À plus tard




-Ninguém vai tocar em Bellatrix, - Voldemort respondeu, e a mão de Melinda tremeu na varinha, mas ele não fez menção nenhuma de ser agressivo. Colocou o acordo no bolso das próprias vestes, e olhou para todos eles. - Ninguém além de mim. - ele passou a mão por detrás dos joehos da bruxa e levantou-se junto com ela, ele consertaria aquilo, ele tinha quem. Bella era forte, sempre fora… sobrevivera a tanto, ela não o abandonaria agora. Ela não podia, ela não iria, ele não deixaria. Voldemort olhou para Madame Pomfrey, e a mulher fitou imediatamente o chão. - Lidere o caminho.   




Madame Pomfrey não precisou ouvir duas vezes o comando, e andou a passos largos em direção à enfermaria de Hogwarts – onde um grupo de voluntários e medibruxos recém formados, liderados pelo chefe de casos urgentes do Saint Mungus, cuidavam dos feridos na batalha. Era um milagre que aquele lugar não tivesse sido atacado ainda, mas eles tinham desconfianças de que estavam guardados por paredes e mais paredes de feitiços."



    A entrada abrupta do estranho grupo misto de Comensais da Morte e Ordem da Fênix deixou todos na sala extremamente confusos. A visão de, Voldemort com Bellatrix Lestrange nos braços, então, foi o suficiente para que todos levantassem suas varinhas.



    Madame Pomfrey deu um passo à frente com os braços levantados, - Está tudo bem, meus caros, podem abaixar as varinhas. - os presentes trocaram olhares rápidos entre si e olharam sem muita confiança para Voldemort, que parecia inerte em seus pensamentos – olhando fixamente para a mulher em seus braços. - Ele não vai fazer nada contra ninguém aqui, vocês têm a minha palavra, eu nunca o traria aqui a não ser que tivesse certeza.



    Melinda também foi para a frente do grupo, com ferimentos por todo o corpo, e ainda fraca devido ao envenenamento. Os medibruxos engoliram seco ao vê-la, claramente os juramentos que haviam feito contrastando com suas convicções. - A guerra acabou, estamos em paz... Harry Potter está vivo, lá em cima, podem perguntar a quem for, podem mandar um representante. A professora McGonagall logo estará aqui para explicar tudo a todos.



- Agora, - Voldemort se pronunciou pela primeira vez desde que pisara na sala, mas sem ainda tirar os olhos de Bellatrix. - Viemos a este lugar em busca de atendimento médico, e esperamos que sigam o juramento que fizeram, pois minhas promessas de paz não se manterão se eu perceber que minha família foi erroneamente tratada de propósito.



    Draco revirou os olhos, Voldemort não era nem de longe o melhor diplomata da vida (ou nem mesmo tinha um terço das habilidades para isso que Melinda e Bellatrix demonstraram), mas ser temido provavelmente tinha o mesmo efeito, pois as varinhas foram se abaixando uma a uma e, em trinta segundos, Bellatrix tinha um leito.



    - O que aconteceu com ela? - o medibruxo mais velhor perguntou, examinando a bruxa.



    - Nós não sabemos, - Melinda respondeu. - Ela desmaiou, do nada, e o coração dela bate fraco... ela não responde a nada.



    O profissional novamente a examinou, e continou a fazer vários testes, com magia e poções para tentar descobrir o que acontecera, mas Bellatrix apenas começava a ficar mais e mais pálida e gelada, - Isto é impossível, - ele comentou. - Ela não tem nenhum ferimento externo, a não ser estas marcas vermelhas no pescoço. - Melinda olhou por cima do ombro para Voldemort, que fingiu não ver. - E alguns hematomas... mas nenhum deles é consistente com o quadro dela.



    De repente, Bellatrix começou a se debater na cama, e Voldemort teve que ser segurado para trás por Melinda e Draco, enquanto os médicos tentavam conter o ataque. - Merlin... - Melinda sussurrou, ela bem sabia como convulsões podiam ser horríveis, e... - Veneno! - ela gritou, e soltou o pai. - O estado dela é consistente com veneno?



    - Senhorita Black, - o doutor respondeu, lambendo os lábios. - De acordo com os testes que fiz, a Sra. Lestrange não ingeriu nenhum veneno, e ela não tem ferimentos de entrada compatíveis com nenhum animal peçonhento...



    - Não temos outra teoria, - ela respondeu, - testem-na, por favor. Eu... eu fui envenenada hoje, e não estaria aqui se não fosse um Benzoar, e eu tive sintomas muito parecidos. Eu fui ameaçada hoje, pela mesma pessoa que me envenenou, de que perderia tudo o que mais amo hoje.



    Madame Pomfrey assentiu, - Testar a teoria não a fará ficar pior. E... senhorita Black, por favor, venha comigo para esta outra cama. Benzoares são eficientes, mas não custa termos certeza de seu estado.



    Melinda assentiu, e deixou-se ser conduzida até o leito ao lado, onde foi medicada e tratada para o próprio envenenamento, mantendo um olho constante em Bellatrix.



    



    Uma hora mais se passou, enquanto tudo era feito para manter Bellatrix viva, enquanto se tentava descobrir o que lhe acometera. Voldemort estava no canto da sala, com um copo de uísque de fogo na mão – apesar das críticas de Madame Pomfrey contra consumo de álcool na Ala Médica. - Não seria melhor transferí-la para o St. Mungus? - ele finalmente perguntou, quase sem paciência.



    - No St. Mungus ela não teria o atendimento necessário, hm, milorde. - Madame Pomfrey respondeu, - Pois todos os melhores curandeiros vieram para o castelo ao ouvir da batalha.



    Voldemort riu-se e revirou os olhos, - Bela tentativa, mas claramente nem você acredita que sou seu Lorde... - ele tomou mais um gole de seu uísque, e deu de ombros. - Mas a parte trágica é que eu sou e ela, - ele apontou para a cama de Bellatrix, - é a sua Lady. Melhor se acostumar, a paz não mudou isso.



    - Pai... - Melinda alertou, de sua cama – Depois, por favor. Todos aqui entenderão logo como nossa estrutura ficou pós guerra, mas vamos nos focar na recuperação da mamãe, por gentileza.



- Como quiser, princesa. - ele vez uma pequena reverência sarcástica. Aquela história de paz seria mais difícil do que ele pensava. As palavras de Melinda após a queda de Bellatrix, sobre a teoria da mãe, e a facilidade que ele encontrava em querer fazer a filha feliz lhe faziam pensar. Estaria Bellatrix certa? Teria Potter causado nele a capacidade de ter o sentimento que abominara por toda sua vida? Pior ainda... aquele sufocamento, a necessidade de salvar Bellatrix, de tê-la perto de si, de sentir seu cheiro e ouvir sua respiração mais uma vez... estaria Bellatrix errada? Até onde iria o que ele claramente sentia por sua mais fiel seguidora e que negara para si mesmo por anos?



    - Não é possível, - Doutor Oliver Davis, que eles vieram a descobrir ser o nome do medibruxo chefe. - A senhorita Black tinha um bom palpite...



    Narcissa Malfoy, que chegara haviam poucos minutos, e tivera a estada permitida por ser irmã de Bellatrix mesmo depois que todos com exceção de Melinda e Voldemort haviam sido expulsos, deu um passo a frente. - Ela foi envenenada? Mas como?



    - É aí que fica impossível, madame Malfoy... eu não sei. - ele parecia desesperado. - eu sei que o corpo dela luta contra algum veneno, pelo sintomas, e pelas alterações nos testes, mas... eu não sei dizer como o veneno  chegou em seu sistema, ou o que a envenenou. É como se uma magia poderosa bloqueasse meu acesso. - ele engoliu seco.



    - Alguém tentou matá-la, - Narcissa caiu na cadeira que estava a seu lado. - Isso foi uma tentativa de assassinato, uma muito bem planejada...



    O medibruxo negou com a cabeça, - Alguém está conseguindo matá-la, madame. Sinto muito, eu fiz tudo o que pude, bloqueei o veneno com tudo o que sei, mas se não conseguirmos descobrir nas próximas vinte e quatro horas  o que a envenenou... eu temo que – ele foi interrompido pelo som do copo de Voldemort se espatifando na parede.



    O bruxo passou por eles como um furação, e saiu da Ala Médica sem dizer uma palavra. Ele precisava ficar sozinho.



    - Bellatrix tem muitos inimigos, - Narcissa comentou. - Melinda, você comentou quando eu cheguei que Pansy Parkinson te ameaçou... mas a menina está morta, pela sua própria mão. - Madame Pomfrey contorceu o rosto, mas tanto Melinda quanto Narcissa a ignoraram. - Mas a mãe não está.



    - Eu preciso sair daqui, - Melinda sentou-se na cama, mas imediatamente foi parada por Madame Pomfrey.



    - Sinto muito, senhorita Black...



    Narcissa se levantou, arrumando o vestido e andou até a cama da sobrinha. - Não se preocupe, querida, eu vou resolver isso. - Melinda jurava que nunca havia visto os olhos da tia brilharem daquele jeito.



 



    Mais de cinquenta anos haviam se passado desde que ele estivera naquela entrada, que agora estava aberta. A realização de como algumas de suas horcruxes foram destruídas veio a si. Potter também era Ofidioglota... e havia destruído o basilisco anos antes... não era de se impressionar.



    Ele passou pela entrada e olhou o salão à frente de si, a primeira vez que ali entrara sentira-se o rei do mundo, e sabia até onde poderia ir: imortalidade, poder, dominação. Nunca pensara, no entanto, que um dia teria a necessidade de dividir este sucesso tanto quanto naquele momento.



    A Câmara Secreta um dia fora o lugar para planejar o seu futuro brilhante, agora – com o cadáver da criatura que um dia fora sua maior arma a alguns metros de si – era o lugar onde planejaria os próximos passos para que seu futuro brilhante não tivesse um sabor amargo com o qual não conseguia lidar.



    - Veneno... - ele olhou para o basilisco, - Veneno irrastreável... - ele lambeu os lábios finos, apenas uma pessoa teria os colhões de planejar algo como aquilo sendo Bellatrix quem era.



    Era claro o responsável: Katherine Parkinson. A questão era: não havia tortura que tiraria aquela informação da bruxa, e a filha estava morta, além disso se ele ou Melinda se aproximassem – ela sabendo que era Legilimentes – ela se mataria antes que pudesessem acessar sua mente. Mas para conseguir aquilo, Parkinson provavelmente teria trabalhado com um parceiro, ela não era brilhante o suficiente para chegar àquele nível de engenhosidade.



    Ele riu sozinho, ao notar o quão extensa era a lista de possíveis cúmplices formada em sua cabeça: se tinha alguém com mais inimigos do que ele, este alguém era Bellatrix. Ela nunca fora excepcionalmente carismática entre os Comensais da Morte, menos ainda na história recente. - Bella, Bella... por onde começamos?



    A escolha óbvia de qualquer pessoa seria Rodolphus Lestrange, devido ao histórico conturbado do casamento dos dois, mas ele duvidava profundamente que Lestrange tivesse auxiliado Parkinson naquilo, afinal a relação complicada dos dois havia evoluído para a mais enjoativa amizade – e ele que nunca imaginara Bella capaz de ter amigos muito mais do que ele mesmo era.



    E então... ele percebeu. Havia apenas uma pessoa com conhecimento e acesso o suficiente a Bellatrix para ter ajudado Parkinson a ter sucesso. A outra ponta solta, que apesar de ser apenas uma sombra de quem fora graças à própria Bella, estava vivo. Agora ele só não conseguia entender se feliz ou infelizmente. - Malfoy, Malfoy... nunca aprenderá.



    



    Narcissa saiu da enfermaria a passos largos, e viu uma rodinha de Comensais da Morte parados – esperando a notícia da morte de Bellatrix, ela imaginava. Mas alguns, ela sabia, estavam realmente preocupados. Gabrielle, Rabastan e Rodolphus vieram ao encontro dela. - Precisamos achar Katherine Parkinson, - ela disse, assim que eles estavam perto o suficiente.



    - O que aquela maluca fez dessa vez? - Rodolphus perguntou, cruzando os braços... até que se lembrou. - Não, não! Ela me procurou há algumas semanas, com uma história maluca de acabar com a história de Bella com o Lorde para sempre, mas eu me neguei a ajudar, disse que pouco me interessava na história deles... Narcissa, o que ela fez?



    - Envenenou a minha irmã, Rodolphus... de uma forma esperta, os medibruxos não conseguem desvendar o veneno, e temos pouco tempo para salvá-la. Não sei o que fazer, a não ser caçar a vadia.



    - É inútil caçar a vadia agora, - eles ouviram a voz de Voldemort se aproximando, e a multidão de Comensais se curvou. - Vamos caçá-la, e acabar com ela lenta e dolorosamente, mas ela se matará antes que possamos tirar alguma informação dela. Temos uma fonte mais confiável e acessível.



    - Quem? - Narcissa franziu o cenho.



    - O seu marido.     



    



    O som dos passos no corredor assustou Lucius Malfoy, sempre que ele ouvia alguém se aproximar significava uma de duas coisas: Bellatrix vindo para lhe infligir mais horror, ou alguém para trepudiar.



    Quando a porta se abriu, e ele viu Voldemort entrar na câmara, seu sangue gelou ainda mais. Algo estava errado, os olhos do Lorde brilhavam com um ódio que ele nunca havia visto em seus vinte anos de servidão.



    - O que ela fez? - ele mal havia entrado quando esbravejou. - Meça suas palavras, Malfoy, ou o que Bellatrix fez com você até aqui será brincadeira infantil.



    - Parkinson, - Narcissa completou, sem olhar para o estado deplorável de seu marido. - Sabemos que ela foi atrás de pessoas com... problemas com Bellatrix.



    - Todo mundo e suas mães, você quer dizer? - ele zombou, como o homem nem nada a perder que ele havia se tornado.



    Voldemort rapidamente voou para cima dele, com a varinha pressionada contra o pescoço do outro bruxo. - Eu não estou particularmente paciente hoje, Malfoy. - ele sussurou, e Lucius riu-se novamente.



    - E eu, milorde, agradeceria se me matasse. Dificilmente, poderá fazer algo que sua querida ex-esposa já não fez comigo. - ele respondeu, lambendo os lábios feridos. - Ela é bastante criativa, e tem um fascínio em se sujar que garanto que milorde não têm.



    Voldemort sorriu macabramente, e traçou a varinha pelo rosto de Lucius, - Eu não preciso me sujar para fazer pior do que Bella fez, - ele parou nas têmporas de Lucius, - sua mente controla seu corpo e sua dor, Malfoy... e eu sou especialista na mente. Quanto à criatividade, minha queria ex-esposa está numa cama morrendo graças a seu plano estúpido, então... ou você me diz, ou eu tiro da sua mente e uso o tempo que eu levar para salvá-la para pensar numa tortura que quebrará todos os recordes de dor já registrados.  



    -Morrendo? - Lucius indagou, engolindo seco. Ele desviou o olhar de todos, como se somente ele estivesse naquele quarto. - Não, não, não, mas está errado... vagabunda, esta não era a intenção...     



    Narcissa aproximou-se alguns passos, incredulidade estampando seu rosto pálido, seu corpo tremia apenas de pensar no que ela iria dizer. Não era possível que Lucius tivesse perdido o juízo àquele ponto, não depois de tudo o que acontecera. - Você… você sabe de algo? - a voz dela tremeu, e Lucius recusou-se a encará-la. A verdade estava estampada nas feições dele. - Você sabe o que aconteceu à minha irmã… não sabe? O que diabos vocês fizeram, Lucius?



    Ele finalmente encarou Narcissa, os olhos encharcados de culpa. - Katherine… ela veio até mim um dia, quando vocês estavam fora ou distraídos, não tenho como saber. Primordialmente veio pisar na minha desgraça, é claro… mas, ela tinha uma proposta para mim, a mesma que havia feito a outros antes. Ela queria um aliado para se vingar de uma vez por todas de Bellatrix, - ele desviou o olhar para Voldemort, - acabando com o relacionamento dela com o Lorde das Trevas de uma vez por todas, de forma irreparável.



    Voldemort lambeus os lábios finos e inclinou-se mais na direção de Lucius, - O que ela fez?



    - Ela acreditava que se Bellatrix pensasse que milorde tentou assassiná-la, ela nunca mais o perdoaria, não a ponto de continuar seus trabalhos como Lady das Trevas, ou qualquer coisa do tipo. - Lucius viu um lampejo de algo que ele não sabia reconhecer nos olhos de Voldemort, mas preferiu prosseguir. - Então ela foi à Travessa do Tranco, atrás de um bruxo especializado em animais especiais. Uma cobra.



    - Que cobra? - Narcissa perguntou. - Qual tipo?



    - Eu não sei, ela não me disse, só disse que colocaria no quarto de Bellatrix para que ela encontrasse, mas que o bruxo era ofidioglota e que instruiu a cobra para não atacá-la.



    Voldemort riu-se, quase desesperadamente, - E você acreditou, seu tolo? Ofidioglotas são raríssimos, e mesmo que ele seja, acredita mesmo que Katherine deu essa instrução?



    Lucius encarou o chão enquanto a verdade, e a obviedade dela, o assolavam. - Não… é claro que não, é claro que ela armou isso tudo.



    - E você caiu como um idiota graças à sua obsessão. - Narcissa esbravejou e negou com a cabeça, as lágrimas chegando a seus olhos mais rápido do que ela podia controlar. Era como se esse inferno nunca fosse acabar. Uma parte dela queria seu marido de volta, aquele com quem ela pensava ter se casado, e a outra queria que Bellatrix acabasse com ele logo. - Esse especialista em animais modificou o veneno, que está irrastreável.



    Voldemort então afastou-se de Lucius abruptamente, - Mas o animal.. este não é irrastreável. Narcissa… me leve ao quarto de sua irmã.



    Narcissa praticamente parou de respirar no momento em que a realidade caiu sobre ela como uma pedra… era óbvio! A não ser que Katherine tivesse sido esperta o suficiente para remover a cobra, o que ela possivelmente não tivera tempo de fazer - pois fora chamada para Hogwarts - o animal estava lá.



    



    Havia duas horas que a cobra encontrada no quarto de Bellatrix havia sido entregue no St. Mungus para que o antídoto fosse aplicado.



Todos estavam sentados na sala de espera, aflitos, até que o medibruxo chefe os informou que uma poção havia sido aplicada à Bellatrix e ela estava começando a demonstrar sinais de resposta ao remédio.



    - Podemos entrar no quarto? - Melinda perguntou, e o medibruxo assentiu.



    - À vontade, senhorita Black. Agora é uma questão de tempo e de resposta do corpo dela.



    - Resposta? - Narcissa questionou, - Existe a possibilidade de ela não responder?



