Maio



Gina chegou ao pub Hogan’s se sentindo muito melhor que no dia anterior, mas seus reflexos ainda estavam um pouco mais lentos que o normal. Suas ressacas pareciam estar ficando gradualmente piores a cada ano, e a da noite anterior levara a medalha de ouro. Ela tinha saído para dar uma caminhada da orla de Malahide até Portmarnock mais cedo e a brisa fresca tinha ajudado a desanuviar sua mente um pouco. Ela havia visitado os pais na noite de domingo, quando eles lhe presentearam com um lindo vaso de cristal. Aquele havia sido um dia relaxante e maravilhoso ao lado de seus pais e ela quase teve que se arrastar do sofá macio para o Hogan’s.

O pub era um popular prédio de três andares no centro da cidade, e mesmo durante a semana o lugar ficava lotado. O primeiro andar era uma boate da moda que tocava as músicas de sucesso da estação. Era onde as pessoas jovens e bonitas iam para lançar moda. O térreo era um pub inglês muito tradicional para os mais velhos (onde normalmente iam homens velhos que ficavam pendurados no balcão segurando bebidas e refletindo sobre a vida). Algumas noites na semana, havia uma banda de música inglesa tradicional que tocava e era muito popular tanto com o pessoal mais velho quanto com os mais novos. O porão era escuro e onde as bandas geralmente tocavam. A clientela era feita apenas de estudantes e Gina parecia ser a pessoa mais velha ali além dos irmãos e outros dois homens. O bar era basicamente um balcão no canto do estabelecimento, rodeado por uma multidão de jovens estudantes vestidos com jeans rasgados e camisas estilosas, todos empurrando uns aos outros e gritando para serem atendidos. O pessoal que trabalhava no bar também aparentava ainda estar na escola e estava correndo pelo lugar a mil por hora, cada um em uma direção, e pingando como uma torneira.

O porão era abafado e sem ventilação ou sequer ar-condicionados, e Gina teve dificuldade em respirar naquela atmosfera fumarenta. Praticamente todos ali pareciam estar fumando e os olhos da ruiva já protestavam. Gina temia o estado em que estaria dali a uma hora, apesar de parecer ser a única incomodada. Ela acenou para Fred e Jorge para que eles soubessem que ela estava ali mas decidiu não ir falar com eles, já que estavam rodeados por um grupo de garotas. Ela não ia querer dar uma de irmãzinha dependente e arruinar o estilo deles.

Gina havia perdido toda aquela vida de estudante quando era mais nova. Ela havia decidido não fazer faculdade depois da escola e começou a trabalhar como secretária, mudando de emprego em um período de meses até que largou o trabalho horrível que tinha para passar o tempo com Draco enquanto ele estivera doente. De qualquer forma, ela duvidava que teria ficado lá por mais muito tempo mesmo. Draco tinha se formado na conceituada universidade de Londres, mas ele nunca saía muito com os colegas; ele preferia sair com Gina, Laura, Blaise, Luna e quem quer que a última estivesse namorando na época. Olhando para todo mundo, Gina não sentiu que tivesse perdido nada muito especial.

Finalmente Fred e Jorge conseguiram se desfazer do grupinho de garotas e ir até Gina.

“Olá, Srs. Populares, me sinto lisonjeada por ter sido a próxima escolhida para falar com os senhores!” Todas as meninas olharam Gina de cima a baixo e se perguntaram que diabos os gêmeos viam naquela mulher mais velha que elas.

Jorge riu e esfregou as mãos. “Esse meio artístico é ótimo, parece que vamos ter um pouquinho de ação essa noite,” ele disse metido.
“Como sua irmãzinha mais nova, é sempre um prazer ser informada sobre isso,” Gina respondeu sarcasticamente. Naquele momento, naquele lugar, ela não via como poderia ter alguma conversa com os gêmeos. Especialmente porque nenhum deles dizia nada e enquanto Fred olhava para as mulheres passando, Jorge sempre ficava olhando pelo lugar como se procurasse por algo ao invés de olhar para ela.

