cabeça no ombro do namorado. - Mas ela não sabe, claramente. Ela se recusa a entender que o destino de seu pai não pode ser decidido por mais ninguém.


- Minha mãe… - Draco começou e parou para pensar por um momento. - Ela está acostumada a um conforto que ela não mais pode ter, a ter todos o tempo todo tomando decisões importantes por ela. Isso acabou, para todos nós.


Melinda desencostou-se do sofá e olhou Draco nos olhos, tocando o rosto do loiro delicadamente, - Por mais que esteja preocupada com a tia Cissy… como vocêestá? Nesse fogo cruzado, é o destino do seu pai que será decidido.


Draco sorriu e segurou a mão de Melinda, depositando um beijo na palma antes de retornar a mão ao local em que antes estivera em seu rosto. - Eu estou bem, Mel. Acredite. Meu pai deixou de ser família para mim há muito tempo, e o prospecto da morte dele é um tanto tranquilizante, pois demonstra que esse terror estará logo finalizado. Nossas mães, você e Pandora são minha família, e são vocês que eu quero manter a salvo, entende? E isso inclui nossas mães resolverem logo essa briga entre elas.


Melinda assentiu e inclinou-se para beijar os lábios do namorado suavemente, sentindo-o sorrir sob seu beijo. - E elas vão… logo… Agora, não pense que eu não percebi que você não incluiu meu pai na sua noção de família. - ela brincou, dando um tapa fraco no ombro dele, que riu e agradeceu-a mentalmente por mudar o assunto.


- Ele é meu rei antes de ser meu sogro e, até onde eu sei, também não me inclui na noção delede família. - Ele respondeu, apenas para ganhar outro tapa de Melinda, que agora ria.


Draco segurou-a abruptamente pela cintura e a puxou para seu colo, beijando-a calma e silenciosamente enquanto Pandora dormia. Ele entrelaçou os dedos nos cabelos negros dela, pedindo a Merlin que ele estivesse errado sobre o Lorde das Trevas e que logo se resolvessem e ele pudesse mais uma vez ser incluído na família. Aquele distanciamento o deixava desconfortável, não apenas de um ponto de vista de sua carreira, mas também de seu relacionamento. Por mais que Melinda o amasse, e ele sabia que fortemente, Voldemort era seu pai e mestre para todos eles… Como ele poderia competir com aquilo?


 


Metade da garrafa de uísque de fogo já havia sido consumida pelo dois, muito para a surpresa de Rodolphus, que não esperava que Narcissa fosse uma pessoa tão investida em beber uísque de fogo - provavelmente ele estava certo e ela não era, mas aquela era uma situação fora do comum.


- O que foi? - Narcissa perguntou, tirando-o de seus pensamentos.


- Nada, eu só… não imaginei que você tivesse um gosto por uísque de fogo…


- Meu caro Rodolphus, acho que nós dois podemos concordar que um belo vinho ou hidromel são muito superiores em sabor. No entanto, sabor não é o que eu estou procurando agora. - ela bateu no copo no dele e bebeu o líquido forte, como sempre tentando não demonstrar em sua expressão o quanto aquilo queimava. - Precisava de algo mais forte.


- Imagino que o resto de nós está sempreprocurando algo mais forte, então… - ele respondeu, imitando o gesto anterior dela.


- Alguns de nós viveram vidas mais calmas, com isso eu posso concordar. Até agora, pelo menos. - por um instante, ela pareceu reverter à tristeza anterior, mas voltou rapidamente ao aspecto brincalhão. - Mas eu tenho uma dúvida: se vocês sempre querem algo forte, o que bebem quando precisamde algo mais mais forte?


Rodolphus riu-se e negou com a cabeça, olhando para o próprio copo. De certa maneira, ele dera a desculpa perfeita para que Narcissa fugisse do assunto, mas ele faria questão de garantir que aquilo não durasse por muito tempo. - Geralmente, absinto. E você saberia disso, caso conversasse com sua irmã. - Narcissa fitou o próprio colo, impressionada com a inesperada reação de Rodolphus. Se ela tivesse pensado bem, não seria tão impressionante assim, uma vez que ela estava fugindo do assunto. - Eu não consigo te ajudar, Narcissa, se nós continuarmos a fugir do assunto na primeira oportunidade que tivermos. Agora, onde estávamos mesmo? Ah sim, em como deixá-lo viver, por mais que a ideia me dê arrepios, ainda é uma opção. Bellatrix não estava blefando quanto a isso.


- Esse é o ponto, Rodolphus. Eu sei que não, mas… por que todos insistem em acreditar que eu vou escolher essa opção? Por mais que o tenha amado, que ele seja o pai do meu filho, e eu esteja aterrorizada com a ideia de destruir minha família mandando-o para a morte… eu sei que ele deve morrer. - Narcissa tomou mais um gole da bebida à sua frente, e deu de ombros. - Acho que é isso que me irrita tanto na atitude de minha irmã: não é como se eu de fato tivesse uma escolha. Todos nós sabemos que Lucius deve morrer. Não posso simplesmente exilá-lo ou perdoá-lo, ele voltaria para nos assombrar. A chance que minha irmã me deu foi a de escolher comoele morre.


