OS PREDADORES ADORMECIDOS



CAPÍTULO 13 – OS PREDADORES ADORMECIDOS


―O que está acontecendo aqui?


A voz retumbou por todo o salão. Era de um homem alto e de pele morena suavemente dourada, que saiu da escuridão da passagem secreta para a luz, com uma Hermione desacordada nos braços.


O homem era incrivelmente belo, de longe o mais belo de todos ali apresentes. De ares egípcios, tinha a cabeça raspada, nariz fino e os olhos delineados de cajal preto, da mesma maneira que os faraós usavam em sua época de ouro. Vestia-se com uma manta bege de algodão cru, e um colar de ouro egípcio lhe enfeitava o peito. Outros ornamentos de ouro estavam dispostos em seus punhos e nos tornozelos. Em alguma época, ele fora rei. De alguma forma, ainda parecia ser.


Os tronos de mármore antes ocupados, agora estavam vazios. Homens e mulheres se levantavam, uns parecendo muito fracos, outros, bastante fortes. A maioria deles ainda mantinha a pele no mesmo aspecto de mármore, contudo as roupas haviam magicamente ganhado as cores originais. Apenas dois pareciam seres humanos saudáveis: os que carregavam Lia e Tina nos braços.


O que segurava Cecília tinha a pele muito branca e cabelos loiros muito lisos, que escorriam como um véu dourado até metade de suas costas. Os olhos eram muito verdes e tinham um brilho igual ao de olhos de gato. Suas roupas, apesar de antigas, pareciam novas, e a capa de veludo vermelho que lhe caía sobre os ombros completava o ar senhorial daquele jovem nobre.


O homem que segurava Valentina era igualmente pálido. Tinha as feições mais suaves e cabelos ruivos muito cacheados e assanhados. Os olhos eram cor de mel, com o mesmo brilho semelhante ao de olhos de felinos. A boca carnuda se alargava num farto sorriso de dentes muito brancos e alinhados. Vestia-se com um pouco mais de displicência, como se roupas pomposas não lhe fossem importantes diante de toda a sua beleza.


Eles se entreolharam com um sorriso em suas faces perfeitas. Em seguida, a voz retumbante e séria do egípcio se aproximou mais.


―Quem as atraiu até o nosso refúgio? Foram vocês?


―Quem mais poderia ter sido? – o homem que carregava Tina falou, sorrindo. ―Agora elas são nossas... Nossas crias... – disse, admirando apaixonadamente Tina em seus braços.


―Mal posso esperar para iniciar o ritual. – o que carregava Lia falou. Tinha a voz suave de um gentleman e uma arrogância desmedida no olhar.


Ele tirou do bolso duas moedas de ouro e as ergueu à altura dos olhos: O galeão falso que Neville perdera no banheiro e o galeão de Harry.


O homem egípcio os olhou com ar extremamente grave.


―Vocês são loucos? Há séculos que nos mantemos seguros e distantes das perturbações dos bruxos, apenas cumprindo com a nossa palavra de não atacar os estudantes desta miserável escola!


Os outros homens e mulheres que haviam deixado seus tronos olhavam de uns para os outros. Uma mulher se aproximou de Cecília com fome no olhar.


―Para trás, Giovana! – o egípcio ordenou, e como se uma mão invisível tivesse puxando a mulher pelo pescoço, ela voltou guinchando ao seu trono e retomou à forma de estátua pedra.


O homem voltou-se novamente para os dois.


―Nós não vamos transformá-las. Não nos tempos atuais. Seria o fim da paz que conquistamos.


―Também não vamos deixá-las morrer, Ramsés! – o homem que segurava Valentina exclamou.


―Andrea está certo. Desde que elas chegaram ao castelo que a temos observado. Nós as escolhemos! Podemos não transformá-las agora, mas certamente não iremos desfazer o laço! – o outro protestou.


Ramsés olhou de um para o outro, inflamado.


―Que diabos aconteceu com vocês em todos esses anos de hibernação? Ficaram rebeldes? Contestam agora a ordem de seu Rei?


Eles olharam Ramsés alarmados, e o que carregava Valentina falou, cauteloso:


―Perdão, majestade. – disse, abaixando a cabeça. ―Mas, por favor, tente compreender que a atração que um vampiro sente por sua escolhida... O senhor deve se lembrar de como é...


Ele não continuou e Ramsés suspirou.


―Eu também não posso negar que esta aqui me chamou atenção. – sussurrou, com certo carinho no olhar ao mirar Hermione. ―Mas não podemos ceder aos nossos instintos e trazê-las para o nosso mundo desta maneira, sabendo que aquele maldito bruxo das trevas está de volta.


Ele voltou a mirar os dois à sua frente.


―Andrea, – ele se dirigiu ao que carregava Valentina. ―Pierre, – falou ao que carregava Cecília. ―Vamos levá-las agora até o soberano desta escola.