    - Talvez… o tempo sem tratamento foi um agravante sério, mas a Madame Lestrange é uma pessoa forte, já passou por coisas piores, tenho certeza. - ele limpou a garganta, - Digo, com sua história e tudo o mais. Agora, com licença, vou deixá-los à vontade. - o medibruxo se afastou, e Voldemort foi o primeiro a se dirigir ao quarto. Aquela seria uma espera quase torturante, para todos.



 



Pálida, rígida, gelada. Estas eram geralmente palavras usadas para descrever Bellatrix, mas naquele momento, elas ganhavam um novo significado. Ela estava respondendo, aos poucos, seu corpo lutava. Ele conseguia praticamente sentir a luta dentro dela, era como se os feitiços de cura e poções que as enfermeiras e medibruxos aplicavam de hora em hora estivessem transpirando pelos poros dela, enchendo o quarto com partículas mínimas da magia que tentava salvá-la.



- Milorde… - Narcissa aproximou-se. - Está aí há cinco horas, sem mover-se… Não deseja ir se alimentar, ou descansar? - ela não tinha certeza se Voldemort de fato precisava de quaisquer dessas coisas, mas era educado perguntar.  



    Bellatrix abriu os olhos, o ar entrava em seus pulmões queimando, seu corpo pesava uma tonelada e seus membros estavam rígidos como se feitos de pedra. Ácido parecia correr por suas veias, sua boca estava seca e sua visão estava ofuscada pela luz.  - Onde… - ela conseguiu falar, piscando diversas vezes e tentando se mover.



    Sua audição também acentuada pela situação captou diversos ruídos, como se de pessoas se movento agitadamente, e ela sentiu mãos quentes forçarem-na de volta para sua posição deitada.



    - Mãe… - ela ouviu a voz embargada de Melinda, provavelmente a dona das mãos. - Alguém chame um medibruxo, ela acordou… ela acordou! - passos rapidos se afastaram dali, e a visão de Bellatrix finalmente começou a focar.



    Medibruxo…. - Saint Mungus… - ela suspirou, e ela conseguiu ver o rosto da filha, sentada a seu lado na cama. As lembranças vieram a sua cabeça, e ela olhou ao redor do quarto. A figura de preto próxima a janela que a observava com os olhos vermelhos fixos nela a fez pular para a cabeceira da cama, ficando em posição sentada com uma velocidade que segundos antes ela se julgava incapaz. Seu corpo reclamou do movimento brusco e ela sentiu-se enjoada e tonta.



    - Mãe! - Melinda a repreendeu, claramente a reação de Bellatrix a assustura profundamente. Ela não sabia há quanto tempo estava inconsciente, e a filha provavelmente temeu a volta desta situação. - Por Merlin! Você mesma disse, está num hospital… não pode se movimentar desse jeito brusco, você acabou de….



    - Ela não teve controle, - a voz dele soou, e ele deu um passo na direção dela. Bellatrix realmente, e novamente, não teve controle nenhum sobre o espasmo que tomou conta de seu corpo, fazendo com que ela se aninhasse ainda mais contra a cabeceira. - Medo. - ele riu-se amargo, quase incrédulo. - Bellatrix Lestrange me teme, ao fim.



    Bellatrix fitou o colchão, quase chocada ao sentir seu corpo tomado por aquele sentimento que nunca fora destinado a ele, não ao Lorde das Trevas. A antiga Bellatrix no fundo de sua mente gritava, chamava-a de traidora, mas a nova Bellatrix, a sobrevivente da Batalha de Hogwarts apenas conseguia pensar: Quem podia, depois de tudo o que havia acontecido, culpá-la? Sua última lembrança não era uma de felicidade, era uma de pavor.



    Ela olhou para ele, fundo nos olhos pela primeira vez em sabe-se lá quanto tempo, lutando todos os instintos de seu corpo ferido. Ela fez menção de falar, mas foi cortada por ele. - Não precisa dizer, madame Lestrange, eu me retiro. - ela quase podia ouvir uma nota de desgosto na voz dele, e pela primeira vez na vida, aquilo não a machucou. Ela não ia pedir para que ele se retirasse, mas a sugestão dele não lhe era incômoda.



- Obrigada, milorde. - ela respondeu, com toda a voz que conseguia usar, e Voldemort se afastou dela, e em poucos segundos, estava fora do quarto.



Bellatrix olhou para a filha, claramente chocada com aquele desenvolvimento. Narcissa, que somente então Bellatrix havia notado, parecia mais conformada do que surpresa. Naquele momento, Narcissa provavelmente era a pessoa que melhor a entendia. - Descense, minha irmã. - ela sentou-se ao lado da cama, oposta a Melinda, e sorriu. - Ainda está fraca, e tem muito a se recuperar. Mas nos alegra imensamente vê-la acordada. Foram dias dificeis…



- O que aconteceu? Quem me… quem me salvou dele? - os olhos de Bellatrix encheram-se de lágrimas, apesar de seus protestos internos.



- Você não acreditaria se eu te contasse…  



- Mas é uma longa história, mãe… - Melinda aparentemente havia recuperado a capacidade de falar. - Que teremos muito tempo para lhe contar.



 



- Eu não sabia que eles tinham uísque de fogo no Saint Mungus… - Voldemort ouviu a voz de Melinda, mas não deixou de encarar a chuva que escorria pela janela do hospital.



- Eles têm uísque de fogo em todo lugar. - ele respondeu, e bebeu mais. - Se souber onde conseguir…



Melinda riu-se, Voldemort nunca deixaria de ser… bem, Voldemort. Todo poderoso dono do mundo bruxo, ainda mostrando suas raízes Sonserinas.



- Imagino que o uísque está cauterizando tudo…



- Tudo o que? - ele virou de frente para ela pela primeira vez. - Não há nada para ser cauterizado. Oh, você quer dizer a reação de sua mãe… Não se preocupe, Melinda, eu vou sobreviver. Sou imortal, se lembra? Ou pelo menos costumava ser.



Melinda cruzou os braços, e suspirou. Era de se esperar que a reação do pai quanto àquilo tudo não seria das mais positivas… e que se abrir não era exatamente o estilo do Lorde das Trevas.



- Imortal não significa invulnerável!



- Mas eu sou os dois, eu sempre fui, Melinda! E foi assim que eu cheguei aqui! - ele estava nervoso, do jeito que faria todos os Comensais tremerem, mas não ela. Não mais. - Eu não me deixo atingir por coisas bobas e fúteis como os outros. Bellatrix tem todas as razões para me temer e me afastar, Melinda, você não tem que vir aqui me oferecer seu ombro amigo, pois eu não preciso dele! Sua mãe e eu somos adultos, e dois bastante práticos.



- Posso ver, claramente… - Voldemort estava praticamente caindo em cima da filha, havia andado sem perceber e estava a poucos centímetros dela. Ele se recompôs, e virou de costas novamente.



- Chegar à conclusão de que, apesar de seus esforços e crença, ainda é capaz de amar deve ser difícil… - Minerva McGonnagal havia chegado e eles não haviam notado. - Ainda mais quando claramente se ama tão louca e profundamente uma pessoa que você conseguiu afastar. A única que todos pensaram que nunca se afastaria, nem mesmo eu… mas com essa atitude, não é difícil de se entender o porquê.



- Não me provoque, Minerva. - ele cuspiu por cima do ombro, - Bellatrix é a única razão pela qual eu não quebro o seu pescoço agora mesmo e acabo com essa trégua tola.



Minerva rolou os olhos e lambeu os lábios, - Eu não o temo, não mais, e sabe que isso não tem nada a ver com essa trégua. Vim checar como Bellatrix estava, afinal foi ela quem acabou com essa guerra e eu infelizmente tenho uma dívida por isso, e soube do que aconteceu… mas não se preocupe, não tenho a mínima vontade de tentar te ajudar. Lide como quiser com o seu mundo caindo em sua cabeça, isso não está nas minhas obrigações naquele maldito acordo.



Voldemort saiu de lá, sem nem mesmo dizer uma palavra. Em poucos momentos, elas ouviram um estrondo, e não precisavam nem mesmo perguntar de onde aquele, e os estrondos subsequentes vieram. Aquilo estava longe de acabar.



 



Dois dias desde que ela havia acordado, Bellatrix finalmente começava a se sentir como ela mesma, mas… algo havia mudado. Dentro dela, é claro.



- Como foi? - ela trouxe novamente a pergunta, - Como eu vim parar aqui?



Narcissa suspirou, e observou a irmã que estava sentada próxima à janela. - Horrível… logo depois que ele a beijou, você desmaiou. - não havia mais porque não contar a ela. - E ele entrou em desespero, provavelmente pensava que tinha te matado de alguma forma que nem ele sabia, e então tudo se tornou uma confusão. Melinda deseperada, os membros da Ordem tentando explicar a ele sobre o acordo… e tudo o que ele queria era que você acordasse. Então você foi pra enfermaria e, depois, pra cá.



- Então não foi ele…



- Parkinson, é claro. Ela te envenenou na Mansão Malfoy, ela usou uma cobra, esperando te separar dele antes de te matar, mas você não viu…



Bellatrix então riu, gargalhou como há tempos Narcissa não via, mas aquela risada não tinha nada de engraçada, era carregada de rancor e sarcasmo. Os punhos cerrados da irmã denunciavam a verdade.



- É quase trágico que uma pessoa tentando me matar no fim me salvou… a pesosa que mais odiei me salvou daquela que mais amei…



- Amou? No passado? - Narcissa se arrependeu imediatamente do comentário, pois a irmã a olhou como um animal ferido e, muito, muito irritado.



- Isso não importa, Cissy. Sabe por que? Porque não importam as circunstâncias, Parkinson me salvou dele. Ele teria me matado.



- Bella você não viu o estado em que ele ficou quando você desmaiou. Sim, o que ele fez foi horrível, nojento, errado em vários níveis, e praticamente imperdoável, mas matá-la… ele não teria a coragem.



- TERIA! - Bellatrix levantou bruscamente, - Foi você que não olhou nos olhos dele, que não o beijou naquele momento, eu podia… eu podia sentir a morte naquele beijo… Pode até ser que você esteja certa e ele sentiria culpa a vida toda… mas a verdade é que a única coisa que o teria parado seria a minha morte. E eu não sei lidar com isso, não depois de todos esses anos, de tudo que eu entreguei a ele! Da lealdade, do amor, da minha vida! Eu merecia mais, eu merecia um voto de confiança! - as lágrimas corriam pelo rosto dela, queimando, marcando como sua alma estava. - Eu merecia mais do que culpa!



- Você está certa, sem nenhuma repreensão. Mas… Não é culpa que ele sente, não agora.



- Ele não me ama, se é isso que quer dizer. E esse assunto está encerrado.



Narcissa levantou as mãos em derrota, - Eu não estou do lado dele, Bella… você é minha irmã, e eu venho criticando a maneira como ele a trata há anos… e se você nunca mais quiser vê-lo você tem todas as razões do mundo, eu só não sei até que ponto a irmã que eu conheci saberia lidar com isso.



- A irmã que você conhece morreu. Ele a matou. Esta aqui é uma sombra dela… que ainda o ama, e tem nojo disso, desse amor que parece uma doença e nada consegue matar. Mas não sou tola, não mais… nem deixarei que ele me machuque novamente.



 



Era estranha… a falta que ela fazia. Como a Mansão Slytherin parecia mais e mais vazia a cada dia, sua cama mais e mais fria. Ele não voltara ao hospital. Ela não o queria lá, e ele precisava cuidar dos assuntos de Estado, por assim dizer. Se Nagini estivesse ainda viva, diria que ele estava se escondendo nisso.



Os preparativos estavam todos em ordem… a jóia à sua frente era o símbilo de como aquilo não mais o animava. Todos os planos, todo o projeto do que fazer depois da guerra… sem ela não tinha o mesmo sabor.



Ele puxou sua varinha e com um suave movimento o nome dela começou a se formar à fogo na superfície do ouro branco. Ela não queria aquilo, nada daquilo, mas era dela. Sempre seria dela, mesmo que nunca de verdade.



As coisas dela ainda estavam no quarto, desde que ela fora para a Mansão Malfoy, as sedas e veludos que mantinham aquele aposento com o perfume dela. Agora que ele sabia que podia de fato sentir, doía. Tudo doía, e mesmo assim ele não tinha forças para se livrar de tudo aquilo, da lembrança dela que o mantinha.



Melinda lhe contara os planos da mãe. Ela se mudaria para a França, para a antiga propriedade dos Rosier em Bordeaux, assim que estivesse recuperada.



Ela queria se afastar dele, e tudo o que ele queria, era tê-la em seus braços mais uma vez. Uma única vez, que fosse, sentir que ela estava inteira, viva, de verdade, depois de todo aquele pesadelo que ele infligira.



Podia culpá-la? Ela o salvou, e ele a teria assassinado. Ele sabia que sim, que caso Katherine não a tivesse envenenado, ela estaria morta.



Pela segunda vez naquele dia, um copo de uísque de fogo colidiu com a parede da lareira. Ele era o culpado da própria tristeza, da própria dor. Mas ele a teria de volta, de alguma forma, faria com que ela o perdoasse. Ainda não sabia como, mas ele teria sua rainha de volta.



 



- Ele fez o quê? - Bellatrix pegou o jornal das mãos de Melinda, quase se repreendendo pelo quão orgulhosa ela estava do Lorde das Trevas. No fundo, por mais ferida que ela estivesse, a mais leal e fiel das Comensais sempre viveria dentro de si. “Um novo começo para o Mundo Bruxo” dizia a manchete, Kingsley havia assumido o Ministério e o Lorde das Trevas usado a vantagem de dar uma cadeira tão poderosa à Ordem da Fênix para transformar o Mundo Bruxo numa monarquia, com ele no comando, é claro. Kingsley podia ser Ministro da Magia, mas… seus apoiadores eram a minoria. Jogada de gênio, Kingsley tinha o poder de um ninho de víboras, e o Lorde das Trevas uma coroa na cabeça.



- Falaram tanto que eu era a Princesa das Trevas, que aparentemente ele levou essa ideia a sério. - Bellatrix riu e rolou os olhos.



- Claro que ele fez isso por sua causa… bem do feitio dele mesmo…



- Não destrua o sonho. - Melinda riu junto com a mãe, e elas ouviram uma batida na porta do quarto. - Eu atendo… de qualquer forma, a coroação oficial é em alguns dias.



- O que dizer… ele deu um Golpe de Estado dentro das regras do meu acordo de paz… preciso admitir que foi genial. Minerva e Snape devem estar espumando…



A pessoa na porta lhes era desconhecia, um jovem em torno de seus dezessete anos, com uma longa capa de viagem verde com um brasão. Um S, cercado de serpentes, mas não… não era o brasão da Sonserina, então ela viu bordado quase transparente atrás do S uma letra V. Aquele era novo. O brasão dele.



- Madame Lestrange, - jovem entrou no quarto de hospital dela, - Princesa, - ele fez uma reverência. - Peço desculpas aparecer tão abruptamente em um momento delicado. Meu nome é Thomas Devonshire, a seu dispor.



- Deixe-me adivinhar, está aqui a serviço do rei? - Bellatrix questionou, com um sorriso.



- Sim, senhora.



O jovem sorriu, e aproximou-se. Ele segurava um pergaminho. - Tenho uma convocação para a senhora, por isso não pude esperar - ou mandar uma coruja. Sua majestade, o rei, mandou-me dizer que viria ele mesmo, mas… que a senhora provavalmente preferiria estar sozinha ao ler.



Ele estendeu o pergaminho, e Bellatrix franziu o cenho. Ao encarar Melinda, ela viu um sorriso que delatava claramente que ela sabia de algo. A bruxa pegou o pergaminho e abriu o selo para ler. Ela simplesmente não acreditou no que leu.



    -  Eu… Diga ao rei que agradeço e estarei presente. - Thomas fez uma reverência e saiu, com um sorriso e um sussurro de “Sua Graça”. - Um ducado? Este é o pedido de desculpas do seu pai?



    Melinda deu de ombros, - Não tenho certeza se o ducado, ou o título… ou talvez não seja isso? Talvez ele esteja te recompensando pelos anos de serviço?



    - Bordeaux? Com a sede na antiga propriedade dos Rosier? Você contou a ele…



    - Ele perguntou, você não me proibiu.



    - Justo…



    - Você vai comparecer?



    - Eu tenho escolha?



 



    O cheiro de papel queimado encheu o chalé dos Weasley. Todos os exemplares d’O Profeta Diário que entraram naquela casa foram queimados. Ginny Weasley observava Harry ao longe, sem saber o que dizer. As notícias do dia não haviam sido fáceis.



    - Ele tortura, mata, manipula e machuca aos outros… e a parte dele nesse estúpido Tratado de Paz é uma coroa na cabeça? Enquanto nós sentamos e aplaudimos do nosso canto? - ele disse, quando notou a presença dela.



    Ginny suspirou, não fora fácil pra nenhum deles ler aquilo, e menos ainda ouvir as desculpas de McGonagall e Kingsley sobre como tecnicamente ele não desrespeitara nada. - Aparentemente, nosso prêmio é manter nossas cabeças.



    - Ou não… - ele olhou para a varinha em suas mãos. - O premio dele foi eu concordar em manter a minha, mas se… - ele colocou a varinha contra seu pescoço e Ginny congelou no lugar, apavorada com o que ela sabia que ele estava pensando. - Mas se eu morrer, levo ele junto, é tão fácil.



- Harry… não faça nenhuma besteira.



- Besteira? Livrar o mundo daquele monstro e de toda a sua corja?



- O meu irmão, o seu padrinho, e todos os outros não morreram te salvando para você se matar agora! - ela gritou. - Porque não consegue aceitar que perdeu a guerra!



- Que ele saiu impune!



- Quão impune é realmente pra ele? Ele está proibido de matar, de caçar, de fazer todas as coisas que o tornam Lorde Voldemort! Está vendo? Nem o tabu no nome ele pôde manter! Ele vai lá posar com uma coroa na cabeça, sozinho, e é isso que ele vai ter. Enquanto você, você tem a nós, a nossa vida, Hogwarts! Você vai terminar Hogwarts comigo…



- Por quanto tempo?



- Pelo menos por enquanto Kingsley for Ministro da Magia… nós podemos ser felizes, Harry! Ter uma vida, uma vida normal! Você não precisa ser O menino que sobreviveu pra sempre… Você merece ser feliz! Isso Kingsley vai assegurar! - ela se aproximou, e tirou a varinha das mãos dele. - Isso é muito maior, e melhor, do que ser um rei sem rainha. A diferença entre nós e eles, Harry, é essa. Nós temos amor…



- Sem rainha? O que quer dizer? Que o animal insano de estimação dele não vai voltar pra casa? - Harry riu. - Quem diria?



