Fazendo Amigos... E Alguns Ini



CAPÍTULO DOIS



Fazendo amigos... E alguns inimigos.



 



 



 



A estação King’s Cross de trem estava lotada. Muitos trouxas – pessoas comuns, que não possuíam magia, transitavam de um lado para o outro, correndo, sempre de cabeça baixa, esbarrando uns nos outros sem sequer pedir desculpas. A família Weasley tentava transitar no meio de todo esse povo com suas malas, malões, corujas e apetrechos que a maioria dos trouxas julgariam estranho, porém a pressa que tinham não deixava que notassem.



Para chegar à Hogwarts, os alunos tinham que tomar o Expresso de Hogwarts, o trem vermelho que cruzava o país até a escola. Logicamente o trem não parava em uma das plataformas normais dos trouxas; havia uma estação especial que somente os bruxos e os pais trouxas de bruxos, no caso de crianças nascidas trouxas, acessavam: a plataforma 9 ¾, uma plataforma oculta que ficava entre as plataformas 9 e 10. A olho nu ninguém conseguiria encontrá-la, o que geralmente causava problemas em novos alunos que não nasceram em família bruxa, que nada conheciam sobre o mundo deles.



Molly andava apressada na frente dos filhos, resmungando, como sempre. Para ela, a pior parte do dia primeiro de Setembro era levar os filhos à estação. Ela odiava esses trouxas. Não, não trouxas em geral, pelo contrário, ela gostava bastante deles. Ela não gostava desses aglomerados que andavam de um lado para o outro sem nem olhar para frente, esses mal-educados que pareciam que nunca saíam da estação de trem. Aliás, ela também não gostava de bruxos mal-educados que andavam aglomerados; porém isso acontecia com menos frequência.



A família Weasley era uma das famílias puro sangue mais traidoras que tinha, já que não faziam distinção de pessoas por sua linhagem sanguínea. Aliás, seu pai era um dos maiores amantes de trouxas que conhecia, ele tinha um fascínio pelas coisas que eles criavam, seus olhos chegavam a brilhar quando descobria algo novo. Algumas famílias de sangue puro, ou seja, que não tinha trouxas na família ou caso houvesse eram parentes muito distantes, achava que eram superiores às outras. Esse pensamento a cerca de dez anos atrás gerou uma grande guerra, onde até seus pais lutaram.



— Cheio de trouxas, é claro... — Molly reclamou com os filhos, tirando Rony de seus devaneios. — Será que eles não passam um só dia sem vir aqui?



Pararam entre as plataformas nove e dez. Um homem segurando uma maleta esbarrou em Molly, que resmungou mais uma vez, baixinho.



— Agora, qual é o número da plataforma? — perguntou Molly. Rony, Jorge e Fred se entreolharam, rindo; até mesmo Percy deu uma risadinha discreta. Sua mãe já tinha ido àquela plataforma mais do que poderia contar, mas ela estava estressada, e estressada, fazia perguntas bobas.



— 9 ¾  — Gina informou prontamente, tentando impressionar. Rony sabia o que ela estava querendo... — Mamãe, não posso ir...



— Você ainda não tem idade, Gina, agora fique quieta. — cortou, impaciente. — Está bem, Percy, você vai primeiro.



Percy marchou em direção à pilastra que indicava as plataformas nove e dez e logo já tinha desaparecido.



— Fred, você agora — Molly ordenou



Viu seu irmão sorrir maroto. Sinal que alguma coisa viria.



— Eu não sou Fred, sou Jorge — ele retrucou e o Jorge verdadeiro riu atrás de si. — Francamente, mulher, você diz que é nossa mãe? Não consegue ver que sou o Jorge?



Ela olhou de um para o outro, confusa. Ela ia cair nessa, Rony não podia acreditar. Era engraçado como as pessoas tendiam a confundi-los por serem gêmeos, usarem o mesmo estilo de roupa e corte de cabelo, mas não achava eles tão iguais assim. Fred tinha muito mais sardas e o sorriso mais aberto; já Jorge tinha a voz mais grossa e os olhos mais puxadinhos.



— Desculpe, Jorge, querido.



O Jorge verdadeiro passou à frente, gargalhando, e Fred completou:



— É brincadeira, eu sou o Fred — disse rindo, como se isso fosse muito engraçado. Então logo os dois correram para a plataforma.



Agora era a sua vez. Sua mãe balançou a cabeça e Rony preparou-se para correr, mas foi interrompido.



— Com licença, — Um menino magricelo de cabelos negros e arrepiados e olhos verde-vivos, usando óculos redondos e expressão humilde se aproximou. Empurrava um enorme malão com uma grande coruja branca presa na gaiola. Parecia ter mais ou menos a sua idade e estar perdido.



— Olá, querido. É a primeira vez que vai a Hogwarts? — Molly perguntou, gentil — Rony é novo também.



Ela apontou para Rony e o menino lhe deu um meio sorriso, que Rony devolveu. Já havia o visto em algum lugar.



— Sim, é minha primeira vez. — respondeu baixinho — A coisa é, a coisa é que não sei como...



— Como chegar à plataforma? — disse sua mãe sorrindo maternalmente para o garoto, que concordou com a cabeça.



— Não se preocupe. Basta caminhar diretamente para a barreira entre as plataformas nove e dez. — Ela explicou, apontando — Não pare e não tenha medo de bater nela, isto é muito importante. Melhor fazer isso meio correndo se estiver nervoso. Vá, vá antes de Rony.



— Hum... Ok.



O menino acenou a cabeça em agradecimento, virou o carrinho para a barreira e começou a andar em direção a ela, inseguro. Depois apertou o passo e logo não estava mais lá.



Rony ajeitou-se, ansioso; agora sim chegara sua vez. Correu em direção a barreira, decidido. Aquele caminho não era novidade já que todo ano levava seus irmãos para o embarque; em segundos finalmente atravessou o portal e chegou à plataforma 9 ¾.



A tão sonhada locomotiva vermelha a vapor estava parada à plataforma. Um letreiro no alto informava “Expresso de Hogwarts: 11 horas”. Foi inevitável não sentir o frio na barriga. Agora era a sua vez, não iria ficar na plataforma dando adeus para seus irmãos e depois voltar para casa. Iria para Hogwarts, se tornaria um bruxo de verdade.



