PRESENTES DE NATAL



CAPÍTULO 9 – PRESENTES DE NATAL


Valentina acordou com uma boa dor de cabeça. A luz do sol que entrava por uma grande fresta das cortinas ao redor de sua cama e a acordara. Sentindo a cabeça pesada por causa de todos os salgadinhos e das taças de hidromel, ela lembrou o último acontecimento da noite passada com a mesma tranquilidade de quem tem certeza de que nada havia passado de um pesadelo.


Mas então ela abriu os olhos e fitou o veludo verde a sua frente e seu cérebro fez questão de lhe assegurar as diferenças entre a realidade e os sonhos. O beijo de Draco havia sido tão real quando o sucesso do manifesto silencioso, fazendo com que ela já iniciasse sua manhã de domingo se perguntando que jeito daria de não ver Malfoy nunca mais na sua vida; mas caso o visse, o que ela faria (ou deixaria de fazer) nesses momentos embaraçosos.


Valentina se levantou mesmo desejando poder dormir mais, afinal já eram nada menos que dez horas da manhã. Com alguma sorte, ela conseguiria alguma coisa para comer indo diretamente na cozinha – Fred e Jorge lhe haviam ensinado o caminho e o modo de abrir a passagem para uma sempre calorosa e farta recepção dos elfos domésticos.


Ela trocou de roupa e se agasalhou, saindo vacilante da ala da sonserina e tomando o rumo da cozinha. No meio do caminho, ela reparou que havia algo de errado: seus cabelos continuavam anormalmente longos como na noite anterior, e com apenas um aceno da varinha, ela os prendeu em um coque fofo no alto da cabeça, decidindo que mais tarde pediria a Hermione para cortá-los para ela.


Tina havia justamente passado pelo Salão Principal sem olhar para os lados quando sentiu cheiro de pão fresquinho no ar. O café tinha sido postergado até mais tarde naquele domingo e ela se sentiu grata por isso. Foi até a mesa da Sonserina e procurou se sentar no cantinho mais invisível que lhe foi possível encontrar.


Ela estava justamente colocando leite em seu café e tomando cuidado para não sujar a manga do seu moletom, quando sentiu alguém lhe plantar um beijo na bochecha. Seu estômago gelou antes mesmo que ela escutasse a voz de Draco lhe desejar bom dia. Completamente embasbacada, Tina olhou de um jeito meio idiota para o lado onde o garoto acabara de sentar, e tamanha foi a sua surpresa que ela sequer reparou que ainda segurava o pequeno bule que leite pela alça prateada.


—Não seja má educada, Alves. Eu acabei de te dar bom dia. Ou será que você está chateada porque só te dei um beijo no rosto? – ele se aproximou, sorrindo debochado —Posso te beijar decentemente aqui mesmo se você quiser. – sussurrou.


—Não seja idiota. – ela resmungou por entre os dentes, se afastando.


—Eu é que deveria te aconselhar a não ser idiota, Alves, porque eu sei que lá no fundo, você gostou...


Valentina respirou profunda e ruidosamente, começando a passar manteiga em um pãozinho de minuto com uma força exagerada.


—Draco, por que você não me faz um favor? Por que você simplesmente não some daqui e me deixa em paz?


Ele apoiou o rosto em uma das mãos e olhou despreocupado para ela.


—Porque eu não quero. E também porque eu estou decidido a fazer você engolir todos os desaforos que jogou na minha cara ontem, especialmente o que você disse a respeito de jamais querer aparecer do meu lado em algum lugar. – ele sorriu —Que ironia, não? Em pensar que agora somos namorados!


—Nós não somos namorados coisa nenhuma! – ela rosnou imediatamente.


Draco continuou sorrindo.


—Isso é o que nós vamos ver, não é?


Sem pensar duas vezes e ainda escutando Draco rir, Tina enfiou o resto do seu pãozinho na boca e pegou sua xícara e pires, levantando-se da mesa da Sonserina e seguindo a passos certeiros para a mesa da Grifinória. Não lhe importava que seus amigos pudessem não estar lá (ela não havia sequer reparado que Hermione e Harry estavam sentados à mesa e haviam parado a conversa para observá-la), apenas imaginou que na mesa do Leão ela iria ter mais paz do que em qualquer lugar onde Draco Malfoy estivesse presente.


