TARANTALLEGRA!



A notícia de que Hogwarts tinha agora duas alunas meio vampiras correu por toda a escola com a mesma rapidez de um rastilho de pólvora. Não se falava de outra coisa. Alguns alunos comentavam o assunto com empolgação e até um pouco de inveja, já outros pareciam ter tanto medo de se aproximarem de Tina e Lia que faziam questão de manter uma distância mínima de dois metros das garotas toda vez que passavam por elas.


—Até parece que somos cachorros de três cabeças! – Cecília chiou, irritada, quando um dia uma garota de Corvinal fez um arco largo ao se afastar repentinamente dela e de Tina, quando se cruzaram no corredor.


—Fica fria. A propósito, tomou sua poção ontem?


—Claro que sim. – Lia bufou, mal humorada. —Se bem que um dia desses, eu bem que poderia esquecer de tomá-la antes de dormir, e no dia seguinte descer para o salão para tomar um café da manhã mais exótico...


Tina deu uma risadinha contida.


—Me avise quando você pretender fazer isso. Temos que combinar, sabe.


E às gargalhadas, as duas seguiram lado a lado; os cabelos lustrosos balançando, os olhos místicos faiscando, os caninos brilhando perigosamente, e a pele lisa e sedosa como pêssego atraindo olhares abobados dos rapazes mais velhos.


Quem não havia gostado nada da notícia das meio vampiras fora, obviamente, Dolores Umbridge. A mulher, preconceituosa e intolerante, não suportava mestiços, e ter de dar aula a duas meio vampiras parecia agora uma grande ironia. Toda vez que Umbridge via as duas, sua boca de sapo se crispava, e ela não se arriscava mais em fazer comentários ofensivos em relação à nacionalidade das meninas, com medo de que elas pudessem voar diretamente em seu pescoço gordo. Sua atitude para com Tina e Lia tinha então mudado para o total desprezo. Era como se, durante as aulas, elas não estivessem ali. É claro que elas não reclamaram.


Jorge pareceu adorar o novo visual de Cecília, que fazia questão de chamar de "melhoramento selvagem". Draco, por sua vez, parecia ter a mesma opinião em relação à Valentina.


—Aposto como agora você tentaria me morder se eu te deixasse com raiva, Alves. – ele sussurrou jocoso, quando voltavam do jantar, de mãos dadas, para as masmorras da Sonserina.


—Talvez em outra época. – Tina disse sorrindo, e seu canino brilhou por um segundo e Draco quase se derreteu com a visão. —Você não tem me deixado com raiva ultimamente.


—Seria divertido tentar, sabia? – riu.


Ele empurrou Valentina para um canto deserto e mal iluminado e a abraçou pela cintura. Tina encostou sua testa na dele e por um momento os dois olharam dentro dos olhos um do outro.


—Você me escolheria? Se você tivesse se transformado totalmente, você me escolheria para transformar? – perguntou em voz baixa, apaixonado.


Tina sorriu e mordeu o lábio inferior.


—Escolheria. – sussurrou.


Draco lhe beijou os lábios, feliz em escutar a resposta. Ele então escorregou a boca até o ouvido da garota e sussurrou:


—Vou arranjar um jeito de te provocar, só para ver se você vai me morder.


—Posso te morder agora se você quiser.


Tina roçou os dentes no pescoço de Draco, fazendo a pele do garoto se arrepiar.


—Os dois pombinhos já não deveriam ter voltado para o salão comunal?


Tina e Draco olharam para o lado e se depararam com Snape, há uns dois metros de distância deles.


Merda! De novo. – Tina murmurou em português.


—Eu entendi isso, Alves.


Snape deu três passos em direção a eles e os estudou com os olhos apertados.


—Mas vou me fazer de surdo desta vez... – ele fez uma pausa, deixando o ar ainda mais tenso. —A Srta. Alves já deveria estar no salão comunal, já que não é monitora para estar nos corredores a esta hora; e você, Draco, deveria estar fazendo a ronda junto da Srta. Parkinson, já que eu concedi a ambos o cargo de monitores.


