DIA DOS NAMORADOS EM HOGSMEAD



As aulas recomeçaram com ares de novidade. Não porque houvesse algo verdadeiramente novo acontecendo, mas pelo fato de todos terem andado tão distraídos com o assunto do baile e do manifesto. Era como voltar de férias, ao ritmo normal, que em todo caso já era naturalmente acelerado.


Os professores, sentindo a aproximação do feriado relativo às festas de fim de ano, tomaram a resolução de recuperar o tempo perdido com todos os acontecimentos excepcionais aumentando o ritmo do trabalho naquela última semana antes do recesso escolar. Esta resolução se fez sentir no volume de trabalho durante e após as aulas, com tarefas extraclasse intermináveis.


—McGonagall perdeu completamente a juízo desta vez… Impossível terminar todos estes questionários até sexta-feira!


—Rony, ela já tinha passado dois questionários antes! Ela só acrescentou mais um à lista!


—Mas eu esperava ter tempo pra terminar os dois, Hermione. E agora eu tenho três gigantescos para terminar. Sem contar que agora começam os treinos do… quadribol… – ele disse, diminuindo o tom de voz e olhando para os lados, como se não quisesse ser escutado por ninguém.


A garota franziu o rosto numa expressão séria.


—Bem, você precisa estipular as suas prioridades, não concorda?


—Tá dizendo que quadribol não é importante? – perguntou Harry, se intrometendo na conversa, com cara de poucos amigos.


—Não, não foi isso que eu quis dizer, mas… se você for pensar bem… a não ser que ele queira ser jogador profissional de quadribol…


—Já entendi, Hermione. Já entendi. Vamos estabelecer nossas prioridades e deixar a Sonserina levar a taça de quadribol este ano em sua homenagem, que tal? – cortou Rony, cáustico.


—Em minha homenagem, não! As minhas lições estão quase todas encaminhadas! E se vocês querem saber – ela continuou, virando-se de costas para onde estava caminhando para encarar os dois frente a frente. – A Lia e a Tina também estão em dia com os trabalhos delas! Então vocês façam como achar melhor! Ah, olha quem vem vindo, a Gina! Então eu vou deixar vocês a três pra discutirem mais sobre quadribol! Passar bem!


E de forma teatral ela bateu uma continência debochada e correu na frente, desaparecendo no meio da massa de alunos que saiam das salas para seus quinze minutos de intervalo.


Harry e Rony se olharam, pasmos.


A Lia e a Tina também estão em dia com os trabalhos delas… – Rony imitou, com uma voz aguda. – Eu só reclamei do volume de trabalho! Você discorda? Acha que estou delirando quando digo que é muito?


A indignação de Rony com a reação de Hermione parecia um tanto quanto exagerada e sôfrega demais. Harry se sentiu consolando um amigo em plena crise de casamento e se sentindo estranho demais com a situação, preferiu se abster de ir mais fundo na discussão.


—É… ela pira completamente quando o assunto se volta pra quadribol, cara… Mas depois fica tudo bem…


—Eu sei que sim. Não tô preocupado, não. Só que ela é surtada, maluca… – ele continuou, passando a resmungar em uma voz quase inaudível até Gina se juntar aos dois.


—Que houve? – perguntou ela, apontando o dedão para a direção na qual Hermione tinha ido.


—Ah, nada não… – antecipou-se Harry, sentindo que Rony ia começar a reclamar novamente. – Mas e então, e as aulas? Ritmo louco, né?


—Flitwick nunca foi tão cruel nas lições de casa! – Gina confirmou, com uma expressão de desgosto. – Mal vai dar pra respirar…


Rony fez uma expressão como quem diz “Exatamente”.


—Mas… – Harry recomeçou, de forma rápida, para não lhe dar o ensejo que precisava para começar a falar de Hermione de novo. – Mas… você sabe como está a Katie?


—Não melhorou ainda… Madame Pomfrey aconselhou que ela não pegue vento, ou a garganta pode piorar e ela vai precisar ficar na Ala Hospitalar.