Rony se encontrou com seus irmãos e logo Molly e Gina se juntaram a eles. As duas travavam a conhecida discussão das últimas semanas. Porém dessa vez sua mãe estava mais impaciente do que nunca.



— Gina, você vai ano que vem. Para de insistir!



Aproveitou a confusão para observar em volta. A plataforma estava lotada de alunos, novos e veteranos, comemorando o reencontro com os amigos, outros se despedindo das famílias. Viu de Longe Neville Longbotton, neto de uma amiga de sua mãe, era um garotinho de rosto redondo e dentes salientes. Dino Thomas, filho de um colega de seu pai que conheceu há alguns anos num festejo do ministério da Magia também se encontrava pouco a frente. Tanto Neville quanto Dino também começavam esse ano. Também viu Lino Jordan, amigo dos gêmeos, entrar no trem acompanhado de seus irmãos. Também viu ao longe um garoto pele pálida, cabelos muito loiros e olhar aristocrático e seu pai, Lúcio Malfoy. Assim como Arthur, Lúcio também trabalhava no ministério, mas por ter um cargo alto se achava no direito de maltratar e humilhar as pessoas que julgava ser inferiores à ele. Entre suas favoritas estava seu pai. Além de ser arrogante, era um cara mau. No passado, estava metido com artes das trevas, mas quando foi descoberto jurou que estava enfeitiçado. Foi perdoado e dizia estar arrependido, mas Arthur duvidava.



O apito ensurdecedor do trem soou, anunciando que a hora de partir se aproximava. As centenas de alunos começaram a se movimentar para dentro.



— É melhor vocês entrarem — Molly observou — Cadê os meninos? Fred? Jorge? Vocês estão aí? — Ela gritou para dentro do trem. De repente virou-se para Rony, fitando seu rosto com uma careta — Você está com uma sujeira no nariz. — e tirou um lenço do bolso. O garoto ainda tentou fugir, mas ela o agarrou e começou a tentar limpar.



Tinha esquecido da porcaria da mancha.



— Mamãe, sai para lá — Desvencilhou-se, empurrando a mão da mãe, no momento em que seus irmãos voltaram para a plataforma.



— Aaaah, o Roniquinho está com uma coisa no nariz? — caçoou Fred.



Cara de pau, como se não soubesse o que era.



— Cale a boca — bradou irritado, mas Fred nem ligou.



— Onde está o Percy? — perguntou Molly.



— Está vindo aí.



Percy veio todo pomposo, já com as vestes novas de Hogwarts. Rony percebeu que suas vestes pareceriam um pouco cinza perto das vestes novas do irmão, e deu graças aos céus por não ter ido vestindo as suas. O mais velho estava com um ar superior, o distintivo de prata reluzia com a letra “M” em seu peito, que ele fazia questão de estufar para que aparecesse mais ainda.



— Não posso demorar, mãe — anunciou de nariz em pé. — Estou lá na frente, os monitores têm dois vagões separados...



— Ah, você é monitor, Percy? — perguntou Fred, com ar de grande surpresa. — Devia ter avisado, não fazíamos ideia.



— Espere ai, acho que me lembro de ter ouvido ele dizer alguma coisa — caçoou Jorge. — Uma vez...



— Ou duas..



— Um minuto...



— O verão todo.



— Ah, calem a boca — Percy bradou, zangado.



— Afinal por que foi que o Percy ganhou vestes novas? — Perguntou Jorge só para implicar, ele já sabia de cór a resposta, todos sabiam.



— Porque agora é monitor — disse Molly com carinho, mirando Percy com brilho no olhar. Por trás, os gêmeos fingiam que vomitavam — Está bem, querido, tenha um bom ano letivo, mande-me uma coruja quando chegar.



Ela beijou Percy no rosto e ele foi embora. Então virou-se para os gêmeos, mas a feição carinhosa que antes foi destinada a Percy já tinha mudado, e no lugar tinha a assustadora expressão que fazia quando queria ameaçar alguém.



— Agora, vocês dois, este ano, se comportem. Se receber mais uma coruja dizendo que vocês... Vocês explodiram um banheiro ou...



— Explodiram um banheiro? Nunca explodimos um banheiro.



— Mas é uma grande ideia, obrigado, mamãe.



Ela deu um tapa no ombro de Jorge.



— Não tem graça. E cuidem do Rony.



— Não se preocupe, Roniquinho está seguro com a gente.



— Cale a boca! — Rony mandou. Sabia que os irmãos sequer lembrariam que ele estava lá, e no fundo agradecia por isso.



— Ei, mãe, advinha? — Fred chamou sua atenção — Adivinha quem acabamos de encontrar no trem? Sabe aquele menino de cabelos pretos que estava perto da gente na estação? Sabe quem ele é? Harry Potter!



Rony arregalou os olhos abismado, Gina soltou um gritinho e Molly pôs a mão na boca, impressionada.



Harry Potter era o famoso menino-que-sobreviveu. No passado, havia um poderoso bruxo das trevas, Lord Voldemort, que lutava para exterminar todos os nascidos trouxas existentes, pois os julgava indignos de possuírem poder. Era um bruxo tão cruel que até hoje as pessoas não tinham coragem de pronunciar seu nome, era como se junto trouxesse algo ruim.



Por algum motivo desconhecido, no passado, esse bruxo perseguiu a família Potter. Na noite de 31 de outubro de 1980, dez anos atrás, esse bruxo que não deve ser nomeado encontrou os Potters em seu esconderijo e os atacou. Após matar Tiago Potter, o pai de Harry, tentou matar o garoto de apenas um ano que chorava em seu berço. Porém Lílian Potter se atirou na frente do feitiço, dando a vida no lugar do filho. Quando esse bruxo das trevas atirou a maldição da morte em Harry, misteriosamente o feitiço voltou contra o próprio homem, fazendo com que ele desaparecesse e o menino Harry ficasse com uma cicatriz em forma de raio na testa. Mesmo sendo tão novinho quando isso aconteceu, desde então era considerado um herói, uma lenda viva; ninguém na história havia sobrevivido a uma maldição da morte até então. Entretanto por morar com parentes trouxas, poucos bruxos já o haviam visto.



