Versos, Ciúme e Fossa




...ou Tudo Começou Com Uma Briga Inútil


A poeira dos sinistros atos de Voldemort já havia assentado há muito tempo no período em que se passa essa história. Harry e seus amigos tinham arranjado empregos estáveis e interessantes, e montado família. Aliás, todos agora eram parte da grande e acolhedora família Weasley.

George e Ammya já tinham completado um ano de casados, de convivência pacífica na medida do possível. Ammy continuava sendo auror, e ás vezes ajudava o marido na loja, o que descobriu ser um trabalho divertido. George preocupava-se com a esposa, por causa dos perigos que o trabalho de auror oferece, mas nada dizia, pois não queria ser um marido autoritário. Gostava de liberdade e sabia que Ammy também gostava.


            Já com Ron e Hermione a coisa não era bem assim. Casados já havia quase três anos, tinham vivido boa parte desses em paz, mas os dois eram ciumentos e controladores, e isso às vezes acarretava problemas. Hermione se preocupava muito com o trabalho de Ron, o que às vezes o incomodava, pois ele pensava estar sendo subestimado. Hermione apenas queria saber de tudo, como era sua mania. Se bem que ele não podia reclamar, porque faia o mesmo. Desde o começo não aprovara o trabalho dela como jornalista, porque a mantinha longe dele (e perto de Wilfred Reed) por muito tempo (na visão dele), embora fosse melhor que o de auror no sentido de ser mais seguro e mantê-la longe do perigo.


            Por esse tempo, houve um caso complicado no Ministério, um escândalo com uma tradicional família bruxa, e estavam tentando encobri-lo. Então o Profeta Diário colocou todo o seu pessoal em campo para cobrir o caso. Hermione tinha muito trabalho, corria pra lá e pra lá, saía cedo e chegava tarde em casa. Estava estressada, ainda mais porque isso acontecera bem quando ela estava terminando seu livro sobre Elfos Domésticos.


            Wilfred Reed também lançava um livro por essa época, e presenteou Hermione com um exemplar, com a seguinte dedicatória: “Para minha inspiração...” Hermione leu-o e guardou-o no fundo do armário, conhecendo o marido e sabendo que não seria bom ele ter conhecimento daquele presente, pelo menos enquanto ela não pudesse dar-se ao luxo de ouvir e acalmar uma crise de ciúme, por falta de tempo.


            Só que essa altura Ron já estava aborrecido com ela. Ela o repelia constantemente e já não se interessante tanto pelo trabalho dele, que estava envolvido num outro caso. Metade do pouco tempo que ela passava em casa, escrevia o seu livro, e na outra metade, fazia o trabalho doméstico que ele não ajudava a fazer. Isso o deixava rude e ela retrucava.


            Um certo dia, Hermione teve que sair apressada. Foi apanhar uma pasta no armário e deixou tudo revirado, algumas coisas caídas no chão. Quando Ronald voltou do Ministério e viu aquilo, primeiro achou que haviam sido assaltados. Depois se lembrou de que sua casa tinha vários feitiços contra assaltos e portanto estava segura.


            Num rasgo de compaixão pela esposa, acenou com a varinha e as coisas voltaram a seus devidos lugares. Ron viu um livro em seu vôo e, de relance, leu o nome do autor; apanhou o livro antes de ele entrar no armário: A bruxa do bardo, Wilfred Reed.


            Ron sentou-se na casa e estreitou os olhos para o livro. Viu a dedicatória na primeira página e suas orelhas ficaram vermelhas. Foi folheando as páginas, cada vez mais carrancudo, até chegar ao poema título do livro, lá pela metade. Havia uma parte assim:



 



“Ouvindo  da torre o acorde


da harpa do bardo triste,


o marido, varinha em riste


lançou maldição de morte.


A bruxa, desesperada,


chorou sobre o corpo do bardo.


Ao bruxo foi feito nada


por ter a um amor destroçado.”



 


            Ron apertou o volume nas mãos trêmulas. A primeira idéia que lhe veio à cabeça foi fazer o poeta em picadinhos. Descartou-a logo como impraticável. Em seguida pegou o sobretudo para ir tirar satisfações com a esposa. Foi até a porta mas voltou pensando que podia esperar até ela chegar.