- E, levando em conta essa sua opinião de que ele devemorrer e ignorando que existem milhões de feitiços que poderiam ser usados para mantê-lo longe, não que eu o queira vivo e sim reforçando que você temopção, qual seria o problema se ela tivesse confiado a você apenas a forma como ele morreria? Conhecemos a Bellatrix. Se dependesse dela, Lucius morreria da forma mais horrível e gráfica possível…


- Não que isso seja exatamente uma coisa ruim. - Narcissa o cortou e virou todo o resto de seu uísque de fogo, estendendo o copo para que ele enchesse mais. - Depois de tudo o que ele fez... e não pareça tão surpreso! - ela completou ao perceber o choque na expressão de Rodolphus, - Qualquer coisa que minha irmã tivesse preparado para ele talvez ainda fosse pouco!


- Fácil falar, difícil de executar. Esse provavelmente foi o plano de Bellatrix o tempo todo… é muito simples deixar sua irmã fazer todas as coisas para as quais você não tem ainda coragem, Narcissa, por mais que as deseje. - Rodolphus respondeu, servindo mais uísque a ambos. - É por isso que está irritada, pois nunca teria a coragem de ser a mandante das atrocidades que esperava que sua irmã fosse fazer. E está claro para mim que esse seu próprio lado sombrio a assusta, estou errado?


Narcissa deixou de encará-lo e pareceu encontrar algo muito interessante na mesa abaixo de si. Rodolphus, no entanto, conseguia ver a verdade através da tensão no corpo e na expressão dela: ele havia mexido em uma ferida que ela não queria ter reaberta. O problema era que ele não conseguiria ajudá-la a não ser que gerasse algum incômodo.


- Narcissa…


- Desculpe… você está certo. Por mais que me doa admitir, eu estou virando uma pessoa que não reconheço mais. Desde que tudo isso aconteceu, é como se algo em mim tivesse quebrado, Rodolphus. Eu não desejo ver pessoas torturadas, eu sei que elas são e viro o rosto pro outro lado. Eu não condeno familiares à morte! - Narcissa cobriu o rosto com as mãos, segurando-se para não chorar. Tudo o que ela menos queria ou iria permitir era que Lucius lhe arrancasse mais lágrimas, principalmente na frente de Rodolphus que estava fazendo de tudo para ser um bom amigo e ajudá-la naquele momento tão difícil. Seu futuro ex-marido não merecia seu sofrimento, não mais.


- Familiares”, - Rodolphus repetiu, pensativo. - Bela escolha de palavras… por que não “pessoas que amo”, eu me pergunto? - Narcissa pareceu gelar imediatamente e o encarou, quase como se estivesse assustada. - Peço desculpas se ousei, mas para mim a situação acabou de ficar clara: Você não o ama mais, Lucius conseguiu matar o amor que você um dia sentiu por ele e, mesmo assim, você se prende a um sentimento que não mais existe, e se convence de que as pessoas a seu redor estão propositalmente te ferindo e ignorando um sentimento que você não quer admitir que não existe mais. O que te prende a Lucius Malfoy é uma convenção, Narcissa, alguns papéis e, sim, um filho. Eu te pergunto, no entanto, onde está Draco? Ah sim, lá em cima com a Melinda e imagino que a filha deles. Seu próprio filho está lidando muito melhor com a iminente morte do pai do que você está… e eu lhe garanto que acabar com o amor que Draco sentia pelo pai foi muito mais doloroso e complicado do que o seu caso. E aqui estamos. Qual o real problema, Narcissa? Acostumada demais com a imagem de Sra. Malfoy que você criou para si mesma baseada em tudo que foi esperado de você? Oh, eu conheço alguém que teve uma imagem muito parecida criada para si e a jogou no lixo na primeira oportunidade. E essa noite ela te deu a chance de fazer o mesmo com a sua. A pergunta é: você vai? Eu não concordo com o fardo que sua irmã colocou publicamente nos seus ombros. Fazer isso sem te avisar anteriormente é tão cruel e típico de Bellatrix que chega a ser óbvio, mas você está olhando pela ótica errada. O seu problema não é com sua irmã, ou com matar o seu marido, é com perder tudo que você construiu para você. - Rodolphus pegou na mão dela e apertou com cuidado, tentando passar confiança.


- A vida era mais fácil quando meus amigos se resumiam a pessoas que vinham em minha casa tomar chá e Comensais da Morte que mal me cumprimentavam…


- Ter amigos não pode ser sempre uma festa. Às vezes, precisamos dizer algumas verdades inconvenientes. - Rodolphus apertou mais a mão dela, que sorriu.


Narcissa sabia que, no fundo, ele estava certo. O prospecto de como sua vida mudaria após a vida de Lucius a assustava, e ser a pessoa que decidiria comoele morreria era tão incômodo que ela não sabia como seria capaz de lidar com aquela escolha. Ela podia fazer a escolha fácil e banir o marido, mas ela sabia que seria uma péssima ideia, e Lucius não merecia o perdão de nenhum deles. Assim, a morte era a única opção, como ela já havia reforçado dezenas de vezes naquela conversa. O que lhe assombrava era: como ela faria aquilo sem se tornar parecida com Bellatrix e os outros Comensais? Ela percebera, ao observar a irmã e o próprio filho, que aquele era um caminho praticamente sem volta… e ela não sabia até que ponto aquela ideia, de se parecer com eles, a agradava. Rodolphus estava novamente certo, era tão mais fácil olhar para o lado, aproveitar os espólios e as festas, e ignorar o preço que deve ser pago para tal.