— Ah, mamãe, posso subir no trem para ver ele, mamãe, ali, por favor... — Gina perguntou, ficando na ponta dos pés.



— Você já o viu, Gina, e o coitado não e um bicho de zoológico para você ficar olhando. — ela puxou a menina de volta. — É ele mesmo, Fred? Como é que você sabe?



— Perguntei a ele. Vi a cicatriz. Está lá mesmo, parece um raio.



— Coitadinho. Não admira que estivesse sozinho. Foi tão educado quando me perguntou como entrar na plataforma. — Os olhos de Molly encheram de lágrimas.



— Deixa para lá, você acha que ele se lembra como era Você-Sabe-Quem? — Fred perguntou, curioso.



Molly ficou séria na mesma hora, adotando a expressão de ameaçar. Rony se afastou um pouco.



— Proíbo-lhe de perguntar a ele, Fred. Não, não se atreva. Como se ele precisasse de alguém para lhe lembrar de uma coisa dessas no primeiro dia de escola.



— Está bem, não precisa ficar nervosa. — murmurou encolhido.



Um segundo apito ecoou pela plataforma. O trem iria partir.



— Depressa! — Disse Molly. Rony e os gêmeos subiram no trem e debruçaram na janela para a mãe lhes dar um beijo de despedida. Gina começou a chorar. Devia estar assustada, era a primeira vez que ficaria sem nenhum de seus irmãos.



— Não chore, Gina, vamos lhe mandar um monte de corujas. — Fred falou serenamente.



— Vamos lhe mandar uma tampa de vaso de Hogwarts.



— Jorge! — Molly bradou.



O garoto piscou, maroto.



— Estou só brincando, mamãe.



O trem se moveu. Rony acenou para Gina, que corria atrás do trem ainda com carinha de choro, acenando de volta para os irmãos. Logo chegou a primeira curva e a mãe e a irmã sumiram. Fred e Jorge entraram na cabine onde se encontrava Lino Jordan e outros terceiranistas, porém já estava cheia. Caminhou pelo corredor olhando outras cabines na esperança de encontrar algum lugar, mas todas pareciam lotadas; quando não, os ocupantes pareciam já se conhecer, e Rony se sentiria deslocado. Já estava ficando cansado de procurar quando encontrou uma aparentemente vazia. Parecia estar com sorte, ficaria com uma cabine só para ele, mas quando entrou, percebeu que já havia alguém dentro. O mesmo menino magricela de óculos redondos e olhos verdes da estação de trem. Era Harry Potter. Pensou em fechar a porta de volta e sair, afinal, era um garoto famoso, dificilmente ia querer a companhia de alguém pobre e medíocre. Por outro lado, o trem estava cheio, era só uma viagem. Ele poderia aguentar.



— Tem alguém sentado aqui? — Rony perguntou, apontando para o assento vazio — O resto do trem está cheio.



— Não! — o garoto respondeu ansioso. — Por favor, sente-se!



Rony sentou-se de frente para Harry. O menino parecia feliz de ter companhia, o que levava-o a se perguntar porque estava sozinho então. Qualquer um gostaria de estar sentado com alguém famoso como ele. Se bem que olhando de perto ele parecia incrivelmente normal. Quando falavam do menino-que-sobreviveu, Rony sempre imaginou alguém mais forte e com uma aparência bravia; talvez bonitão, que fazia sucesso com as meninas. Harry parecia ser tão forte e corajoso quanto Rony, ou seja, nada. Aliás, era mais magro que ele próprio, se saíssem numa briga, o ruivo o esmagaria antes que pudesse lhe acertar um soco. Além do mais, sua franja escondia sua cicatriz, então não sabia ao certo se realmente ele possuía uma. Talvez Fred e Jorge estivessem brincando. Harry se mexeu um pouco desconfortável, e só então percebeu que olhava o menino sem desviar, disfarçou olhando para a janela.



A porta da cabine abriu-se naquele instante. Era os gêmeos que entravam, sorridentes.



— Oi, Rony, finalmente te encontramos! — Jorge falou — Escuta aqui, vamos para o meio do trem. Lino Jordan trouxe uma tarântula gigante.



Rony arrepiou-se no mesmo instante; aranhas eram seu ponto fraco. Quando pequeno os gêmeos armaram para que ele ficasse preso com uma enorme. Desde então tinha um medo descomunal desses animais.



— Certo. — murmurou, desejando que eles não voltassem com a tal aranha.



— Harry — Fred virou-se para o menino no canto —, nós já nos apresentamos? Fred e Jorge Weasley. E este é o Rony, nosso irmão. Vejo vocês mais tarde, então.



Os garotos saíram e deixaram Rony e Harry sozinhos. O ruivo estava mesmo encucado: Seria verdade? Esse era mesmo o tal menino-que-sobreviveu? Bom, só tinha uma maneira de saber.



— Você é Harry Potter mesmo?



Harry confirmou com a cabeça e Rony sorriu, satisfeito.



— Ah, bom, pensei que fosse uma brincadeira do Fred e do Jorge e você tem mesmo... Sabe... — e apontou para a testa de Harry.



A única coisa que restara do momento que aquele-que-não-deve-ser-nomeado atacou Harry foi uma marca em forma de raio na testa. O menino afastou a franja e Rony pôde confirmar; era exatamente como descreviam, então era ele mesmo.



— Então foi aí que Você-Sabe-Quem...? — sussurrou, mirando a cicatriz, curioso.



— Foi, mas não me lembro. — Harry apressou-se em dizer.



— De nada? — perguntou ansioso.



Sua mãe disse que não deveriam falar sobre isso com o menino, mas ah! Quantas vezes na vida iria sentar e bater um papo com Harry Potter?



— Bom... Lembro de muita luz verde, mas nada mais. — falou, coçando a cabeça.



— Uau! – Rony exclamou! Ele lembrava da maldição da morte que fora lançada nele. Não com clareza, obvio, afinal, era um bebê de um aninho. Mas uma maldição da morte, não importa a idade, não era uma coisa para se esquecer.



— Todos na sua família são bruxos? — Harry perguntou, interessado.



— Hum... São, acho que sim. Acho que mamãe tem um primo em segundo grau que é contador, mas ninguém nunca fala nele.



— Então você já deve saber muitas mágicas. — O garoto chegou a se ajustar na cadeira, ansioso.