- Ouvi que ele nem chega perto do quarto dela no Saint Mungus… bom, você estava lá… Duvido que ela deixo-o chegar perto de novo, pelo menos desse jeito.  



- Então eu espero que aquilo que disseram seja verdade… que por minha causa ele tenha se tornado capaz de amar, e que a ame, mas muito, de verdade, Ginny. Porque aí… aí ele vai saber que toda a dor que está sentindo é culpa dele mesmo.



- Harry, deixe-os pra lá… nós temos a vida toda pela frente… - ela beijou-o na testa. - Não vamos perdê-la com eles, não mais, chega. Por favor…



Ele suspirou e assentiu, deixando-se levar pelo abraço da namorada. Aquela suposta paz não traria bem a nenhum deles, ele sabia, mas havia feito promessas. Promessas que - naquele momento - ele não sabia por quanto tempo poderia cumprir. Uma coisa era um acordo de paz, outra era uma desculpa esfarrapada que se parecia com um. A guerra havia terminado, e eles sabiam que tinham perdido mais do que o outro lado, mas todos a seu redor pareciam conformados. Eles queriam sossego, mesmo que isso significasse deixar Voldemort triunfar.



“Nós somos melhores do que isso”, lhe diziam, quanto ao ódio que ele sentia em ver Voldemort livre, e pior ainda, governando. São os tratados que perdedores conseguem, ele imaginava. “Fiquem com suas vidas, mas é só isso.”, era o que aquele acordo queria dizer. Ah, é, e uma cadeira no Ministério.



No caso, Kingsley era ministro, mas todos sabiam a verdade: um ministro sem apoio não governa. Todos pareciam ter a esperança de que tê-lo lá significaria algo, mas ele sabia a verdade… Voldemort estava jogando com todos eles, fingindo paz e brincando de monarquia, mas era uma questão de tempo até ele mostrar as garras novamente. E ele esperava, ansioso, por esse dia. Porque nesse dia… ele mostraria as suas e ninguém poderia repreendê-lo.



 



Aquele fim de primavera já mostrava os indícios do verão que se aproximava. A temperatura subira nos últimos dias, e o ar se mostrava ainda mais úmido - se é que isso era possível em Londres, é claro. Ela recebera no hospital - na semana anterior - a notícia da coroação do Lorde das Trevas, uma cerimônia pequena, mas os íntimos apenas, mas com a cobertura de todos os jornais. Não deixar o povo entrar fora inteligente, e usar a Mansão Malfoy mais ainda. Ele ainda era um rei controverso frente à população, e não daria a qualquer um a localização da Mansão Slytherin até que fosse obrigado.



A cerimônia para a qual ela fora convocada, no entanto, a indicação oficial dela como nobre… esta seria na Mansão Slytherin, três dias depois de sua alta do Saint Mungus, que em alguns minutos.



Em três dias, ela seria oficialmente a Duquesa de Bordeaux, e a Lady das Trevas ficaria em sua lembrança. Ela sabia que entrar na Mansão que um dia fora sua traria lembranças que ela não queria, sentimentos que a machucavam, mas ela não tinha escolha.



Andou até o espelho, pela primeira vez em semanas ela se via vestida em qualquer coisa que não fosse uma roupa de hospital. Narcissa lhe trouxera um de seus vestidos pretos: longo, não muito justo, simples. Não era a vestimenta de uma duquesa, mas iria servir para aquele caminho até a Mansão Malfoy. Mal ela podia esperar por um banho aromático nas enormes banheiras e sentir-se como si mesma. Mas ela duvidava que se sentiria como si mesma… pelo menos por um longo tempo.



Uma batida na porta acordou-a de seus pensamentos, era Melinda, que entrou com o pergaminho de sua liberdade daquele lugar.



- Uma assinatura e, oficialmente, você já pode aparatar daqui. - ela disse, assim que entrou no quarto.



- Sem tiara, Vossa Alteza? - Bellatrix provocou, ao pegar o pergaminho da mão da filha e assinar com a pena mágica que tinham lhe entregado. Era o novo sistema de Saint Mungus para evitar fugas, somente após todas as assinaturas, o bloqueio de aparatação do paciente era retirado.



- Princesas não usam tiaras o tempo tudo, muito menos pelas ruas de Londres. - ela respondeu, rolando os olhos. - Quero ver quando a Duquesa tiver as dela! Você é a nobre mais alta fora da família real, quero ver se não vai andar de tiara para cá e pra lá, sendo como você é.



Bellatrix fez uma expressão forçada de choque, - Não sei do que está falando…



    - Aposto que sabe. Vamos?



    - Sim… - Bellatrix pegou a varinha, e fez uma expressão de desgosto ao se lembrar de que não era a dela. - Preciso resolver isso… Adeus Saint Mungus, espero nunca ter de voltar. - Melinda se aproximou, e elas aparataram juntas.



    O piso de mármore da Mansão Malfoy logo entrou em foco, e os elfos vieram pegar a pouca bagagem que elas traziam.



    - Bem vinda de volta, - Narcissa se aproximou delas, com um sorriso. - Mandei prepararem praticamente um banquete para você, Bella… e seu quarto está lá, se quiser tomar um banho ou algo antes do jantar.



    - Eu adoraria, sim, tirar esse cheiro de St Mungus de mim, com licença… - Bellatrix respondeu, e passou por elas na direção de seu quarto.



    Quando Bellatrix terminou de subir as escadas, Narcissa aproximou-se de Melinda. - Como ela está?



    - Lidando com tudo na base do sarcasmo, como temíamos. - a jovem respondeu, com um sorriso triste. - Não sei como será, com ela na França…



    - Para ela ou para nós?



    - Os dois… meu pai está… eu não sei se a palavra é arrasado. Algo do tipo… ele sabe que causou isso tudo, e isso é complicado.



    Narcissa indicou para que Melinda a seguisse para a sala de estar, onde elas se sentariam mais confortáveis.



    - Seu pai… - Narcissa suspirou ao sentar-se. - Me mandou uma coruja hoje mais cedo, e aquele escudeiro dele trouxe presentes para ela, com a desculpa de que ela deve usá-los na cerimônia. Ela logo verá, estão em cima da cama dela. A coruja dizia que ele fará uma visita hoje, você sabia?



    Melinda assentiu, e sentou-se ao lado da tia, - Ele sabe, no fundo, que isso talvez piore as coisas. Mas ele quer vê-la, ele precisa vê-la… Meu pai é fantástico para esconder as coisas, mas… Ele está destruído. A descoberta de toda essa questão sobre ele ter se tornado capaz de amar parece ter desbloqueado algo nele de uma vez só… Pelo menos em relação a ela, é claro.



- Faço ideia, - Narcissa suspirou, - Todos nós sabíamos, duvidávamos é claro devido ao histórico do Lorde das Trevas, mas as reações dele, a forma como ele se comportava com ela, era claro que ele se importava com ela, mesmo que de uma forma esquisita e deturpada.



- O modo Lord Voldemort de se importar, eu suponho. - Melinda concordou, enquanto um elfo doméstico aparecia na sala com uma bandeja de chá, Narcissa sempre seria aquela maravilhosa anfitriã. - Mas toda essa preocupação, amor, paixão, e seja lá o que mais ele sente por ela... estão afogando-o, tia Narcissa, e eu não sei o que fazer.



Melinda lambeu os lábios, e estalou os dedos nervosamente, deixando Narcissa ainda mais preocupada do que ela já estava... Melinda não era o tipo de pessoa que ficava facilmente naquele estado.



- O que foi?



- Ele vai fazer tudo o que puder para tê-la de volta, tenho receio de onde isso o levará, e em qual nível pode atrapalhar o governo dele... Ela não me parece propensa a voltar tão cedo, por mais que eu divida com ele o desejo de que isso aconteça...



- E é pra isso que você estará lá, Melinda, para ser o suporte dele neste tempo difícil. Não sou a melhor apoiadora dele nesta missão, eu sei  o quanto ele feriu a minha irmã em diversas maneiras, mas é inegável o quanto ela o ama, apesar de seu trauma, e como vai sofrer longe dele.... e a cada dia mais, eu vejo o quanto ele sofre. É uma situação complicada demais, com feridas profundas, e anos de cumplicidade. Honesmente, Melinda, acho que nosso papel será de conciliar isto o melhor que pudermos, e nos mantermos o mais imparciais possível...



- Eu sei, mas... Eu vejo de longe que ele ama, e o quão arrependido ele está... Uma parte de mim sempre esperará que ela o perdoe, mas ao mesmo tempo eu vejo o sofrimento dela, a quebra de confiança... Não vou me intrometer... É só que, chegou a um ponto... os empregados estão comentando pelos cantos que ele gravou o nome dela numa coroa, “a coroa da rainha” como eles a chamam na Mansão Slytherin… Não que eu acredite nisso tudo, e ele nega… mas não sei até que ponto está me dizendo a verdade, não é como se eu tivesse habilidade para ler a mente dele. - a menina suspirou, e Narcissa assentiu quieta. - E ele quer apontar um cavalheiro para mim, acredite ou não. Ele está com medo, claramente, do que pode acontecer daqui pra frente. Sabe muito bem que sei me proteger, mas imagino que esta pobre pessoa será meu escudo humano em casos de armadilha. Ele não está lá para me proteger...



- Está lá para te ganhar tempo, evitar elemento surpresa. - Narcissa compreendeu, e assentiu. - Quando ele apontará essa pessoa?



- Assim que ele encontra alguém de sua confiança, eu suponho. - Melinda deu de ombros, - Pobre pessoa... a Ordem da Fênix pode manter esse acordo, mas Potter e seus amigos não são nossos únicos inimigos, e não tenho certeza por quanto tempo esta paz durará.



Narcissa pegou sua xícara de chá, e tomou um gole tentando se manter calma. Melinda estava certa, eles teriam algum trabalho em manter aquela paz, - E é por isso que teremos que ser cuidados, e espertos.



- Exato, precisamos da população a nosso favor... - Melinda sorriu, ao ver que Narcissa começara a entendê-la.



- E como exatamente pretendem fazer isso? Eles meio que nos odeiam...



Melinda respirou fundo, aquele pensamento podia dar muito certo, ou muito errado, - Simples, fazendo-o nos amar, nos humanizar a seus olhos... e não há melhor forma de fazer isso, do que com uma história de amor.



Narcissa quase cuspiu o chá dela, - Não. Você não pode estar considerando... Melinda, isso é errado.



- Eu não vou criar histórias, ou boatos, se é isso que você está imaginando, tia... Eu só vou deixar o mundo saber da verdade, - Melinda tomou um pouco do chá. - Eu vou deixar todos conhecerem uma das maiores histórias de amor de todos os tempos, eu vou fazê-los desejar que eles voltem um para o outro... Qual a melhor forma de nos humanizar? De fazê-los desejar nosso bem, em vez de nossa morte? - para aquilo, Narcissa não tinha resposta.



 



O quarto parecia o mesmo de quando ela havia saído semanas antes, porém claramente mais arrumado. Havia uma sensação de melancolia em estar ali, trazia muitas lembranças... e ela sabia que em algum momento, teria que pegar as coisas que restaram em seu quarto na Mansão Slytherin. Ela não estava ansiosa por isso.



Em cima de sua cama, no entanto, havia uma caixa branca, de madeira, com arabescos entalhados. Em cima dela, um pergaminho. Ela não precisou abrir a carta para saber de quem era. Para adiar isso o máximo possível, ela deixou o pergaminho na cama e abriu a caixa.



    Dentro dela, havia um vestido bordô. Ela quase riu com a referência. O tecido do corpete era de seda tafetá, com uma leve cintilância, coberto de renda. Era bordada desde a cintura com pedras negras, formando arabescos que subiam a um dos ombros, até encontrar com o outro lado do vestido, para formar uma discreta alça diagonal tecida com pedrarias.



A saia era rodada, devido ao fato de ser formada por diversas camadas diagonais e com comprimentos diferentes de tafetá e renda intercalados, que faziam com que o vestido fosse mais curto na frente (onde a saia mais longa parava um pouco abaixo de seu joelho) do que nas costas (onde chegava ao chão). Algumas partes da saia também eram bordadas com as pedras, e ela se perguntava se eram preciosas ou não - devido ao enorme brilho que emitiam.



Junto ao vestido, ela encontrou sapatos e joias cravejados nas mesmas pedras, e não pode evitar de sorrir. Havia também uma rosa – ela engoliu seco ao perceber que poderia ser uma das remanescentes do jardim – amarrada com uma fita negra que carregava um bilhete.



“Nada mais justo do que cobrir minha mais nobre Comensal com a realeza das jóias em seu dia de glória. Brilhe esta noite, minha cara. L.V.”



Ela amassou o bilhete entre os dedos, e correu para o banheiro. Aquela seria uma noite e tanto. “Difícil” não começaria a descrever.



    Mesmo na Mansão Malfoy, tudo lembrava ele. Ou a história deles. Suas roupas, seu perfume, quem ela era. Por décadas, ela fora sua consorte. E, antes disso, havia sido a princesa dos Black. - Quem é você, milady? - ela perguntou ao espelho. - Quem são os seus inimigos?- ela mordeu os lábios, sabendo a resposta. Todos que fossem inimigos dele. Por mais que tudo houvesse ocorrido... ela sempre seria a mais leal, a mais fiel. Ela queria odiá-lo, arriscar a própria vida dizendo todas as verdades que ele merecia ouvir... mas no fundo, ela não era tão forte assim.



    A banheira enchia lentamente, e ela limpou a única lágrima que escorrera por seu rosto. - Bordeaux, - ela repetiu para si mesma. Sua vida mudaria, ela precisava daquela mudança desesperadamente. O aroma de baunilha e jasmim começou a invadir o banheiro e a acalmá-la. Aquela noite, ela teria de fazer uma última performance. Dali pra frente, ela decidira, Rodolphus a representaria em todas as ocasiões oficiais possíveis.



    Quanto às pessoais envolvendo Melinda... ela conversaria com a filha. Pelo menos por um tempo, ela precisava se afastar.



    A temperatura quente da água foi muito mais relaxante do que ela esperava, e seus pensamentos puderam finalmente descansar, pelo menos por um tempo.



 



    O brilho prateado da coroa cravejada de esmeraldas e diamantes não diminuia o peso da mesma. Era engraçado que Voldemort nunca antes imaginara o quanto uma dessas pesava. Bom, agora ele sabia. Assim como a longa capa negra e bordada com fios de prata que ele usava sobre o terno bem ajustado. Ele se fizera Rei, e de alguma forma, a majestade não era tão saborosa quanto ele antecipara. Não sem ela.



    O salão da Mansão Slytherin já estava lotado de seus Comensais mais próximos, e alguns simpatizantes fora do círculo íntimo. “Estou formando minha Corte,” ele pensou, quase rindo de si mesmo. Não era como se antes ele já não fosse cercado de puxa-sacos.



    Ela, a homenageada da noite, ainda não havia chegado. E ele estava perdendo a paciência. Mais uma taça de champagne estava vazia em suas mãos, e ele já procurava uma nova bandeja para mudar aquela situação. Champagne não fazia efeito nem perto tão bem quanto uísque de fogo.



    - Continue neste ritmo e não se lembrará de como ela esteve essa noite, - ele ouviu a voz da filha e virou-se, contendo um rolar de olhos. Ela, ironicamente, também segurava uma taça de champagne. - Antes de ir para a França, eu digo. - Melinda estava com um vestido longo preto de tecido esvoaçante, mas assim como ele parecia estar de luto, no caso dela até mesmo a tiara que adornava os cabelos era cravejada de diamantes negros. A notícia, no entanto, era mais perturbadora do que o traje da filha.



    Ele não conseguiu conter a surpresa, - Amanhã? - ele pirragueou. - Imaginei que ela esperaria mais para se recuperar.



    Melinda goleou a champagne, e deu de ombros. - Ela tem pressa de ir para longe, talvez tenha medo...



    - De? - ele indagou.



- Você. Ou vocês. Ou do quão forte é a decisão dela... Eu não tenho certeza. - ela terminou a champagne de uma vez, parecendo ter se esquecido de sua pequena lição de moral de antes, - Mas algo me deixa curiosa... Ela iria para a França sem a própria varinha? - Voldemort sorriu de canto, entendendo o recado que a filha queria lhe passar, e assentiu. Melinda pegou a taça vazia da mão dele, - Agora se me dá licença, vou conseguir mais desses. - ela andou em direção ao salão, mas não sem lhe enviar uma piscadela. Ela podia ter se tornado uma princesa de fato, e se parecer com uma, mas sempre teria a estrategista de guerra por dentro. Não importava o tipo de guerra, pelo jeito.



    A Champagne nunca chegou a tempo, porque segundos depois, Bellatrix passava pela porta. “Exuberante” era a palavra. Ela usava o vestido que ele havia enviado, o traje completo na realidade. Uma parte dele despertou com aquele pensamento. Ela havia prendido o cabelo elegantemente na nuca e os lábios estavam bordô como o vestido.



    Ela se curvou no momento em que seus olhos se cruzaram com os dele, - Majestade, - ele se perguntava se ela havia ensaiado aquilo, se quase referiu-se a ele como “Milorde”.



    Voldemort aproximou-se dela, todos os olhares cravados neles, como se aquele fosse um momento decisivo para o mundo bruxo. De uma certa forma, para os presentes, era.



    - Bella, - ele estendeu-lhe a mão, e ela tremeu quando a pegou. Ele respirou fundo, incerto sobre as razões que causaram o tremor.



    Mais uma vez, os olhares se cruzaram quando ela levantou, ainda mais linda de perto. Nem de longe ela estava tão pálida quanto estivera no hospital, e parecia ter recuperado o peso perdido. Ele queria tomá-la nos braços, mas sabia que aquele prazer não mais lhe era permitido.



    - Vejo que gostou dos presentes, - ele comentou, casual, mas sem soltar a mão dela. - Era o mínimo que merecia, milady. - ele beijou o dorso da mão de Bellatrix, que por um segundo fechou os olhos.



 



    Tortura. Era como ela definia aquela noite, seus sentimentos confusos em relação a Voldemort não estavam ajudando. Vê-lo ali, trajado como um rei, tratando-a como uma rainha, fazia com que uma parte dela quisesse se jogar nos braços dele novamente. Mas a outra parte, a mais forte, reprimia o amor que ainda sentia por ele, lembrava-a do que havia acontecido, e ela se odiava.



    Os lábios em sua mão, frios como sempre, lhe lembravam de um outro tempo. Da primeira vez que ele a tocara daquela forma, e como ela o desejara. Aquela Bellatrix estava morta, e também aquele Voldemort.