- Como eu posso ter certeza? Que não acabarei como vocês…? - ela perguntou, antes que pudesse filtrar as próprias palavras. - Peço desculpas, eu não quis ofender.


- Não ofendeu, não sei do que está falando. Acabar como nós, deixe-me ver: um bando de maníacos homicidas, completamente desprovidos de empatia e qualquer noção de amor ao próximo?


- Não foi o que eu disse.


- Foi o que pensou. - ele devolveu, e Narcissa não conseguiu evitar de corar. - E não deixa de ser verdade! Mas eu gosto de pensar que nós somos maisdo que isso, Narcissa, ou eu não estaria aqui com você agora… Acho que posso dizer que pelo menos a quantidade mínima de empatia nós conseguimos ter, não? E sua irmã é um poço de amor ao próximo… bom, se o próximo for o Lorde das Trevas ou a princesa.


- Ela também gosta de você, apesar de tudo.


- Como eu disse, sou um poço de empatia, como ela não gostaria de mim? Aliás, é o mínimo que ela me deve! - Narcissa começou a dar risada, mas Rodolphus tinha um ponto. Eles não eram assim tão ruins, pelo menos não como eles mesmos gostavam de se pintar para o mundo durante as guerras. - Além do que, Narcissa, você nunca vai acabar como “um de nós”, porque todos nós somos diferentes ao extremo e você é você. Matar, ou escolher como matar, alguém que costumava ser tão maníaco homicida quanto o resto de nós, e que decidiu se tornar um estuprador como a cereja no bolo, não se compara a invadir uma cidadezinha trouxa e exterminá-la. Sinto lhe dizer, minha cara, vai ter que trabalhar muito mais se algum dia quiser a honra de se juntar ao resto de nós. - ele finalmente deixara aparecer uma ponta de ofensa, mas foi cavalheiro o suficiente para ignorar e deixar o assunto morrer.


- Vou manter isso na memória, não se preocupe. Parece que eu tenho muitas coisas para manter em minha mente pelos próximos dias…


- Incluindo algumas formas bem horrorosas de execução, eu presumo? Ou seria apenas mais um desejo meu?


- Colocarei na lista, prometo. - Narcissa respondeu, em tom brincalhão. E, somente então, ela percebeu que Rodolphus ainda segurava sua mão. Não que a incomodasse, a mão dele ali lhe trazia conforto e segurança de maneiras que ela não conseguia explicar. Narcissa conhecia Rodolphus há décadas e, até então, ele nunca demonstrara ser tão aberto e compreensivo e ela estava agradecida pelo timingperfeito dele. Quase que inconscientemente, ela colocou sua outra mão sobre a dele. - Assim como uma maneira de te agradecer por tudo isso no futuro… confesso que não creio que um dia conseguirei, mas vou tentar.  


- Narcissa, não é necessário, por favor sabe muito bem que - antes que ela pudesse perceber o que estava fazendo, ela tocou os lábios de Rodolphus para que ele se calasse.


- Desculpe, - ela retirou o dedo rapidamente e puxou a mão que ele segurava. - Não quis ultrapassar a linha…


- Não tem problema algum, mas creio que você queria dizer algo ao me interromper? - ele tinha um pequeno sorriso formando-se no canto dos lábios, sutilmente deixando claro o quanto o gesto dela o agradara. Era interessante ver como ela se comportava com todas as mudanças em sua vida, aquela não era nem de longe da Narcissa que ele conhecera.


- Cissy, - ela respondeu, com um sorriso tímido. - Eu ia dizer que você pode me chamar de Cissy, se preferir, Narcissa é extremamente longo e formal e, depois de hoje à noite e toda essa sessão comigo expondo minha alma para você, parece um pouco desnecessário que me chame assim.


O sorriso de Rodolphus aumentou, e ele assentiu. - Como preferir, Cissy.


- Quanto à minha gratidão, voltaremos nesse assunto depois, porque você não tinha obrigação alguma de se envolver nessa confusão e perdeu sua noite assim!


- Digamos que eu tenho um gosto por me envolver nos dramas da família Black, velhos hábitos são difíceis de morrer e tudo o mais. - ele se levantou, e Narcissa o seguiu. - Mas tudo bem, voltaremos a falar nisso. Agora, creio que esteja na hora de nós dois descansarmos. Você ficará por aqui, ou me daria a honra de escoltá-la em segurança de volta à Mansão Malfoy? - Rodolphus lhe ofereceu o braço e Narcissa nem mesmo piscou antes de aceitá-lo.


- A honra é minha, Sr. Lestrange. - ela respondeu, em tom de brincadeira e Rodolphus revirou os olhos.


- E você fala sobre formalidades… - ele fez menção de se mover, mas olhou para a mesa. - Acho que seria prudente escondermos a evidência de nosso roubo, não?


- Provavelmente, - ela respondeu com um sorriso, e o observou puxar a varinha pra esconder a garrafa vazia e os copos.


- Onde estávamos mesmo? - Rodolphus perguntou, após terminar de esconder as ditas evidências. - Ah sim, Mansão Malfoy.