—Então temos mais uma vaga pendente no time, é isso? – perguntou Rony, com uma expressão preocupada. – Era o que faltava, defesa e ataque desfalcados…


Harry olhou condescendente para o amigo. Desde quando o anúncio de seleção para um novo goleiro havia sido feito, Rony andava treinando severamente pela vaga, em segredo. Não era a toa que seus trabalhos estavam atrasados e Harry se perguntou se isto seria um atenuante para sua situação, caso Hermione viesse a saber.


—O ruim é que não teremos muito tempo para selecionar uma nova pessoa. A seleção para o goleiro é daqui a três dias… Você acha que deveríamos colocar uma seleção também para atacante? – perguntou a garota.


—Eu preferia acreditar que Katie ficará bem… – comentou Harry, divertindo-se com o fato de Gina não desconfiar que o irmão estaria participando daquele mesmo processo de seleção e notando a coloração do rosto do amigo desaparecer.


A expressão de Gina não foi de satisfação, tampouco.


—Mas, Harry… é muito arriscado. Nós temos que ter alguém de reserva, caso ela realmente fique impedida de jogar!


Harry notou que Gina estava discutindo um tanto quanto apaixonadamente aquele assunto.


—Bem, então é o caso de falar com Angelina, não acha? Ela é a capitã, ela vai decidir…


—É. Vou fazer isso. – ela disse, um tanto decidida demais. – Até mais, Harry!


—Mas você vai agora? – perguntou Rony, surpreso.


—Sim, claro! Quanto mais cedo ficar decidido, menos risco corremos, não acha?


—É, certo! – ele respondeu, tendo que aumentar o tom de voz, porque Gina já corria na frente, da mesma forma como Hermione tinha feito.


Vendo-a desaparecer através das escadas, Harry e Rony se olharam uma vez mais.


Mulheres…


Harry respondeu apenas dando de ombros.


—Prepare-se para as coisas ficarem piores. Temos Snape agora… – ele acrescentou, tomando o caminho para as masmorras.


Foi a vez de Rony dar de ombros.


—As coisas só podem ficar piores caso ele resolva me enfeitiçar publicamente. Fora isso…


Apreciando a coragem do amigo, Harry seguiu resignado para a sala de poções.


A turma já se encontrava tomando seus lugares e remexendo as mochilas em busca de seus quites de ingredientes, livro, pergaminhos, penas e outros instrumentos. Snape, contudo, não deixou de reparar na chegada silenciosa de Harry e Rony.


—Ora ora, Potter. Sempre atrasado. Ande, tome logo seu lugar.


—Não estou atrasado. – Harry protestou, verificando o relógio de pulso.


Snape deu um meio sorriso torto e Rony deu uma cotovelada nas costelas do amigo.


—Não entra na pilha, cara. – sussurrou.


Os meninos se sentaram perto de Neville, Hermione e Lia. Tina dividia uma mesa do outro lado da sala com Parkinson. Harry olhou e viu que as duas cochichavam entre si, e pensou que talvez estivessem trocando novidades a respeito das vozes misteriosas.


A aula correu como de costume: Snape implicando com Harry, caçoando de Neville e favorecendo a Sonserina. Draco conseguiu dez pontos para a Casa simplesmente por ter cortado corretamente suas raízes, e Valentina conseguiu outros dez por ter colocado os ingredientes na ordem correta dentro do caldeirão, algo tão banal que até mesmo a garota ficou espantada ao ouvir a voz do professor dizer “Parabéns, Alves. Dez pontos para a Sonserina.”


Ao final da aula, a Sonserina contava com um total de quarenta pontos à frente da Grifinória. Snape distribuiu outros vinte pelas poções de Draco e Valentina terem cozinhado perfeitamente.


—Nenhum pontinho para a Grifinória e a poção de Hermione estava perfeita! – Harry chiou, indignado enquanto caminhavam para longe das masmorras.


—Tudo bem, Harry. Isso não é novidade nenhuma. – Hermione suspirou.


As semanas passaram e a neve aumentava com a proximidade de fevereiro. Cecília e Valentina não se agüentavam mais de tanto frio e ambas tiveram seus dias de glória na enfermaria, com Madame Pomfrey ao redor delas ministrando poções para curar gripe e dor de garganta. Cecília pegou uma gripe que não a deixava respirar direito e Valentina adquirira uma dor de garganta tão forte que ela mal conseguia engolir as refeições.