Sentou-se na sala com um jogo de xadrez. Começou a jogar consigo mesmo, ele fazia isso muitas vezes quando estava sozinho; mas desta vez não estava conseguindo se concentrar, ficava lançando olhares ao relógio que, presente de casamento dado por seus pais, ao invés das horas continha dois ponteiros com os nomes e os retratos dele e da esposa. O ponteiro dele apontava para “casa” agora, e o de Hermione, em que ele fixava o olhar, não saía do “trabalho”. Muito tempo depois (quanto, Ron não saberia precisar), o ponteiro Hermione apontou “viagem” e logo em seguida parou bruscamente em “casa” também. Ao ver o ponteiro sair de “trabalho”, Ron levantara-se rápido, derrubando o tabuleiro. Ouvindo um barulho no vestíbulo, Ron foi até lá. Hermione acabara de aparatar ali. Pendurava o sobretudo no cabideiro. Lançou um rápido olhar ao marido, apoiado no umbral da porta que dava para a sala, com os braços cruzados, e cumprimentou-o cordialmente:


— Olá, Ron – o garoto não respondeu e seguiu-a até a cozinha. Não perdeu de vista um só movimento dela. A garota foi até o filtro, tomou um copo d’água e em seguida, tendo percebido há muito a expressão estranha do rapaz, olhou-o interrogativamente. Ele, sem tirar os olhos dela e descruzando apenas parcialmente os braços para fazer isso, colocou o livro em cima da mesa, o livro de Reed.


A garota olhou o livro e corou de leve, o que já foi considerado por Ron como um indício de sua culpa. Ergueu os olhos chamejantes para o garoto.


— Andou mexendo nas minhas coisas? – perguntou, com voz controlada.


— Não procurei por isso, se é o que quer saber – respondeu ele, secamente, sem alterar em nada sua posição. – Estava caído no chão.


Houve um silêncio tenso, durante o qual podia-se ouvir a respiração contida dos dois. Hermione engoliu em seco e, depois de ganhar tempo folheando o livro e colocando-o de volta na mesa, olhou o marido e, levando a mão ao ouvido instintivamente para abafar o som dos gritos, disse:


— Fale.


— Quais são... exatamente... as suas relações com esse Reed? – o garoto perguntou, em voz baixa, nitidamente contida.


— Ele é meu amigo. Apenas meu amigo – Hermione respondeu com sinceridade, olhando nos olhos do marido.


— Ora, nós temos uma contradição aqui – disse Ron, em tom irônico, colocando os braços atrás das costas e balançando-se para frente e para trás, – porque ele escreveu aí “Para minha inspiração” e, segundo me consta, essa palavra não é um sinônimo de “amiga” – sua voz já estava alterando-se.


Hermione suspirou e fechou os olhos. Em seguida encarou-o.


— Olha, Ron, eu estou de bem com a minha consciência, eu sei que disse a verdade. Se você não acredita, aí já não é problema meu. Não estou com paciência pra aturar as suas crises, tá legal?, minha cabeça está estourando.


— Então por que escondeu essa droga? – gritou ele, furioso.


— Justamente porque te conheço e previ que fosse fazer escândalo – respondeu ela, no mesmo tom, e saiu do local batendo violentamente a porta atrás de si.


Ron ficou na cozinha por um tempo, respirando com dificuldade. Em seguida saiu também, apagando a luz. O livro ficou sobre a mesa.


O garoto ficou circulando pela casa até tarde; depois tomou um banho e foi se deitar. Hermione estava no quarto, debruçada sobre a escrivaninha, arranhando furiosamente um pergaminho. Esporadicamente, consultava um ou outro livro dos que estavam amontoados na própria escrivaninha, e em volta.
 


Ron deitou-se, tentou ler por um tempo, em seguida jogou o livro de lado. Virou-se na cama algumas vezes; depois disse em voz alta:


— Eu gostaria de dormir, tenho que trabalhar amanhã.


Hermione não disse nada, apenas levantou-se, agarrou algumas de suas coisas, fez o resto flutuar atrás dela, e saiu do quarto, deixando a porta aberta. Ron apagou a luz com um aceno de varinha, mas demorou muito a adormecer. A lembrança do poema de Wilfred e da atitude de Hermione o atormentava. Ele queria confiar na esposa, e até acreditava nela. Mas ele abominava aquele poeta. Precisava tirar isso a limpo, e tinha uma boa idéia de como fazê-lo... Ele ainda estava acordado quando Hermione veio deitar, muito tarde da noite, apesar de fingir-se adormecido, e sentiu quando ela o cobriu delicadamente. Nesse momento, quase desistiu do plano, mas realmente precisava tirar isso a limpo.

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