 


Aquele banho parecia mais longo do que qualquer outro que ele tomara em todo o tempo em que eles estiveram juntos, pelo menos na percepção dela, que jurava já ter tocado vinte músicas diferentes naquele piano. A verdade era que ela não terminara nenhuma das ditas músicas, com sua capacidade de concentração afetada pela situação e pelo absinto. Em algum momento que ela não conseguia apontar, a garrafa tomara seu lugar ao lado do copo em cima do piano, e encontrava-se pela metade.


- Má, má ideia. - ela disse para si mesma, enquanto dedilhava uma melodia muito mais melancólica do que poderia ter desejado. Seus dedos tremiam e ela não sabia se era a bebida ou a antecipação e ela esperava que o Lorde das Trevas tivesse piedade dela e não lhe provocasse mais do que o usual ao sair daquele banheiro, mas ela era mais inteligente do que aquilo. Ah, ele ia, não que precisasse de muito esforço. - Uma mansão desse tamanho, Bellatrix, você poderia ter ido para qualquer lugar. E o que você fez? Decidiu ficar aqui, com absintoe esse piano.


A tranca do banheiro então a acordou e Bellatrix virou abruptamente para olhar na direção do banheiro. Logo ele apareceria e ela não queria ser tão óbvia, mas ela quase não conseguia controlar o próprio corpo. - Por Merlin, Bellatrix, não seja ridícula. - ela voltou a encarar o piano e a tocá-lo, deixando a própria imaginação tomar conta. Sua mente, por mais focada que estivesse nas notas, não podia deixar de lhe mostrar imagens do que aconteceria nos próximos minutos caso… caso a situação fosse diferente. Ela sentiu as mãos dele em seus ombros, frias como sempre, e ela não sabia dizer se ele estava realmente ali, ou se sua mente estava brincando com ela.


- Eu ainda me lembro de quando decidi colocar este piano aqui, - ela ouviu a voz dele e soube que sua mente não era assim tão poderosa. Ela podia sentir o perfume dele, recém aplicado, e o cheiro dos óleos da banheira ainda nele. - Como imaginei que você se agradaria dele… - os dedos de Voldemort traçaram formas em seus ombros nus graças ao decote do vestido e os cabelos presos. A mão esquerda dele subia perigosamente em direção ao pescoço da bruxa, que não conseguia juntar força de vontade o suficiente para fazê-lo parar.


Os olhos de Bellatrix fecharam-se sem sua permissão, e sua cabeça pendeu para o lado, dando a Voldemort mais acesso a seu pescoço. Ela não podia vê-lo, mas sentiu a mão dele segurar a base de seu pescoço com mais força. A música não havia parado, como se as mãos dela também estivessem fora de seu controle, e o corpo dele parecia a cada segundo mais próximo do seu.   


- É quase triste, - ela parecia ter recuperado o controle sobre suas cordas vocais, - Que eu tenha tirado tão pouco proveito dele enquanto ainda morava aqui… Você estava certo, sempre me agradou muito…


- É o lado negativo da guerra, - a mão direita dele havia deixado seus ombros e, segundos depois ela percebeu, pegado a própria varinha para soltar seus cabelos. Ele sempre tivera gosto pelos cabelos dela e, como ela imaginara, não demorou até que os dedos do Lorde estivessem perdidos em meio aos negros fios. - Nos obriga a aproveitar menos do que devíamos tantas coisas… - ele não precisou puxar muito os cabelos de Bellatrix para que ela obedecesse seu comando e se colocasse de pé.


- Como nós dois? - as palavras saíram dos lábios de Bellatrix muito antes que ela pudesse pensar no que dizer, e a única resposta que ela recebeu foi um aceno de cabeça, que ela não pôde ver, mas sentiu, pois os lábios dele já estavam pressionados contra a pele de seu pescoço.


Bellatrix mordeu o lábio inferior e deixou de respirar por um segundo, enquanto os lábios dele tomavam o lugar onde outrora uma de suas mãos estivera, e a dita mão a segurava firmemente pela cintura, trazendo o corpo dela para tão perto do dele quanto o banco do piano entre eles permitia. Atendendo a um pedido silencioso dela, Voldemort chutou o móvel para o lado e se viu capaz de encostar o corpo ao dela.


A excitação dele, àquele ponto, já era mais do que clara, e senti-lo pressionar a própria ereção à sua lombar, só fez com que Bellatrix relaxasse ainda mais contra o corpo de Voldemort, deixando sua cabeça recostar-se no ombro dele. Sua mão encontrou os cabelos de seu eterno mestre, puxando-o para mais perto de si, silenciosamente suplicando para que ele continuasse.


Voldemort nunca deixaria pedir duas vezes, ele agarrou com mais força dos cabelos dela, puxando com a força exata que ele aprendera que a agradava, e mordiscou o pescoço dela, que gemeu em resposta. Os beijos alternados com mordidas subiram da base do pescoço dela até a orelha, ponto em que as unhas da bruxa já estavam cravadas no braço dele que circundava sua cintura.