O frio estava realmente mais forte que nos anos anteriores e a neve nos jardins da escola chegara a um metro. Nenhum aluno ou professor se atrevia a sair do castelo, e enquanto isso Hagrid era muitas vezes obrigado a passar horas fora de sua cabana cuidando de suas abóboras e hortaliças para que elas não morressem no frio.


As reuniões da AD continuaram no ritmo normal. Harry agora ensinava seus amigos a conjurarem o patrono, feitiço esse que lhes custaram duas aulas, tamanho o nível de dificuldade do encantamento.


—Pensamento firme, pessoal. Pensem numa lembrança boa! – Harry encorajava os amigos, andando por entre eles, enquanto exclamavam “Expecto Patronum” por todos os lados.


Hermione fora, obviamente, quem primeiro conseguiu conjurar seu patrono. Uma lontra muito luminosa corria em volta dela, fazendo todos baterem palmas. Já o patrono de Rony era um cachorro que pulava e corria ligeiro. Cecília conjurara seu patrono na segunda aula e ele tinha a forma de um cavalo. O patrono de Jorge, que também tinha a forma de um cavalo, foi de encontro ao de Lia num cumprimento gentil. Valentina também conseguira o seu patrono na segunda aula e ele tinha a forma de um brilhante golfinho que parecia nadar alegre no ar.


Harry terminou aquela aula sentindo-se animado. Todos tinham ido muito bem, com a única exceção de Neville, cujo patrono ainda estava muito fraco. Fora isso, a turma estava bem avançada em feitiços de defesa e que certamente os ajudariam se tivessem que um dia lutar contra artes das trevas.


Os dias corriam e de repente faltava uma semana para o Dia dos Namorados. Como a data caía exatamente num sábado, uma visita a Hogsmead fora programada para combinar com a comemoração. Todos os alunos estavam alvoroçados com a perspectiva do passeio e mais ainda com a possibilidade que alguns vislumbravam em finalmente fazer um convite às suas paqueras.


Cecília e Jorge sequer discutiram as possibilidades – ambos iriam juntos ao passeio romântico. Harry conseguiu convidar Cho depois de gaguejar em algumas palavras e a menina aceitou o convite dando risinhos envergonhados. Rony e Hermione pareciam muito sem jeito um com o outro, então ambos optaram por tratar a situação com a maior naturalidade possível, admitindo que era natural que eles passassem o dia juntos, já que seus outros amigos estariam acompanhados. Já Valentina passou a ser constantemente vista na biblioteca, escondida atrás de uma torrinha de livros.


—De quem você está fugindo? – perguntou por fim Hermione quando viu a garota pela quinta vez na biblioteca.


Tina respondeu sem encará-la.


—De ninguém, oras.


Hermione sentou-se a frente dela e a garota foi obrigada a tirar os olhos do livro que segurava.


—Isso é realmente necessário?


—Não sei do que você está falando.


—Claro que sabe. – Hermione deu um sorrisinho. —Se você não quer ir à Hogsmead com Malfoy, simplesmente diga que não.


Tina arregalou os olhos para ela. Abriu a boca e tornou a fechá-la. Por fim respondeu:


—Eu já disse a ele que não.


—Então!


Tina desandou a falar sem pausas:


—Mas ninguém mais me convidou! Quer dizer… Sean Smith, aquele bonitão da Sonserina, ele me convidou, mas… Ai, como eu fui burra! Eu disse que não!


Hermione deixou o queixo cair.


—Mas por que você dispensou ele?


—Eu não sei! – exclamou em falsete. —Acho que fiquei nervosa. Ah!


Valentina escondeu o rosto nas mãos, parecendo muito infeliz.


—Agora não tenho ninguém para ir comigo. Vou ter que ficar sozinha no castelo.


—Claro que não! Você pode ficar comigo e com o Rony…


Valentina riu.


—É a minha vez de gargalhar?


Hermione corou.


—Nós não estamos juntos… – disse, desviando os olhos para o chão.