Rony sorriu sem graça. Seus pais evitavam ao máximo ensinar algo de magia para os filhos antes de Hogwarts para que não caíssem na tentação de usá-las. Magia fora da escola só era permitido aos bruxos maiores de dezessete anos. Todas as magias que já fez foram sem querer, como na vez que Fred o empurrou do alto de uma árvore, e quando aterrissou, no lugar do chão tinha um poço fundo de água. Porém com a varinha, propositalmente, nunca fizera. Com exceção daquela que seu irmão ensinou mais cedo para mudar a cor de Perebas e que não funcionara.



O moreno continuava olhando ansioso Rony começar a florear a varinha. Era estranho o fato que o famoso Harry Potter não soubesse muito de magia; de qualquer modo, não tinha o que mostrar.



— Ouvi dizer que você foi viver com os trouxas. Como é que eles são? — Rony desconversou.



— Horríveis... — o garoto falou, rolando os olhos — Bom, nem todos. Mas minha tia e meu tio e meu primo são. Eu gostaria de ter tido três irmãos bruxos.



— Seis. — Rony falou um pouco desanimado. Amava seus irmãos, mas as vezes era difícil ter um pouco de atenção ou privacidade com tanta gente — Cinco irmãos e um irmã mais nova. Sou o sexto de minha família a ir para Hogwarts. Pode-se dizer que tenho de fazer justiça ao nosso nome. Gui e Carlinhos já terminaram a escola. Gui foi chefe dos monitores e Carlinhos foi capitão do time de Quadribol. Agora Percy é monitor. Fred e Jorge fazem muita bagunça, mas tiram notas muito boas e todo mundo acha que eles são realmente engraçados. Todos esperam que eu me saia tão bem quanto os outros, mas se eu me sair bem, não será nada de mais, porque eles fizeram isso primeiro. E também não se ganha nada novo quando se tem cinco irmãos. Uso as vestes velhas de Gui, a varinha velha de Carlinhos e o rato velho do Percy... — Rony meteu a mão no bolso interno do paletó e tirou o rato cinzento e gordo que continuava dormindo.



— O nome dele é Perebas e ele é inútil, quase nunca acorda. Percy ganhou uma coruja de meu pai por ter sido escolhido monitor, mas eles não podiam... — pigarreou. Era melhor não falar da situação da sua família para Harry Potter. Talvez ele desistisse de ser seu amigo quando soubesse. — quero dizer, em vez disso ganhei Perebas.



Sentiu suas orelhas esquentarem. Tinha falado demais e sua tentativa de esconder sobre sua situação financeira não fora tão boa assim e Harry percebeu, mas ao contrário do que pensou, ele sorriu, compreensivo.



— Er... Até um mês atrás eu não tinha dinheiro algum... — falou. — Meus tios não gostam de mim, sempre me trataram como se fosse um estorvo, um lixo. Meu primo Duda sempre teve de tudo, meus tios nunca dizem não para ele, então tem todos os tipos de brinquedos e roupas, enquanto eu não tinha nada, e nem podia usar nada dele. Por diversas vezes ele sentava na minha frente com todos os seus brinquedos novos só para me fazer inveja. E se eu tentasse pegar alguma coisa e ele visse, me batia e eu não podia revidar. Primeiro eu não conseguiria, ele é muito maior que eu; segundo que se meus tios soubessem eu apanharia ainda mais.



Rony estava boquiaberto.



— Apesar de sempre ser um menino quieto, meus tios me viam como um delinquente. Qualquer coisa de errado, sendo eu o responsável ou não, eu era castigado. Eles me batiam, me trancavam e me deixavam sem comer. Meu quarto até esse ano era debaixo da escada, o que facilitava o processo. Esse ano eu ganhei o segundo quarto do meu primo só porque começaram a acontecer algumas coisas... estranhas.



— Cresci usando as roupas velhas do Duda que é umas duas vezes maior e mais gordo que eu, porque eles não gastariam com roupas para mim. Eu era até humilhado na escola por isso, principalmente pelo grupinho de Duda. Nem mesmo no meu aniversário ganhava alguma coisa legal, na verdade nunca tive um bolo de aniversário até esse ano, quando Rúbeo Hagrid me deu um. O máximo que ganhava era uma blusa que Duda não gostava de presente. — O menino suspirou, triste.



De tudo que esperava ouvir do menino-que-sobreviveu, saber que era maltratado era a última delas. Será que o ministério da magia não sabia de uma coisa dessas? Não era possível, ele era a criança mais famosa do mundo bruxo! Qualquer família bruxa daria a vida trata-lo bem, aliás, sua mãe seria a primeira da fila para querer enchê-lo de comida.  



— Na verdade até Rúbeo me contar, eu não sabia o que era ser bruxo, nem quem eram meus pais, muito menos de Voldemort.



Rony pulou em cima do banco com o susto. Harry, justo Harry, havia pronunciado o nome dele. Ninguém pronunciava esse nome dessa maneira, displicente.



— Que foi? — o garoto perguntou confuso.



— Você disse o nome do Você-Sabe-Quem! — exclamou, assustado — Eu achava que de todas as pessoas você...



— Não estou tentando ser corajoso nem nada dizendo o nome dele. — o garoto o cortou — É que nunca soube que não se podia dizer. Está vendo o que quero dizer? Tenho muito que aprender... Aposto que vou ser o pior da classe.  — falou triste.



— Não vai ser não. Tem uma porção de gente que vem de famílias de trouxas e aprende bem depressa, as vezes melhor até que os nascidos e criados com bruxos. — Rony o consolou.



Os minutos passaram depressa e logo o trem saiu de Londres. Agora corriam por campos cheios de vacas e carneiros. Engataram em uma longa conversa sobre o mundo bruxo, e vez ou outra Harry pontuava alguma coisa, traçando um paradoxo entre os dois mundo. Ele era um cara legal, fácil de se conversar e até mesmo engraçado. Ainda bem que não desistiu de entrar naquela cabine, talvez pudessem se tornar amigos verdadeiros amigos.



Por volta do meio-dia e meia ouviram um grande barulho no corredor e uma senhora com um grande carrinho de doces perguntou sorrindo:



— Querem alguma coisa do carrinho, queridos?