Um pouco desconcertado e muito mal humorado, Draco acenou com a cabeça e acompanhou Valentina até a entrada do salão. Ele beijou suas duas mãos antes que ela entrasse e falou:


—Depois vou querer continuar nossa conversa.


Ela riu, corando um pouco.


—Em um lugar um pouco mais reservado, ou seremos surpreendidos pelo Prof. Snape de novo.


Tina puxou Draco pelas mãos e lhe beijou os lábios, desejando boa noite. Quando Valentina deu as costas, deparou-se com Pansy, que cruzou com ela lançando-lhe um olhar de profundo desprezo, para então encontrar Draco.


—Temos que fazer a ronda, Draco.


—Eu sei. Prof. Snape acabou de me lembrar disso.


Draco deu meia-volta, acompanhado de Pansy, e Valentina acompanhou-os com o olhar. Sabia que Pansy tinha um xodó por ele e que ainda poderia vir a aprontar alguma. Decidida a não deixar passar em branco nada que a colega tentasse fazer, Tina sumiu pela escadaria do dormitório feminino, fechou as cortinas ao redor de sua cama de dossel e se pôs a ler um livro de azarações que ela mantinha muito bem guardado no fundo do seu malão.


Os dias se passaram e todos os acontecimentos que Harry tivera estranhado não terem ocorrido durante o ano, se resumiram naqueles poucos dias. A AD fora denunciada por Marieta, uma amiga de Cho Chang, porém maliciosamente encoberta por Dumbledore, que assumiu para si mesmo a responsabilidade de ter criado a organização. Tendo ele conseguido escapulir das mãos de dois aurores, Dolores Umbridge se viu na posse de um maravilhoso prêmio de consolação: não prendera Dumbledore, mas se tornara diretora de Hogwarts.


Com sua nova autoridade, ela se esbanjou em distribuir detenções para qualquer aluno que a contestasse ou não seguisse à risca os seus novos decretos. Como conseqüência, não suportando mais os novos tempos de Hogwarts, os gêmeos Weasley deram asas ao seu sensacional plano de fuga, com direito a show pirotécnico de fogos e um pântano encantado bem no meio de um dos corredores, o que deixou Umbridge visivelmente enlouquecida de fúria por semanas.


Entrementes, Harry ia de mal a pior com os treinos de Oclumência, já que Snape se negara a continuar lhe dando aulas. Contudo, Os sonhos eram os mesmos toda noite, e os acessos de fúria e felicidade também.


Já Valentina e Cecília se sentiam melhores do que nunca agora que tomavam a Poção da Sobrevivência Sobrenatural todos os dias antes do café da manhã e não tinham mais que beber sangue de dragão para evitarem atacar algum aluno. Seus mentores, como eram chamados os vampiros que as morderam, foram proibidos por Ramsés de se aproximarem das meninas por qualquer motivo que não fosse desfazer o laço de sangue. Como era impossível para eles desobedecerem às ordens do seu líder, eles se viram obrigados a permanecer presos dentro da câmara, até que o real desejo dos seus corações fosse devolver a humanidade das moças.


Contudo, estar na condição de meio vampira e ter dois vampiros antigos e poderosos sempre atentos aos seus passos, era algo que se mostraria, em breve, muito útil não apenas para Valentina e Cecília, mas para todos.


Era uma tarde morna de verão. O salão principal estava mergulhado no que seria um completo silêncio se não fosse o arranhar de penas no pergaminho dos alunos que faziam seus NOMs de História da Magia, observados atentamente por um professor velhinho e de ares simpáticos.


Cecília foi uma das primeiras a se levantar para entregar suas respostas, seguida por Hermione e Lilá Brown. Valentina se levantou cinco minutos depois, entregou suas respostas e saiu sozinha pela lateral do salão em direção aos jardins, deixando para trás os colegas que ainda respondiam as questões da prova.


O som dos passos da garota se distanciaram gradualmente. Harry tentou se concentrar na oitava pergunta, mas o toc-toc dos sapatos de Valentina o distraiu. Ele fechou os olhos e tentou lembrar da resposta, mas seu cérebro parecia estar fazendo de propósito em não lhe ajudar.