    - Foi um prazer, - ela respondeu, quase citando a velha Bella, aquela com quem a vida ainda não havia sido cruel, e cujo coração não havia sido destruído. Oh, ela naquele tempo não tinha um. - Não poderia deixar de aceitá-los numa data tão especial.



    Voldemort sorriu, de uma forma que ela nunca havia visto antes, de forma tão sincera, que ela sentiu os olhos encherem-se de lágrimas. Merlin, onde eles haviam chegado.



    Em algum momento, Melinda havia se aproximado, com duas taças de champagne nas mãos. Ela não pode deixar de notar como ambos estavam cobertos de preto, e tentava não analisar os motivos. Voldemort soltara sua mão, mas era como se ainda a tocasse. Ele pegou as taças da mão da filha, e estendeu uma a Bellatrix.



    - Um brinde, à futura Duquesa de Bordeaux. - ele levantou a taça, e foi acompanhado por todos – que pareciam estranhamente amigáveis. Ela os seguiu.



    - Saúde, - ela respondeu e bebeu da taça, terminando a champagne quase rápido demais. Então, ela parou por um segundo. - Futura?



    Voldemort sempre adorara como ela não deixava nada passar, e daquela vez, não fora diferente. - Futura... eu ainda não oficializei, Bella. Esta é a razão desta celebração, afinal. Como na coroação e no dia que eu apontei meus outros nobres, ainda estava... recuperando-se de seu papel como heroína de guerra, nada mais justo do que fazer este dia apenas sobre você. E faremos... em breve.



    - Em breve? - ela arqueou uma sobrancelha.



    - Sim... desta vez, a diversão virá antes das formalidades.



    - Oh, uma última noite como plebéia? - ela provocou, e era como se os velhos tempos tivessem voltado.



    “Ou uma última chance de te fazer minha rainha,” ele pensou, mas as palavras nunca deixaram seus lábios. - Exatamente, - ela quase sorriu, - E que tal para uma plebéia uma valsa com o Rei? - ele deixou a taça em uma bandeja e deu um passo para trás, com a mão estendida.



    Nos segundos entre aquele gesto, e a resposta de Bellatrix, era como ela e todo o salão tivessem parado de respirar. - Seria uma honra, - ela terminou a segunda taça de champagne e segurou fortemente sua mão. Aquela mulher sempre fora forte, ele conseguia agora de perto, ver dentro de sua mente a guerra que ela não deixava aparentar.  



    Bellatrix engoliu seco, mas sorriu do mesmo jeito. A mão dele na sua parecia mais quente do que jamais fora, e ela lembrava-se da antiga versão de si mesma, que - dependendo da época - passaria mal de emoção, ou se jogaria nos braços dele sem pensar. Esta Bellatrix, no entanto, estava tensa e confusa.



    Ele fez um sinal e os instrumentos iniciaram uma valsa muito mais lenta do que ela teria desejado; a mão dele em sua cintura, no entanto, pareceu reconfortante e familiar. Novamente, sua mente e seu coração estavam em luta. Coração este que deixou de bater por um segundo quando ele a puxou para perto.



    Eles começaram a se mover com a música, e ela mal havia notado. Por alguma razão, ou várias que ela já conhecia, ninguém mais se moveu no salão. Os olhos estavam colados neles, curiosos, atentos. Ela respirou fundo, e seguiu a condução dele, com a naturalidade de sempre. Tão familiar... para ela,era fácil estar naquela posição: nos braços dele novamente. E ainda assim, ela gritava internamente para se lembrar do quanto aquilo era errado.



    - Opalas Negras, - ela de repente acordou de seus pensamentos - Esta é a resposta para sua pergunta de mais cedo, - ele sorriu, e ela franziu o cenho.



    - Tão cedo na minha mente? - ela indagou, quase numa provocação. - Imaginei que teria alguma privacidade…



    A mão dele em sua cintura a trouxe para mais perto, e desta vez ela esqueceu de respirar. Eram tantas dúvidas, tanta guerra interna… e ela ainda o amava, da mesma maneira insana que sempre amara, o venerava como o único líder para quem ela se curvou na vida, mas  também o odiava pelo maldito histórico recente que tinham adquirido, e o temia profundamente como o único que a fizera se sentir indefesa.



    - Velhos hábitos… e em minha defesa, minha cara, suas paredes estão no chão… - tom era quase de brincadeira, com a intenção de quebrar a parede de gelo entre os dois.



    - Nunca precisei de paredes, majestade. - ela respondeu, sincera. - Não com você… - ela inconscientemente apertou o ombro dele, - Apenas as usei em casos atípicos, ou emergenciais.



    - Como o nascimento de Melinda? - ele lembrou, e ela assentiu. Ele olhou pelo canto de olho na direção da filha, - Fez bem.



    Bellatrix sorriu, - Meu maior erro, meu maior acerto.



    A cada compasso da música, o corpo dele - outrora frio - parecia mais quente próximo ao seu, e ela tentava ignorar a vontade de se aproximar mais que surgia no canto de sua mente. Inferno. Voldemort então afastou-se alguns centímetros dela, apenas para girá-la e trazê-la para si de novo, desta vez com as costas dela pressionadas contra seu peito.



    - Espero que a celebração esteja a seu gosto, - ele sussurrou perto demais do ouvido dela. - Digamos que eu não tenho a mesma habilidade que você e Narcissa têm para isto e foi a primeira vez que nossa filha fez algo assim.



- Bom, eu ainda não consegui ver muito… já que mal cheguei e ja fui intimada a uma valsa, - ela riu-se, relaxando contra o peito dele. - Mas imagino que esteja tudo maravilhoso, majestade. Afinal, Melinda é uma Princesa há anos, e tem extremo bom gosto.



Os dedos de Voldemort entrelaçaram-se nos dela na mão que ele segurava, e Bellatrix pro um momento quase esqueceu quem eram, como estavam, o que havia acontecido. Naquela festa, ela era a velha Bella de sempre, e se não tomasse cuidado, terminaria seduzida até se tornar aquela Bella novamente. Mas ela não podia, não devia, depois de tudo o que havia acontecido. Nada nunca mais seria como antes.



-As coisas não precisam ser como antes, milady. - ela achou que estava delirando e virou o rosto bruscamente para encará-lo.



Ela engoliu seco e as palavras que ela queria responder se negaram a se formar. Esta fora a primeira investida dele da noite, e ela ainda não sabia como lidar com o fato de que não seria a última. - Em um segundo, você se tornou uma pedra de gelo. Não se preocupe, eu não te forçarei a nada que não queira, mesmo porque nem mesmo eu tenho este poder. Há vinte anos, Bella, eu te fiz uma promessa e não precisei cumpri-la. Talvez, agora seja a hora de conquistá-la.



Ela então percebeu que a música havia parado, e eles continuavam dançando, num ritmo lento e íntimo, sob os olhares atônitos dos convidados. Os olhos dela estavam marejados, e foi ele quem cuidadosamente soltou-a, se afastou e fez uma pequena reverência. Ela repetiu o gesto, e assistiu-o enquanto ordenava aos outros que se divertissem, pois aquilo não era um show e sim uma festa. Ela precisava de mais álcool.



 



Aquela dança não havia sido mais fácil para ele do que fora para ela, ele podia ver como ela em sua mente convencia a si mesma a não ceder toda vez que ele se aproximava. Não que ela não tivesse motivos, ela tinha todos eles. Ele só queria, só precisava que ela o aceitasse de volta.



- Eu acredito que o álcool está naquela direção, - ele ofereceu o braço para ela, que suspirou e educadamente aceitou.



- Você costumava ser mais discreto sobre minha falta de privacidade a seu redor, majestade. - ela riu-se, quase irônica.



- Você não costumava se importar, minha cara. - ele devolveu, e Bellatrix fitou o chão. - No entanto, eu não entrei em sua mente agora. Eu consigo ver que é disto que está atrás apenas de olhar para você, te conheço melhor do que isso e, se eu for sincero, entendo e compartilho do apelo.



Bellatrix soltou uma risada sincera e negou com a cabeça, parecendo quase incrédula. - Nunca pensei que em algum momento você precisasse deste tipo de coisas mundanas e intoxicantes.



Ele olhou para ela, que agora segurava fortemente em seu braço enquanto cruzavam o salão em direção às mesas e bebidas, e deu de ombros. - Você me conhece o suficiente para não acreditar nisso, e existe uma diferença entre precisar e apreciar.



Ela revirou os olhos e abriu um sorriso. Finalmente, ele podia senti-la mais relaxada ao seu lado, e era uma espécie de alívio perceber que ela não estava levantando mais paredes de gelo entre eles.



Voldemort conduziu-a para uma mesa, e fez sinal para que uma das bandejas flutuasse até eles. - Alguns diriam que isto é um desperdicio de uma arte tão complicada quanto a de feitiços silenciosos e sem varinha, majestade.



- Quem quer que diga isso não tem esta champagne, e nem muito menos é capaz de fazer isso.



Ele entregou-lhe uma taça e levantou a própria. - A que brindaremos desta vez?



Bellatrix mordeu os lábios, - A novos começos?



Voldemort assentiu e tilintou a taça na dela, - A novos começos. - ele sabia que ela queria dizer um começo sem ele, mas nada o impedia de brincar a um novo começo com ela, sem as barreiras que ele mesmo havia levantado.



Bellatrix tomou a taça toda de uma vez, e ele entregou-lhe outra sem nem ao menos comentar. Ele sabia porque ela fazia aquilo, e não era como se não tivesse motivos. Ele não estava facilitando, nem precisava.



- Então… - foi ela quem começou, ao pegar a segunda taça. - Como sente-se reinando?



Ele sorriu com a tentativa, e lhe ofereceu o braço novamente. Bellatrix, educada como sempre, não hesitou ao aceitar - mas ele pode sentir como ela estava tensa com a proximidade.  



- Definitivamente, menos glamuroso do que parece. - ele confessou, levando-a na direção de uma das portas do salão. Ele podia senti-la cada vez mais tensa, e isso só provava que Bellatrix era extremamente inteligente - ela sabia para onde ele a estava guiando. - Talvez porque, bem, nós já reinavamos… Isso tudo, - ele gesticulou com a mão que usava para segurar a taça - foi apenas uma oficialização.



- Nós nunca reinamos, milor-majestade. - ela devolveu, com um leve sorriso. - Você reinou sobre todos nós, mesmo quando aqueles tolos não sabiam… mas agora, agora nós estamos livres deles. Sem sermos caçados, livres para andarmos por onde quisermos, com terras e títulos… você sempre cumpriu suas promessas, e graças a você, aqui estamos. - ela olhou-o nos olhos, e Voldemort pela primeira vez na noite não sabia o que responder. Bellatrix sempre o surpreendera, mas parecia que quanto mais o tempo passava, pior isso ficava. Mas a realidade é que ela estava errada: Ele não era responsável por nada daquilo.



    - Oh, minha cara, este é realmente o meu sonho… mas tudo o que eu nos trouxe foi guerra. A paz, isto tudo que você está vivendo, foi você quem nos proporcionou. - a porta do jardim estava na frente deles, e nenhum dos dois hesitou em cruzá-la. Voldemort não poderia negar que estava de certa forma aliviado, considerando o que havia lá.



    Bellatrix fitou o chão, e lambeu os lábios nervosamente. - Eu apenas… fiz meu trabalho. Meu trabalho era protegê-lo… eu fiz uma promessa… - ela olhou para a Marca Negra cintilando negra contra a pele dela, ainda mais pálida na luz da lua. - E eu a cumpri. Não importando as consequências. - ela o olhou nos olhos, e Voldemort viu a dor. Pela primeira vez naquela noite, Bellatrix deixara toda a dor tomar conta dos olhos verdes, agora brilhantes com as lágrimas que ameaçavam enchê-los. - E nós dois sabemos, - ela riu nervosamente, - o quão duras elas foram.



    Ele parou abruptamente. Eles entrariam no assunto, finalmente? Desde que ela acordara, eles ainda não haviam realmente discutido o que havia ou não acontecido. Não realmente. Até aquele ponto. A culpa do que acontecera o acordava todas as noites, a ideia daquilo que ele teria ou não feito caso ela não tivesse desmaiado o aterrorizava. - Sim, sabemos. - ele virou-se de frente para ela e a segurou pelos ombros, o som das taças de champagne espatifando no chão foi ignorado por ambos. - E a verdade me atormenta todos os dias… Foi por isso que eu te trouxe para o jardim… - ele olhou na direção do jardim, das rosas que ele havia criado para ela, que não mais estavam morrendo. - Eu havia ligado a vida das rosas a nós dois, e elas morreram no dia em que você foi para o St Mungus… pois bem, eu mudei o feitiço. Estão ligadas a você, à sua vida. - ele voltou a encará-la. - Porque eu vi essas rosas renascerem, e agora toda vez que eu olhar para esse maldito jardim, eu saberei que está bem, segura.     



    



    Bellatrix então olhou para as rosas, tão belas quanto haviam sido na primeira vez que ele a apresentara àquelas flores. Um voto entre eles que agora estava acabado e ressignificado. Ela não sabia o que pensar sobre a nova versão daquele jardim, sobre a culpa que ele dizia sentir, mas a visão daquele jardim completo novamente a fez cair de joelhos. O peso daquilo tudo era demais para ela, a valsa, as rosas, tudo a levava de volta a um passado bonito, uma realidade que não era mais dela, e que ela queria esquecer.



- Te atormentam? - ela riu, e negou com a cabeça… aquilo era demais, demais para ela. As lágrimas finalmente vinham a seus olhos, e desciam por seu belo rosto quando ele se ajoelhou a seu lado. -  Ah, como eu queria acreditar nisso. Como eu queria acreditar que os pesadelos também te acordam à noite, que a dor… a dor de se sentir traído, apunhalado pelas costas… a quebra de confiança… te envenenem como fazem a mim. Você era o meu mundo… - ela chorava, sua voz embargada, mas ela não se importava. Desde o Saint Mungues, ela precisava colocar isso para fora. - Eu te amei de um jeito que eu não amo nem a mim mesma… e a última lembrança que eu tenho de nós dois juntos é uma de mim mesma aterrorizada com a idéia do que você ia fazer comigo depois daquele beijo, de como ia ou não me torturar… e sem nem mesmo me dar a chance de me explicar. Vinte anos, e de nada isso importou.



Ele não respondeu, apenas passou o braço por trás dos ombros dela, e a puxou para si. Bellatrix não quis lutar, ela deixou-se cair no abraço dele, e chorar. Era como se toneladas de dor estivem-na esmagando, e ela finalmente podia se libertar. O abraço dele era estranhamente reconfortante, daquela maneira insana que apenas eles podiam explicar. Ela o amava, e o odiava. Ela o temia, e sentia-se segura perto dele. A lista de contradições poderia durar eternidades, mas o ponto era que por mais que ele fosse a razão de sua dor... ele era também seu conforto. Os braços dele estavam estranhamente quentes em sua pele, e agora suas lágrimas manchavam o caro tecido das vestes dele, mas Voldemort não parecia se importar.



Ali, ajoelhados na grama, eles não precisavam de palavras. Ele sabia exatamente o que ela estava pensando, podia ver toda a extensão de sua dor, e quanto mais ela o deixava ver, mais forte ela a segurava. Ele estava diferente, ele não era quem ele costumara ser, e Bellatrix se negava a admitir para si mesma o que ela achava que aquilo significava.



Pode ter sido dez segundos depois, ou quatro horas, ela não sabia, mas ele se afastou um pouco dela para segurar seu rosto entre as mãos. Ela provavelmente alucinou, mas parecia que os olhos dele estavam marejados. - Importou, mas de uma forma completamente errada… - ele admitiu. - Foram estes vinte anos que me tiraram do controle, Bella… nada, absolutamente nada, vai conseguir justificar o que eu fiz, porque não há uma justificativa. Eu perdi o controle e te machuquei, você merecia mais, tão mais… a ideia de que tudo havia sido uma mentira, quebrou algo em mim, eu fiz algo imperdoável e não sei se vou conseguir um dia me perdoar. Mas a vida, ela foi boa demais comigo, Bella… ela me protegeu de mim mesmo, te protegeu de mim… e você está aqui, viva, bem… inteira. Aqueles dias foram os mais terríveis da minha vida, a possibilidade de te perder estava me dilacerando aos poucos… e, por mais que eu não tenha o direito de te pedir qualquer coisa, Bella… eu preciso de você.



Bellatrix fechou os olhos, engasgada com tudo o que tinha acabado de ouvir, era mais do que ela podia suportar. Seu coração gritava para que ela o perdoasse, fosse correndo de volta para os braços dele, aceitasse ser sua rainha, mas a verdade é que se ela fizesse aquilo… nunca seria real, pois ela não o havia perdoado, não de verdade… e dificilmente poderia esquecer. Talvez um dia, ela estivesse pronta para recomeçar, mas a dor ainda era muito grande e - por mais que a destruísse - ela não podia, ela não conseguia ficar. - Eu não posso… - ela respondeu, em meio às lágrimas… - Eu preciso ir… eu preciso me distanciar… eu não sei mais quem eu sou, o que nós somos… eu não o perdoei, e se eu ficar vamos viver uma mentira. E nós merecemos mais do isso… eu queria conseguir, queria esquecer… uma parte de mim quer te pedir para me fazer esquecer, mas eu não quero. Se algum dia nós saírmos disso, eu quero que seja real. Pela primeira na vida, nós dois na mesma página… - ela riu, amarga. - Merlin, como eu esperei por esse dia, e mesmo assim… eu não consigo, ainda dói demais, eu ainda não consigo confiar em você… e tudo isso está me destruindo, acabando comigo. Eu estou indo para a França porque eu não suporto a proximidade e - então ela não podia mais falar, porque os lábios de Voldemort estavam sobre os dela, firmes e ao mesmo tempo cuidadosos.



    - Eu sei… - ele respondeu, com os lábios ainda próximos dos dela, e os dedos pressionados firmemente na nuca de Bellatrix. - eu estava em negação, e uma parte de mim ainda acreditava que eu conseguiria te trazer de volta ainda esta noite ainda, mas… vendo tudo o que você me mostrou, me deixou ver nos cantos mais íntimos… oh, Bella, eu não tenho a menor chance, não é mesmo? Pelo menos não agora. Mas eu também não consigo desistir de você. Talvez você esteja certa, talvez me afastar fosse o correto, o melhor para você, mas eu simplesmente não consigo. É mais forte do que eu.