Bellatrix mais uma vez sentiu o próprio corpo derreter, quando ele colocou a parte exposta do lóbulo de sua orelha na boca - como ela desejava que aqueles malditos brincos não estivessem ali atrapalhando, - e deu uma mordida quase dolorosa demais. Quase. O corpo da bruxa estava oficialmente fora de seu próprio controle, seu sangue fervia quase como se estivesse todo na superfície de sua pele, e seus pulmões haviam esquecido-se do que era respirar. E se ela fosse julgar pelo o que podia sentir atrás de si, ele estava em uma situação muito similar, embora sempre fosse muito mais controlado do que ela. - O que quer de mim, Bellatrix? - ele finalmente perguntou, os lábios colados no ouvido dela.


Os olhos da bruxa se abriram, a visão transformada em turva pela excitação e prazer, e ela abriu e fechou os lábios algumas vezes antes de respondê-lo. Voldemort permaneceu congelado na posição em que estava, enquanto ela não respondia. Ele podia perfeitamente ver o que acontecia na mente dela, mas ele iria esperar a resposta dela. Ele merecia aquela resposta.


Bellatrix, incapaz de formular uma resposta naquela situação, girou nos calcanhares e o encarou face a face. Ela sabia muito bem o que queria e, àquele ponto, ele já sabia também, mas era evidente que Voldemort queria uma resposta audível, e ela não podia culpá-lo, não depois de tudo o que havia acontecido.


- Você. - ela respondeu, - Não é evidente? - Foi a vez dela de entrelaçar os dedos nos cabelos da nuca dele. - Eu quero você. Eu não posso lhe garantir que a mesma resposta se manterá pela manhã, mas agora você é tudo o que eu quero.


Voldemort queria ter tido a força de vontade de se afastar dela. Ele não queria Bellatrix por uma noite, para que tudo fosse esquecido na manhã seguinte, mas ele também não podia negar que a queria, e os lábios dela estavam perigosamente próximos aos dele. Ele também a queria e, se tê-la por aquela única noite fosse um começo, ele - contra seu orgulho - aceitaria.


Os dedos do bruxo encontraram facilmente o pescoço de Bellatrix e beijá-la foi apenas o passo seguinte mais natural para aquela situação. As mãos dela escorregaram até a lapela do robe de Voldemort, metade brincando com o tecido e metade agarrando-se a ele, ansiando pelo momento em que ela poderia tirá-lo. Sua mente gritava em negação, lembrando-a de todos os motivos pelos quais aquele quarto e aqueles beijos não lhe pertenciam mais - e não deviam pertencer-lhe novamente - mas ignorar a tudo aquilo era tão confortável e fácil, que ela escolheu fingir que não estava ouvindo a si mesma. As dúvida poderiam permanecer enterradas até a manhã.  


Bellatrix deixou os lábios se abrirem sob os de Voldemort sem precisar de incentivo algum, assim como a língua do bruxo aceitou o convite sem delongas, e passou a entrelaçar-se com a dela, tomando cada centímetro que ela deixasse disponível, enquanto Voldemort trazia seu corpo para impossivelmente perto. Ela não queria pensar em como o beijo dele fizera falta, em como seu cheiro a intoxicava e seu toque a enlouquecia, pois ela sabia que pela manhã estes pensamentos a fariam chorar quando misturados com a dor, o medo e a decepção. Oh, mas ele sabia o que fazia com aqueles beijos, não lhe dando muito espaço para pensar, não quando a ardência de seus lábios presos entre os dentes dele lhe fazia suspirar.


Voldemort não gostava de ouvir tudo aquilo que ela estava pensando e, por isso, preferiu deixar a mente dela abafada, o mais longe de si que pudesse. Ela o entorpecia tanto quanto ou mais do que ele a ela, e a última coisa que ele queria é sentir que precisava deixá-la ir novamente, não quando a queria tão insanamente. Precisava daquela mulher com todas as suas forças e, agora que a tinha em seus braços novamente… não queria imaginar como seria perdê-la mais uma vez pela manhã. Ele não sabia ao certo em que ponto a levantara, mas ela havia tão graciosamente envolvido seu corpo com as pernas, apesar das camadas do vestido, que ele não conseguia se importar.


Eles ainda se beijavam quando ele a deixou cair sobre as teclas do piano, que fizeram uma série de sons desordenados, em meio aos suspiros e risadas dos dois. O robe dele já estava no meio do caminho de ser completamente solto, mas ela já havia olhado o suficiente para ter a quase decepcionante visão de que ele estava usando calças por baixo.


- Você vai arruinar o piano desse jeito, - Bellatrix provocou, no pequeno momento em que usou para respirar, e conseguiu apenas que ele voltasse a beijá-la com ainda mais intensidade, antes de descer os lábios pelo queixo e pescoço dela, com um destino claro em seu decote.


- É o nosso piano, você se importa? Porque eu não. - Voldemort respondeu contra a pele dela, que teve a risada que havia planejado interrompida pela mão dele em sua coxa por baixo do vestido. Sua mente conseguia, então, se focar apenas em quanto ela queria que ele arrancasse aquele maldito vestido de uma vez e a tomasse.


Os beijos que devoravam cada pedaço de pele disponível, e que faziam-na secretamente desejar por marcas, a irritavam tanto quanto a deleitavam, pois atrasavam o momento em que ele finalmente a tomaria, ali, naquele piano, finalmente. Ele parecia querer reivindicar para si cada centímetro do corpo de Bellatrix, que não podia exatamente reclamar, pois ela planejava fazer o mesmo noite adentro.