A concentração de todos de repente foi quebrada pelo som de um baque surdo no chão, seguido pelos gritos de Harry, que apertava a testa como se dela estivesse prestes a sair uma língua de fogo. O professor foi ao seu encontro e tentou ajuda-lo a se sentar, ofereceu-lhe uma taça de suco de abóbora, mas ele recusou. Olhou significativamente para Rony, que rabiscou rápido a sua última resposta e colocou o pergaminho em cima da mesa do professor.


—Tem certeza de que não quer ir até a Ala Hospitalar, Harry? Talvez um tônico lhe fizesse bem.


—Não, professor, muito obrigado. Aqui – Harry lhe entregou o pergaminho de qualquer jeito. —Já terminei. Não consigo fazer mais nada.


Harry se levantou cambaleando e correu para se juntar a Rony que já se adiantara e o esperava na porta.


—Preciso falar com você e com Hermione. – Harry falou, puxando Rony pelo braço. —Onde está ela?


—Lá fora. – o amigo apontou para um dos pontos ensolarados do gramado, onde Hermione estava sentada no chão junto de Tina e Lia. —O que foi que você viu dessa vez?


Mas Harry não respondeu. Fez sinal para Rony segui-lo e foi até onde as amigas tomavam um merecido banho de sol. Chegando lá, ele explicou a visão que teve de Sirius sendo torturado por Voldemort no Departamento dos Mistérios. Contou do diálogo que ouvira. Sirius estava guardando a arma que Voldemort queria, mas se recusava a entregá-la, mesmo sob tortura. Harry sabia que o padrinho seria assassinado dentro de pouco tempo. Teria então que ir para Londres naquele mesmo instante para salvar o padrinho, teria que fazer alguma coisa pela única família que ele tinha.


Hermione conseguiu persuadir o amigo a antes verificar se aquela visão era verdade ou se era apenas uma armadilha de Voldemort para fisgá-lo. Para tanto, teriam de usar a lareira da sala de Umbridge e entrar em contato com Sirius através da Rede Flu. Gina, Neville e Luna, que se juntaram a eles e concordaram em ajudar Rony, Lia e Tina a dispersar os alunos do corredor da sala de Umbridge, enquanto Harry ia junto com Hermione arrombar a porta da sala e usar a lareira.


Tina guardava um dos acessos ao corredor quando escutou passou, virou e deu-se com Draco andando decidido até ela.


—O que está acontecendo aqui? – ele perguntou autoritário. —Que história é essa de que o corredor está infestado de Gás Fedorento?


Valentina cruzou os braços e fez cara de sonsa.


—Não fale comigo como se eu fosse uma aluna do primeiro ano. Você já perdeu esse direito faz tempo.


Mas Draco desta vez não se deixou abalar. Mais do que nunca sustentava aquele ar insuportável de monitor e membro da ridícula Brigada Inquisitorial. Ele passou pela namorada e olhou para o corredor vazio, e viu Crabbe dar uma chave de pescoço em Rony e arrasta-lo para fora dali.


—Eu sabia! Vocês estão de armação junto com o Potter!


—Não seja idiota! Nós só estamos precavendo os outros de...


Mas Valentina não terminou a frase. Emília Bulstrode vinha ao longe, dando uma forte chave de pescoço em Lia com aquele braço maciço, e rindo abertamente com um ar lunático de vingança.


—Veja aqui, Malfoy. Mais uma! – guinchou.


Draco encarou Tina e a garota mandou o fingimento às favas. Ela segurou os dois braços dele e encostou-o na parede oposta, longe dos olhos dos outros.


—Escute aqui! Nós estamos sim ajudando Harry a falar com o padrinho. – sussurrou urgente.


Draco fez uma expressão raivosa e ao mesmo tempo incrédula. Ele levou uma das mãos à boca, fechando os olhos respirando fundo. Na falta de resposta dele, Valentina apertou ainda mais seus braços (suas unhas afiadas fizeram um rasgo na manga da blusa de Draco) e implorou:


—Por favor, não nos entregue para a Umbridge! Você estará colaborando para uma tragédia! Aquela mulher é louca, não se sabe o que ela poderia fazer com a gente! Nos torturar, ela seria bem capaz...