    - Eu sei… - foi a vez dela de sorrir, ainda esbarrando os labios nos dele ao falar. - Eu sabia que essa noite seria difícil, talvez a mais difícil de todas, e quem sabe em alguns meses eu vá voltar correndo como todos pensam que eu vou, mas ir embora é necessário. Assim como eu não te peço para parar de lutar por mim, peço que não me peça para ficar, por favor. Não agora, não hoje, é tudo o que eu te suplico. Se eu ficar… não seria bom pra nenhum de nós, não sem confiança, confiança em você, em mim como seguidora, está tudo tão bagunçado, que…



    Bellatrix não conseguiu terminar a frase, pois os lábios dele estavam pressionados contra os dela novamente, e sua mente não sabia exatamente no que se focar. Sua mente traiçoeira a levou imediatamentr ao último beijo que eles haviam compartilhado, e era como se ela mais uma vez pudesse sentir o ar saindo de seus pulmões e a lenta e dolorosa retração de sua traqueia, o pânico a enchia aos poucos com as lembranças que ela não conseguia apagar. O pavor, a destruição da idolatria que ela nutrira por ele no passado, oh mas ela sabia que não era verdade. O que acontecera em Hogwarts fora apenas o último sopro que destruíra um vidro há muito estilhaçado. Sua mente então a levou às brigas, uma por uma naqueles últimos anos. E então ela percebera com a relação deles se deteriora após seu retorno. Treze anos separados os fizeram mais fortes, mas também com cicatrizes demais. Sem perceber, ela abrira os lábios para deixá-lo aprofundar o beijo, e outras lembranças a atormentaram…o inicio, como ela se sentira orgulhosa e privilegiada por ser amante dele, como o ódio de todos a fazia rir, ela era a mais fiel, a mais leal, e aquela que ele escolhera para lhe dar um herdeiro e, posteriormente, para ser a Lady das Trevas, anos e anos de altos e baixos invadindo sua mente sem sua permissão, causando-lhe uma espécie de pânico, que de repente a fez puxá-lo para longe e levantar de sopetão. A imagem daquele jardim não ajudou muito quando ela abriu os olhos, aquela cena toda era mais do que ela podia suportar. Mais uma vez, as lágrimas encheram-lhe os olhos, e ela não conseguia respirar.



    - Não! - ela gritou, cobrindo o rosto com as mãos. - Eu não vou deixar isso acontecer, eu não vou deixar você me manipular!



    - Bella, - ele se levantou, e a segurou pelos ombros. - Eu não estou tentando. Bella, me escuta, eu estou-



    - Chega! - ela se desvincilhou dele, - Me dá essa droga de título logo, e me deixa ir, por favor. É tudo o que eu te peço…. Eu preciso ir.



- Você precisa fugir. - o tom dele balançou, os primeiros sinais de nervosismo aparecendo. - Fugir é a palavra.



- Que seja. - ela deu de ombros. - Então eu vou fugir, de você, de nós, ou o que quer que seja que “nós” tenhamos sido, de qualquer forma, desse maldito lugar que tenta minha convicção. Eu preciso cuidar de mim, milorde. Pela primeira vez na vida, eu escolho a mim. - as lagrimas corriam livres pelo rosto dela, e Bellatrix tremia visivelmente. - Já apelou para meu coração, agora meu orgulho… se importa-se tanto comigo como declara, como até mesmo aqueles que me aconselharam no passado a me afastar como Narcissa gritam aos quatro cantos, pense em mim também.



Voldemort lambeu os lábios e ficou de pé, encarando-a. - Se até mesmo Narcissa passou a me defender, Bella, não cruza a tua mente a ideia de que algo possa ter acontecido? Que eu possa ter mudado? Você não faz ideia de como foi, com você em coma.



Bellatrix riu-se então, - Ah, mas eu faço ideia de como foi estar em coma. E o quão agradecida eu estava em estar viva. - Voldemort engoliu seco, - Não teve culpa de meu coma, e pode ter movido mundos e fundos para me salvar por culpa, mas teria feito muito pior. Eu me pego pensando se teria me matado rápido, ou me torturado até que eu implorasse por misericórdia. Minha mente insana preferia a segunda opção, porque era minha unica forma de sobreviver, pois eu teria tempo de me explicar. Me explicar… para o homem que eu amava mais do que a mim mesma, e a quem servi por vinte anos, para que ele não me matasse. Esse tipo de experiência te muda. Principalmente porque daquela vez eu não somente era inocente, como eu estava salvando sua vida.



Eu sei. - ele engoliu seco, e fitou a grama abaixo de si. - Sei que estava. E compreendo o quanto que eu fiz te feriu… Bella, eu-



- Achou que tudo ia voltar ao normal? A qual normal? Ao de vinte anos atrás? Ao de três? Porque estou confusa já que desde então eu não sei mais o que é normal!



Voldemort, daquela vez, não respondeu. Apenas fitou o chão. Era verdade, é claro, ele estava - mais uma vez - sendo egoísta. E ainda sim, aquela parte de si não lhe permitia deixá-la ir. Diriam que era por orgulho, e talvez fosse, mas desde que seus olhos haviam se aberto para a verdade do que sentia, a ideia de perdê-la tornara-se ainda mais aterrorizante. Havia perdido tanto tempo com seu próprio orgulho, e com a deliciosa noção de que era além de um humano, superior aos sentimentos e sensações, que perdera anos e desperidaçara a chance que a vida lhe tinha dado… mas, mesmo tendo perdido, ele não podia permitir que ela fosse embora sem saber. “Era o mínimo que ele devia à Bellatrix”, era o gostava de dizer a si mesmo, embora soubesse que no fundo uma parte de si acreditava que dizer-lhe a verdade era uma última esperança.



- Seu silêncio mostra que estamos acertados, - ela riu-se. - Até você sabe, milorde, que “nós”…  não temos como continuar. Estamos quebrados demais, e tentar consertar vai apenas causar mais dor. - ela ajustou o vestido, e respirou fundo. - Por que, então, não voltamos ao nosso teatro e terminamos essa noite torturante de vez? - ela estendeu-lhe o braço.



Bellatrix esperou pelo o que pareceu uma eternidade, até que Voldemort segurou sua mão, mas sem menção de se mover. Aquela situação toda já havia sido dolorosa demais, e ela só pedia a Merlin para que ela terminasse, mas pela hesitação dele… estava longe de terminar. Ela o examinou por um momento, analisando seu rosto, enquanto ele fitava o chão. O bruxo estava pensativo, até demais, praticamente como se não a ouvisse e estivesse em outro mundo.



- Eu te amo, - a respiração de Bellatrix parou, e seus olhos encheram-se de lágrimas mais uma vez. Ela não sabia se as lágrimas eram de felicidade, tristeza, ou ódio. Deu alguns passos para trás, a mão outrora estendida caiu ao lado de seu corpo, enquanto ela tentava respirar.



Não. Ele não tinha feito aquilo. Podia ser verdade, como ela desejava que fosse, mas era impossível. “Não, não é. Você mesma descobriu a verdade.”, aquela voz irritante respondia em sua cabeça, e ela tentava ignorar e racionalizar sobre aquele maldito momento. Três palavras que ela silenciosamente esperava por vinte anos, que ela tentara não desejar, se odiara por falhar, e que ele falava tarde demais.



- Não! - Bellatrix se viu gritando, de repente. - Você não tem o direito de fazer isso comigo! - ela olhou na direção dele, mas Voldemort que ainda olhava o chão, apenas fechou os olhos. Era mentira, era a única realidade que ela conseguia aceitar. Ele estava fazendo aquilo para lhe manipular, só podia ser. - Como você se atreve a tentar, a ser tão baixo, usar isso contra mim…Mentir pra mim? Porque nós dois sabemos que isso não é verdade!



- Não é? - ele finalmente a encarou de volta, com aquela calma que ela estivera tão acostumada. - Ou você prefere acreditar que eu inventei isso e estou usando para te manipular? Bella, por favor, acha mesmo que eu declararia um sentimento que por anos preguei abominar apenas para te machucar e manipular? Nós dois sabemos que, se você não tivesse praticamente morrido nos meus braços, eu provavelmente não teria admitido a mim mesmo. Fique à vontade de culpar Harry Potter, Katherine Parkinson, quem for, mas é a realidade - por mais dolorosa que seja. E sim, o momento é uma merda, mas não torna nada disso mentira.



- Então, - ela andou para trás novamente, ainda confusa e sem saber digerir aquilo. Por anos ela sonhara, e quando acontecera ela não podia desejar mais nunca tê-las ouvido. - Achou uma ótima ideia me dizer, para que? Nós dois sabemos que eu não vou ficar, mesmo assim. - Bellatrix disse com convicção, uma que nem sabia que ainda tinha. Uma parte de si queria jogar-se nos braços dele e perdoá-lo por todo, e outra o odiava mais ainda. - Para que eu sofra junto? Divida a dor de ter descoberto isso no pior momento possível?



- Não. Pelo contrário, - ele aproximou-se dela, com cuidado, mas Bellatrix não se afastou mais. Voldemort segurou o rosto da bruxa, que tremeu com o toque, e olhou-a nos olhos. - eu não acho justo você ir embora sem saber, não depois de tudo que passamos, dos anos, e do sofrimento. Você conseguiu, Bella… - ele riu-se, - Sem que nenhum de nós percebesse.



- Foi o P-



- Ser capaz de amar e de fato amar são coisas diferentes, - ele a cortou, - Foi você quem fez a parte importante-



- Não faça isso! Uma vez na vida, pense em mim, e não me coloque nessa situação. - ela respondeu, entre dentes. - Sabe muito bem o que está fazendo, e com o que está brincando, e-



- Seria mais fácil se estivesse, não? Para todos… Infelizmente, - ele soltou o rosto dela, e jogou os braços ao ar, - Eu não estou, Bellatrix. E, se eu tinha antes alguma esperança de que isso mudaria sua decisão, vejo que estive errado. - ele estendeu-lhe a mão, como ela mesma havia feito momentos antes, - Então creio que seja hora de terminarmos este teatro, - a citação de suas próprias palavras, naquele tom tão...frio, e quase desapontado, quebrou algo dentro dela. Por Merlin, eles estavam danificados. Não apenas ela, não apenas devido aos ocorridos em Hogwarts, eles como um todo. O que diabo acontecera nos últimos dois anos? Ou teriam sido os últimos vinte?



Bellatrix se recusou a pegar a mão dele, apenas virou as costas e andou o mais rápido que conseguiu de volta para o salão, lutando contra as lágrimas que queriam escorrer de seu rosto; mais do que nunca, ela desejava que nada daquilo tudo tivesse acontecido - mas, até aí, quem não desejava o que não podia ter? Por anos, ela sonhara com o amor dele (mesmo que negando este direito a si mesma) e agora… ela não sabia mais o que queria.



 



Os ruídos do salão próximo já enchiam seus ouvidos, e ele podia vê-la um pouco à frente e - mesmo assim - ele podia sentir a tensão, a dor que ela sentia, e ouvia o conflito em sua cabeça - por mais que tentasse evitar. Naquele momento, ele não sabia diferenciar o governante do mundo bruxo do garoto em um orfanato que tivera qualquer afeição negada. Ao mesmo tempo, ele sabia que aquilo não era verdade. Ah, não era. Ele não tivera nada negado, ela lhe dera tudo, e agora ele não passava de um pirralho mimado que não sabia aprender com os próprios erros. Ele não desistiria de Bellatrix, e nunca deixaria de tentar reconquistá-la, mas sua tática tinha de mudar: Sem mais pressão, sem lembrá-la da exata pessoa que lhe machucara.



- Bella… - ele chamou, acelerando o passo e ficou aliviado de ver que ela parara. A bruxa girou nos calcanhares, parecendo cansada.



- Milor-Majestade. - ela se corrigiu e rolou os olhos,



- Para você eu sempre serei o Lorde das Trevas, então me chame como preferir. Não faço real questão. - ele respondeu, e deu de ombros.



- Que seja, milorde. Por favor, eu não quero mais - ele fez um sinal, como se fosse tocar os lábios dela, mas sem encostar em Bellatrix.



- Não falaremos mais disso. -  ele concordou. - Você é minha convidada, em sua última noite no Reino Unido, não merece ser colocada nesta situação tão desagradável que te coloquei. - ela franziu o cenho. - Obrigado, Bella, por vir. E me desculpe a indelicadeza de tocar em assuntos tão difíceis, esta é uma noite de diversão e assim será.  A última coisa que lhe direi, e pedirei que não duvide ou se esqueça, é que o que ocorreu naquela noite em Hogwarts me assombrará para sempre, um tipo de remorso que nunca senti e espero sinceramente que nunca volte a sentir.... E que... espero que um dia consiga seu perdão. - ele lhe estendeu o braço, novamente. - Agora… Se saímos juntos, acredito que seja apropriado que entremos juntos para evitar perguntas desagradáveis, eu já lhe causei estresse o suficiente para uma noite, Sua Graça.



 



Era como se ela não pudesse acreditar no que ouvia… quando ele lhe pedia desculpas, ela simplesmente não podia acreditar. Ele não parecia a mesma pessoa, e talvez não fosse como Narcissa dizia… ela também esperava que um dia o conflito dentro de si pudesse se atenuar.



- Sim, - ela confessou. - Para mim, sempre será o Lorde das Trevas… não importando o que mude, ou como nos relacionamos… - Bellatrix lambeu os lábios e suspirou, - e, apesar de não parecer, aparentemente nada consegue abalar minha lealdade… - ela riu de si mesma, - espere apenas alguém ousar falar mal de você perto de mim…



- Então se refere a alguém que não seja você, eu suponho? - ele brincou, e ela não conseguiu não rir. - Não que eu me importe, ambos sabemos que tem todos os motivos.  



- Não que alguém vá precisar fazer isso, pois todos ultimamente parecem colocar a mão no fogo por você, mas sim… Tenho meus motivos pessoais, mas nada disso pode atrapalhar o profissional. Não foi isso que estragou nosso relacionamento ao longo dos anos? - ela lhe deu o braço, com mais conforto do que gostaria. - Nossa incapacidade de conciliar ambos…?



- Quer dizer minha falha em não aceitar que minha mulher não teria mais como ser tratada como os outros Comensais, e castigada da mesma forma? Que era impossível ter ambos sem abrir mão de nossa paz, ou sem lhe dar certos privilégios... ?



- Ou minha tolice de pensar de que poderia tolerar ser sua mulher sem ditos privilégios? Ambos sabemos que isso não é verdade. Achei que cederia mais do que fui capaz… e me iludi com tal noção. - ela confessou, quase de forma melancólica… Melancolia por uma Bella que não existia mais, e nunca existiria.



- Talvez… nunca devesse ter existido, pra começar. - ele completou, e Bellatrix nem mesmo se deu ao trabalho de contestar. Não era como se ela estivesse fechando a mente de qualquer forma. - Talvez nós nunca saberemos, mas esse é o ponto de tudo isso, não é? Nós dois nos tornando novas pessoas.



Bellatrix assentiu, e eles voltaram ao salão. Todos dançavam e se divertiam, apesar da ausência do anfitrião e da convidada de honra. Melinda estava em um canto, acompanhada de Gabrielle e Nicky - era a primeira vez que Bellatrix as via desde a batalha de Hogwarts. A sobrinha sorriu assim que a viu, e andou em sua direção. Voldemort soltou seu braço e beijou-lhe a mão, e foi embora antes que ela percebesse.



- Tia Bella, - a ruiva cumprimentou, e fez uma reverência. - Sua Graça.



- De acordo com o rei, esta noite eu ainda sou parte da plebe. - Ela devolveu, pegando mais uma taça de champagne.



- Você nunca será parte da plebe, - foi Gabrielle quem respondeu, também fazendo uma reverência. - Nada além do merecido, milady.



Bellatrix não deixou de notar a diferença de tratamento das duas garotas, Gabrielle… essa não aceitaria a separação dela e de Voldemort melhor do que Melinda havia aceitado, e isso já era muito. Para ambas as meninas, eles eram quase como um ideal. Ela entendia o ponto, juntos… eles eram letais. Mas, infelizmente, eles eram letais entre si também - e o mundo não mais precisava que eles fossem letais. Com Gabrielle, no entanto, havia um outro ponto.



- Nunca tive a oportunidade… de lhe agradecer. - Bellatrix começou, fitando a taça de champagne em suas mãos, - Foi você quem descobriu tudo, quem nos ajudou a acabar com essa guerra.



- Ganhei um condado por isso… - ela deu de ombros, - Mas no fim sinto que perdi mais do que ganhei.



- Gabrielle! - Melinda repreendeu, e a loira rolou os olhos e levantou a própria taça de champagne em um brinde.



- Às verdades! - ela bebeu. - Sejamos honestas, eu posso ser uma grande heroína de guerra agora… mas nós, todos nós, nunca seremos os mesmos. Severus e eu… acabou de vez. Ele quer conversar, mas… pra quê? A ilusão acabou.



- Talvez esse seja o ponto, Gabrielle. - Bellatrix comentou. - Se alimentar de ilusões é algo perigoso, e no longo prazo… falha.



Gabrielle olhou-a nos olhos pela primeira vez, e ela podia ver nos olhos da menina uma tristeza incompatível com a pouca idade. Dezesseis anos, mas muito mais na alma. Era o que a guerra fazia à crianças, é claro, mas no caso dela não fora a guerra. O primeiro amor, quando tratado de forma tão adulta e quebrado em mil pedaços, pode também deixar cicatrizes profundas. De certa forma, Gabrielle era como ela: se entregara a uma causa e a um homem com todas as esperanças do mundo, a única diferença é que a loira podia diferenciar as duas coisas.



- Você saberia dizer… - a garota se atreveu a responder, - Depois de tudo o que aconteceu, digo, mas é uma pena. Vocês….



- Éramos um ideal? Qual a diferença entre um ideal e uma ilusão, Gabrielle?



- Mas então o problema não é a ilusão, pois nós duas não as temos mais, e sim nossa falta de capacidade de lidar com o mundo real? - Bellatrix não respondeu, - Ele não era o mestre perfeito e sem nenhuma falha, não é mesmo? Nem ele mesmo conseguiu manter essa fachada quando a guerra veio, e as chances de derrota o assolaram… alguns diriam, - Gabrielle olhou na direção de Voldemort, que estava do outro lado do salão, sentado em uma grande cadeira.  - Que para quem foi derrotado uma vez, a segunda derrota era inimaginável. Não que isso justifique, é claro, o que aconteceu com vocês. Apenas estou apontando o problema: o Lorde das Trevas e seu marido nunca poderiam ser a mesma pessoa, a Bellatrix comensal e a Lady das Trevas também não, não sem ficar feio. Vocês acharam que tinham ultrapassado isso quando você se tornou a Lady das Trevas…. Mas todos nós sabemos que não.



- E porque, de repente, analisar os problemas que levaram a nosso rompimento tornou-se o passatempo favorito dos Comensais da Morte? - Bellatrix indagou, irritada. - Não é como se eu e ele já não estivéssemos ficando insanos de nos fazer as mesmas perguntas.