—Então eu é que não vou estragar a chance de ficarem. – Tina olhou pela janela cheia de neve e suspirou triste. —Vou ficar no castelo. Talvez eu passe o dia dormindo. Não tem remédio mesmo…


No fim da tarde da véspera do Dia dos Namorados, Tina estava mais uma vez na biblioteca e tinha os olhos presos nas palavras de um livro, mas estes não se moviam e ela não virava a página havia uns cinco minutos. Estava perdida em pensamentos, decidindo o que faria no dia seguinte – ficaria em Hogwarts colocando os trabalhos em dia e dormindo ou iria para Hogsmead curtir aquele clima romântico, sozinha? Nenhuma das duas possibilidades lhe pareciam muito atrativas, porém ela tinha que admitir que a mais suave ainda era ir para Hogsmead na companhia de algumas meninas da Sonserina que a deixariam sozinha, como sempre, afinal todas as suas outras amigas estariam acompanhadas e ela não queria estragar a chance de Rony e Mione.


Ela já podia até visualizar a cena: entraria no Três Vassouras, pediria uma cerveja amanteigada e, com alguma sorte, sentaria numa mesa ao fundo e leria alguma coisa interessante sem ser perturbada por estalos de lábios de separando depois de um beijo apaixonado. Quem sabe até não encontraria alguém nas mesmas condições que ela para lhe fazer companhia?


A manhã seguinte estava muito branca e gelada, mas nenhuma neve caía do céu, o que era uma sorte. Todos os alunos se mobilizaram em se arrumar com suas melhores roupas e os casais estavam se encontrando diante das escadas de mármore antes de passarem por Filch e seguirem a pé pela estrada que levava até o vilarejo. Valentina subiu os últimos três degraus até o hall arrumando o cachecol em torno do pescoço, depois de tomar sua decisão em última hora. Seus olhos correram por todos os casais que ali estavam, à procura dos amigos, mas não viu nenhum, e muito menos viu Sean Smith, então pressupôs que ele também já deveria estar a caminho do vilarejo. Valentina viu o hall esvaziar aos poucos e logo estava sozinha, sentada num dos degraus das escadas que davam para os jardins. Até mesmo o Harry já havia passado por ela de mãos dadas com Cho. Se não reunisse mais um pouco de coragem para por em prática sua decisão, seria a única a permanecer ali.


— Deixada para trás, não é Alves?


Ela não precisou virar-se para trás para saber a quem pertencia àquela voz. Preferiu então não responder, o que deu chances a Draco de continuar com as implicâncias.


— Bem feito. Quem mandou nunca prestar atenção em mim?


Valentina gelou. Não podia acreditar que estava escutando aquilo.


— O que foi, Alves? Além do cérebro, o frio também congelou tua língua?


Ela apoiou as mãos nos joelhos e se ergueu em silêncio. Desta vez sua falta de resposta não era fruto de consternação, apenas de surpresa. Olhou Draco nos olhos e pela primeira vez reparou que ela era mais alto que ela e que havia adquirido um porte físico bastante generoso desde o início do ano. Talvez fossem os treinos mais pesados de Quadribol?


— O que você disse mesmo?


— Eu disse muitas coisas, cabeça-de-vento.


— Não… não. Você disse que eu nunca…


— Nunca prestou atenção em mim. Sim, ou vai negar que é verdade? Não adianta, você não capta as coisas, não é, Alves? Não é do tipo de garota que entende as coisas por meias palavras.


— O que está querendo dizer? – Valentina estava totalmente confusa.


— Exatamente o que estou dizendo. E que você pelo visto continua sem entender. – Draco colocou as duas mãos nos bolsos do sobretudo verde escuro.


— Você queria mesmo ir comigo a Hogsmead hoje? De verdade?


Malfoy respirou fundo, impaciente.


— Eu vou a Hogsmead hoje, Alves. Mesmo que não seja com você, como eu gostaria de verdade.


Valentina ficou sem saber o que falar, apenas fitava a figura de Draco de forma exasperada. Bem ou mal ela imaginava que o garoto a havia convidado apenas para provocá-la.


— Eu jamais seria teu par, Malfoy. – Valentina disse de modo bastante idiota.


Ele deu de ombros.


— É… eu acho que não.


Ele passou por ela e desceu os quatro degraus de mármore. Lá de baixo, com os pés na neve, olhou para Valentina e disse:


— Passe então o dia sozinha no castelo. Acredito que só fique você aí dentro. Até mesmo o velhote do Dumbledore já foi.