Harry se levantou prontamente observando cada item à venda, tirando muitos nuques e fazendo contas. Molly não podia dar dinheiro a Rony para comprar doces, pois teria que dar para seus irmãos também, e ela não teria o bastante para todos. Harry escolhia um pouco de cada coisa: feijõezinhos de todos os sabores, balas de goma, chicles de bola, sapos de chocolate, tortinhas de abóbora, bolos de caldeirão, varinhas de alcaçuz. Tudo que sempre gostou de comer. Seu estomago roncou e ele lembrou-se que não tinha tomado café. Até tinha o sanduíche que sua mãe lhe dera, talvez comendo ele enganaria seu estômago e o distrairia das guloseimas de Harry.



O menino finalmente terminou de comprar e voltou, satisfeito, e jogou todos os doces no acento vazio. Era mais doces do que Rony havia pensado, e seu estômago protestou, novamente.



— Que fome, hein? — puxou assunto.



— Morrendo de fome — respondeu Harry, dando uma grande dentada na tortinha de abóbora.



Não conseguiu conter um gemidinho de frustração. Aquilo parecia tão bom... Não queria pedir nada a Harry, poderia parecer interesseiro e não queria isso, afinal, tinham acabado de se conhecer. Sem alternativa e querendo distrair sua mente e estômago daquele tanto de gostosuras, Rony tirou os sanduíches que sua mãe fizera mais cedo do bolso. Não tinha a menor vontade de comê-los, mas era melhor do que nada. Abriu o sanduiche para ver o conteúdo e suspirou, triste.



— Ela sempre se esquece que não gosto de carne enlatada.



Harry, parecendo ter entendido a situação, enfiou a mão entre suas coisas e puxou um pastelão de carne.



— Troco com você por um desses — propôs — Tome, pegue...



O ruivo coçou a cabeça, sem graça. Não queria a piedade de seu novo amigo, mas estava louco para comer o que ele oferecia.



— Você não vai querer isso, é muito seco. — Rony explicou, desanimado. — Ela não tem muito tempo para caprichar; você sabe, somos cinco.



— Come... Coma um pastelão — Harry insistiu, quase enfiando o alimento no rosto do amigo. — Acho que exagerei na comida, não vou conseguir comer tudo. Vamos lá, coma!



Rony não fez cerimônia, largou os sanduíches de lado e pegou o pastelão, abocanhando na mesma hora. Isso sim era lanche, delicioso. Os dois garotos passaram os minutos seguintes na longa jornada que era acabar com a fome. Harry podia até não conhecer sobre a vida bruxa, mas acertou direitinho na escolha dos lanches e doces.



— Que é isso? — o moreno perguntou, mostrando um pacote de sapos de chocolate. — Eles não são sapos de verdade, são?



— Não. — respondeu rindo. — Mas vê qual é a figurinha, está me faltando a Agripa.



— O quê? — Perguntou, confuso.



— Claro que você não sabe, — Rony bateu na própria cabeça. Harry não sabia nada sobre os doces típicos de bruxos, nem sobre as figurinhas colecionáveis. — os sapos de chocolate têm figurinhas dentro, sabe, para colecionar, bruxas e bruxos famosos. Tenho umas quinhentas, mas não tenho a Agripa nem o Ptolomeu.



O garoto assentiu e abriu o pacote do sapo de chocolate, puxando a figurinha. Rony esperou, ansioso; estava a meses tentando tirar as duas que faltavam.



— Então este é Dumbledore! — exclamou.



— Não me diga que nunca ouviu falar de Dumbledore! — Rony perguntou. Mesmo para um garoto criado por trouxa, não conhecer Dumbledore era raro — Quer me dar um sapo? Quem sabe eu tiro a Agripa. Obrigado.



Abriu a caixa cuidadosamente, procurando a figurinha, enquanto Harry lia a dele.



— Ele desapareceu! — o garoto falou surpreso ao notar que a imagem de Dumbledore não estava mais lá.



— Ora, você não pode esperar que ele fique aí o dia todo. Depois ele volta. — e puxou finalmente a figurinha do seu sapo de chocolate — Não, tirei a Morgana outra vez e já tenho umas seis... Você quer? Pode começar a colecionar.



Estendeu a figurinha à Harry, que aceitou de bom grado, juntando a outra de Dumbledore. Virou-se para as outras caixinhas de sapos. Ainda tinham umas sete, quem sabe uma delas...virou-se olhando suplicante para Harry, querendo outro, mas o garoto ainda encarava o cartão, impressionado pelo homem na foto ter ido embora.



— Sabe, no mundo dos trouxas, as pessoas ficam paradas nas fotos... — comentou, e então viu que Rony queria mais sapos. — Sirva-se.



— Ficam? O que, eles não se mexem? — Ficou surpreso. — Que coisa esquisita!



Não conseguia imaginar alguém estático numa foto. Devia ser muito chato para a pessoa fotografada não poder se mexer. Eram muitos sapos de chocolate para abrir, pensaria nisso depois.



— Você vai ter que tomar cuidado com essas aí — alertou Rony, vendo que Harry já abria um pacote de feijõezinhos de todos os sabores. — Quando dizem todos os sabores eles querem dizer TODOS OS SABORES. Sabe, todos os sabores comuns como chocolate, hortelã e laranja; mas também espinafre, fígado e bucho. Jorge achou que sentiu gosto de bicho-papão uma vez.



Rony apanhou uma balinha verde, geralmente as verdes vinham com uma pegadinha. Normalmente não pegaria dessas, mas queria provar seu ponto a Harry. Examinou-a atentamente para ver se não era algo ruim demais e mordeu uma ponta.



— Eca! Está vendo? — falou cuspindo — Couve-de-bruxelas.



Harry gostou de verdade dos feijõezinhos e os dois travaram uma batalha de quem tinha mais sorte ao comer, onde um de cada vez pegava um feijão aleatoriamente e comia; ganhava quem pegasse menos sabores ruins. Eram engraçadas as caras que Harry fazia a cada balinha que tirava, e como gargalhava com uma brincadeira tão simples. A impressão que tinha era de que Harry Potter nunca havia se divertido na vida.



Os campos que passavam agora pela janela estavam ficando mais silvestres. As plantações tinham desaparecido. Agora havia matas, rios serpeantes e morros verde-escuros. Já deviam ter passado um pouco da metade da viagem.