- Não sei sobre os Comensais, mas eu o faço porque ligo o seu caso ao meu. No fundo, somos iguais. A diferença é que Severus não era dois homens em um, ele era um homem que nunca existiu. Nem ele mesmo sabe quem é… então, como espera que eu saiba? Ele se definiu pelas mulheres que amou, e pelas pessoas que odiou, nunca por si mesmo…



Bellatrix suspirou e assentiu, Gabrielle no fundo estava mais falando sobre seu próprio caso do que sobre o dela. E não era como se ela estivesse errada, sobre nada daquilo, principalmente sobre suas perdas - os últimos meses não haviam sido exatamente amigáveis para a jovem.



- Depois que eu terminar Hogwarts, tecnicamente eu tenho uma Mansão me esperando na França, mais precisamente na Bretanha…meus pais estão lá agora, cuidando do local. Estavam doidos para voltar pra França… já eu, talvez volte, talvez não. Não sei mais o que me espera… a guerra acabou, nenhum de nós é Comensal mais… estamos todos meio perdidos.



    - Calma, Gabrielle. - Melinda comentou, - Existe vida após a guerra, principalmente quando se é vencedor. Eu sei que você não se sente vencedora, ok? Eu entendo… mas, não é como se a vida tivesse acabado, você acabou de dizer: ainda nem Hogwarts terminou, e não é justo que com tantas possibilidades você se jogue em depressão por causa de um homem que não te merece, por Merlin!



    Gabrielle engoliu seco e fitou os pés, é claro que Melinda estava certa, e provavelmente não fora a primeira a dizer aquelas verdades para Gabrielle, mas algumas realidades são de difícil aceitação - principalmente quando se tem dezesseis anos. Melinda, não muito mais velha do que isso, também não aceitava bem a falta de fé da amiga.



    - Nós vencemos, e por que será que para todo lugar que eu vou, sinto como se estivéssemos num velório?



    Nicky segurou o braço de Melinda, sinalizando para que a prima se acalmasse, mas não adiantara. A fúria da princesa já estava solta, e dificilmente alguém conseguiria controlá-la. Era compreensível a frustração da garota, que tentava se divertir enquanto todos pareciam tentar minar sua felicidade.



    - Mel, - Bellatrix tentou intervir, mas àquele ponto ela já havia se soltado dos braços da prima.



    - Não! - a filha protestou, e olhou com frustração para todos a seu redor. - O que diabos aconteceu com vocês? Com as mulheres fortes que eu imaginei que estariam comemorando a vitória conosco? Nós vencemos! Devíamos estar nos afogando em champagne, e não afogando nossas mágoas nele! Até a Nicky, que perdeu a família toda, está mais feliz do que vocês.



    - Você fala isso porque está com o Draco do seu lado, - Gabrielle disparou, nervosa. - Queria ver o quão amarga essa vitória teria sido, caso o tivesse perdido! Ou pior, descobrisse que ele é um traidor, ou pior ele tentasse matá-la!



    Bellatrix engoliu seco, e pegou mais uma taça de champagne. Ambas as garotas estavam certas, em seu próprio modo. Talvez, apenas talvez, todos estivessem exagerando. Melinda feliz demais, e elas tristes demais. Aquilo afinal era para ter sido a festa da vitória que eles nunca tiveram e, por mais que coisas tristes tivessem acontecido, e amores tivessem sido destruídos… o mundo era deles. Oh, não, o Lorde das Trevas não estava brincando de monarca. Ele era um. Tudo aquilo pelo o que eles haviam lutado por décadas, finalmente parecia próximo das mãos deles… isso era tão maior do que Gabrielle e Snape, do que ela e Voldemort…



    - Melinda está certa, - Bellatrix disse, mais para si do que para Gabrielle, mas mesmo assim conseguiu o olhar confuso da loira. - Nós temos todo o direito de sentir a amargura que quisermos em relação à nossas vidas amorosas, Gabrielle, mas você não vê? Tudo aquilo pelo o que lutamos, o próprio motivo pelo qual eu arrisquei minha vida e você começou a odiar o homem que ama...



    - Amava.



    - Continue dizendo isso a si mesma, até acreditar, como eu nem me dou ao trabalho de fazer… - o olhar da bruxa encontrou Voldemort na multidão, - A verdade, minha cara, é que uma coisa não exclui a outra… a mágoa, a raiva, são apenas potencializadas pelo amor que você não queria que estivesse lá, mas que está enraizado….Este não é o ponto. O ponto é: nós seguimos uma causa, uma causa vitoriosa, Gabrielle. Snape não merece que você se prive de festejar… assim como o que aconteceu comigo não merece.



    - Esquisito quando o seu motivo de tristeza e de felicidade são as duas faces mesma pessoa? - Gabrielle comentou, quase em provocação.



- Essa dualidade foi o que acabou conosco, Gabrielle… como você mesma disse há pouco. Meu mestre, e o único homem que amei… Hoje, ele deve ser meu mestre, o símbolo da causa à qual jurei lealdade, Gabrielle



- Continue dizendo isso a si mesma, até acreditar. - Gabrielle respondeu, usando as palavras de Bellatrix. - Jurou lealdade ao homem que viria a amar, porque ele te encantou…a causa foi uma das razões, sem dúvida, mas a ordem foi inversa, minha cara. Não precisa responder, eu já entendi o recado, não dar a Severus o gostinho de acabar com a minha festa.



- Finalmente alguém entendeu, - Melinda suspirou. - que isso não é sobre amor, é sobre poder! - ela jogou as mãos ao lado do corpo. - Podemos, finalmente, começar a comemorar nosso império em formação?



    - Império? - Nicky riu-se. - Achei que tínhamos um reino... na verdade, mal me acostumei com o reino, vossa alteza.



    - Alguém está com ilusões de grandeza, - Gabriella provocou. - Oh espere, ela sempre teve. - Melinda virou os olhos e deu um tapa no ombro da amiga.



    - E é por isso, minhas cara, que eu sou a princesa aqui… eu tenho uma visão macro.



    Bellatrix deu risada, e cruzou os braços, - É assim que chamamos informação privilegiada agora?



    Melinda fingiu estar chocada, mas começou a sorrir poucos segundos depois. - Seja como for, até parece que meu pai vai se contentar com o que tem… tão não a cara dele.



    - O que seu pai precisa é tomar cuidado para não quebrar o acordo de paz que eu quase morri para forjar!



    O sorriso de Melinda murchou um pouco, e ela assentiu. - Ele vai… ele nunca jogaria o acordo fora, não depois de pagar o custo… Ele respeita muito o que você fez, sabia? Nunca vou esquecer que ele nem leu os termos antes de assinar… - Bellatrix respirou fundo e assentiu, ela via a seriedade nos olhos da filha. O custo… ela sabia bem qual fora.



 



    - Conheço esse sentimento, - Rodolphus acordou Voldemort de seus pensamentos. Novamente, ele se pegava observando Bellatrix sem que ela notasse. - Perdê-la.



    Voldemort então riu, e bebeu do copo de absinto em suas mãos. - Esperou vinte anos para isso, não Lestrange? Para poder tripudiar… fique à vontade, mas nossa situação não é a mesma. Não pode-se perder o que nunca foi seu.



    - Eu só estava querendo ajudar… - Rodolphus se defendeu, - Tenho juízo o bastante para não tripudiar, além do que… superei nossa querida Bella há muito tempo. Demorei a aprender que não quero me envolver nesse espinheiro, mas aprendi quando percebi que não tinha chance alguma…



    - Fez bem, Rodolphus… salvou-se de muito sofrimento. - Voldemort concordou,  - Quanto a nós dois, não tivemos o mesmo juízo.



    - Fogo e uísque… - Rodolphus levantou um brinde, e Voldemort tilintou o copo no dele. - Por melhor combinação que possa ser, não deixa de ser explosivo.



    Voldemort assentiu e fitou os pés por um momento, pensando em como talvez já a tivesse segurado tempo demais ali. Aquela situação toda era talvez mais do que Bellatrix pudesse aguentar, e as interações de mais cedo haviam mostrado isso. Além do que, esperar que os Comensais estivessem completamente bêbados para fazer o grande anúncio… mataria o clima.



    A música de repente parou, e todos olharam para ele, sabendo que ele fora responsável. Voldemort se dirigiu ao meio do salão, - Viemos aqui hoje por uma razão e, por mais que eu tivesse prometido que a diversão viria antes das formalidades, creio que precisaremos adiantar o nosso cronograma. - ele quase podia ouvir a mente de Bellatrix agradecendo. Ele dirigiu-se até o canto da sala onde uma grande cadeira de prata havia sido colocada para ele, com um tapete esmeralda estendido a partir dali. - Hoje, eu homenageio a mulher que esteve a meu lado por todos estes anos, e liderou a todos vocês em diversas batalhas… além de ser a razão pela qual nós podemos celebrar hoje. - ele disse, ao sentar-se, e estendeu a mão na direção dela. - Bella, não importa o que eu fizesse, seria ainda pouco para lhe recompensar por todos os anos e por tudo que fez, mas é o mínimo que eu posso fazer. Aproxime-se.



    A bruxa cruzou o salão, sob os olhares atentos de todos os presentes, e viu no canto de olho Melinda agarrar-se à mão de Draco, tentando focar-se apenas no caminho que tinha que percorrer, usando os olhos dele como guia mesmo sem perceber.  Ela parou a poucos passos do trono dele, e sorriu. - Será um prazer continuar a servi-lo, nesta nova ordem.



    - O prazer sempre será meu, Bella, de tê-la conosco. - ele respondeu, e pareceu respirar fundo. - Por isso, mais uma vez, devo incumbi-la de uma enorme missão. Ajoelhe-se, Bellatrix Lestrange.



Nenhum dos outros apontados nobres havia ganhado uma cerimônia oficial como aquela, mas ninguém se dava ao luxo de sentir inveja àquele ponto. Eles sabiam que ia além de um título, de uma bela cerimônia. Ele não podia coroá-la rainha, mas não o impediria de reconhecê-la como podia. Bellatrix obedeceu e ajoelhou-se, sentindo um manto pesado e negro pousar sobre seus ombros, enquanto Voldemort tirou de uma caixa a seu lado uma coroa forrada de veludo verde, entalhada em pedras parecidas com aquelas que ela usava na roupa. Ele então segurou a coroa sobre sua cabeça,  - Bellatrix Lestrange, pelo poder em mim investido e em nome do reino, eu lhe nomeio Duquesa de Bordeaux e guardiã da França. As terras que lhe concedo, assim como seu título, passarão para todas as gerações depois de você e não serão perdidos, enquanto este reino existir. - ele abaixou a coroa lentamente até tocá-la na cabeça da bruxa, que fitou o chão até o fim.



Voldemort estendeu-lhe a mão e ajudou-a a se levantar. Um dos empregados, estendeu a ele um anel com um B entalhado, ela questionaria, mas logo ele explicou. - Este anel será o seu selo, daqui para a frente. - ele colocou o anel no indicador direito dela, que reclamaria de ele ter escolhido seu brasão por si, mas era belo demais para isso. - Bem vinda, Sua Graça. - ele puxou a varinha, e fios verdes e prateados saíram de sua varinha, formando o novo brasão dela no ar ao redor deles, e os Comensais da Morte começaram a festejar novamente e a aplaudir, enquanto ela se acostumava com tudo aquilo. Voldemort suspirou e aproximou-se do ouvido dela, - Está livre, minha cara, se quiser ir pra casa. Se preferir ficar, é bem vinda, mas não a segurarei. - então, ele havia se afastado dela.



Ela olhou a seu redor e, por mais que quisesse ficar… ela talvez devesse ir. Aquela noite havia sido mais do que ela havia pensado ser, e ela saía dali com muito mais dúvidas do que entrara. Seus pensamentos ainda a atormentavam, e tê-lo coroando-a daquela forma a fez imaginar coisas que não queria. Um outro mundo, uma outra situação, e ela queria afogar e matar aqueles pensamentos. Ali, ela não conseguiria. Mentalmente, ela o agradecia por ter feito aquilo.



Voldemort olhou mais uma vez por cima do ombro, na esperança de que seus pensamentos estivessem errados, antes que ela desaparatasse para a Mansão Malfoy.  



 



Bellatrix não esperava pisar na Mansão Slytherin novamente tão cedo, não após a noite que havia tido, mas a carta de Voldemort lhe causara curiosidade. “Existe ainda uma pendência que imagino que prefira resolver antes de se mudar,” ele dizia, e ela estava curiosa para descobrir o que esquecera.



A mansão em nada parecia-se com a mesma da noite anterior, e nunca fora tão movimentada. É claro, ela entendia, agora tudo seria diferente. Eles não eram fugitivos mais, muito pelo contrário.



    Além dos elfos domésticos, que ele finalmente conseguira para a Mansão Slytherin, servos humanos andavam pelos corredores, todos com uniformes similares aos do garoto que lhe entregara a carta, e ela conhecia os rostos da maioria daqueles que claramente posavam ali como seguranças - antigos Comensais da Morte de círculos mais afastados do Lorde, que provavelmente nunca tiveram a Marca Negra e não faziam parte da estratégia da Causa, mas eram de confiança e bons o suficiente quando se tratava da batalha (o que claramente explicava o posto de seguranças da família real, e o claro orgulho deles por suas novas posições). Muitos deles lhe fizeram reverências quando ela passou, e mal perguntaram-lhe algo, é claro… Provavelmente, muitos deles mal haviam sido informados de que a Lady das Trevas não seria a Rainha.



 



    - Sua graça, - um dos mais bem informados lhe chamara a atenção quando ela cruzava a Sala de Estar da Mansão. - Sua Majestade lhe espera na Sala do Trono. - Bellatrix quase seu risada. É claro que uma sala como essas existiria. -  Por aqui,



    Antes que ela pudesse ir até a sala onde Voldemort estava, ela ouviu alguém chamar seu nome. Melinda descia as escadas animada. Quem olhasse para sua filha naquele momento, nunca diria que ela acabara de voltar da guerra - ou que teria matado tantos quanto matara em seus dezessete anos. Melinda estava com um vestido até os joelhos, de saia rodada e tecido leve, em várias camadas de preto e off white, amarrado na cintura, sem decote algum. Os cabelos estavam enfeitados com um arco de rosas prateadas, alternadas com pérolas, e o que ela acreditava serem diamantes - apesar dos materiais, era bastante discreta. Ela acreditava que aquela era a imagem de Princesa da filha no dia-a-dia.



- Pode deixar-nos, Wright. Eu a levarei ao rei, obrigada. - Melinda sorriu da maneira mais doce e encantadora que Bellatrix havia visto desde que elas haviam se reencontrado. O que haviam feito com aquela menina? Estaria ela finalmente mostrando os sinais do parentesco com Narcissa, ou tudo isso era o efeito Princesa?



- Tão educada, quase diria que não é minha filha. - Bellatrix debochou, quando a filha segurou-lhe o braço. Melinda revirou os olhos, e começou a andar.



- Calma, o Lorde das Trevas explicará tudo… - Melinda respondeu, - Ele está orientando a todos por esses dias, e logo a você também. Ele tem planos, é claro, mesmo dentro da paz. Mas dessa vez, digamos que não desejamos oposição.



Bellatrix não precisava de muito mais do que aquilo para inferir o que Melinda quisera dizer: não existe nada mais poderoso do que líderes amados por seu povo. Mas, como seriam amados a ponto de dobrar todos a suas vontades, depois de tudo? Mesmo antes do fim da guerra, ela mesma começara a mudar o discurso… a convencê-los de que estavam apenas se defendendo dos trouxas que os haviam caçado por séculos e condenado-os ao anonimato. Algo dentro dela se reacendia com a ideia de um novo rumo para a causa. - Amados… ele quer que sejamos amados. - E eis que entra a jovem princesa, poderosa, porém encantadora…. Ah, Melinda. Quem diria há alguns anos que, além de ser mais do que capaz destruir todos inimigos dele, antes dos vinte você seria a imagem deste novo mundo que se inicia? Um mundo de paz.



- Paz, e prosperidade. Como nunca antes vistos…  - Melinda concordou.



- Mas Melinda não será a imagem de nossa causa, - elas ouviram a voz de Voldemort, que as esperava no portal da sala do trono alguns metros à frente. Bellatrix e a filha fizeram uma leve reverência. - Não sozinha, é claro. - ele andou até a filha, e depositou um beijo no dorso da mão livre. Nós seremos… A familia real, eu digo.



- Se tem uma coisa que aprendi sendo uma Black… é que uma familia de imagem forte move o mundo com um estalar de dedos. - Bellatrix concordou, e pegou a mão que Voldemort lhe estendera. Um gosto amargo vinha à sua boca, tendo uma parte de si querendo correr para o mais longe possível, e a outra gritando em animação para ser uma parte daquilo. Oh, os tempos que estariam para vir.



    - Se nos dá licença, Melinda, Bellatrix e eu precisamos conversar. - Voldemort avisou, e Melinda se afastou com um sorriso e uma reverência.



    - Como preferir, majestade. Estarei no meu quarto, estudando o livro que me deu. - ela virou-se para Bellatrix, -  Não se atreva a esquecer de se despedir de mim antes de partir!



    Melinda girou nos calcanhares e saiu quando ela mal havia tido tempo de assentir, e Voldemort a puxou na direção da sala do trono. Ela sentia-se estranhamente confortável tão próxima a ele tão pouco tempo depois do acontecido, ou talvez não fosse tão estranho assim considerando-se os anos de convivência.



    - Não acha melhor assim? - ele perguntou, após alguns minutos. - Não seremos nada perto do que éramos, pelo menos no futuro próximo, você deixou muito claro. Mas isso não significa que precisamos ser estranhos, mantendo uma parede de gelo entre nós o tempo todo para garantir que não vamos cair em tentação. - ela quase protestou, mas ele tinha alguma verdade no que dissera. - A partir do momento em que nossas convicções estão desenhadas, nada nos impede de sermos amigos, Bellatrix.



    Bellatrix lambeu os lábios, quase nervosa. Ela nunca havia considerado aquela possibilidade. Ele fora ou seu mestre, ou amante, nunca seu amigo. Seria tal feito possível? Com toda a história? De qualquer forma, ela continuaria sendo sua súdita, e mãe de sua única filha. Não era como se ela pudesse se esconder na França para sempre.



    - Amigos… - ela repetiu, com estranheza. - Achei que não tinha amigos, milorde… - Bellatrix provocou, enquanto lutava com seus próprios pensamentos. Voldemort apenas riu-se e revirou os olhos, sem dar-lhe o luxo de uma resposta àquela brincadeira. Bellatrix segurou a vontade de rir ela mesma, - O que foi, milorde? É a verdade! Tem súditos, uma filha, e uma ex-amante… mas amigos? Acredito que será uma novidade para ambos…



    - ‘Ex-amante’, é assim agora que chamaremos a Lady das Trevas? Achei que tínhamos acabado com o status de ‘amante’ no dia em que te transformei nela… - ele não resistiu à provocação, e Bellatrix suspirou.



