Liberdade e Conseqüência



Harrycliffe apareceu no pátio da escola segurando Edwiges. Tudo estava coberto de neve. Harrycliffe soltou a coruja, que saiu voando em direção ao sol. Três segundos contados mais tarde, toda a neve desapareceu e o sol voltou a brilhar, pois chegara o dia da tão esperada liberdade de Hemmaione Grantson.
– Então, Harrycliffe – disse Runpert estirado no tapete da Sala Comunal – Hemmaione sai de Azkaban esta noite. Eu vou lá, e você?
– É claro que eu vou – respondeu o amigo prontamente – Todos os jornais do mundo bruxo só falam nisso, a saída da prisão vai estar lotada de fotógrafos. Você acha que eu ia perder essa chance de aparecer por lá agora que a Hemmaione é uma estrela internacional? Bobinho!
– Mas isso significa que você não está nem um pouco preocupado com o estado dela? Azkaban não é exatamente o melhor lugar do mundo. É claro que deve ter valido a pena, pois ela pode repensar em tudo que fez e provavelmente se arrependeu...
– E o que é que ela tinha pra repensar mesmo? – perguntou Harrycliffe distraído enquanto analisava suas unhas feitas há pouco.
– Deixa pra lá. O que importa é que nós dois vamos, certo?
– Vão para onde?
Dois relâmpagos foram vistos através da janela e uma musiquinha de suspense foi ouvida ainda que não houvesse qualquer objeto no local que pudesse originar aquele som. Lilá havia se aproximado sorrateiramente do local e agora observava os dois com um olhar desconfiado.
– Oi, a-amor – gaguejou Runpert – Nós estávamos aqui combinando de ir buscar Hemmaione na saída da prisão.
– Ah, ótimo. Eu vou com vocês – respondeu a garota com toda a calma do mundo.
– Mas, amor, acho que você não ouviu direito – disse Runpert nervoso – Nós vamos até Azkaban buscar Hemmaione. Hemmaione será solta esta noite.

– Sim, meu querido, eu ouvi muito bem. Mas por que essa surpresa? Depois que Hemmaione foi presa eu tive muito tempo para repensar minhas atitudes e acabei percebendo que todas aquelas picuinhas que havia entre nós não passavam de besteiras e infantilidades sem tamanho. E é por isso que eu faço questão de acompanhar vocês hoje para pedir perdão a Hemmaione.
– Ai, Lilá! – choramingou Harrycliffe emocionado – Como você está mudada, amiga!
– É, Harrycliffe, eu deixei de ser aquela pessoa fútil – Lilá falava isso enquanto retocava seu batom com o auxílio do espelhinho de bolso em forma de coração – Você acha que essa cor combina comigo?
– Sem dúvidas – sorriu o garoto dos olhos azuis.
– Bom, já que estamos combinados é melhor eu ir agora. Não quero me atrasar, tenho hora marcada no salão de beleza! Vou fazer cabelo, pés e mãos, depilação total e maquiagem. Ah, e antes disso preciso me encontrar com meu pessoal trem!
– Seu o quê?!
– Pessoal trem, amor, aquele homem musculoso que diz os exercícios que eu preciso fazer! Agora, se me permitem – ela deu um beijo demorado em Runpert e foi embora pelo buraco de Pamela Anderson.
– Essa vaca está aprontando alguma coisa – murmurou Lissa que escondida nas sombras assistiu toda a cena.
Minutos depois, ela Pedro e Ademilton estavam reunidos no canto do quarto conversando sobre o suposto plano malévolo de Lilá.
– Clarissa, você não acha que está exagerando um pouquinho? – perguntou Ademilton irritado – Você não tem provas de absolutamente nada!
– Mas, Adê...
– Mas nada! Você pegou implicância da garota porque ela começou a namorar com Runpert, e agora quer nos convencer de que ela não presta.
– Claro que não! Eu realmente acho que ela está aprontando alguma coisa. Essa mudança repentina não me convenceu!