Hermione ainda segurava o Profeta Diário com as duas mãos quando ela chegou e sentou ao lado de Harry, parecendo lívida. Nenhum dos dois se atreveu a dizer nada quando a garota chegou bufando e derramou café com leite pelos lados do pires ao colocá-lo com exagerada raiava sobre a mesa.


Valentina olhou de Harry para Hermione a sua frente.


—Bom dia. – rosnou.


—B-Bom dia. – Hermione disse. —D-Dormiu bem? – perguntou sem jeito.


—Mais ou menos. – ela fez uma pausa levando uma das mãos à cabeça. —Acho que bebi hidromel demais ontem.


—Ah. – a garota disse, já mais aliviada, achando que compreendia o motivo de tanto mau humor. —Vai passar. Você pode visitar Madame Pomfrey depois do caf...


—Ah, não, melhor não. Que vergonha seria aparecer lá pela primeira vez com uma baita ressaca.


Harry riu e engasgou no meio do seu café, fazendo as duas rirem também.


—Veja, publicaram aquela foto que tiraram da gente ontem. – Harry disse, pegando um exemplar esquecido do Profeta Diário e ao seu lado e entregando para Valentina.


A menina sequer precisou abrir o jornal. Na primeira página havia uma enorme fotografia de um grupo de alunos em alinhadas vestes negras. Harry estava no centro do grupo, como Rita Skeeter o havia carinhosamente ordenado para ficar e ele obedecera de boa vontade. Ele estava de mãos dadas com Cho, e ao lado direito dela estavam Rony e Hermione, de braços dados, e ao lado deles estavam Valentina de braços dados com Neville, ambos completamente mascarados. Já ao lado esquerdo de Harry estavam Cecília com Jorge; o rapaz a abraçava pela cintura com o braço esquerdo e levantava uma taça de suco de abóbora com a mão direita. A máscara de joker fazia de sua figura algo ainda mais irônico do que já naturalmente deveria ser. Ao lado deles estavam Fred e Angelina, e ao lado dos dois, Luna e Justino.


—Eu quero guardar essa foto! – ela exclamou, fazendo Harry e Hermione abrirem sorrisos. —Sério, quero guardá-la. Você se incomoda se eu recortar o jornal, Harry?


—Não, claro que não.


Tina pegou sua varinha e com ela recortou a foto do jornal. Em seguida, com um simples toque de varinha sobre o papel frágil, o recorte se plastificou, ficando bem mais resistente.


—Ótimo! – sorriu, pousando a foto em cima da mesa com carinho.


—Você deveria ler o que eles escreveram sobre o manifesto. É claro que mais uma vez tentaram liquidar com a minha imagem. – Harry disse. —Mas nada que eu já não esperasse.


—Não há com o que se preocupar. – Hermione disse, solene, abaixando o jornal. —Luna me disse que o pai dela concordou em fazer uma matéria bem mais fiel aos fatos para o Pasquim com as fotos que ela tirou ontem. Veremos qual será a repercussão.


—O Pasquim? Mas... – Tina perguntou, um pouco incrédula.


—Pois é... Mas temos que contar com todos os nossos aliados, não? – Harry suspirou, um pouco infeliz.


Naquele momento, Rony chegou acompanhado de Cecília. Rony sentou-se ao lado de Hermione, e Lia escolheu sentar ao lado de Tina.


—Bom dia! – Lia cumprimentou, com uma alegria desmedida.


Harry, Rony, Hermione e Tina riram.


—Nossa, quanta disposição! – Tina alfinetou.


—Pois é. – Lia disse, com um sorriso, pegando um pãozinho e puxando o pote de cream cheese para perto de si. —Estou tão feliz! – cochichou para a amiga.


—Eu sei que está. – ela disse, coçando a cabeça.


—O que houve com o seu cabelo?


—Ah, é verdade. – Tina olhou suplicante para Hermione. —Você poderia me ajudar? Acho que usei poção demais ontem e meus cabelos não voltaram ao normal.