    - Não é exatamente como se pudéssemos dizer que sou sua ex-esposa, milorde. - Bellatrix devolveu, enquanto ele abria a porta para a sala do trono. - E não fuja do assunto!



    - Com este nível de atrevimento, tem a coragem de dizer que não somos amigos? Pelo jeito, a falta de respeito eu já tenho… - ele provocou, num tom totalmente inofensivo, como se estivesse apenas brincando com ela. Ela gostava, por mais que se negasse a admitir. - E por que não? - ele de repente ficou sério. - Achei que não precisássemos de alguns papeis para sabermos o que éramos…. Então, ‘ex-esposa’ seria o termo. Oh, como no futuro te odiarão.



- Muitos já me odeiam, - ela engoliu seco, tentando ignorar a chuva de pensamentos que a assolaram quando ela se lembrava do passado, de quem eles haviam sido. Era a hora de superar, não de fraquejar e voltar atrás. - Quem mais entrará na lista agora? Já tem uma longa lista de pretendentes à rainha?



- Nada do tipo… mas se algum dia tiver, ter tido você como minha Lady terá tornado a barra alta… alta demais. - ele pareceu pensativo, quando parou na porta da sala. Voldemort colocou-se entre ela e a porta e, sem que ela percebesse, pegou sua mão e beijou o dorso. - A razão disso, é que você tem tudo, Bellatrix, tudo o que eu podia ter desejado... e foi um honra tê-la a meu lado por todos esses anos.



De repente, ele entrou na sala, e deixou-a do lado de fora. Ela talvez o agradecesse, no futuro próximo, pela cortesia de deixá-la sozinha por alguns minutos, afogada em seus próprios pensamentos e tensões. Ela fez um movimento involuntário, como se fosse mexer em um anel que não mais estava mais em seu anelar esquerdo, e franziu o cenho, tentando livrar-se daquele hábito, principalmente porque aquele anel era uma das razões dela estar ali.



Bellatrix pegou o anel que havia escondido em suas vestes e o observou uma última vez. O ouro branco, que parecia ter moldado-se ao formato de seu dedo, os brilhantes e a esmeraldas pareciam os mesmos do dia em que ele a presenteara… mas aquele era o anel da Lady das Trevas, e ela não era mais ela. Era hora de devolver.



A bruxa respirou fundo e apertou o anel entre os dedos finos, tentando passar a si mesma toda a segurança que podia, e entrou na sala. Ele não estava sentado na grande cadeira ao fundo, como ela esperaria, e sim estava virado para uma parede, fitando um mapa. - Ao todo, temos cinco países em nosso domínio, milady. - Bellatrix sentiu um arrepio ao ouvir aquele termo. Ele suspirou, e lambeu os lábios. - Sua Graça? Madame Lestrange? Bella? Há tantas formas de te chamar agora… por mais que todos insistam em te chamar de ‘A Duquesa’, não acho que me acostumaria. Bellatrix aproximou-se lentamente, ainda pressionando o anel entre os dedos. - ‘Bella’.... me chama assim desde que me lembro, e não sei se me acostumaria de outra forma, sendo sincera. As poucas vezes que me chamou de qualquer coisa que não fosse isso… machucou pois eu sabia que algo estava errado.



- Qualquer coisa? - Voldemort não resistiu ao impulso de provocá-la, e a bruxa apenas rolou os olhos, mas não sem um sorriso. Ele entao deu de ombros, - Não se preocupe, eu entendi, Bella… não vou negar que provocá-la é extremamente interessante.



Bellatrix pretendia responder, mas parou ao lado dele no mapa, que tinha diversos pinos coloridos Europa adentro. Alguns, eram verdes com o novo brasão que ele havia criado para si após a guerra. Cinco deles, sendo precisa. O Reino Unido, Irlanda, França, Albânia e Bulgária.



- Países leais? - ela perguntou, tocando um dos pinos no mapa.



Voldemort assentiu, e apontou aos pinos de outras cores. - Os amarelos estão em processo de declararem sua lealdade a mim, os em laranja teremos dificuldade, e os pinos vermelhos….



- Ameaças… - ela completou, e um sorriso formou-se no canto dos lábios dele. Ela sempre o impressionava. Como ele havia dito minutos antes, ela tinha tudo.



Os olhos da bruxa viajaram para o outro lado do mapa, onde um único pino vermelho estava instalado. Estados Unidos, é claro. Ela havia ouvido histórias sobre como as leis de magia eram severas, e eles tinham uma fama de gostar de se meter nos assuntos mágicos de outros países no momento em que notassem quaisquer risco para si.



- Os americanos estão quietos até agora, como estiveram desde que me ergui na primeira guerra. Nunca moveram um dedo, pois não os afetava…. E enquanto não os afetar, permanecerão assim. De qualquer forma, seria tolice desconsiderar o risco. Não estamos mais na surdina, minha cara, muito menos podem nos pintar como um bando de loucos. Eu sou o rei de cinco paises, dentre eles dois dos mais poderosos da Europa.



- Como? - ela perguntou. - Como manteve os outro quatro? O Acordo foi feito aqui….



- E copiado e enviado aos ministros da Magia dos outros países, que assinaram. Devo lhe agradecer por isso, inclusive. A resistência aqui era muito maior do que nos outros países, com Potter e a Ordem da Fênix… uma vez que eles assinaram….



- Países com resistências mais fracas simplesmente assinaram….



Voldemort afastou-se do quadro, e sentou-se no trono ao fundo da sala pela primeira vez desde que ela chegara. A cadeira era de madeira negra, com serpentes circundando-a e alguns detalhes em ouro e esmeraldas. Ele parecia pensativo, e ela o observou atenta. - Muitos paises ainda não caíram, e outros se libertaram de meu poder ao fim da guerra. Eles tinham a escolha de aceitar o acordo ou não, e no acordo britânico, eu me comprometi a acabar com a guerra… por isso se libertaram, mas vou recuperá-los. Se não será pela força, terá de ser pela diplomacia.



Bellatrix franziu o cenho, as peças daquele estranho quebra cabeças começando a se formar. De repente, tudo parecia fazer mais sentido. A monarquia, o comportamento de Melinda… todo o show, e seu propósito. Ela não conseguiu deixar de sorrir e de andar rapidamente até Voldemort



- É claro que você não se coroaria tão rapidamente, sendo que já tinha poder o suficiente em suas mãos para conseguir se coroar, sem um motivo maior do que vaidade. Por mais que seja divertido a todos nós, e que sua coroa e todos esses títulos não sejam mais do que uma oficialização de uma realidade, como me disse ontem… você não faz nada sem conseguir algo em troca… fez isso para se colocar em destaque e demonstrar sua boa vontade como governante, e é por isso que Melinda está sendo o esteriotipo de uma princesa. Está tentando mudar nossa imagem, fazer com que esqueçam que somos os vilões que assombram suas crianças a noite. Quer que nos amem, que queiram ser leais, fazer parte de seu império.



- Paz e prosperidade como nunca antes vistos… - Voldemort cruzou os braços, com uma expressão de claro orgulho em relação a ela. - Sempre tão inteligente, minha cara Bella. Não é novidade para você meu nato talento em encantar as pessoas, fazê-las acreditar em uma causa, seduzi-las com minhas palavras e promessas de um mundo diferente… afinal de contas, algum de vocês no círculo íntimo se juntou a mim à força, por medo? Oh não, não vocês… todos se ofereceram, pediram para serem marcados. Após tantos anos conseguindo o que eu queria com violência, no campo de batalha, será interessante voltar às bases, para dizer o mínimo, mas é claro que a violência virá inevitavelmente neste processo. E é por isso, entre outras coisas que você está aqui…



Bellatrix não havia notado, mas havia cruzado a sala enquanto ele falava, e estava ao lado do trono em que Voldemort estava sentado, observando-o atentamente. Ela ajoelhou-se para olhá-lo nos olhos. - Não importa o que aconteça entre nós, pessoalmente falando, sempre estarei disposta a lutar por ti no campo de batalha, a ser uma de seus tenentes.



- Minha primeira e melhor tenente… - ele a encarou, intenso como apenas ela conhecia, os olhos vermelhos faiscando. - Ou eu deveria dizer general?



A bruxa não formou uma sentença satisfatória para respondê-lo, os pensamentos se formando rápido demais em sua mente. Ela havia mesmo ouvido aquilo? O que ele queria dizer com general? Ele queria que ela… - Preciso de alguém para liderar meu exército, Bella, enquanto eu estiver ocupado encantando governantes e um povo inteiro. E não conheço ninguém em que confie o suficiente para exercer este papel, a não ser… você. Lidere minhas forças por mim, Bella, mantenha-os inspirados nos tempos de paz e traga-os para a batalha quando minha diplomacia não for suficiente, ou quando ela chegar onde queremos e a real guerra começar. - Voldemort não precisava explicar o que era a “guerra real”. O mundo trouxa, ela sabia. E não havia outra resposta que ela podia dar. - Será uma honra.



Os cantos dos lábios dele se curvaram em um sorriso, e ele pegou a mão de Bellatrix para beijar o dorso, até notar que algo estava ali escondido. Quando ele virou o pulso dela, seus receios se concretizaram.



Bellatrix sentiu o corpo todo tensionar quando ele virou sua mão e viu o anel que havia lhe dado, que agora parecia pesar dez vezes o que havia no passado. - Milorde, - ela começou, e ele já havia levantado-se do trono e andado alguns passos na direção oposta à dela.



- Não se atreva a tentar me devolver isso, Bellatrix. - ele cuspiu, e ela não precisava olhar nos olhos dele para saber que naquele momento ele possivelmente poderia matar alguém com o olhar.- Não me lembro de te ver devolvendo suas jóias, ou seu anel de casamento, ao Rodolphus quando nos envolvemos. Use-o como uma jóia qualquer, jogue-o no fundo de uma gaveta, como preferir. Eu não vou recebê-lo de volta.



    Ela se levantou abruptamente e andou até Voldemort, que girou nos calcanhares para encará-la. Até então, tudo havia sido praticamente pessoal, mas à medida em que eles se aventuravam em seu passado conturbado, a situação deixava de ser tão simples assim. - Sabe muito bem que eu não é fácil assim, - ela rebateu, apertando o anel entre os dedos. - Eu não vou conseguir me livrar dele, não depois de tudo… do que significou.



    - E quer que eu faça o serviço por você? Sinto muito, Bella, mas eu também sou parte dessa história, e não vou deixar você me usar como escudo para aquilo do que você quer se esconder. Quer se livrar do anel? Livre-se, não peça que eu o faça, pois você também sabe que eu não seria capaz de mantê-lo comigo… eu te dei esse anel por uma razão, porque ele era destinado a ser seu. - Bellatrix engoliu seco, e fechou os olhos. Quase como um reflexo, ela começou a colocar o anel de volta em seu dedo anelar esquerdo, até que ele a parou. - Não precisa usá-lo se não quiser, mas eu não resisto ao ímpeto de lhe pedir para lembrar que esse anel é o símbolo de duas décadas que nenhum de nós dois tem o luxo de esquecer.



    A verdade era que ela estivera nos últimos dias se convencendo de que devia devolver o anel a ele, mas grande parte de si olhava para aquela jóia quase como uma parte de si àquele ponto. Era mais do que o símbolo do que fora o relacionamento deles nos últimos anos, era o símbolo de uma história inteira, que podia ter chegado a seu fim, mas… deixara lembranças e marcas, de todo não ruins. A quem ela queria enganar? Ela sabia que no fundo faria tudo de novo, e que as lembranças boas eram maiores do que as ruins. Ela queria devolver o anel, queria não desejar continuando usando-o, mas não era tão fácil assim.



- Nós sabemos que se eu ficar com ele, serei incapaz de jogá-lo em algum canto… Lembro-me como se fosse ontem do dia em que me deu, da emoção que eu senti… se eu ficar com ele, eu o usarei. Agora, será como uma lembrança física dos tempos que, podem não voltar, mas sempre encherão nossas memórias.



Voldemort não respondeu verbalmente àquela sentença, apenas assentiu, e ajudou-a a deslizar o anel de volta a seu lugar devido. O bruxo pegou a mão dela, e beijou-a por cima do anel. Bellatrix respirou fundo, e lutou contra as lembranças e anseios que irritantemente insistiam em encher sua mente. - Agora, o motivo pelo qual te chamei aqui.



- Achei que era porque queria me informar de meu novo posto como general? - ela perguntou, confusa, nada mais lhe passava pela cabeça que não fosse aquilo.



Voldemort riu-se, e negou com a cabeça. - É claro que você se confundiaria, eu pretendia lhe dar a noticia sobre seu novo posto em uma outra oportunidade, para ser sincero, é só que tudo se desenrolou de formas inesperadas. A razão pela qual está aqui é mais simples do que isso. - ele de repente puxou a Varinha das Varinhas e apontou-a para a bruxa, que não conseguiu resistir ao impulso de puxar a própria varinha e apontá-la de volta.



Voldemort lambeu os lábios, e abaixou a varinha, levantando as mãos em sinal de trégua. - Peço desculpas pelo susto, - ele disse, e guardou a própria varinha, mas olhe bem para a varinha que está segurando.



Bellatrix se recompôs, segurando o impulso de agredi-lo pelo susto desnecessário, e examinou a varinha que havia ficado consigo após o episódio da Mansão Malfoy. Não era a dela, é claro, e ela contorcia a face apenas de pensar que aquela varinha poderia ter pertencido a Hermione Granger - provavelmente pertencera à garota.



- Não é a sua, é claro. É a que vem usando desde o fatídico incidente… imagino que não gostaria de ir para a França com esta….



Ela assentiu, e suspirou em derrota. - Não, não gostaria, milorde, mas como bem sabe, Olivaras fugiu da Mansão Malfoy naquela noite, e não pude exatamente conseguir outra…



Voldemort pareceu estudá-la por um momento, e fez um sinal para que ela o entregasse a varinha. Apesar do susto anterior, Bellatrix não hesitou em obedecer, e ele então estudou o objeto. Claramente, aquela varinha não se encaixava com Bellatrix. - A varinha escolhe o bruxo, - ele repetiu as palavras de Olivaras - Exceto em alguns casos, é claro. - ele guardou a própria varinha, e Bellatrix quase riu com a referência. - Mas não é como se eu fosse deixá-la partir deixando uma parte tão importante de si em mãos estranhas.



Bellatrix franziu o cenho, confusa com o que ele estava ou não propondo. Sua varinha fora levada por Potter… e é claro que ele não estava propondo algo tão fora de cogitação. - Não está pensando em…



- Buscar sua varinha? Espero que esteja com sua capa de viagem, Bella.



Bellatrix arqueou a sobrancelha, quase entretida com a idéia de explodir a casa daquela sangue-ruim como nos recentes velhos tempos - mas ela sabia que aquilo não seria possível, é claro, ela mesma organizara aquele maldito acordo. Isso apenas lhes deixava com uma alternativa.



- Decidiu testar suas enferrujadas habilidades diplomáticas no inimigo? - ela provocou, dirigindo-se até a porta, onde parou virada para ele. - Talvez seja um desafio maior do que planejava, milorde? Eu odiaria que o acordo que tivemos tanto trabalho em firmar fosse quebrado por causa de minha varinha.



Voldemort andou até a bruxa, com a expressão neutra daquela forma irritante que somente ele sabia, e apoiou a mão na porta, bem ao lado da cabeça de Bellatrix, e inclinou-se um pouco. - Não duvide de minhas habilidades, minha cara. - as mãos dele de repente fecharam-se ao redor da cintura da bruxa, apenas para levantá-la a alguns centímetros do chão, e colocou-a de volta no chão um metro para a direita - consequentemente liberando a porta, que ele abriu. - Vamos?



 



Tardes como aquelas pareciam quase criminosas, considerando-se tudo pelo o que haviam passado nos últimos meses, e todas as perdas que eles deveriam estar lamentando - e estavam. No entanto, naquela tarde, todos estavam juntos - como não haviam estado desde o casamento de Gui e Fleur - e até mesmo Andrômeda e Ted haviam se juntado a eles, afinal Harry era o padrinho de Teddy e era bom para o menino conviver com ele. Kingsley e McGonagall chegariam logo, também.



    Era como se fosse uma comemoração não oficial de estarem vivos e bem, numa homenagem silenciosa àqueles que não podiam estar. Harry de certa forma queria explodir de raiva, mas entendia os motivos que os levaram ali. Ele podia não concordar com aquela porcaria de tratado de paz, mas entendia porque os outros concordavam e apoiavam - pelo menos, dias como aquele o faziam entender.



    Harry brincou com o pudim à sua frente, quase rindo-se ao lembrar-se de Luna e sua obsessão com aquela comida. Ele estudaria no mesmo ano de Luna a partir de setembro, e tinha certeza de que seria engraçadíssimo ter a loira e Ginny junto consigo - seu cérebro insistiu em lembrar-lhe de que também teria de conviver com Gabrielle Ceresier, mas ele ignorou.



    - Harry, - Fleur decidiu perguntar, após algum tempo de silêncio. Seu sotaque havia melhorado muito e, àquele ponto, mal diriam que ela era francesa. - Como se sente voltando À Hogwarts, depois de tudo?



    - Estranho, - ele respondeu, sem pensar muito. Lambeu os lábios, e deu de ombros, pois aquela era a única descrição que podia encontrar. - e ao mesmo tempo familiar. É um conforto esquisito, entende? Nunca pensei que voltaria a Hogwarts, e aqui estarei eu fazendo meus N.I.E.M.s... depois de lutar numa guerra. Sempre quis ser auror, mas agora não tenho certeza de que é o que farei… devido às circunstâncias.



    - Eu não diria isso, se fosse você. - ele ouviu a voz de Kingley, e virou-se para ver o novo Ministro da Magia chegar, acompanhado da professora McGonagall. - Os aurores ainda respondem a mim, - ele piscou, enquanto terminava de cumprimentar os Weasley. - E eu pretendo transformar a vida do nosso querido rei num inferno. Ele assinou a droga do tratado, e ah meus aurores vão fazê-lo cumprir.



    Harry não pôde deixar de sorrir, e levantar um copo a Kingsley, - Espero que esteja certo, Quim…



    - Eu estou. - o Ministro respondeu, e sentou-se à uma das cabeceiras da mesa, próximo a Ted Tonks. Molly imediatamente serviu-lhe uma caneca com cerveja amanteigada.