Eles concordaram em silêncio com um aceno da cabeça para Ramsés. Ele era seu Rei, portanto lhe deviam obediência.


―Majestade. – Pierre começou ―Elas não são as únicas que estão aqui. Tivemos que atrair outros dois. – confessou.


Ramsés pareceu furioso a ponto de explodir.


―Não posso acreditar em tamanho absurdo! Vocês serão punidos, devidamente punidos!


―Não, majestade! Por favor... – Pierre gaguejou. ―Nós não os mordemos. Só nossas escolhidas nos interessam. Eles foram apenas iscas. – ele tentou explicar rápido.


Ramsés respirava pesado, as narinas dilatadas como as de um dragão. Sem dizer uma só palavra, ele girou nos calcanhares e sumiu no breu de onde havia saído, entrando pela passagem que Hermione descobrira minutos atrás.


―Roxana! Latifa!


A voz de Ramsés ecoou preenchendo todo o salão como se viesse de um alto falante. Andrea e Pierre se entreolharam, tensos – Ramsés havia acabado de convocar as suas duas crias mais antigas, e portanto, tão poderosas quanto ele.


Duas mulheres se ergueram de seus tronos: Roxana, uma grega de cabelos castanhos e rebeldes, que vestia um vestido branco e uma toga vermelha; e Latifa, uma árabe morena, de nariz côncavo e cabelos negros e longos. As duas atenderam ao chamado de Ramsés como se já o esperassem, e desapareceram no breu. Quando retornaram, Roxana trazia Harry desacordado em seus braços, e Latifa trazia Rony, também desacordado.


Ramsés se colocou a frente do grupo e olhou gélido para Andrea e Pierre.


―Mais algum humano que os dois apaixonados resolveram trazer de isca?


Eles negaram com um aceno da cabeça, em silêncio. Dando-se por satisfeito, Ramsés ordenou que os quatro vampiros os seguissem.


Eles se encaminharam para a saída da câmara. Ramsés parou à porta e olhou para cada um dos outros que cambaleavam sem forças e sem cor, parecendo zumbis perdidos e famintos.


―Vocês todos, voltem à hibernação. – ordenou.


E como se as palavras do homem tivessem poderes invisíveis perante seus súditos, eles imediatamente voltaram aos seus tronos e retomaram a aparência inanimada de estátuas de mármore. A porta de pedra se fechou assim que o rei passou por ela, e os cinco predadores começaram a refazer o caminho que subia até os níveis do castelo.


Após alguns minutos de silenciosa caminhada, a voz de Andrea cortou o silêncio:


―Majestade, me permite lhe fazer uma pergunta?


―Sim, Andrea. Prossiga.


―Se Vossa Alteza não tem a intenção de criar nenhum outro vampiro, principalmente dentre os alunos desta escola, porque então mordeu a menina em seus braços?


Ramsés suspirou antes de responder. O luar tocou suavemente seu rosto moreno.


―Instinto. – respondeu, simplesmente. ―São mais de quinze anos sem sentir o cheiro de carne humana e o gosto do sangue deles. Não pude resistir quando esta menina invadiu meus aposentos. – ele fez uma pausa. ―Não me orgulho disso.


Já era noite quando os cinco alcançaram o salão principal da escola. Estava tudo silencioso, o que indicava que os alunos já haviam se recolhido aos seus devidos salões comunais. Ramsés seguida liderando o grupo, parecendo saber exatamente aonde ir.


Passaram por corredores escuros, que estariam completamente silenciosos se não fossem os quadros que roncavam e ressonavam tranqüilos e alheios à presença ancestral de cinco vampiros. De repente Ramsés parou e os outros pararam atrás dele. Estavam frente a frente com a gárgula que guardava a entrada para o escritório de Dumbledore.


Latifa, a árabe que carregava Rony, se colocou ao lado de seu criador.


―Como faremos para entrar? – perguntou, sem tirar os olhos da gárgula que se mantinha imponente e imóvel.


Ramsés não respondeu. Limitou-se a falar com a gárgula, como se falasse a alguém vivo:


―Quem lhe fala é Ramsés III. Preciso falar com Alvo Percival Wulfric BrianDumbledore com urgência.


Como se tivesse compreendido aquelas palavras, a gárgula se moveu e liberou a passagem. O grupo seguiu o Rei, em silêncio.


Para surpresa dos quatro, mas não de Ramsés, a porta do escritório se escancarou, e Alvo Dumbledore foi ao encontro deles. Sua expressão não era bondosa ou compreensiva, mas sim severa, como aluno ou professor nenhum jamais havia visto. Ele parou frente a frente com Ramsés. Seus olhos correram dele para os outros vampiros e então para os alunos desacordados.


―Ramsés, o que significa isso? – ele perguntou, grave. Parecia furioso.


―Dumbledore, houve um acidente. Precisamos ter uma conversa séria.


―Certamente precisamos.


