A caminho de Stonehenge



OS PASSOS LEVES SOAVAM MAIS como um farfalhar no piso antigo de madeira, talvez para não chamar a atenção ou, mais possivelmente, por ser um atributo desejável naquela espécie, que se sentia feliz em viver apenas para servir. A porta do dormitório, no pavimento superior d’A Mui Antiga e Nobre Casa dos Black’, se abriu lentamente, com um breve ranger das dobradiças, e a pequena criatura de longas orelhas pendentes sobre os ombros adentrou ao recinto: seus enormes olhos se fixaram na imagem de um corpo deitado de bruços sobre a cama, com os braços estendidos e os despenteados cabelos loiros a lhe cobrirem parcialmente a face.

Winky aproximou-se, redobrando a sutileza de sua presença, e observou por uma fração de segundo aquilo que seus olhos lhe mostravam, então suas orelhas se levantaram em um sinal de apreensão: havia algo errado! Ela esticou uma das mãos para tocar a parte mais próxima daquilo que enxergava sobre a cama, mas ao seu toque a imagem se desfez, dissipando-se como fumaça.

Estupefaça!

Ela não teve tempo de reação: o raio de luz vermelha cortou a extensão do aposento e atingiu-a nas costas, derrubando-a inerte sobre o local onde, até poucos segundos atrás, descansava a imagem de Draco Malfoy.

O bruxo adolescente de sangue-puro saiu de seu esconderijo nas sombras, logo ao lado da porta por onde o elfo acabara de entrar, mantendo sua varinha em punho.

— Animal imbecil! – disse ele com desdém, olhando enojado para o pequeno corpo desfalecido à sua frente e, aproximando-se mais, enfiou a outra mão sob o colchão de plumas e retirou dali o pedaço de pergaminho que o serviçal da família Black lhe entregara pouco tempo atrás.

A um gesto de sua varinha o bilhete se incendiou, mas o rapaz orientou caprichosamente as chamas, de modo que alguns pontos vitais da mensagem permanecessem intocados, deixando os pedaços caírem, em seguida, sobre a tapeçaria, de modo a parecer que foram inocentemente esquecidos ali.


CRAQUE! – o som típico de alguma coisa desaparatando se fez ouvir além da porta fechada, o sonserino se sobressaltou e colocou-se em posição de combate, seu corpo voltado em direção à entrada do aposento.
— Winky! Menino Malfoy! – a voz esganiçada de Dobby ecoou surdamente, enquanto as dobradiças da porta rangiam, outra vez, para permitir a entrada de mais um elfo no cômodo.

Estupefaça!

Novamente o jato de luz vermelha jorrou da ponta da varinha do bruxo, fazendo com que também esta criatura caísse estuporada ao chão. Os olhos cinzentos do rapaz varreram o corredor além da porta, tão logo saltara sobre o corpo do elfo e atirara-se em direção à porta da rua: nada! A casa estava vazia! Se o elfo tinha ido chamar o “Santo Potter”, este demoraria ainda algum tempo para chegar até lá – tempo suficiente para que ele alcançasse os jardins do Largo Grimmauld e aparatasse para o destino que havia sido traçado para ele pelo Lord das Trevas.

* * *


As formações rochosas que se erguiam aleatoriamente ao longo do pequeno platô, formavam breves muralhas de rocha maciça que lembravam os corredores de um tosco labirinto, as sombras projetadas pela luz trêmula do lusco-fusco poderiam atiçar a imaginação de um ser humano comum, de um simples mortal, mas não da criatura altiva, e detentora de um poder inigualável, que caminhava em direção a uma elevação vulcânica que se destacava mais ao centro e atingia uma grande altura, destoando do restante da paisagem árida e onde, quase em seu topo, se avistava uma pequena caverna incrustada na rocha, de onde com toda certeza se poderia avistar de forma privilegiada toda a amplidão da área ao redor.

Lord Voldemort, como era conhecido o mais terrível bruxo das trevas que se teve notícias nos últimos séculos, parou ao sopé da milenar erupção e mirou a entrada da pequena gruta, dezenas de metros mais acima, sua boca se abriu, mas não foram palavras que dela saíram, não da forma como conhecida pelos humanos normais: linguagem de cobra! Sim, esse era o idioma que o bruxo falava, e aquele dialeto subia em direção ao topo do monte, serpenteando por entre as protuberâncias da rocha, até atingir e chamar a atenção de seu objetivo.