Antes que Hermione pudesse assentir com a cabeça, Lia chiou:


—Por que você não me pediu para consertar isso? Você sabe muito bem que eu adoro mexer com cabelos e quem sempre fazia os seus penteados era eu!


Cecília mexeu no coque negro de Tina e soltou os cabelos da garota que caíram até a cintura.


—Posso fazer um corte repicado desta vez, se você quiser. E uma franja também não cairia mal. – disse, analisando os cabelos de Valentina.


—Nada de muitos modismos, por favor. – ela disse, rabugenta e refazendo o coque. Em seguida, olhou para Hermione. —Por isso que eu tinha pedido a você para cortar, Mione. A Cecília não consegue se segurar de tanta felicidade quando tem um motivo para mexer com o cabelo dos outros. Parece que nunca brincou de boneca na vida.


Hermione sorriu.


—Tudo bem. Se você concordar, Lia, eu gostaria de fazer uns cachos mais mansos nos meus.


—Claro! – ela concordou, animada.


Mulheres... – Rony resmungou para Harry. —Não me surpreenderia se resolvessem abrir um salão de beleza depois de se formarem.


Harry riu. Pensou que trocaria de bom grado os sonhos que tinha toda noite com o corredor no Departamento dos Mistérios por preocupações com seus cabelos.


Ao terminarem de comer, Hermione, Lia e Valentina saíram para os jardins. O tempo estava frio, mas o sol fraco que havia encontrado uma fresta pelas nuvens de início de inverno foi o suficiente para convidá-las a um passeio. Elas sentaram num banco de pedra embaixo de uma árvore sem folhas e conversaram sobre o baile e os acontecimentos da noite passada. Hermione falou cheia de orgulho sobre como Rony estava mais cavalheiro, e Lia contou em detalhes como havia sido o seu primeiro beijo com Jorge. Depois, Valentina e Hermione deixaram que Cecília se divertisse em seus cabelos.


Harry, Rony, Fred e Jorge chegaram um pouco depois e se uniram às meninas. Jorge deu um beijo rápido nos lábios de Lia e sentou-se no chão ao lado de Fred, e os quatro ficaram observando as habilidades estéticas de Cecília. Depois de cinco minutos, Rony perdeu o interesse, embora tivesse tentado acompanhar cada movimento e cada palavra de Hermione enquanto ela tinha os cabelos modificados por Lia, e convidou Harry e os irmãos para uma partida de snap explosivo que eles começaram a jogar ali mesmo.


Ao final de aproximadamente uma hora e meia, Hermione tinha os cabelos mais mansos e com cachos mais definidos devido a um feitiço de Lia que duraria por um mês, ao que a garota ficou muito grata. Valentina havia se rendido aos pedidos de Lia para deixá-la cortar uma franja, mas como Tina não tinha muita paciência para cabelo caindo no rosto, ela rapidamente jogou a franja para o lado e a prendeu com um grampo. Contudo, seus cabelos haviam voltado ao tamanho usual: na altura dos ombros.


—Eu ainda acho que você ficaria bem de cabelo curtinho.


—Ah, não inventa, Lia!


—Não sei porque você tem tanta resistência a mudar o visual! – Cecília implicou.


—Ah, não? Bem, porque você não corta o seu bem curtinho?


—Porque meu cabelo é muito volumoso. Não ia ficar legal...


A implicância de Tina e Lia foi interrompida por uma corujinha mínima que vinha voando na direção deles. Rony, Harry e Hermione a conheceram imediatamente.


—Deve ser de mamãe... – Rony disse.


Píchi, a corujinha, soltou o envelope na cara de Rony e sobrevoou feliz todos os presentes, piando orgulhosa de si mesma por ter feito mais uma entrega. Em seguida, ela pousou no galho mais baixo da árvore debaixo da qual estavam.


Rony abriu o envelope e todos se amontoaram ao redor dele para lerem juntos.


"Queridos Rony, Gina, Fred e Jorge,


Vamos todos ficar muito felizes se vocês, Harry e Hermione vierem passar as férias de Natal conosco.


Não podemos dizer onde passaremos o Natal pois temos suspeitas de que as cartas estejam sendo interceptadas. Vocês sabem a que lugar nos referimos.