“Bem, por que não vão paquerar aquelas garotas ao invés de ficar aqui com a caçula, hein?”
“Não, não é nada disso,” Jorge se desculpou, percebendo a impressão que deixara. “É que disseram que talvez um cara de uma gravadora viesse ver os rapazes tocarem hoje.”

“Nossa, que legal!” Os olhos de Gina se arregalaram de animação pelo irmão. Obviamente aquilo ia ser importante para ele. Que bom, ela pensou, vamos ver se o Jorge relaxa um pouco. Ela deu uma boa olhada pelo porão e tentou encontrar alguém que se parecesse com alguém de uma gravadora. Como ele seria? Finalmente seus olhos encontraram um homem que parecia ter mais ou menos sua própria idade. Ele estava vestindo uma jaqueta de couro preta, jeans, camisa e sapatos também pretos e estava em pé com as mãos nos quadris, olhando para o palco. É, definitivamente era ele o cara. Parecia ter estado bem ocupado pela cara de quem não dormia há dias e pelo maxilar contraído.

“Ali, Jorge!” Gina sobrepôs sua voz ao barulho e apontou para o homem. O sorriso de Jorge sumiu quando ele obviamente reconheceu o sujeito. “Não, é só o... Danny!” ele gritou e logo em seguida assoviou para chamar sua atenção.

Danny se virou para achar quem o chamava e caminhou até eles. “Oi, cara,” Jorge disse, apertando sua mão e apresentando-o logo depois a Fred.
“E aí, Jorge, os meninos já estão prontos?” Ele parecia estressado.
“É, acho que sim,” Jorge acenou com a cabeça.
Depois de um breve momento em que Jorge teve de jurar que tudo estava indo bem, Danny pareceu convencido.
“Ótimo.” O rosto dele relaxou e ele se virou para cumprimentar Gina. “Desculpe por ignorá-la, sou Daniel.”
“Prazer, meu nome é Gina.”
“Ah, foi mal,” Jorge, que já havia iniciado uma conversa com Fred, interrompeu. “Gina esse é o dono daqui; Daniel, essa é a minha irmã.”
“Irmã? Uau, de igual vocês só tem o cabelo.”
“Graças a Deus,” Gina murmurou baixinho para que Fred ou Jorge não ouvissem e Daniel riu.
“Ei, Jorge, tá na hora!” gritou um garoto de cabelo azul.
“Vejo vocês depois. Vem, Fred,” e ele saiu correndo.

“Então, seu sobrenome é Hogan?” ela disse, se virando para encarar Daniel.
“Bem, não, na verdade, sou um Connolly,” ele sorriu. “Eu assumi esse pub faz só algumas semanas.”
“Ah.” Gina estava surpresa. “Não sabia que tinha sido vendido. E você pretende mudar então para Connolly’s?”
“Não tenho dinheiro para fazer o letreiro, é meio grande.”
Gina riu. “Bem, todos conhecem o nome Hogan’s a esse ponto; seria provavelmente idiota mudar.”
Daniel concordou com um aceno. “Esse é o motivo, na verdade.”

De repente, Rony apareceu na entrada e avistou Gina. “Desculpe, estou atrasado. Perdi alguma coisa?” ele disse, dando-lhe um beijo e um abraço.
“Não, a banda vai entrar no palco agora. Rony, este é Daniel, o dono.”
“Prazer,” Daniel disse enquanto os dois apertavam as mãos.
“Eles são bonzinhos?” Rony perguntou a ele indicando o palco com a cabeça.
“Para dizer a verdade, nunca os ouvi tocar,” Daniel disse preocupado.
“Caramba, que coragem a sua!” riu-se Rony. “Ei, eu reconheço alguns rostos por aqui e a maioria é menor de idade,” ele acrescentou passando os olhos pela multidão.