Bellatrix quase assustou-se, de tão perdida que estava nos próprios pensamentos, beijos e carícias daquele que seria seu eterno Lorde, que quase não percebeu quando ele se moveu e, novamente, pegou-a pela cintura, para tirá-la de cima das teclas e sentá-la confortavelmente no tampo do piano. A posição em que eles estavam lhe trazia um vislumbre do que estava por vir, e ela sentiu a própria boca secar em antecipação.


Voldemort fechou a mão ao redor do pescoço dela e a puxou para mais um de seus irresistivelmente sedutores beijos, mais uma vez tendo sucesso em fazer com que seus pulmões e coração falhassem, antes de se afastar somente o suficiente para colocar um dos tornozelos de Bellatrix em seu ombro. Ela poderia jurar que tinha visto os lábios dele se curvarem em um sorriso quase convencido, mas a verdade estava no brilho de antecipação que tomara conta dos olhos de Voldemort, o mesmo que ela sabia ter nos seus.


E foi por ali que ele começou a trilha de beijos e mordidas que viria por enlouquecê-la antes que seu joelho fosse alcançado. Era como se o desgraçado soubesse a localização de cada lugar sensível naquela perna, e estava fazendo questão de explorar um por um, convencendo-a aos poucos de que ele a faria explodir antes de chegar a sua virilha. Voldemort parecia se divertir tanto com aquela tortura que era como se eles não tivessem ficado meses separados. Ele teria o troco, se tudo fosse como se ela planejava.


Bellatrix deixou o próprio corpo relaxar, até que estivesse deitada no tampo do piano, aproveitando as sensações causadas pela talentosa boca de Voldemort em sua perna. Ele sabia como fazê-la gritar, e ela tinha certeza de que em muito pouco tempo estaria lá. Sua perna inconscientemente se esforçava para trazê-lo mais para perto, e o vulcão formando-se dentro dela estava cada vez mais fora de controle. Ele precisava parar com aquela maldita tortura.


A mordida na parte interna de sua coxa, de repente perto demais de sua virilha, foi um aviso para ela de que ele havia voltado a ler sua mente, e fez com que ela arqueasse as costas violentamente, muito para o agrado dele, que não pode deixar de sorrir convencido. O que Bellatrix não havia percebido era que, enquanto ele atenuava a ardência deixada pela mordida com a língua, seu braço escorregava perigosamente para perto da garrafa de absinto pela metade que ela deixara em cima do piano e que não seriam necessárias muitas provocações de Voldemort para que ela a atingisse e derrubasse.


Voldemort não precisou chegar à virilha da mulher para que a garrafa caísse e espatifasse contra o chão de mármore. No susto, ele se afastou dela para ver o que havia acontecido e, apesar das investidas dela para que retornassem ao que estavam fazendo, congelou no lugar em que estava, assimilando o que estava acontecendo. Ele sentira, anteriormente, o gosto do absinto na boca dela, mas não havia pensado muito sobre isso, afinal eles sempre haviam bebido e não lhe parecera nada fora do comum. Imediatamente, os pensamentos anteriores dela encheram sua cabeça e ele, por fim, entendeu. Aquela garrafa estivera muito mais cheia horas antes… era claro que ela não sabia qual seria sua resposta pela manhã, porque, naquela noite, suas dúvidas estavam adormecidas pelo absinto. As mãos de Voldemort fecharam-se decididamente ao redor da cintura dela, tirando-a de cima do piano, apesar de seus protestos.


- Você não sabe sua resposta pela manhã, - ele finalmente falou - mas eu sei e não me agrada. Eu não vou saciar o seu desejo agora, minha cara, quando você mesma deu todos os sinais de que tudo o que você quer é essa noite. Se é que você está em condições de querer algo.


- Eu não estou bêbada, se é isso que quer dizer. Não está claro? Você levou quanto tempo para sequer perceber que eu tinha bebido e se incomodar mesmo?


- Não, demanda muito mais do que isso para te desequilibrar, minha cara. Mas eu sei que você tomou o suficiente para mandar suas dúvidas e mágoas para o fundo de sua mente, mas amanhã um novo dia e tudo virá à tona. Não vou estragar nossa recém adquirida amizade, a chance que tenho de…


- De ganhar minha confiança mais uma vez, de me fazer sua rainha… entendo, então é por isso que estamos sendo amigos agora? Para se reaproximar de mim? - Bellatrix parecia irritada, além de claramente frustrada. - Você tem razão, majestade, isso tudo foi uma péssima ideia, e agradeço sua hombridade em parar essa versão patética de um revival.


- Clássico! - Voldemort se afastou dela, a passos lentos. - Tão evidente… como as coisas não foram do jeito que você planejou, comigo lidando com os seus desejos, você se tornou agressiva novamente. O que foi, Bella? Não aprendeu ainda a dar um jeito em si mesma na França? Talvez eu devesse lhe enviar a escova que deixou aqui, Vossa Graça? - o tapa que ele recebeu doeu muito mais seu ego do que seu rosto. - Vou tomar isso como um não. Você aprenderá, minha cara. Agora se me dá licença, vou para meu escritório.