    A diversão, no entanto, não durou muito tempo. Poucos segundos depois, a campainha tocou, e Molly Weasley deixou os pratos cair ao abrir. Voldemort e Bellatrix eram as últimas pessoas que eles esperariam aparecer ali. Antes que ela pudesse piscar, todos aqueles que estavam sentados haviam se levantado e puxado as varinhas. Voldemort, entretanto, entrou na casa calmamente, com a varinha guardada e as mãos levantadas em sinal de rendição - sendo seguido de perto por Bellatrix, que parecia extremamente entretida e levemente fascinada.



    - O que estão fazendo aqui? - foi Harry quem questionou, completamente transtornado. - Já não tripudiaram o suficiente? Ou o rei e a rainha precisam se paradear por aí para garantir seu poder? Saia dessa casa.



    - Eu não preciso me paradear por aí, Potter. Muito pelo contrário, a situação política é clara e eu diria que bastante… estável. Não concorda comigo, Shacklebolt? - Voldemort desviou o olhar para Kingsley, que limpou a garganta quase contrariado.



    - Sim, majestade. - ele fez um aceno de cabeça a Voldemort, como uma desculpa para não precisar se curvar. Não que algum deles fosse fazer aquilo dentro daquela casa, mas como Ministro da Magia, Kingsley era obrigado a ter um certo nível de diplomacia. - Desde que todos nós cumpramos nossas partes do tratado, não vejo porque não teremos uma paz estável e duradoura.



    - Vejo que concordamos em algo, - Voldemort assentiu.



    - E não seja rude, Harry. - Ginny Weasley interveio, e fitou Bellatrix. - Ela não é a nossa rainha…



    - Ah não? - Andromêda Tonks questionou, confusa. - Da última vez que eu soube por minhas filhas, ela era a… como Nicky se referia a você? Oh, a “Lady das Trevas”, certo minha irmã?



    - Digamos que a batalha de Hogwarts mudou muitas mais coisas do que nossa situação política, Andy… nem tudo sobrevive à guerra. Mas é um assunto delicado e particular de sua majestade, então… talvez devessemos deixar para lá… - Ginny respondeu, e lambeu os lábios. Ela sabia que estava mexendo em um terreno muito perigoso, mas não era como se alguém fosse fazer algo, não ali.



    Bellatrix engoliu seco, desconfortável com a situação que Ginny Weasley criara. Ela ainda mataria aquela garota intrometida e mimada. - Poderia-se imaginar que você tivesse coisas mais importantes com o que gastar o seu tempo do que lendo a coluna de fofocas do Profeta Diário, Weasley. Mas o que pode-se esperar de uma pirralha mediana de dezesseis anos, não é mesmo? O máximo que você pode fazer com sua vida é se entreter com a vida daqueles mais importantes e interessantes do que você… de qualquer forma, Andrômeda me choca em se importar com esse tipo de coisa. Você nunca foi de se interessar em minha vida amorosa…?



    - Vida amorosa? - Andrômeda quase riu, e olhou para Voldemort. - Diga o que quiser a si mesma, minha irmã, mas até onde sei… foram vocês que se importaram demais com a minha.



    - Apenas quando você desgraçou a família. - ela rebateu, e cruzou os braços. Andrômeda teve que segurar Ted, - Ah, a verdade dói, não é mesmo? Mas parece que os genes ruins tendem a passar de mães para filhos… até onde sei, em algum ponto Nicky se interessou por Potter, graças a Merlin ela criou senso. - Harry rolou os olhos e bufou, também sendo segudo por Ginny àquele ponto. - E Nymphadora… bem, todos sabemos.



    A face de Andrômeda contorceu-se assustadoramente num misto de incredulidade e o mai profundo ódio. Era inconcebível a frieza da irmã, - Não ouse citar minha filha… não depois… diga-me, Bella, foi você não é? - ela cuspiu as palavras, e aproximou-se da irmã. - Nymphadora disse-me que você havia jurado matá-la, e Snape disse à ordem que ele lhe ordenou… mas, pelo visto, não foi uma ordem tão desagradável… Matar a própria sobrinha.



    - Nymphadora não era minha sobrinha. Nicky é. Existe uma diferença. - Bellatrix respondeu, cruzando os braços. - Sua filha mais velha era uma auror, o inimigo, que fizera toda a questão do mundo de arrastar o nome da família ainda mais na lama.



Andrômeda riu-se, sarcástica, e andou até a irmã apenas para esbofeteá-la. - Vá à merda, Bellatrix. Eu não vou me dar ao trabalho de discutir com você. O que diabos está fazendo aqui? Porque eu sei que vocês não vieram fazer uma visita casual, e esse encontro já me enjoou. Portanto, se pretendem ficar aqui onde não são bem vindos, nos avisem para que não percamos nosso tempo.



- Eu honestamente também não tenho a mínima vontade de discutir com você, Andrômeda, é inútil e extremamente irritante. Sabe muito bem que nunca chegaremos a um acordo - Bellatrix suspirou, e arrumou a capa de viagem e os cabelos. - Se acha que vou revidar, está enganada. Alguma de nós ainda tem que manter o nível, então preferir se retirar, fique à vontade. Além do que, sou muito mais adepta de alguns feitiços que não tirarei da manga já que prometi me comportar…  - ela olhou quase divertida para Voldemort que riu e limpou a garganta, e interrompendo a briga entre as irmãs: aquilo já estava passando dos limites e ele não queria mais perder nenhum minuto ali, - Viemos resolver um problema muito simples, - Voldemort estendeu a mão a Bellatrix, - Bella…



Bellatrix tirou a varinha, e cuidadosamente colocou-a na mão de Voldemort. Por mais que muitos tivessem ficado ainda mais tensos ao vê-la puxar uma varinha, Hermione Granger deu um passo à frente, como se estivesse fascinada pela varinha. - Oh, alguém reconheceu algo. - Bellatrix provocou, mordendo o lábio.



- Minha varinha, - Hermione dirigiu-se a Kingsley, - tivemos alguns problemas na Mansão Malfoy, e as varinhas foram trocadas.



- Sim, - Harry interveio, - e foi assim que entramos no seu cofre e roubamos uma das horcruxes, aliás. Isso, e o seu cabelo que você teve o descuido de deixar na Hermione. Nunca pensei que diria isso, mas… obrigado, Belllatrix.



- Não me provoque, Potter. - Bellatrix respondeu, - Prometi não te matar, nunca prometi não te conseguir uma segunda cicatriz.



- Tente, - Ron Weasley ameaçou, e Bellatrix riu como se tivesse acabado de ouvir a piada mais engraçada de sua vida.



- Poupe-me, Weasley. Não é como se qualquer um de vocês tivesse chance contra nós… Milorde, se eles tentarem algo, nós fazemos uma aposta de quem derruba mais em menos tempo? Meus caros, Kingsley e Minerva até têm experiência de combate, mas o resto de vocês acha que são grande coisa pois participaram de uma grande batalha? Cresçam. Viemos fazer uma oferta, vão nos ouvir? - ela desviou o olhar para McGonagall, que observava-a atenta. - Minerva, pensei que tínhamos feito este acordo juntas, não? Controle seus alunos.



- Eles não são meus alunos até Setembro, Bellatrix. - ela respondeu, abaixando levemente a varinha, - E vir até aqui provocar não era parte do acordo.



- Não estamos provocando, - Voldemort colocou a varinha de Hermione em cima da mesa, junto com as outras que conseguira com Narcissa. - Viemos apenas buscar as varinhas que foram extraviadas da Mansão Malfoy, e devolver estas num símbolo de boa vontade.. Imagino que seus donos as procurem. Iremos embora assim que fizermos a troca. - ele apontou para as varinhas, e sorriu para Kingsley e Mineva. - Em momento algum os ameacei, e Bella… ela está apenas se divertindo. Nenhum de nós tem a intenção de derramar sangue hoje, por incrível que possa parecer.



Bellatrix observou-o boquiaberta. Tudo nele estava certo, a postura, a linguagem corporal, o tom de voz. Pela primeira vez em anos, ela o olhava e não via a ameaça que ele claramente era para todos ali. Ele então sorriu, e levantou ambas as sobrancelhas para Kingsley, quase em indagação. Aquele era o diplomata que ela conhecera anos antes, ela reconhecia os trejeitos, o jeito encantador - que, por mais que não funcionasse em cem por cento em seus inimigos, ela tinha certeza de que os deixaria confusos.



    - Sem nenhuma segunda intenção, Tom? - Harry provocou, e ela viu os olhos vermelhos de Voldemort faiscarem, mas ele tinha um plano, um objetivo, e não deixaria Harry tirá-lo de seu curso. - É quase desapontador.



    - Abandonei este nome há décadas, Potter, mas imagino que Dumbledore não se deu ao trabalho de lhe ensinar. - ele lambeu os lábios e suspirou, - É uma pena que apenas um de nós esteja de fato se esforçando para tornar este acordo viável e confortável para todos nós. Estendo minha mão a vocês, num movimento de paz e colaboração, e recebo dúvida? Estou quase ofendido.



    Kingsley revirou os olhos, e abaixou a varinha. - Perdoe-me, sua majestade, mas todos temos um histórico.



    - Que estamos tentando deixar para trás, - Bellatrix completou, antes que Voldemort pudesse. Ela também sabia brincar. - Nos deslocamos até aqui com apenas uma intenção.



    - Se não querem fazer negócio conosco, muito bem, voltaremos à nossa casa. - Voldemort acidentalmente se referira à Mansão Slytherin daquela forma, mas fora tão confortável que mal notara. A própria Bellatrix demorarar mais do que gostaria de admitir para incomar-se com aquilo. Ele fez menção de pegar as varinhas na mesa, e foi parado por um som que escapou de Hermione Granger.



    - Não vejo porque não, - ela sugeriu aos outros. - A varinha escolhe seu bruxo. Mantermos como está é prejudicial a todos nós. - ela deu de ombros. - Já estamos nessa situação mesmo, não sei porque protelar. - ela tirou a varinha de Bellatrix das vestes, e a estendeu à bruxa mais velha. - Toda sua.



    Bellatrix observou a própria varinha, e a pegou com cuidado. O peso em suas mãos era tão diferente, que ela não pôde deixar de sorrir. Logo, Hermione garantiu que as outras varinhas extraviadas da Mansão estavam no poder de Voldemort. Ela queria mais do que tudo que eles fossem embora dali, e que eles não fossem obrigados a ter nenhum objeto que os lembrasse daquela maldita Mansão e tudo o que acontecera lá.  



    - Interessante ver a racionalidade, - Voldemort admitiu, enquanto dos observavam calados Hermione resolver a questão sem consultá-los.



    - Eu fui a mais prejudicada de todos naquele episódio, sou a mais interessada em acabar com isso. Além do que, quanto mais rápido se resolve algo… - ela cruzou os braços impaciente, e Voldemort respirou fundo para manter-se em seu centro.



    - Eu mantenho minhas promessas, como todos vocês verão. - ele deu um passo para trás, e estendeu o braço à Bellatrix, que o seguiu sem protestar. - Até breve, imagino. Kingsley, o vejo antes disso no Ministério.



    Voldemort murmurou um boa tarde, quase sarcástico demais, ao sair pela porta com Bellatrix, que nem mesmo se deu ao trabalho de olhar para trás.



    Quando eles sumiram, foi como se o ar na casa tivesse se tornado respirável novamente. Os braços das varinhas caíram como se buscassem desesperada por descanso, e Harry foi direto para o quarto, batendo a porta atrás de si entre murmúrios de “Você não tinha o direito” em direção à amiga.



    - Mione, - Ron tentou, mas ela deu de ombros.



    - Existem coisas que o Harry nunca vai entender, porque por mais difícil que tenha sido a vida dele… ele não passou. - ela pegou a varinha em cima da mesa, e a observou. - Acho que vou ter que desinfetar isso…  e tentar ignorar o fato de que ela matou a Tonks com isso.



    - A varinha escolhe o bruxo, mas o bruxo faz a varinha. - Ron respondeu, e Hermione sorriu com um aceno de cabeça. Ele beijou a testa de Hermione, - Bellatrix assassinou a Tonks, não a sua varinha.



 



    Quando eles desaparataram nos jardins da Mansão Malfoy, Bellatrix estava rindo. Mais de estranheza do que de diversão, talvez. - Foi como assistir ao passado,



    - Devo admitir que foi mais dificil do que eu havia imaginado, - ele respondeu, rolando os olhos. - Lidar com a insolência deles. No passado, quando eu tinha que lidar com insolência, ela vinha de poderosos em vez de moleques.



    - Os tempos mudam, - ela mordeu o lábio inferior, e franziu o cenho, - Mas de certa forma, não você… não sua essência. Como eu disse, fui transportada de volta a um passado não muito distante.



    - Fico feliz de lhe trazer de volta às memórias de juventude, Bella. - Voldemort respondeu, e Bellatrix deixou o queixo cair em falso choque.



    O silêncio então imperou entre eles por alguns segundos. Eles sabiam o que aquilo significava… ela precisava ir. Não para dentro da Mansão, para a França. Bordeaux, o ducado que ele lhe havia presenteado, a esperava, e este era o último compromisso que ela devia ter no Reino Unido. Melinda a visitaria no dia seguinte, para ajudá-la com a ambientação, mas quanto a ele...



    - Acredito que seja hora de nos despedimos, milorde. - ela finalmente disse, num tom sério, e fez uma reverência. - Obrigada, pela varinha, é claro. Não seria a mesma coisa sem isso...



    - Que seja um até logo, não um adeus. - a resposta que ele decida dar pegou Bellatrix de surpresa, não pelo conteúdo, mas pela lembrança que acordava em si, e ela sabia que ele não dissera aquilo acidentalmente.



 



 



 



 



 



 



Largo Grimmauld, 12 - 31 de Dezembro de 1968



 



    A festa de ano novo da família Black havia se tornado uma tradição entre todos aqueles da alta sociedade bruxa. As estravagâncias típicas e o ambiente agradável faziam com que seus convidados nunca deixassem de vir, mas naquele ano… os Black tinham um convidado especial… àquele ponto, todo mundo que fosse alguém havia ouvido falar do Lorde das Trevas. Lorde Voldemort…. O misterioso homem de cabelos negros que Bellatrix havia observado a noite toda.



    Muitos eram os boatos sobre ele, é claro, e aquele leve tom vermelho contornando o negro de seus olhos não os deixava mentir. Ele era tão poderoso quanto era belo, e do topo de seus dezessete anos… servi-lo era tudo o que Bellatrix mais queria. Apenas as histórias a faziam tremer, e nas poucas ocasiões da noite em que ela se aproximara dele, era como se pudesse sentir a magia emanando dele - era quase uma situação sobrenatural.



Seu pai havia apresentado-a a ele, é claro, logo no princípio… mas fora tudo muito formal, e ele quase fingira que não era quem era, e àquele ponto, sozinha escondida em seu canto favorito da Mansão, ela lamentava não ter tido mais oportunidades de ouvi-lo, aprender com ele… talvez, os jovens recém saídos de Hogwarts não eram dignos o suficiente dos ensinamentos dele. Além do que, seu pai lhe dissera, não havia uma única Comensal da Morte mulher àquele ponto.



“Isso nada impediu ninguém,” Ela mal pôde acreditar quando ouviu a voz daquele homem tão próxima dela. A jovem virou-se para ele, “E eu não recruto meus seguidores baseado em gênero… apenas em talento. Vejo que sabe quem eu sou,” Legilimência, é claro. Ela lambeu os lábios, animada.



“Alguém que valha um galeão não sabe, milorde?” Bellatrix perguntou, olhando pela primeira vez diretamente nos olhos dele. Por mais que ela soubesse que ele estava lendo sua mente, ela não ligava. Era quase como se pudesse senti-lo em meio a seus pensamentos.



“Não sou seu Lorde... Não ainda, Srta Black.” ele respondeu sério, e ela quase recuou. “Mas posso ser, se assim quiser… Eu reconheço talento bruto quando o vejo, Bella.”



“Isso é um convite?” Bellatrix perguntou, quase incrédula e ainda sem saber processar a forma como ele a chamara. Não que as perguntas fizessem sentido, pois àquele ponto ela faria qualquer coisa que ele pedisse. “Está… me recrutando?”



“Como eu disse, se assim o quiser…seria bem vinda em nosso círculo. É claro… precisa ser lapidada, aulas, instrução, e alguém que esteja disposto a lhe estender este conhecimento.” Bellatrix concentrou-se em respirar, quando ele pareceu pensar e deu um pequeno sorriso antes de continuar, “Parece que este é o seu dia de sorte, Bella, pois estava mesmo procurando uma pupila.”



“Estava?” De alguma forma, ela ainda estava de pé, mesmo sem conseguir respirar há vários minutos.



    “Apenas não sabia ainda disso,” ele aproximou-se um pouco mais, e ela engoliu seco, sem saber responder. Não era comum para ela ficar sem fala, mas até aí ele não era comum. “Se quiser, é claro.”



    “Seria uma honra,” a jovem respondeu com os olhos marejados, “Segui-lo, aprender contigo, morrer por ti… o que quiser de mim, minha vida é sua, sou sua.” Ela fez menção de se ajoelhar, e ele a impediu.



“Não agora, não tão cedo, minha cara. Cada coisa a seu tempo… temos ainda algum caminho a percorrer antes que possa oficialmente me chamar de mestre.” Ele tocou o antebraço esquerdo dela, “Mas tomarei sua promessa como verdade, e voltarei por você.”



“Quando?”



“Logo. Não seja impaciente… Agora, se me dá licença, Srta Black” Bellatrix daria muitas coisas para ouvi-lo chamando-a de Bella novamente, “Creio que esta festa já acabou para mim..,”



“Tão cedo?”



“As melhores festas são aquelas que sabemos aproveitar até o ponto em que encontramos nela o entretenimento ou vitória que nelas buscávamos, e em meu caso… eu já completei este requisito.”  Ele pegou a mão dela e deixou um beijo no dorso, de forma educada e quase mecânica. Os lábios dele eram frios, mas os olhos queimavam com promessas de todo um mundo a ser conquistado. “Assim sendo, é hora de nos despedirmos.



“Que seja um até logo, não um adeus.” Bellatrix respondeu, sem deixar de olhar nos olhos dele, guardando para si as promessas que faziam.



 



- Conosco, sempre parece ser um até logo, - ela respondeu, fitando o chão com os olhos marejados. - Se a vida não conseguiu transformá-lo em um adeus… que forças terei eu? Sou sua serva, e general… imagino que nos veremos em breve. - ela fez uma nova reverência. - Majestade.



- Bon voyage, mon cheri. À plus tard… - ele beijou o dorso da mão dela.



- À plus tard.



 


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Comentários (1)

  • S.M.F.

    Perfeita e encantadora como sempre. Não canso de me surpreender com a sua genialidade ao escrever cada capítulo.

    2017-01-24
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