Uma garota vestida com (o quê mais?) jeans rasgados e um top passou devagar por Rony com um sorriso incerto no rosto. Ela colocou o indicador sobre os lábios como que dizendo a ele para ficar quieto. Rony sorriu e acenou.

Gina olhou para o irmão questionadora. “O que foi isso?”
“Ah, eu sou professor dela. Ela só tem dezesseis ou dezessete anos. Mas é uma boa garota.” Rony acompanhou a menina com o olhar e disse, “Mas é melhor ela não chegar atrasada na aula amanhã.”

Gina observou a menina virar uma dose de bebida com os amigos, desejando que tivesse tido um professor como Rony na escola; todos os alunos pareciam adorar ele. E era fácil saber por quê; ele era muito amável.
Depois de Daniel oferecer e voltar do balcão com bebidas para Gina e Rony, a banda começou a tocar. O som realmente não fazia o tipo de Gina e era tão alta e barulhenta que ela achou impossível ter como dizer se eles eram bons. Depois de quatro músicas, a ruiva já estava cheia daquilo; ela abraçou o irmão e beijou-o na bochecha. “Diga aos gêmeos que fiquei até o final!” ela gritou. “Foi um prazer conhecê-lo, Daniel! Obrigada pela bebida!” ela berrou e fez o caminho de volta para a civilização e o ar fresco.

Seus ouvidos pareceram zumbir o tempo todo durante a ida para casa. Eram dez horas quando ela chegou lá. Apenas mais duas horas até Maio. E aquilo significava que ela poderia abrir o envelope.

Gina se sentou nervosa à mesa da cozinha, batucando na madeira com as pontas dos dedos. Ele bebeu sua terceira xícara de café de um gole só e descruzou as pernas. Ficar acordada por mais apenas duas horas estava se provando ser mais difícil do que ela pensava. Ela bateu o pé por debaixo da mesa sem nenhum ritmo em particular e então cruzou as pernas novamente. Eram onze e meia. Ela tinha o envelope na mesa, bem à sua frente, e quase podia ver o papel botar a língua para fora e cantar “Na-na na na na-na!”

Ela pegou o envelope e passou a mão livre sobre ele. Quem saberia se ela o abrisse mais cedo? Laura e Blaise provavelmente tinham esquecido que existia o envelope e Luna devia estar acabada depois do estresse de sua ressaca de dois dias. Ela poderia facilmente mentir se eles alguma hora perguntassem se ela havia trapaceado, mas ela sabia que eles nem se importariam. Ninguém saberia e ninguém se importaria.

Mas aquilo não era verdade.

Draco saberia.

Cada vez que Gina segurava os envelopes, ela sentia uma ligação com Draco. Nas últimas duas vezes, sentira como se ele estivesse sentado bem ao seu lado e tivesse rido das suas reações. Sentia como se estivessem jogando um joguinho juntos mesmo que estivessem em dois mundos diferentes. Mas ela podia sentir ele, e ele saberia se ela trapaceasse, ele saberia se ela desobedecesse as regras do jogo deles.

Depois de uma outra xícara de café, Gina estava agitadíssima. O ponteiro do relógio parecia andar em câmera lenta, mas a meia-noite uma hora chegou. Mais uma vez ela virou lentamente o envelope e saboreou cada momento do processo. Draco estava sentado em sua frente na mesa. “Vá em frente; abra!”

Ela cuidadosamente rompeu o lacre e correu os dedos por ele, sabendo que a última coisa que tocara ali fora a língua de Draco. Ela puxou o cartão para fora e abriu-o.



Vá em frente, Disco Diva! Encare o seu medo de karaokê no Club Diva este mês e, nunca se sabe, pode até ganhar uma recompensa...

PS, Eu te amo...




Ela sentia Draco observando-a e os cantos de seus lábios vermelhos se curvaram em um sorriso e ela começou a rir. Draco ria junto com ela. Gina ficava repetindo “sem chance!” sempre que recuperava o fôlego. Finalmente, ela se acalmou e anunciou para o vento, “Draco! Seu safado! Não há absolutamente nenhuma chance de eu fazer isso!”