Dumbledore fez com que entrassem. Ele se colocou de pé atrás de sua mesa, e encarou todos os vampiros, um por um, de uma maneira tão grave que eles desviaram o olhar, incomodados.


―O que aconteceu com eles? – Dumbledore exigiu saber.


―Uma fatalidade, pela qual desde já rogo desculpas. – Ramsés começou a se explicar. ―Duas de suas alunas foram escolhidas por dois de minha linhagem e o primeiro laço foi concretizado.


―O que significa que elas foram mordidas. – Dumbledore concluiu.


―Exatamente.


Dumbledore circulou sua mesa e examinou Hermione, Valentina e Cecília de perto. Todas exibiam as marcas dos caninos de Ramsés, Pierre e Andrea no pescoço.


―Eu me lembro, Ramsés, – Dumbledore começou a falar, encarando o vampiro de igual para igual ―Que quando permiti que você e sua linhagem escolhessem Hogwarts para hibernarem na época em que Voldemort galgava cada vez mais alto os patamares do poder, você havia me prometido que jamais nenhum de seus vampiros atacaria nenhum aluno.


―Um pacto que se manteve por vinte anos.


―Sim, sim, e eu admiro muito seu talento em manter o seu bando afastado dos humanos. Mas isto que vejo agora, Ramsés, isto não é admissível. O laço tem que desfeito o mais rápido possível.


Pela primeira vez Andrea se manifestou.


―Nós as escolhemos. Não iremos desfazer o laço.


Dumbledore olhou-os, e em seus olhos azuis não havia indícios de complacência. Em seguida, suspirou, pegou sua varinha e conjurou um patrono que iluminou a sala inteira com uma claridade prateada.


―Vá buscar Prof. McGonagall e Prof. Snape.


O patrono voou pela janela aberta e desapareceu na noite. Dumbledore se voltou novamente para os vampiros.


―O que aconteceu com Potter e Weasley?


―Estão apenas desacordados. – Pierre se apressou em explicar. ―Nós os atraímos para a câmara como iscas. – ele confessou aquilo sem o menor vestígio de culpa na voz.


―Esta senhorita aqui – Ramsés referiu-se a Hermione. ―terá o laço desfeito. Foi mordida por mim, num ato de instinto. Ela invadiu meus aposentos enquanto eu dormia. Nunca tive e não tenho intenção de transformá-la. – declarou, solene.


―Fico um pouco tranquilizado em escutar isso. – Dumbledore suspirou.


Minutos depois, a porta do escritório de Dumbledore se abriu, e por ela entraram McGonagall e Snape. A professora levou a mão ao peito e soltou um gritinho ao vislumbrar os presentes e compreender a situação. Snape precisou ampará-la para que ela não desabasse.


―Alvo! Alvo, pelo amor de Deus! O que significa isso?


―Minerva, tente se acalmar. Preciso que você e Severo levem as senhoritas Granger, Monfort e Alves e os senhores Potter e Weasley para a enfermaria. Severo, acredito que precisaremos que você prepare a Poção da Sobrevivência Sobrenatural . As senhoritas Alves e Monfort precisarão toma-la até que se chegue a um consenso sobre o que acontecerá em seguida.


Sem contestar as palavras de Dumbledore, Snape conjurou cinco macas. Sua expressão era tensa e compenetrada, e seus olhos negros correram por todos os vampiros com uma severidade excessiva.


Harry, Rony, Hermione, Valentina e Cecília foram acomodados com cuidado nas macas. Snape e McGonagall as fizeram levitar e saíram em direção à enfermaria sem dizer nenhuma outra palavra sequer.


A professora McGonagall parecia estupefata demais para emitir qualquer som que fosse. Snape seguia ao lado dela, pensativo, a varinha em punho fazendo as macas levitarem. Somente quando estavam chegando à ala hospitalar que a professora teve coragem de falar alguma coisa.


―Mal posso acreditar numa coisa dessas! Vampiros em Hogwarts! Severo, você sabia disso?


―Não, Minerva. – respondeu, sinceramente.


―Como Dumbledore pôde permitir...? E essas meninas? O que vai ser delas? O que vamos dizer aos pais? Mal foram transferidas e são atacadas por vampiros bem debaixo do nariz de Dumbledore!


―O Diretor deve ter uma razão forte para permitir que vampiros se alojem nos subterrâneos do castelo. – Snape falou, enquanto entravam na enfermaria. ―Por hora, a primeira medida que devemos tomar é garantir que Alves e Monfort tomem a Poção da Sobrevivência Sobrenatural .


―E em quanto tempo a poção ficará pronta, Severo?


―Duas semanas. Até lá...


―Até lá elas já terão tentado atacar metade da escola! – McGonagall protestou com a voz aguda.


Snape concordou com um aceno da cabeça.


―Até lá, elas terão de trocar a água e o suco de abóbora por sangue fresco.

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