? – exclamou, com a voz esganiçada. — Eu também estou indo, mesmo que sozinha!


— Não precisa ir sozinha.


Valentina titubeou antes de responder.


— Pois eu vou! – e desceu as escadas em passou firmes, parando um pouco a frente de Malfoy e fitando a paisagem branca e gelada a sua frente. Algo nela pareceu perder o entusiasmo e ela empacou na neve. Ela não queria ir sozinha, sabia que seria pior que ficar o dia inteiro no castelo brincando com seu gatinho branco.


Draco andou até ela e lhe estendeu a mão enluvada.


— Deixe de ser teimosa, Alves. Pelo menos hoje…


Ela fitou a mão de Draco e, um pouco hesitante, deu-lhe a mão.


— Isto é ridículo… – disse, olhando sua mão segurando a mão de Malfoy.


— Hoje é o Dia dos Namorados. – ele disse, elegantemente dando o braço a ela. — Será mais que comum vermos casais de mãos dadas por aí. Aliás, não apenas de mãos dadas. – ele deu um sorrisinho pressuroso.


— Nem-pense-nisso, Malfoy. – ela disse, com os dentes cerrados. — Não sou nada sua.


— Então isso é apenas fingimento?


— Não passa disso.


— Ótimo. Que seja. Agora podemos ir andando? Estou ansioso por uma bebida bem quente.


Valentina concordou e os dois começaram a fazer o caminho até Hogsmead de braços dados como se fossem um feliz casal de namorados. Draco sentia-se triunfante, mas Valentina tinha o olhar vidrado na estrada à frente como se estivesse hipnotizada. Na verdade estava tão confusa que não sabia sequer como implicar com Draco ao seu lado.


Ela o olhou de rabo de olho e reparou em seu modo de andar. Parecia um jovem lorde, usando aquele sobretudo por cima de uma blusa negra de gola role, aquelas botas negras de couro de dragão e os cabelos louros platinados elegantemente presos com um laço num rabo de cavalo baixo. Respirou fundo e voltou a olhar para frente.


De repente algo lhe ocorreu.


—Hum… Malfoy?


—Sim?


—Você ia a Hogsmead sozinho?


Draco concordou com um aceno da cabeça.


—Por que a pergunta?


—Eu estava imaginando se você havia convidado outra menina depois que eu te disse que não…


Valentina sentiu seu rosto ficar muito quente depois de afirmar aquilo. Draco apenas parou e olhou sério para ela.


—Não, Alves, eu não convidei mais ninguém.


—Certo. – ela encerrou o assunto, sentindo que a voz saíra meio estranha e que seu rosto estava ainda mais quente.


Uma vez em Hogsmead, Valentina olhou em volta e sentiu que todos estavam reparando neles. Ela perguntou:


— Bem, para onde vamos?


— Para qualquer lugar onde eu não tenha que dividir você com seus amigos idiotas.


— Eu queria ir ao Três Vassouras…


Draco olhou-a do alto de seus um metro e oitenta.


— Eu disse que não quero encontrar seus amiguinhos.


Valentina bufou e bateu um pé na neve fofa.


— Ora vamos, não seja desagradável. Não estrague nosso Dia dos Namorados. – Draco disse, contendo um sorriso. — Venha, vamos ao Café da Madame Lorren.


Draco começou a andar, puxando Tina com ele.


— Mas lá tudo é o triplo do preço normal…!


— É você quem vai pagar, Alves? – ele rebateu, bem-humorado.


Tina gaguejou, alarmada.


— Mas… mas é cla-claro! Ou… Ou você pensa que… Que eu vou deixar você pagar…!


Mas Draco já havia entrado com ela no ambiente aconchegante e aquecido do Café da Madame Lorren e estava pedindo uma mesa em local bem reservado. Enquanto o garçom os levava até a mesa, Draco sussurrou para ela:


— Não me tire a chance de ser gentil com você hoje, Alves. Apenas hoje.


Valentina emitiu um som estranho que parecia um rosnado.