Ouviram uma batida à porta da cabine e Neville, o menino de rosto redondo e um pouco dentuço que vira na estação de trem no embarque, colocou a cabeça para dentro da cabine. Estava meio desesperado e parecia prestes a chorar.



— Desculpem, mas vocês viram um sapo?



Os garotos manearam a cabeça, e Neville começou a chorar. Os garotos entreolharam-se espantados.



— Perdi ele! Está sempre fugindo de mim!



— Ele vai aparecer — consolou Harry.



— Vai — disse o menino infeliz. — Se você vir ele...



E saiu, fungando o nariz.



— Não sei por que ele está tão chateado. Se eu tivesse trazido um sapo ia querer perder ele o mais depressa que pudesse. — Rony caçoou. Sapos eram meio fora de moda, e quem trazia um era considerado cafona. Entretanto, ao olhar para cima do banco, se arrependeu do que disse. — Mas, trouxe Perebas, por isso nem posso falar nada.



O rato continuava dormindo pesadamente. Não que ratos fossem ruins, mas esse em específico sim. Era velho, preguiçoso, e parecia não ter nenhum dote mágico.



— Ele podia estar morto e ninguém ia saber a diferença — completou, desgostoso. — Tentei mudar a cor dele para amarelo para deixar ele mais interessante, mas o feitiço não deu certo. Vou lhe mostrar. Olhe...



Remexeu na mala e tirou sua varinha. Harry se ajeitou na cadeira, ansioso para ver magia, mas viu que seu olhar se deteve no ponto brilhante saindo da ponta da varinha.



— O pelo do unicórnio está quase saindo. — explicou sem jeito —Em todo o caso...



A varinha funcionava, isso que importa. Tinha acabado de erguê-la quando a porta da cabine abriu outra vez, mas não houve batida dessa vez. Neville estava de volta, mas desta vez à sua frente tinha uma garota já vestida com o uniforme da escola em sua companhia. Ela tinha os cabelos castanhos muito cheios, os dentes da frente um pouco grandes e um olhar meio arrogante.



— Ninguém viu um sapo? Neville perdeu o dele. — Seu tom era de superioridade, e isso já colocou Rony na defensiva.



— Já dissemos a ele que não vimos o sapo — respondeu malcriado, na esperança que ela fosse embora. Mas a menina pareceu nem escutar o que falou, detendo o olhar na varinha em sua mão.



— Você está fazendo magia? Quero ver.



Ela entrou sem ser convidada, sentando-se ao lado de Harry, com o nariz empinado. Rony não gostou. Além de achar que foi intrometida, não ficava confortável quando o assistiam. Queria pedir que fosse embora, mas não seria educado.



— Hum... Está bem. — falou contrariado



Pigarreou.



— Sol margaridas, amarelo maduro, muda para amarelo esse rato velho e burro.



Ele agitou a varinha, mas como antes, nada aconteceu. Perebas continuou cinzento e completamente adormecido.



— Você tem certeza de que esse feitiço está certo? — perguntou a garota metida, assumindo um ar intelectual — Bem, não é muito bom, né? Experimentei uns feitiços simples só para praticar e deram certo. Ninguém na família é bruxo, foi uma surpresa enorme quando recebi a carta, mas fiquei contente, é claro, quero dizer, é a melhor escola de bruxaria que existe, me disseram. Já sei de cor todos os livros que nos mandaram comprar, é claro, só espero que seja suficiente, aliás, sou Hermione Granger, e vocês quem são?



Ela disse tudo isso muito depressa. Rony olhou para Harry o garoto estava tão confuso quanto ele. Ninguém tinha perguntado nada, por que estava falando tanto? Mal havia conhecido a menina e já tinha decidido que não gostava dela.



— Sou Rony Weasley. — falou, seco.



— Harry Potter.



Seus olhos arregalaram, assim como os de Neville na porta, como já esperava.



— Verdade? Já ouvi falar de você, é claro. Tenho outros livros recomendados, e você está na História da magia moderna e em Ascensão e queda das artes das trevas e em Grandes acontecimentos do século XX.



— Estou? — perguntou, assustado, olhando depressa para Rony.



— Nossa, você não sabia, eu teria procurado saber tudo que pudesse se fosse comigo — disse Hermione. — já sabem em que casa vão ficar? Andei perguntando e espero ficar na Grifinória, me parece a melhor, ouvi dizer que o próprio Dumbledore foi de lá, mas imagino que a Corvinal não seja muito ruim. Em todo o caso, acho melhor irmos procurar o sapo de Neville. E é melhor vocês se trocarem, sabe, vamos chegar daqui a pouco. — E saiu levando Neville a seus calcanhares.



Rony e Harry permaneceram uns segundos calados, tentando entender o que tinha acabado de acontecer.



— Seja qual for a minha casa, espero que ela não esteja lá — falou, sincero, jogando a varinha de volta na mala. — Feitiço besta. Foi o Jorge que me ensinou, aposto que sabia que não prestava.



— Em que casa estão os seus irmãos? — perguntou Harry.



— Grifinória. — Respondeu, sentindo a ansiedade aumentar ao lembrar-se da escolha da casa — Mamãe e papai estiveram lá também, não sei o que vão dizer se eu não estiver... Acho que a Corvinal não seria muito ruim, mas imagine se me puserem na Sonserina.



— É a casa em que Vol... Quero dizer Você-Sabe-Quem esteve? — Harry perguntou.



— É. — Rony respondeu afundando-se no acento, triste.



Não queria pensar na escolha das casas. Pertencer à Grifinória era motivo de orgulho para todos da sua família, e seria para ele também. Esperava sinceramente que conseguisse a aprovação para entrar lá, e esperava mais ainda que a tal Hermione fosse para qualquer outro lugar.



— Sabe, acho que as pontas dos bigodes de Perebas ficaram um pouquinho mais claras — disse Harry tentando mudar de assunto, tirando uma risada de Rony. — Então, o que é que os seus irmãos mais velhos fazem agora que já terminaram?



— Carlinhos está na Romênia estudando dragões e Gui está na África fazendo um serviço para o Gringotes. — e isso o fez lembrar-se do que seu pai falava mais cedo — Você soube o que aconteceu com o Gringotes? O Profeta Diário só fala nisso, mas acho que morando com os trouxas você não recebe o jornal. Uns caras tentaram roubar um cofre de segurança máxima.