Draco abriu os olhos e fez um sinal para Valentina se calar.


—Eu vou fingir que nunca te encontrei aqui, mancomunada com eles. Volte agora para o salão comunal, ou se esconda onde achar melhor, mas suma daqui!


— E o que é que você vai fazer? – ela exigiu saber.


Eles escutaram os passos de Bulstrode, Parkinson, Crabbe e Goyle se aproximando. Draco encarou Valentina urgente.


—Anda logo!


Valentina não respondeu. Ela deu as costas e rapidamente sumiu dentro de um banheiro feminino ali perto, bem a tempo se não ser vista pelos outros membros da Brigada Inquisitorial.


—Estava falando com alguém, Draco? – Pansy perguntou, desconfiada. Ela carregava uma Luna tranqüila e sonhadora.


—Estava, mas era só uma aluna do primeiro ano, assustada com toda essa palhaçada que esses aí inventaram.


Malfoy olhou bem para cada um dos garotos pegos em flagrante e deu um meio sorriso. Rony, Neville, Gina, Luna e Lia devolveram o olhar sem sorrir.


—Muito bem, vamos levá-los até a Diretora. Aposto como ela ficará feliz em recebê-los.


Valentina, escondida no banheiro, escutou quando o grupo se afastou. Passados alguns minutos, ela arriscou abrir a porta e espiar o corredor e, certificando-se de que ninguém a veria, ela se esgueirou até a sala de Umbridge, decidida em não abandonar o combate agora que havia entrado nele.


Levou algum tempo até que ela conseguisse chegar, sem ser vista por ninguém, ao pé da escada que levava a sala da professora. Escondida atrás de uma gárgula de pedra, Valentina apurou os ouvidos para escutar a conversa a poucos metros acima dela. Por sorte, Umbridge havia deixado a porta entreaberta, e Tina podia ter um pequeno vislumbre dos amigos ainda fortemente imobilizados pelos membros da Brigada Inquisitorial. Ela via os cabelos vermelhos de Gina e parte do corpo de Hermione. Nenhuma delas lutava para se soltar, mas escutavam com atenção o falatório de Umbridge.


Quando a mulher decidiu usar a maldição Cruciatus em Harry para forçá-lo a confessar com quem estivera tentando se comunicar, Hermione guinchou e começou a improvisar uma história que Tina se empenhou em ouvir e tentar entender. Para seu espanto, Umbridge pareceu acreditar e, no auge de sua vontade ensandecia do ter tudo sob o seu controle, fez com que Harry e Hermione a levassem até onde uma suposta arma de Dumbledore estava escondida. Valentina viu quando os amigos passaram por ela – ela se apertou mais atrás da gárgula – e, quando a barra estava limpa, espirou mais uma vez para dentro da sala.


A brigada ficara lá dentro, mantendo os outros prisioneiros. Valentina se esgueirou para fora do seu esconderijo e analisou a situação. Ali de onde estava, ela conseguia ter uma boa visão das pernas de Pansy Parkinson. A garota estava ao lado de Draco Malfoy, e não perdeu a chance de se aproximar dele e começar a contar vantagem sobre como havia sido fácil capturar Luna.


—Você não desiste nunca, não é mesmo? – Tina murmurou consigo mesma.


Ela então sorriu, já imaginando o efeito que teria a sua idéia. Mirou a varinha nas pernas de Pansy e murmurou:


Tarantallegra!


As pernas de Pansy começaram a dançar, por conta própria, um ritmo alucinado de tarantela. Pega desprevenida, ela soltou Luna, que cambaleou e quase caiu. Ela começou a dançar sem parar ao redor da sala, girando e gritando, pedindo que alguém fizesse aquilo parar. Valentina riu com gosto.


—Se exibe pra ele agora, vai. Quero ver, garota idiota. – ela murmurou consigo mesma, rindo.


Os outros, um pouco surpresos, demoraram a perceber a chance de saírem dali. Gina foi quem agiu mais rápido e estuporou seu capturador. Não demorou muito e todos desciam as escadas, deixando para trás uma Emilia Bulstrode e um Draco Malfoy petrificados e o resto da Brigada azarada e sem conseguir sair do lugar.

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