Eles se sentaram a uma pequena mesa redonda de madeira escura, que estava coberta com uma toalha branca bordada. No centro da mesa havia uma vela vermelha pequena e rechonchuda que flutuava há milímetros da superfície. O garçom lhes entregou o cardápio e se retirou. Draco olhava tão fixamente para Tina que quando ela voltou a encará-lo, sentiu uma repentina vontade de voltar o olhar para o açucareiro.


—Escolha o que você quiser. – ele disse. —E não se preocupe com o preço.


Valentina abriu o cardápio e se deparou com uma enorme variedade de apetitosos lanchinhos. Seus olhos inevitavelmente correram para os preços e ela quase deixou o queixo cair. Era tudo realmente bem acima do preço normal. Ela desejou que as coisas ali fossem realmente mais gostosas do que nos outros lugares para fazerem justiça àqueles preços altos.


O garçom retornou depois de alguns minutos.


—Já escolheram?


Valentina pigarreou.


—Hum, sim… Eu quero um chocolate quente grande com marshmallows e uma cestinha de torradas com manteiga.


—Perfeito, senhorita. E o senhor? – dirigiu-se a Draco.


—Capuccino grande. – disse simplesmente, fechando o cardápio e entregando-o ao garçom que também recolheu o de Tina.


Um silêncio desconfortável caiu sobre os dois. Eles olharam para o lado e viram alguns poucos casais trocando carinhos e beijos. Valentina olhou para o outro lado e preferiu manter a atenção na janela. Suspirou.


Então ela sentiu o toque tímido da mão de Draco sobre a sua. Ela o olhou um pouco tensa.


—Não quero forçar a barra, sabe. – ele disse, pela primeira vez sem aquele tom cínico usual. —Mas queria mostrar a você que posso ser melhor do que essa imagem que você tem de mim.


Melhor? Melhor como?


—Não me venha com esse tom. – Draco retrucou, franzindo o cenho. —Você me entendeu.


Valentina não teve tempo de responder, pois seu chocolate quente, as torradas e o capuccino haviam chegado. Eles procuraram comer sem falar muito.


Ao final, Tina limpou os lábios com o guardanapo de seda se sentindo muito satisfeita e quentinha.


—Você tinha razão. As coisas aqui são realmente muito gostosas. – assumiu, com um sorriso. O chocolate era tão delicioso que ela sentia-se até mais bem humorada. —Tenho que dar meu braço a torcer.


Draco riu.


—Bem, quer dar uma volta? – ele convidou.


Ela olhou para a paisagem branca e choramingou.


—Falta até coragem de sair daqui e enfrentar esse frio.


Ele pegou sua mão, dessa vez com mais coragem, e levou-a até os lábios, beijando-a.


—Podemos ficar, se você quiser.


Valentina então teve a reação mais inesperada tanto para ela quanto para Draco – ela acariciou de leve o rosto do garoto com a mão que ele acabara de beijar. Draco, tomado por uma repentina esperança, inclinou o corpo para frente para beijar Tina.


—Não. – ela disse, um pouco a contragosto. —Vamos dar uma volta então. Vamos.


Um pouco desiludido, Draco concordou. Ambos tinham os batimentos cardíacos muito acelerados agora e pareciam ter tomado outras tantas xícaras de chocolate e café, tamanho o calor que sentiam.


Saíram para o frio e andaram por entre as lojas apinhadas de gente. Tina quis entrar numa loja de cosméticos e saiu de lá com um perfume novo, um batom e uma poção para remover a oleosidade da pele. Draco quis pagar tudo, mas Tina só o deixou pagar pelo perfume.


Depois rumaram para a Dedosdemel, parada obrigatória para todos os estudantes que visitavam Hogsmead, e se abasteceram de balas de menta, sapos de chocolate, varinhas de alcaçuz e bolinhos de abóbora.


Tina? Draco?


Valentina se virou para trás, mas Draco sequer se deu ao trabalho, apenas revirou os olhos em silêncio enquanto pagava pelos doces.


Cecília estava atrás deles de mãos dadas com Jorge e os dois pareciam muito alarmados de verem aquele casal inusitado fazendo compras no Dia dos Namorados.


—Er… Oi, Lia. Oi, Jorge.


—O que você está fazendo aqui com ele? – Jorge perguntou, sem entender nada. Lia lhe deu uma pisada no pé.