Estamos morrendo de saudades!


Um beijo afetuoso,


Mamãe e Papai."


—É na sede da Ordem, com certeza. – Harry murmurou esperançoso. —Vou poder ver Si- – ele parou de repente e corrigiu-se: —Snuffles.


—Poxa, que pena. – Cecília murchou, ainda com os olhos na carta que Rony segurava. —Eu e Tina estávamos planejando juntar nossas famílias e chamar vocês para passarem o Natal com a gente. – finalizou, um pouquinho triste.


—Vamos dar um jeito de nos encontrar no Natal. – Jorge disse, abraçando a menina pelos ombros e lhe dando um beijo no rosto.


Concordando com Jorge, eles decidiram voltar para o conforto do interior do castelo quando Harry avistou Hagrid passar carregando abóboras gigantes. Foi então que ele teve uma idéia.


—Ei, Hagrid!


Harry correu até o amigo, que sorriu ao vê-lo.


—E aí, Harry? Tudo bem? Divertiram-se bastante ontem no baile?


—Er... sim. Hagrid, será que eu e Rony poderíamos falar com você depois do almoço?


Hagrid franziu o cenho.


—Claro que podem. Apareçam lá para um chá; Há muito tempo que nenhum de vocês aparece para me fazer um visita. Mas o que vocês estão aprontando desta vez, eh?


—Nada, mas é que precisamos perguntar umas coisas a você.


Hagrid olhou desconfiado para Harry e depois para Rony, mas concordou com um aceno da cabeça.


—Espero vocês de tarde então. Agora me deixem ir porque estas abóboras estão realmente pesadas, sabe?


Hagrid se despediu do garoto e acenou para os outros, indo em direção à sua horta.


—O que você quer falar com ele? – Rony cochichou.


—O que queremos falar, você quer dizer. Vou falar com ele sobre as vozes que a Tina escuta e a aparição que você viu no Baile. Hagrid deverá saber de alguma coisa.


—Mas porque só nós dois?


—Bem, a Hermione não pareceu te levar muito a sério quando você contou a ela, não é?


—É, nisso você tem razão. – Rony concordou, pensativo. —Mas a Tina, por outro lado...


—A Tina já está preocupada o suficiente com as vozes. Não sei, mas acho que ela ia ficar ainda mais cismada se contássemos a ela sobre aquela coisa estranha.


—OK, você é quem manda, cara. – Rony riu.


A hora do almoço chegou antes que todos dessem por si de que o relógio já marcava meio-dia. Harry e Rony almoçaram entre cochichos, sobre o que discutiriam com Hagrid, desta vez livres dos olhares acusadores de Hermione que conversava com Tina ao seu lado.


Depois de um almoço bem servido e de sobremesas fartas, Harry e Rony saíram juntos da mesa.


—Voltaremos logo. – Harry disse.


—Aonde vocês estão indo? – Hermione perguntou.


—Vamos... – Harry esquadrinhou a cabeça à procura de uma resposta —Vamos até o campo de quadribol discutir as novas táticas do jogo. – ele respondeu, certo de que Hermione não se divertiria num passeio com meninos falando a respeito de quadribol.


Eles ainda receberam um olhar astuto da amiga antes de darem as costas e seguirem para os jardins.


—Esses dois ainda estão armando alguma coisa...


—Deixa eles, Mione. Vai ver eles querem falar sobre coisas que não podem conversar perto da gente. – Tina disse.


—O que, por exemplo? – Hermione perguntou, um pouco indignada ainda sem tirar os olhos das nucas de Rony e Harry.


—Coisa de meninos. – Tina riu. —Você sabe!


Hermione fez um muxoxo de impaciência e engoliu o último pedaço da sua torta de caramelo.


Harry e Rony fizeram o caminho até a cabana de Hagrid sem falarem muito. O céu ficava cada vez mais escuro à medida que eles caminhavam, e um vento enregelante começou a soprar. Parecia que uma tempestade estava à caminho.


Eles bateram na porta que se abriu quase que imediatamente.


—Meu Deus, já estão aqui? Eu só estava esperando vocês depois das três horas!