Mas, Lissa – disse Pedro – Depois daquela confusão no capítulo musical brega, vergonhoso e incrivelmente desnecessário, a garota não fez mais nada de errado.
– Mas isso foi há apenas quatro páginas atrás e ela não teve mais cenas depois disso até agora! – berrou Lissa com raiva.
– Clarissa, você já engraxou nossos sapatos e passou ferro nas nossas fardas? – perguntou Ademilton mudando de assunto.
– Não, ainda não. Eu ia...
– Vai trabalhar!
– Mas...
– AGORA!

A noite chegou muito rápido. Ninguém sabia, é claro, que haviam tirado todas as aulas daquele dia na edição das filmagens, coisa que faziam com muita freqüência. Às oito horas em ponto, Harrycliffe e Runpert desceram as escadas do dormitório e ficaram esperando Lilá se arrumar. E ficaram esperando. E esperando. E esperando.
– Lilá está demorando muito! – comentou Runpert quase uma hora depois.
– Calma, amigo! – disse Harrycliffe, como sempre, sorridente – Tenho certeza de que ela já está vindo. Ah! Viu só, eu não disse? – e apontou para o alto da escadaria de onde Lilá descia em direção aos dois.
– Amor – chamou Runpert – Nós vamos a alguma festa depois de pegarmos Hemmaione na prisão e eu esqueci?
– Não, por quê? – perguntou confusa.
– É que talvez possa existir uma pequena chance de você por algum acaso estar um pouquinho arrumada demais. Mas eu posso estar enganado!
– Ora, Runrun! Essa é uma das roupas mais simples que eu tenho!
Lilá estava vestida para um evento de luxo. Usava uma blusa de seda preta com gola alta feita de pele de zebra e botões de prata, uma sala balonê preta de tafetá, sapatos de salto alto prateados, maquiagem muito carregada e brilhante e os cabelos soltos ao custo de três horas ininterruptas de chapinha.
– Hello, people! – cantarolou Harrycliffe – Se vocês dois continuarem com essa discussão boba, nos nunca vamos chegar a tempo para o evento!

Os três foram até o jardim, onde o elfo Dobby os aguardava ansioso com a limusine pronta para partir.
– Para onde, meu senhor?
– Para Azkaban, Dobby! E bem rápido – acrescentou com um tom dramático.

A entrada da prisão – que não mais ficava no meio do mar, mas no topo de uma montanha – não podia estar mais tumultuada. O dobro de repórteres que haviam comparecido ao evento nas favelas estava ali. Fãs enlouquecidos de Hemmaione erguiam cartazes enormes com a clássica capa da revista onde a garota aparecia atrás das grades. Três ou quatro fãs se uniram e fizeram surgir no céu em gigantescas letras de fogo a frase “Leave Hemmaione Alone!”.
O caos estava instalado. Lilá, Runpert e Harrycliffe conseguiram se espremer no final do corredor humano formado no topo da montanha. E apesar do fato de que nenhum dos presentes fazia a mínima idéia de como havia conseguido chegar tão alto sem a ajuda do material de alpinismo necessário, todos gritavam histéricos e se debatiam para ver a estrela daquela noite.
– Runpert, meu bem – berrou Lilá para ser escutada no meio da multidão – Acho que vi uma velha amiga indo naquela direção! Vou falar com ela e já volto!
– Certo – gritou Runpert de volta – Mas não demore! Hemmaione vai ser solta a qualquer momento!
– Não se preocupe! Estarei aqui no momento certo!
Dois minutos depois a torre mais alta de Azkaban foi iluminada por uma intensa luz rosa e a silhueta de Hemmaione apareceu com os braços erguidos para os céus. Bombas explodiam e purpurina era atirada por toda parte enquanto os fãs iam à loucura.
– Olá, meus queridos! – saudou a voz de Hemmaione magicamente ampliada – Vocês sentiram saudades de mim?
A multidão berrava e pulava freneticamente em resposta.
– Paz e amor para todos!