Draco riu mais alto.

“Isso não é engraçado. Você sabe o que acho disso e me recuso a fazê-lo. Não, não. Sem chance. Não vou fazer.”
“Você tem que fazer isso, você sabe,” riu Draco.
“Eu não tenho que fazer isso!”
“Faça por mim.”
“Não faço por você, por mim ou pela paz mundial. Eu odeio karaokê!”
“Faça por mim,” ele repetiu.

O som do telefone fez Gina pular de susto na cadeira. Era Laura. “Certo, são meia-noite e meia, o que dizia? Blaise e eu estamos loucos para saber!”
“O que te faz pensar que eu o abri?”
“Ha!” Laura riu. “Vinte anos de amizade me qualificam como expert em você; agora vamos, fale o que ele diz.”
“Não vou fazer isso,” Gina disse decidida.
“O quê? Não vai nos contar?”
“Não, eu não vou fazer o que ele quer que eu faça.”
“Por quê, o que é?”
“Ah, só a tentativa patética do Draco de ser engraçado,” ela atirou para o teto.
“Oh, estou intrigada agora,” Laura disse, “conte.”
“Gina, fala logo, o que é?” Blaise estava na mesma linha no telefone do andar de baixo.

“Tá bem... O Draco quer... que eu... cantenumkaraokê,” ela disse depressa.
“Hã? Gina, não entendemos uma palavra do que disse,” Laura confessou.
“Não, eu entendi,” interrompeu Blaise. “Acho que ouvi algo sobre um karaokê. Estou certo?”
“Sim,” Gina respondeu como uma garotinha ousada.
“E você tem que cantar?” perguntou Laura.
“Siiiim,” ela disse devagar, hesitando. Talvez se não falasse aquilo não tivesse que acontecer.

Os outros dois explodiram em gargalhadas tão altas que Gina teve que rapidamente afastar o telefone do ouvido. “Me liguem de novo quando vocês calarem a boca,” ela disse zangada, desligando.

Alguns minutos depois, eles ligaram.

“Sim?”
Ela ouviu Laura soltar um ronco alto por prender o riso, dar mil risadinhas e então a linha ficou muda.
Dez minutos depois ela ligou de novo.
“Sim?”
“Certo.” Laura tinha um tom extremamente sério, daqueles do tipo vamos-logo-ao-que-interessa. “Desculpe, estou bem agora. Não olhe para mim, Blaise,” Laura disse quase rindo para o marido em algum lugar perto dela. “Desculpe, Gina, mas eu fico pensando na última vez em que você -”
“É, é, é,” ela interrompeu, “você não precisa revirar isso de novo. Foi o dia mais constrangedor da minha vida, então eu certamente lembro dele. É por isso que não vou obedecer o Draco.”
“Ah, Gina, você não pode deixar uma coisinha assim te vencer!”
“Bem, se aquilo não “vence” alguém, então essa pessoa é certamente louca!”
“Gina, foi só uma quedinha...”
“Sim, obrigada! Lembro-me muito bem! De qualquer forma, nem sei cantar, Laura; acho que esclareci bastante isso da última vez!”

Laura estava muito quieta.

“Laura?”
Ainda silêncio.
“Laura, ainda está aí?”
Não houve resposta.
“Laura, você estaria rindo?” Gina perguntou desconfiada.

Ela ouviu um pequeno guincho e a linha ficou muda novamente.
“Que amigos maravilhosamente apoiadores eu tenho,” ela murmurou baixinho.

“Ah, Draco!” Gina gritou. “Achei que você deveria estar me ajudando, não me transformando numa pilha de nervos!”

Ela dormiu muito pouco aquela noite.


**

Espero que tenham gostado... Em breve vocês vão saber o que realmente aconteceu com a pobre da Gina no karaokê. Ah, e MIL DESCULPAS pela demora desse último capítulo... Prometo que não acontece mais!

Beijooooooo!

Sofi

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