Harry e Rony entraram na cabana e agradeceram por ela ser quentinha e acolhedora.


—Não vou nem oferecer o bolo que fiz ontem, vocês devem estar de barriga cheia.


—Estamos, obrigado. – Rony disse, tentando se livrar de Canino que teimava em lamber suas orelhas.


—Mas então, me contem como foi o Baile ontem. Que beleza de manifesto, não? Soube que as fotos saíram não apenas no Profeta, como também em várias revistas!


—Isso é ótimo! – Rony disse.


Hagrid concordou com um aceno da cabeça.


—Sem dúvida. Mas tenho certeza que ainda não foi o suficiente para o Ministério reconhecer que Aquele-Que-Não-Deve-Ser-Nomeado está de volta. Talvez eles estejam esperando por uma aparição ou alguma coisa assim!


—Bem, é sobre uma aparição que viemos falar com você. – Harry introduziu o assunto.


—Uma aparição? Mas... Não é possível... não ele bem debaixo do nariz de Dum...?


—Não, não estamos falando de Você-Sabe-Quem. – Rony se apressou em dizer antes que Harry falasse o nome de Voldemort. —É que eu vi uma coisa esquisita ontem a noite, rondando o baile. Parecia uma pessoa, mas ao mesmo tempo nenhuma pessoa poderia ser feita de pedra... – ele murmurou muito mais para si mesmo do que para Hagrid.


—Uma pessoa feita de pedra, você está dizendo? – Hagrid pareceu perturbado.


—Rony, conte a ele exatamente o que foi que você viu. – Harry pediu ao amigo.


Rony respirou fundo e contou cada detalhe do ser estranho que viu perto do banheiro masculino no primeiro andar. Encorajado pela expressão de curiosidade de Hagrid, ele mencionou absolutamente tudo, desde as roupas displicentes até o perigo e ironia que pareciam exalar daquela criatura e o rosto que parecia ser feito de pedra, sem olhos, nem nariz e nem boca. Ao final do relato, Hagrid parecia um pouco aturdido.


—Tem certeza de que não era apenas uma gárgula, Rony?


—Absoluta. – ele disse, já esperando pela sugestão que a princípio também fora dada por Hermione e Harry. —Não era uma gárgula, e eu também não estava bêbado!


—Bem – Hagrid se recostou em sua cadeira. —Bem, talvez vocês devessem contar isso a Dumbledore. – ele disse, sério. —Criaturas estranhas rondando um baile de máscaras... Muito suspeito, muito suspeito.


—Mas Hagrid. – Harry começou —Queríamos saber se você nunca ouviu falar em nada parecido nesses anos em que esteve em Hogwarts.


Hagrid olhou pensativo de Harry para Rony e balançou a cabeça.


—Não... nunca ouvi falar em criaturas assim.


—Nem na Floresta Proibida? – Rony perguntou, esperançoso.


—Nem lá. Até onde eu saiba, apenas gárgulas encantadas podem demonstrar algum tipo de animação, mas fora isso, são apenas pedaços de pedra, não é?


Os três ficaram em silêncio por breves momentos.


—Sua amiga Hermione não sabe disso? Ela é inteligente, poderia ajudar.


—Eu contei a ela, mas ela não acreditou. Ainda acha que eu tinha bebido hidromel demais. – Rony respondeu, pesaroso.


—E as suas duas outras amigas, a Valentina e a Cecília?


Rony abriu a boca, esperançoso, mas Harry balançou a cabeça.


—Não sei sobre a Lia, mas a Tina têm escutado vozes humanas na ala da Sonserina desde a primeira noite que passou aqui. – Harry disse. —Ela já tem muito com o que se assustar sem precisar que adicionemos nada mais.


—Vozes humanas na ala da Sonserina, você disse? Como assim? Não estou entendendo...


Rony e Harry juntos explicaram a Hagrid a respeito das vozes misteriosas que Tina vinha dizendo que escutava todas as noites vindas do banheiro nas masmorras da Sonserina.


—Então eu acho que o melhor que vocês fazem é contar a Dumbledore.


Foi a vez de Harry balançar mais uma vez a cabeça, decidido.


—Não. Professor Dumbledore atualmente parece ocupado demais até mesmo para falar comigo.