E todos se calaram instantaneamente, fazendo com que a montanha mergulhasse em um silêncio mortal. Hemmaione desceu flutuando da torre a pousou na porta da prisão. Seu rosto estava tranqüilo e seus cabelos estavam presos em uma trança simples. Ela usava uma calça de algodão e um casaquinho jeans muito discreto. Parecia outra pessoa.
– Senhorita Hemmaione! Senhorita Hemmaione! – gritava um repórter para ser notado, o que não era mais necessário já que ninguém mais pronunciava uma só palavra.
– Sim? – a voz da garota ainda estava enfeitiçada.
– Pode dar uma declaração para a “Fazendo a Diferença”?
– Claro que sim, meu caro senhor. Apenas diga o que quer saber.
– Ah... obrigado, senhorita. O que a senhorita tem a dizer sobre o período que passou presa?!
– Tudo que posso dizer é que aproveitei o tempo que me foi dado para fazer uma viagem introspectiva para dentro do meu eu interior. Penetrei no âmago da minha alma e tive uma revelação belíssima. Irmãos e irmãs aqui presentes! Eu encontrei Merlin! E ele me fez enxergar a luz! E é Merlin que vai me guiar a partir deste momento durante todos os dias da minha vida! Aleluia!
– Mas essa – murmurou o repórter – foi a coisa mais... mais... mais tocante que eu já ouvi! Viva Hemmaione! – gritou para todos.
– VIVA! – explodiu a multidão que voltava a soltar fogos agora que o choque havia passado.
– Viva o Mestre Merlin!
– VIVA!
– Viva a paz mundial!
– VIVA!
– Gente, gente! – gritava um fã chamando a atenção de todos – Acho que devemos nos sentar na montanha e meditar até encontrarmos Merlin também! Vamos entoar o mantra!
Todos sentaram de pernas cruzadas, fecharam os olhos e começaram a cantar juntos.
– ÊÊÊ-MÁÁÁ! ÊÊÊ-MÁÁÁ! ÊÊÊ-MÁÁÁ!
Hemmaione avistou Runpert e foi ao encontro do amigo com um enorme sorriso no rosto. Quando já estava quase o alcançando, Lilá surgiu do nada e deu um beijo na boca do rapaz.

– Mas, Runpert! – falou Hemmaione chocada – Eu não entendo! O que está acontecendo aqui?
– Muito simples, sub-celebridade! Você perdeu! Só isso. E este – Lilá apontou para o rosto de Runpert – Este foi o meu prêmio.
– Na verdade, minha querida, isso só significa que você é uma vadia sem um mínimo de classe ou respeito próprio que se aproveitou de um momento de fraqueza do meu amigo para seduzi-lo com seus golpes baixos e obscenos! – Hemmaione falou isso completamente imóvel e serena.
– Olha aqui, Hemmaione, isso tudo é inveja porque eu tenho o que você nunca vai ter! – e dizendo isso, meteu a mão nas partes de Runpert – E é todo meu!
– CHEGA! – berrou Runpert empurrando Lilá para trás – EU NÃO AGÜENTO MAIS! – todos iam aos poucos despertando do transe e os fotógrafos se reuniam agora em volta de Hemmaione, Runpert e Lilá – EU NÃO SOU UM OBJETO PARA SERVIR COMO UM MALDITO PRÊMIO NESSA DISPUTA RIDÍCULA DE VOCÊS! EU QUERO MAIS É QUE AS DUAS SE EXPLODAM! ERA PARA ISSO QUE VOCÊ QUERIA VIR, LILÁ? PARA ARRUMAR MAIS CONFUSÃO E CONSEGUIR UM LUGAR NAS REVISTAS TAMBÉM? VOCÊ CONSEGUIU, AGORA APROVEITE!
Todos os repórteres mantinham microfones, câmeras a máquinas fotográficas apontadas para Runpert.
– FILMEM ELA! – berrou com mais raiva do que nunca, apontando para Lilá e os repórteres obedeceram.
– E você, Hemmaione – Runpert parou de gritar – Eu estou muito decepcionado com você e com todas as maluquices que você anda fazendo. Acho melhor a gente se afastar por um tempo.
Nesse meio tempo, Harrycliffe havia levado para o castelo um repórter musculoso prometendo contar tudo que sabia sobre Hemmaione em troca de... prefiro não comentar! Os dois foram de limusine com Dobby, e Runpert foi obrigado a ir embora sozinho.
– Runpert, espera! Não faz isso comigo, eu não tive culpa! – chorava Hemmaione.
– Amor! Runrun! – berrava Lilá aos prantos – Desculpa ter dito que você era um prêmio, eu sinto muito! Amor!
Runpert parou no meio do caminho e se virou em câmera lenta.