—Estamos curtindo o Dia dos Namorados. Por que, Weasley? Até onde eu saiba, isso não é da sua conta. – Draco respondeu, finalmente se virando.


Os dois se encararam com raiva. Sentindo o clima tenso, Cecília procurou mudar de assunto.


—Er… o que você comprou de bom, Tina?


Tina respondeu rápido, vendo que Jorge estalava os nós dos dedos, e puxou Draco para fora da loja, se despedindo da amiga Lia com um “nos vemos daqui a pouco!”


Resmungando que “agora só falta encontrarmos o idiota do Potter” Draco saiu pela neve com Tina acompanhando o seu passo. Mas eles não encontraram mais ninguém do círculo de amizades de nenhum dos dois, o que foi uma sorte, e quando a tarde começou a cair e o vilarejo a esvaziar, ambos decidiram que era hora de voltarem ao castelo.


A estrada de volta para Hogwarts estava escurecendo muito rápido e lâmpadas iluminadas a fogo levitavam ao longo do caminho. Poucos alunos passavam caminhando, pois a maioria já tinha voltado ao castelo ou aproveitava para namorar às escondidas.


Draco olhou para os lados e, não vendo ninguém, aproveitou para pegar a mão de Tina.


—Posso, não posso?


—Er… tudo bem.


Em silêncio, eles continuaram a caminhar. Quando deram por si, estavam diminuindo o passo gradativamente. Então pararam um de frente para o outro.


—Alves, eu…


Draco se aproximou um passo e desta vez Valentina não se afastou. Ele tocou o queixo dela com as pontas dos dedos e aproximou o rosto. Ambos olhavam dentro dos olhos um do outro com as respirações presas.


Valentina levantou o rosto como se houvesse um imã atraindo-a para ele, e Draco lhe beijou os lábios, cálido. Ela correspondeu, apertando os braços do garoto e se aproximando mais até sentir seu corpo junto ao dele.


Aquilo de repente parecia tão certo! O calor da respiração de ambos, o toque dos lábios úmidos, o cheiro da pele de Draco, o modo como ele a apertava contra ele…


O beijo se prolongou. Draco segurou com força os cabelos da nuca de Tina com uma mão, enquanto a outra lhe acariciava as costas. Ela suspirou entre um roçar de lábios e suas mãos o envolveram pelo pescoço.


De repente eles escutaram uma tossidinha atrás deles. Confusos e alarmados, eles viram que Prof. Snape estava parado bem atrás dos dois com os braços para trás e uma expressão horrivelmente perigosa no rosto.


Professor Snape! – Valentina exclamou completamente assustada.


—Sim, Alves, a senhorita acertou. Sou eu mesmo. – Snape disse, cínico.


O casal se separou com rapidez, como se nunca tivessem se encostado antes. Valentina poderia jurar que via um lado da boca de Snape tremendo.


—Sr. Malfoy e Srta. Alves, onde os senhores pensam que estão? – Snape perguntou num sussurro suave e perigoso.


Os dois gaguejaram completamente sem jeito. Snape aproveitou para continuar:


—Eu quero ver os dois voltando para o castelo imediatamente ou eu posso deixar escapar para a Profª. Umbridge que dois alunos da minha própria casa andam de atracando por aí e desobedecendo ao Decreto 42.


Draco e Valentina se entreolharam. Valentina teve uma vontade quase irreprimível de responder a Snape que ninguém estava se atracando por aí, mas mordeu a língua.


—Nós já estávamos indo, professor! – Draco apressou-se em dizer.


—Er… é mesmo, nós já estávamos indo… – Valentina falou num fiapinho de voz.


Snape olhou de um para o outro. Os olhos negros pareciam faiscar.


—Então o que continuam fazendo aqui? Andem! De volta o castelo agora! E sem paradinhas pelo caminho. Se desobedecerem eu irei saber. – terminou, apertando os olhos para os dois.


Nervosos, eles apertaram o passo em direção à escola sob os olhos vigilantes de Snape e só voltaram a respirar com calma quando pisaram no saguão de entrada. Mesmo suados com a corrida e envergonhados por terem sido pegos pelo diretor da Sonserina, Draco e Valentina se olharam e, pela primeira vez, sorriram cúmplices um para o outro.

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