—Você parece amargurado, Harry. O que houve? – Hagrid perguntou, preocupado.


—É só que... – Harry engoliu em seco —É só que... bem, já tentei falar com professor Dumbledore algumas vezes este ano e ele... ele tem me evitado.


—Dumbledore evitando um aluno? Pelas calças de Merlim, Harry! Dumbledore não evitaria um aluno que quisesse falar com ele, nem que esse aluno fosse Draco Malfoy.


Harry e Rony permaneceram em silêncio.


—Eu... eu vou pensar então em contar ao diretor. Afinal... er... afinal fui eu que vi a coisa. – Rony disse um pouco sem jeito.


Harry concordou com um aceno da cabeça. Mais alguns segundos de silêncio depois e Hagrid pigarreou, mudando o assunto para a área do Quadribol.


—Então, Harry, você sabe quando será o primeiro treino da equipe da Grifinória?


Parecendo aliviado com a mudança do rumo da conversa, Harry deu ânimo à conversa a respeito do time de Quadribol da Grifinória e em como Angelina parecia ser uma boa capitã. A tarde passou recheada de boas conversas e gargalhadas a respeito do assunto.


Quando o sol começou a desaparecer por entre as montanhas e circundavam os terrenos de Hogwarts, Harry e Rony se despediram de Hagrid e voltaram caminhando pelo terreno enregelado, de volta para o calor agradável do castelo.


A semana que antecedia o Natal passou com absurda velocidade e muita neve. Quando deram por si, a maioria dos alunos já estava preparando as malas para passarem o feriado de Natal com a família. Apenas alguns poucos alunos assinaram a lista que Profa. McGonagall preparara para todos aqueles que permaneceriam no castelo.


Valentina em muito pouco tempo arrumara uma pequena mala com todos os pertences que poderia vir a precisar durante os três dias que passaria em casa. Cecília, por outro lado, levou o dobro do tempo que Valentina julgava necessário para uma tarefa tão simples.


Ela já estava no hall de entrada, completamente envolta em seu pesado casaco de couro revestido de lã, o rosto parcialmente escondido por um cachecol, e nada dos amigos aparecerem. "Certamente Harry, Rony e Jorge estão esperando para descer junto com Mione e Lia." – pensou.


De repente, como vinha acontecendo desde o dia do baile de máscaras, Tina sentiu alguém segurar seu rosto com uma das mãos e lhe dar um beijo sensualmente demorado na bochecha. Como estranhamente também vinha acontecendo desde o dia do baile, Tina não fez movimentos para impedir Draco de beijá-la. Apenas olhou-o sem dizer nada, com uma expressão que seria inexpressiva se não fossem seus olhos azuis comicamente arregalados.


—Eu te deixo sem palavras toda vez que te beijo? Ai, Alves, isso já está perdendo a graça!


—O que é que você quer? – ela perguntou, dando um passinho para trás e se achegando mais para perto da sua mala, como se esta fosse um cão que pudesse defendê-la.


—Vim me despedir e desejar Feliz Natal para a minha namorada. Não que eu ache que não irei ver você no Natal, mas ainda assim... – Draco sorriu, sarcástico. —Bem, Feliz Natal, Alves.


Draco deu as costas, ainda sustentando aquele sorriso confiante quando Tina sussurrou "Feliz Natal" de volta.


Ele parou no primeiro degrau da escada e olhou para ela. Tina tentou desviar o olhar. Ainda sorrindo, Draco acenou com a cabeça e continuou a caminhar em direção às carruagens sem cavalos que o levaria até o Expresso de Hogwarts estacionado em Hogsmead.


—Eu acho que ele gosta de você, esse Malfoy. – uma voz sonhadora falou ao lado de Tina. Ela se virou e deu-se com Luna.


—Acabei de chegar. – ela disse, arregalando os olhos que também eram azuis, porém muito sonhadores.


—Eh, certo. – Valentina disse.


—Eu acho que você gosta dele também.


—Como?


—É tão simples. – Luna deu um sorriso amigável.


Valentina preferiu não questionar os argumentos sem pé nem cabeça de Luna, por isso, manteve-se calada.