– Não quero saber de suas desculpas, Lilá. E tome isso de volta – Runpert tirou uma pesada corrente de ouro do pescoço e atirou o objeto no chão – Não sou bicheiro nem gangster para usar essa coisa!
Dizendo isso, Runpert estirou o braço para o ar e subiu no Noitebus Andante que surgiu imediatamente.
Lilá se abaixou, pegou a corrente e fuzilou Hemmaione com o olhar.
– Viu o que você fez, Grantson?
– Eu fiz? Mas a pessoa tem que ser muito descarada mesmo! Recuso-me a passar por isso mais uma vez – e foi embora na sua limusine branca.
Todos os repórteres e fãs saíram correndo desesperados atrás do veículo, deixando Lilá completamente sozinha no topo da montanha, carregando aquela corrente de gosto duvidoso.

Uma semana já havia se passado e Runpert ainda não estava falando com Lilá nem com Hemmaione. Um dia, quando os alunos estavam reunidos no Grande Salão, Gambondore levantou capengando de bêbado para dar um de seus habituais recados.
– Eu juro pelas barbas da minha avó que não sei como vocês têm tanta sorte! Mas eu acabei de receber um comunicado oficial da Magnânima Elizabeth Alexandra Mary of Windsor II, Rainha e Chefe de Estado do Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte, de Antígua e Barbuda... que se dane! Eu não vou gastar minha saliva lendo tudo isso! - Gambondore amassou a carta que estava lendo e queimou o papel com a ponta da varinha.

É o seguinte, a velha convidou a gente para a sua festa de 55 anos de reinado, ou seja, as Bodas de Esmeralda. Vocês não mereciam ir, é mais do que óbvio, mas se vocês não forem eu também não poderei ir, seria ruim para a minha imagem. Então eu resolvi liberar vocês. Mas eu digo uma coisa! Se vocês fizerem qualquer coisa no Palácio que destrua a minha imagem como o melhor diretor que esta cabeça de porco já teve não vai sobrar varinha sobre varinha. Por enquanto é só isso, podem sair pra comprar os badulaques que vão precisar para comemoração. Ah, só mais uma coisa! Eu não preciso lembrar que os nerds, gordos, feios, pobres e as demais classes desfavorecidas estão totalmente proibidos de participar, não é mesmo? Seria uma vergonha sem tamanho para a escola.
– Nossa! – os olhos de Hemmaione brilharam – É a primeira vez que Gambondore fala alguma coisa sensa... triste, horrível, deprimente! – corrigiu ao perceber a expressão de Runpert – Ele não pode julgar os alunos dessa maneira! Quero dizer, olhem só para Susana Bones! Ela não tem culpa de nasceu horripilante e gorda! – Hemmaione lançou um olhar esperançoso para Runpert, mas ele tinha a cabeça virada em outra direção.
Depois do café-da-manhã, que devido à contenção de despesas consistia apenas em uma torrada e um copo de suco de laranja ralo por cabeça, os alunos foram para Newyorksmead gastar seus galeões – aqueles que faziam parte das classes desfavorecidas ficaram trancafiados nas masmorras para que não tentassem sair escondidos.


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