Harry arregalou os olhos, assustado.



— Verdade? E o que aconteceu com eles?



— Nada, é por isso que é uma noticia tão importante. Não foram pegos. Papai disse que deve ter sido um bruxo das trevas poderoso para enganar Gringotes. O pior é que não notaram a falta de nada, e isso é que é esquisito. É claro que todo o mundo fica apavorado quando uma coisa dessas acontece porque Você-Sabe-Quem pode estar por trás da coisa...



Harry se remexeu no banco, desconfortável. Rony estranhou.



— Aconteceu alguma coisa?



— Nada! — falou assustado.



Mas o garoto ficou pensativo, Rony notou.



— Qual é o seu time de Quadribol — Perguntou mudando de assunto, seja lá o que fosse, Gringotes não era assunto deles.



— Hum... Não conheço nenhum — Harry confessou.



— O quê? — Rony bradou. É obvio, trouxas não jogavam quadribol! — Ah, espere aí, é o melhor jogo do mundo! — falou excitado — É composto por seis jogadores e um goleiro. O goleiro protege os três aros dos arremessos que os três artilheiros fazem com a goles, que é a bola feita para marcar os pontos. Cada vez que acerta o aro o time ganha dez pontos. Tem também os batedores, que servem para proteger o apanhador e os artilheiros dos balaços e tentar acertar os jogadores do outro time. Balaços são bolas menores e que tem vida própria. Também tem os apanhadores, que estão lá apenas para pegar o pomo de ouro, que é uma bola muito pequena e voadora... Está entendendo?



— Não... — Harry confessou, sem jeito.



— Tá, vou te explicar de novo. — E o ruivo desandou à falar, empolgado, mostrando a Harry as estratégias e qualidades do jogo. O garoto estava realmente interessado em saber mais, porém foram interrompidos quando a porta da cabine se abriu mais uma vez, mas agora não era Neville, nem Hermione Granger.



Três garotos entraram, entre eles Draco Malfoy, o garoto loiro que viu na plataforma, que olhou para Harry com um interesse anormal. Rony fechou a cara no automático. Por ser filho de quem é, era ainda pior que Hermione Granger.



— É verdade? — perguntou ele, com os olhos cinzentos cerrados, ainda fitando Harry, sem nem notar Rony no mesmo ambiente — Estão dizendo no trem que Harry Potter está nesta cabine. Então é você?



Harry tombou a cabeça, analisando o loiro em sua frente.



— Sou — respondeu.



— Ah, este é Crabbe e este outro, Goyle — apresentou os outros garotos. Draco era tão magricela quanto Harry e Rony, porém Crabbe e Goyle, por outro lado, eram enormes. — E meu nome é Draco Malfoy.



Rony tossiu de leve, escondendo uma risadinha. Que tipo de pai colocava um nome desses em seu filho? Na verdade se fosse outra pessoa não ligaria, mas sua família não tinha um bom histórico com a família Malfoy, então já era implicância.



O loiro finalmente virou-se para ele, um sorriso debochado.



— Acha o meu nome engraçado, é? Nem preciso perguntar quem você é. Meu pai me contou que na família Weasley todos têm cabelos ruivos e sardas e mais filhos do que podem sustentar. — Rony sentiu suas orelhas queimarem e seu coração acelerar, mas o garoto nem lhe deu chance de resposta e virou-se de volta para Harry — Você não vai demorar a descobrir que algumas famílias de bruxos são bem melhores do que outras, Harry. Você não vai querer fazer amizade com as ruins. E eu posso ajuda-lo nisso. — e estendeu a mão para apertar a de Harry.



Era o que temia. Rony era um garoto medíocre e de família simples. Draco tinha tudo: dinheiro, boa família, uma certa fama que seu nome já carregava... Suspirou, triste. Certamente Harry Potter ia preferir ser amigo de alguém assim.



Draco continuava com a mão esticada, esperando que Harry apertasse. Porém, para sua surpresa, o menino-que-sobreviveu afundou-se no banco em que estava sentado, afastando-se do garoto arrogante, com os olhos semicerrados.



— Acho que sei dizer qual é o tipo ruim sozinho, obrigado. — falou com frieza.



Definitivamente se antes tinha alguma dúvida, agora conseguiu sanar: Harry Potter era um garoto legal e queria ser seu amigo. E no que dependesse de Rony, seriam grandes amigos.



Draco abaixou o braço, claramente irritado, crispando os lábios, enquanto Harry o encarava, desafiador.



— Eu teria mais cuidado se fosse você, Harry. — disse lentamente. — A não ser que seja mais educado, vai acabar como os seus pais. Eles também não tinham juízo. Você se mistura com gentinha como os Weasley e aquele Rúbeo e vai acabar se contaminando.



Rony levantou-se, sentindo muita raiva, seu rosto queimando como brasa; não faltava muito para acertar um soco bem dado nos dentes certinhos do loiro. E não foi só ele, Harry também não gostou do que ouviu, e parecia até mais raivoso que ele próprio.



— Repete isso. — Harry ordenou com os olhos cerrados.



— Ah, você vai brigar com a gente, vai? — Draco caçoou.



— A não ser que você se retire agora — Harry falou entre os dentes. Rony não iria recuar, mas sabia que se realmente rolasse uma briga entre eles iriam levar a pior. Rony sozinho nocauteava Draco em questão de segundos. Sendo o irmão mais novo, teve que aprender a se defender muito cedo, e as trocas de socos que tinha com seus irmãos escondido de sua mãe serviram para algo. Mas levando em consideração a diferença de tamanho de Crabbe e Goyle para eles, estavam em uma séria desvantagem.



— Mas não estamos com vontade de nos retirar, estamos, garotos? — O loiro perguntou, irônico — Já comemos toda a nossa comida e parece que vocês ainda têm alguma coisa.



Goyle fez menção de apanhar os sapos de chocolate ao lado de Rony. No reflexo, deu um pulo para frente, já com o punho cerrado, mas antes que encostasse em Goyle, este soltou um berro terrível.