Cecília chegou cinco minutos depois de mãos dadas com Jorge. Harry, Rony, Neville, Hermione, Fred e Gina chegaram logo atrás do casal, cada um carregando a sua mala. Valentina respirou aliviada por não ter que escutar sozinha mais dos comentários esquisitos de Luna.


—Você demorou esse tempo todo só para arrumar esta malinha! – Valentina censurou a amiga.


Cecília não deu resposta, estava muito entretida recebendo os beijos que Jorge lhe dava nas maçãs do rosto.


—Ah, vamos logo garantir uma carruagem para nós. Vem, Tina! Mione! – Gina exclamou, puxando as amigas.


Seguindo Gina, Harry, Rony e Neville também se apressaram. Dividiram-se em duas carruagens – Gina, Tina, Hermione, Neville e Fred apertaram-se em uma e Harry, Rony, Jorge, Luna e Cecília entraram em outra logo atrás.


A viagem de volta para Londres foi muito agradável. Dentro do Expresso de Hogwarts estava quentinho e seco, bem diferente do gelado e úmido que era do lado de fora. Divididos em dois vagões, os amigos jogaram snap explosivo, xadrez de bruxo, comeram varinhas de alcaçuz e bolinhos de abóbora, tudo regado a um chocolate quente bem cremoso. Volta e meia Rony e Hermione tinham que fazer a ronda pelos vagões, cumprindo suas tarefas de monitores, mas sempre voltavam muito rápido para a companhia dos amigos.


O Expresso só começou a perder velocidade quando já estava escuro e ainda mais frio. A plataforma 9 ½ estava quase tão cheia quanto no dia de volta à aulas e Sra. Weasley logo se fez avistar ao chegar correndo para distribuir abraços nos filhos e em Harry e Hermione.


—Ah, que bom! Estou tão feliz e em rever vocês! Estão todos bem? Ótimo. Nesses tempos turbulentos ninguém fica sossegado longe dos filhos...


—Nem me fale! – a mãe de Cecília exclamou, após um longo e apertado abraço na filha. —Eu estava com o meu coração na mão.


Valentina se aproximou também, segurando a mão de sua mãe. Seu pai vinha logo ao seu lado, estavam todos muito satisfeitos.


—Ah, essas são as suas novas amigas, Harry? Rony? – Sra. Weasley perguntou, sorridente.


Rony e Harry concordaram, mas Jorge era quem parecia mais satisfeito.


Muitas apresentações foram feitas em seguida. Os pais de Valentina e Cecília, que já se conheciam há muitos anos, acabaram ficando muito amigos do Sr. e da Sra. Weasley e combinaram de se encontrarem para um almoço de Natal na casa de Cecília. Valentina bateu um pouco pé para que o almoço fosse na casa dela, mas como as duas dividiam o mesmo muro de tijolinhos entre suas casas, não haveria grandes problemas em Tina encontrar os amigos no Natal.


—Feliz Natal!


Cecília acordou com uma exclamação conhecida, mas não abriu os olhos. Logo em seguida, a claridade da manhã fez com que lacrimejasse e, resmungando, ela virou para o outro lado da cama e enfiou a cara no travesseiro.


—Ah, sem preguiça desta vez! Estão todos aqui e já são onze horas da manhã! A que horas você acha que a gente vai almoçar?


A voz tão familiar de Tina fez Lia abrir os olhos. Sua primeira visão turva foi a da amiga segurando alguma coisa pequena e branca junto ao peito; depois ela viu Hermione se juntar a ela, vindo da janela; certamente havia sido ela quem abrira as cortinas. Cecília olhou para o pé de sua cama e se sentou de um pulo ao ver a pequena montanha de presentes.


—Ah, eu tinha quase me esquecido que hoje é Natal. Feliz Natal! – falou, esfregando os olhos.


—Feliz Natal pra você também! – Hermione disse, ansiosa e sentando-se na cama ao lado de Lia. —Eu não sabia o que comprar pra você, então... ah, espero que goste!


—Eu vou gostar. – Lia sorriu.


—Tive que ajudar a Mione com uns palpites... Mas foi Jorge mesmo quem me deu mais trabalho, ele não parava de me perguntar o que comprar para você! – Valentina falou.