Afastar-se de Bellatrix, dar-lhe as costas, foi muito mais difícil do que podia parecer, por mais que ele tivesse de repente ficado extremamente irritado com ela. Ele sabia que ela também sofria com a separação e que não conseguia aquietar os demônios dentro de sua própria mente o suficiente para acabar com o sofrimento dos dois, mas não podia também simplesmente ouvi-la dizer o absurdo que quisesse. Sim, ele a queria de volta, mas não havia se tornado amigodela apenas por isso: ele queria mantê-la próxima porque se preocupava, queria protegê-la, vê-la, e uma infinidade de outras coisas enquanto ainda não a tinha de volta.


- Eu quero esquecer. - Bellatrix sussurrou, e ele podia ouvir a voz dela embargando. - Por favor.


Bellatrix andou na direção dele, até poder tocar seu ombro. Ela sabia que aquela lembrança a atormentaria e tudo o que ela menos precisava era de mais um tormento em sua vida. Portanto, por mais egoísta que pudesse ser, ela precisava fazer aquele pedido. Aquela noite fora uma pequena demonstração do quão voláteis eles podiam ser perto um do outro, e trouxera lembranças tanto boas quanto ruins. Eles estavam tão bem antes, somente sendo amigos, por mais que a tensão permanecesse, e aquilo também mudaria.


- Você não pode estar pedindo que eu te…


- Oblivie, sim. - ela confirmou os temores de Voldemort. - Prometeu-me que nunca mais me machucaria e você sabe o quanto vai doer! Ainda mais depois dessa discussão, eu não queria discutir… Não posso me lembrar disso tudo, de como eu me senti, de mais uma vez na minha vida ter experimentado o céu e o inferno em um período curto de tempo, eu… por favor. - ela não queria chorar, mas seus olhos insistiam em se encher de lágrimas. Voldemort virou-se para encará-la e convocou a própria varinha, gesto que fez com que ela tremesse um pouco. Aparentemente, até o temor que ela havia desenvolvido por ele decidira aparecer naquele momento tão inoportuno, tirando dele uma risada amarga.


- Como quiser, milady. - e então, ela estava novamente no piano, com a garrafa acima dela inteira e meio cheia, e os cabelos novamente presos. A água no banheiro havia parado de correr, e ela podia ouvi-lo se aproximar. Era estranho o tempo que ele levara preso lá dentro, tão não característico… bom, todos eles haviam tido dias difíceis. - Não precisa se preocupar mais comigo, - Voldemort a tranquilizou, quando ela se virou para encará-lo, parecendo muito mais tenso do que o normal para alguém que acabara de sair de um longo banho.


- Está… está tudo bem? - Ela se levantou e se aproximou dele, que recuou um pouco. - Milorde?


- Sim, Bella. - Voldemort insistiu, se afastando mais dela. - Dia difícil, para todos nós… Tenho tudo o que preciso vou deixá-la à vontade, como prometido.    


Voldemort foi em direção à porta, enquanto Bellatrix tentava entender porque ele parecia tão frio e distante, tão mais do que estivera apenas momentos antes. O que poderia ter acontecido para deixá-lo tão diferente de repente? Ela bem sabia como algum tempo sozinho poderia fazer uma pessoa pensar naquilo que menos queria, e talvez este fosse o caso… ela esperava que fosse o caso.


- Se precisar de qualquer coisa, não hesite em chamar. - ele disse, ao virar a maçaneta. - Deixei toalhas limpas no banheiro, caso queira se banhar. Boa noite, Bella.


- Milorde, espere! - Bellatrix deu alguns passos na direção dele, sem saber muito o que diria, mas algo dentro dela dizia que ela precisava fazer aquilo. - Obrigada, por tudo…


Voldemort riu quase amargo e girou nos calcanhares para encará-la. - Eu poderia repetir que não há o que agradecer, mas... se te faz sentir mais confortável, pode ter certeza de que eu sei que poderá me recompensar por “tudo”, o que quer que “tudo” seja, no futuro.


- Sem dúvidas, - Bellatrix concordou, e fez uma pequena reverência. - Boa noite, milorde.


- Boa noite, Bellatrix. - com um último olhar na direção do piano, Voldemort abriu a porta atrás de si e saiu do quarto. Quem precisaria de absinto para aguentar aquela noite seria ele.


O caminho entre seu quarto e o escritório nunca parecera tão longo. O peso de tudo o que acontecera e, pior, do pedido que ela fizera eram demais para conseguir carregar. Ele passou a mão pelos cabelos. Estava cansado e, se fosse admitir, completamente perdido. Tinha um plano sólido para tê-la de volta e não contava com obstáculos como esse fazendo-o duvidar de seu caminho. Estariam as pessoas à sua volta certas? Deveria desistir e se poupar do sofrimento que reconquistá-la seria? Não, ele fizera uma promessa no passado, e não podia deixar nada e nem ninguém atrapalhá-lo. Ele podia reconquistá-la, ele sabia disso, e não era uma noite que o assombraria com dúvidas. Se aquela noite provara qualquer coisa, fora que ela ainda o desejava tanto quanto ele. A pergunta que o assombrava era: será que Bellatrix ainda o amava tanto quanto ele finalmente sabia que a amava? A dor daquela dúvida era muito mais do que ele podia suportar, e ele não a tinha horas antes. Ela estava certa em querer esquecer, principalmente depois do rumo que as coisas tomaram. Ele não podia viver sabendo o que tinha acontecido, não quando ela havia esquecido.