Perebas estava pendurado em seu dedo, os dentinhos afiados enterrados na junta do rapaz. Crabbe e Draco recuaram enquanto Goyle rodava e rodava o braço, urrando, e quando Perebas finalmente se soltou e bateu na janela, os três desapareceram na mesma hora. Talvez achassem que havia mais ratos escondidos nos doces, ou talvez tivessem ouvido passos, porque um segundo depois, como se não pudesse piorar, Hermione Granger entrou.



— Que foi que aconteceu? — perguntou, vendo os doces espalhados no chão e Rony apanhando Perebas pela cauda.



— Acho que apagaram ele — disse Rony a Harry. Ele viu Hermione chegar, mas preferiu ignorá-la na esperança que saísse. Examinou Perebas mais atentamente. — Não... Não acredito... Ele voltou a dormir! — reclamou. Era realmente um rato estranho, mas tinha que confessar que depois dessa gostava um pouquinho mais dele.



— Você já conhecia Draco Malfoy? — Perguntou à Harry.



— Sim. Conheci quando comprava minhas vestes de Hogwarts. Não imaginei que fosse assim, lá ele pareceu ser um cara normal.



— Conheço a família dele — Rony explicou. — Foram os primeiros a voltar para o nosso lado depois que Você-Sabe-Quem desapareceu. Disseram que tinham sido enfeitiçados, mas papai não acredita nisso. Diz que o pai de Draco não precisou de desculpa para se bandear para o lado das Trevas. — Não iria contar a parte que o pai dele zombava do seu no trabalho, já bastava o que ouviu quando o garoto apareceu. Então virou-se para Hermione, que ainda estava dentro da cabine prestando atenção na conversa dos meninos. — Podemos fazer alguma coisa por você.



— É melhor vocês se apressarem e trocarem de roupa. Acabei de ir lá na frente perguntar ao maquinista e ele me disse que estamos quase chegando. Vocês andaram brigando? Vão se meter em encrenca antes mesmo de chegarmos lá!



Rony suspirou, impaciente. Era difícil acreditar no quanto aquela garota era intrometida.



— Perebas andou brigando, nós não. — falou — E você se importa de sair para podermos nos trocar?



Ela levantou-se, finalmente.



— Está bem. Só vim para cá porque as pessoas nas outras cabines estão se comportando feito crianças, correndo pelos corredores — disse em tom choroso. — E você está com o nariz sujo, sabia?



Ela saiu, batendo a porta. Esperava sinceramente que ao chegar em Hogwarts essa garota chata esquecesse que eles existiam. Olhou para a janelinha de vidro na porta da cabine e viu seu reflexo, e a mancha realmente continuava lá, intacta. Rony amarrou a cara. Fred e Jorge pagariam por isso.



Colocaram suas vestes e poucos instantes depois ouviram uma voz alta ecoando no trem:



— Vamos chegar a Hogwarts dentro de cinco minutos. Por favor, deixem a bagagem no trem, ela será levada para a escola.



Rony novamente sentiu um solavanco no estomago, estava na hora.



Já devidamente vestidos e arrumados, os dois se prepararam para descer. O trem foi diminuindo a velocidade e finalmente parou. As pessoas se empurraram para chegar à porta e descer na pequena plataforma escura. Estava muito frio, e só então que Rony reparou se suas vestes estavam curtas.



— Alunos do primeiro ano! Primeiro ano aqui! Tudo bem Harry?



A voz de trovão de Rúbeo Hagrid ecoava pela plataforma. Rúbeo era um meio gigante que trabalhava como guarda-caça em Hogwarts. Seus irmãos falavam muito dele, principalmente Carlinhos, que quando estudava passava horas conversando no casebre do homem, já que dividiam a mesma paixão por animais fantásticos. Apesar de nunca tê-lo visto pessoalmente, era impossível não reconhece-lo. Tinha quase três metros de altura e uma aparência intimidadora, mas apesar disso, segundo seus irmãos, era o cara mais bondoso que havia em Hogwarts.



— Vamos, venham comigo. Mais alguém do primeiro ano?



Aos escorregões e tropeços, eles seguiram Hagrid. Rony tentava ver algo, mas estava tudo muito escuro. Ninguém falou muito. Neville fungou umas duas vezes atrás de si, pelo jeito não tinha encontrado o sapo. Para sua sorte, Hermione Granger havia desaparecido, e no fundo torceu para que ela tivesse voltado para casa.



— Vocês vão ter a primeira visão de Hogwarts em um segundo. — Hagrid gritou por cima do ombro —, logo depois dessa curva.



Ao virarem, todos os alunos soltaram exclamações ao mesmo tempo.



O caminho estreito levou-os a margem de um grande lago escuro. Encarrapitado no alto de um penhasco na margem oposta, as janelas cintilando no céu estrelado, havia um imenso castelo com muitas torres e torrinhas, milhares de janelas acesas e um ar de magia rodeava-o. Ter essa visão ao vivo era infinitamente melhor do que pelas fotos. Era ali que moraria pelos próximos meses, era ali que estaria pelos próximos anos. Não sabia ainda o que lhe aguardava, mas sabia que esses seriam os melhores anos de sua vida.



— Só quatro em cada barco! — gritou Hagrid, apontando para uma flotilha de barquinhos parados na água junto à margem. Rony e Harry subiram no barco que estava logo à sua frente, seguidos por Neville. Rony ainda sorria com a perspectiva de seu futuro em Hogwarts, sorriso esse que murchou ao ver que a quarta vaga no barco foi ocupada pela chata da Hermione.



— Todos acomodados? — gritou Hagrid, que tinha um barco só para si. — Então... VAMOS!



A travessia durou poucos minutos, e logo os novos alunos estavam desembarcando num cais improvisado que ficava numa parte subterrânea do castelo. Rúbeo checou os barquinhos para garantir que não havia alunos faltando, e quando verificava, ainda encontrou o sapo de Neville. Todos subiram por uma escada de pedra apertada e escorregadia, apertando-se uns contra os outros, até que finalmente pararam em frente a uma enorme porta de carvalho, onde Hagrid ergueu um punho gigantesco e bateu três vezes.



A sua aventura estava prestes a começar.



 


Compartilhe!

anúncio

Comentários (0)

Não há comentários. Seja o primeiro!
Você precisa estar logado para comentar. Faça Login.