Alguém bateu na porta e elas escutaram a voz de Gina perguntar do lado de fora:


—Ela já acordou?


—Sim. Entra aqui, Gina! – Valentina chamou.


Gina entrou, seus cabelos muito vermelhos combinando com o suéter cor-de-rosa seco que ganhara de presente da Sra, Weasley. Bichento veio junto, pulou no colo de Hermione e ficou olhando para Valentina com olhos fixos e astutos, miando baixinho.


—Não, Bichento. Ele ainda é muito pequenininho. – Hermione ralhou, coçando atrás das orelhas do gato.


Cecília olhou para Tina e pela primeira vez reparou o que era o que ela carregava junto ao peito com tanto carinho: um gatinho muito branco e frágil, certamente um filhote. Ele era gordinho e de pêlo lustroso, e os olhos pareciam duas gemas preciosas de tão azuis.


—Que lindinho! Presente de quem? – Lia perguntou, interessada.


—Ótima pergunta. Já perguntamos umas cinco vezes e ela não quis contar pra gente. – Gina disse, cruzando os braços.


Valentina olhou para as três amigas e corou furiosamente.


—Ah... eh, não faz diferença, faz?


—Faz toda diferença! – Gina disse. —Seja quem for, teve um ótimo gosto. Já reparou que os olhos dele são da mesma cor dos seus?


Valentina nada disse, apenas continuou fazendo carinho no gatinho que olhava tudo ao seu redor parecendo muito interessado. Tina permaneceu em silêncio; o gatinho em seu colo olhou para ela, miou e esticou uma patinha querendo pegar o seu nariz.


—Ah, foi... foi...


Ela olhou para todas e murmurou baixinho:


—Foi o Malfoy...


A reação foi imediata: Gina caiu na gargalhada e Cecília exclamou "AHA! Eu sabia!". Hermione foi a única que, de modo solene, tentou segurar o riso. Toda aquela reação era justamente o que Valentina mais temia.


—Ele te adora, Tina! Está mais do que na cara! – Lia riu-se. Gina ria tanto que seu rosto estava quase da cor dos seus cabelos.


Tina fechou a cara.


—Qual o nome dele? – Hermione perguntou, apontando para o gatinho.


—Lazúli.


—Bonito nome. – Gina disse, limpando as lágrimas dos olhos.


—Onde você viu tanta graça? – Valentina perguntou, rabugenta.


Gina nada respondeu, a pergunta de Valentina só serviu para fazê-la voltar a rir. Hermione sentiu-se no dever de dar uma explicação para a amiga.


—É que já faz um tempo que nós desconfiamos que Draco Malfoy tem uma quedinha por você. E que... e que você também...


—Bem, ele é um idiota, não é? – Valentina cortou, parecendo furiosa. —Ele pode ter todas as quedinhas que quiser por mim, que eu jamais poderia imaginar em um dia aceitá-lo! Seria uma ofensa, inclusive para vocês!


—Er... – Hermione fez, insegura.


—Ainda mais quando Harry é um dos meus amigos! Draco e Harry nunca foram bons amiguinhos até onde eu saiba. Nem você, e nem Gina, e nem Rony, e nem...


—Não, realmente... Ah, desculpe, Tina! Não queríamos ofender você. – Hermione falou, amuada.


—Está tudo bem. – Valentina falou, solene, sentando-se do outra lado de Cecília.


As três ficaram em silêncio, olhando Lia desembrulhar seus presentes. Assim como as amigas, ela também ganhara de Sra. Weasley um suéter vermelho com sua inicial gravada em dourado e uma caixa de frutas cristalizadas do Sr. Weasley. Jorge lhe presenteara com um perfume cítrico o qual ela imediatamente passou atrás das orelhas e no pescoço.


Foi com alegria que todos de arrumaram para o almoço de Natal que a mãe de Cecília preparava com esmero. O cheirinho de comida brasileira se espalhava pela casa, fazendo todo mundo salivar. Cadeiras extras foram colocadas ao redor da mesa e entre o tilintar de talheres e conversas, Harry, em especial, sentiu que aquele era o melhor Natal de sua vida.

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