- Pai? - aquela era a pior hora que Melinda poderia ter escolhido para ter aparecido. - Está tudo bem? - por onde ela estava, provavelmente estava voltando do quarto de Pandora. Ela ainda estava com as roupas da reunião, assim como Draco a seu lado, o que foi confirmação o suficiente para sua teoria.


- Sim, Melinda, não se preocupe. - Ele respondeu com sua melhor expressão neutra, - Antes que pergunte, passarei a noite no meu escritório… Ceder o quarto a sua mãe me pareceu a coisa certa a fazer, principalmente em virtude dos motivos que a trazem e mantém aqui.


Melinda franziu o cenho, era evidente que ela desconfiava que algo tinha acontecido e, pelas insistentes investidas dela em sua mente, ela queria saber o que era. Infelizmente para a filha, entrar em sua mente era praticamente impossível e ela perderia a noite toda antes de conseguir.  - Tem certeza que não prefere que eu peça a um dos empregados que arrume um dos quartos de hóspedes?


- Não, obrigado, eu ficarei bem. Boa noite, Melinda. Draco. - Voldemort fez um aceno de cabeça na direção dos dois, que responderam com uma reverência, enquanto ele saía.


- Algo aconteceu... - Voldemort pôde ouvir a filha dizer, antes de sair completamente do campo de visão do casal. Ela desconfiaria, é claro, mas ele se certificaria de que nem mesmo ela descobriria o que acontecera aquela noite.


Chegar àquele escritório causou tanta alegria a Voldemort que ele mal podia admitir, pois ali estava o que ele precisava para colocar sua mente de volta em ordem. Ele mexeu em seu armário de poções até encontrar o que queria: uma solução de veneno de swooping evil… ele podia se obliviar, ou modificar a própria memória, mas daria muito trabalho e levaria muito mais tempo do que ele tinha disponível, uma vez que queria se livrar daquelas malditas lembranças o mais rápido possível. Aquela poção do esquecimento poderosa poderia ser cara e rara, mas valeria toda a pena. Eles haviam reacendido uma chama que ele precisava apagar para garantir que teria a mente clara para o que viria a seguir. Bellatrix estava certa quanto à experiência de céu e inferno e, por isso, ele derramou o conteúdo do frasco num copo e o encheu de absinto. Ele levantou o copo, num brinde a seu próprio reflexo no espelho à frente, e bebeu todo o conteúdo do copo. Em segundos, nada aquilo importaria.


 


Bellatrix havia se esquecido de como aquele banheiro era confortável e estava quase considerando fazer algumas reformas na Mansão Rosier, em Bordeaux, para que não sentisse tanta falta da Mansão Slytherin. - Talvez fosse melhor não ter experimentado novamente, sua tola. - ela disse para si mesma e parou no mesmo lugar, no portal que a levava mais uma vez ao quarto, como se aquelas palavras significassem muito mais do que deveriam. Ela sacudiu a cabeça e continuou andando, ignorando a estranheza que tomara conta de seu corpo, e tentou relaxar… o que foi muito facilitado pelo banho magnífico que havia acabado de tomar.


De volta ao quarto, ela foi surpreendida ao encontrar uma camisola e um robe em cima da cama, junto a uma carta… aquelas peças de roupa eram suas e o ato de reconhecê-las lhe causou ainda mais curiosidade.


 


“Bella,


 


Algumas de suas roupas infelizmente foram deixadas aqui na Mansão, quando você se mudou…(mas eu imagino que você já saiba disso).


 


Há males que vem para o bem, como gostam de dizer, e tomei a liberdade de pegar algumas delas para você.


 


Lhe desejo uma noite mais confortável,


 


L.V.”


 


 


Bellatrix não pode deixar de sorrir ao deixar a carta de lado para pegar a camisola, o tecido de seda estava perfumado como se tivesse sido lavado na noite anterior. Encantado, é claro, para permanecer como estava meses antes. Não era como se Voldemort fosse se dar ao trabalho de manter as roupas dela em ordem em sua ausência, mas era quase reconfortante saber que ele tivera ao menos aquele cuidado.


Ela poderia questionar o fato de que ele nunca lhe retornou as últimas coisas esquecidas, por mais ocupado que fosse, mas estava ocupada demais vestindo o tecido confortável e, por fim, acabou agradecendo-o mentalmente por ter mantido algumas peças. De fato, alguns males vem para o bem.


Bellatrix puxou os lençóis e se deitou no lado que um dia fora seu e que, mesmo assim, parecia ter o cheiro dele… sem lutar, ela deixou que seus sentidos fossem inundados pelo perfume e por todas as lembranças que trazia. Ela estava sozinha e podia se proporcionar um momento de indulgência. Se aquela situação não fosse tão confortante, ela quase podia arrumar desculpas para si mesma, mas ela sabia a verdade melhor do que ninguém: ainda o amava, tão louca e intensamente como sempre o amara, e sentia sua falta muito mais do que gostaria ser capaz de sentir. Deitada naquela cama, em meio àqueles lençóis com tanta história, e somente por aquela noite, ela se daria ao luxo de esquecer de todas as complicações e se confortar no sentimento de que seu lugar era e sempre seria ali.





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