Um grito horroroso eclodiu de dentro da pedra, um misto de guinchar e silvar fez tremer o ar da noite que começava a se instaurar, algumas pequenas pedras rolaram da entrada da cavidade na rocha pelo paredão íngreme: a terrível criatura que ocupava o local estava desperta e posicionada à beira da rocha, invocada que fora por aquele que, até o momento, a controlava.

Era um monstro alado horrível, com o aspecto de uma mulher, mas com uma longa cauda reptiliana coberta de escamas douradas. Tinha serpentes em vez de cabelos, presas pontiagudas, mãos de bronze e asas de um tom de ouro. Ela se arremessou para baixo e veio pousar mansamente à frente do Lord das Trevas, a cabeça baixa e os olhos fechados, na verdade ela enxergava pelos olhos das serpentes que pululavam em sua cabeça e, com toda certeza, eram estas que comandavam a besta, e era com essa porção ofídia da criatura que Voldemort se comunicava, e a dominava.

Ele continuou a falar naquela língua estranha e, quando se encontrou aparentemente satisfeito pelos sinais de servidão e compreensão provenientes da besta alada, disse satisfeito em voz alta, mais para confirmar para si mesmo o acordo que acabara de selar com a criatura:

— Muito bem, minha serva! Em breve você terá o meu troféu ao seu alcance! Obedeça-me! Cumpra a tarefa que lhe destinei e será recompensada com aquilo que mais almeja: a liberdade! Este é o nosso trato!

* * *


Com uma breve seqüência de estalos secos, os quatro bruxos adolescentes desaparataram um a um na cozinha da Mansão dos Black, Harry avançou rapidamente em direção à porta que levava às escadas que o encaminhariam ao pavimento superior, gritando pelo nome de Dobby, Gina seguiu em seus calcanhares, chamando por Winky.

— Não entendo como conseguimos aparatar diretamente pra dentro da casa se ela está protegida pelo feitiço Fidelius! – intrigou-se Rony – Não podemos fazer isso n’A Toca, justamente por causa do feitiço de proteção!

— Isso é por causa de um pequeno ajuste que fiz no feitiço – respondeu-lhe Hermione –, assim não corremos riscos desnecessários desaparatando no Largo Grimmauld... Winky me ajudou com isso... é uma técnica elfica!

Os dois trocaram essas palavras enquanto corriam no encalço de Harry e Gina, que se adiantaram mais à frente, em direção ao quarto que sabiam estar sendo ocupado pelo jovem Malfoy, preocupados que estavam por não obterem resposta dos elfos. Quando adentraram ao aposento, depararam com Harry ajoelhado ao chão ao lado do corpo de Dobby, tentando reanimá-lo.

Enervate! – bradou Gina, ajoelhada sobre a cama, tentando fazer o mesmo com Winky.

— Harry Potter tem que perdoar Winky... tem sim! – o Menino-Que-Sobreviveu ouviu a voz fraquinha e chorosa do elfo dizer, ao mesmo tempo em que Dobby também se recuperava.

— Dobby também foi um mau elfo, Harry Potter! – a pequena criatura esverdeada, que tinha a cabeça amparada pelo braço do bruxo, foi logo dizendo.

— Não se preocupem com isso! – tranqüilizou-os o garoto – Só quero saber se Draco teve ajuda de alguém!

— Não mestre, senhor! – respondeu Winky, ainda choramingando e apoiada no colo de Gina – Ele enganou Winky e a estuporou – Hermione soltou um pequeno gritinho de indignação –, Winky vai prender suas mãos na porta do forno para se castigar por isso!

— E Dobby também foi enganado pelo menino Malfoy... Dobby vai se pendurar pelas orelhas nos canos da calefação! – concluiu satisfeito, aparentemente achando que o seu castigo seria pior do que da amiga.

— Nenhum de vocês vai fazer nada disso! – ralhou Hermione, incrédula – Harry, diga alguma coisa!

— É claro que não irão... – respondeu o menino, enquanto tinha sua atenção desviada para os pedaços de pergaminho chamuscados ao chão.

— Foi essa a mensagem que Monstro entregou ao Draco? – indagou Harry, apanhando os restos de papel e os mostrando aos elfos.

— Sim, Harry Potter! – responderam os dois elfos em uníssono – É a letra da Senhora Malfoy! – completou Dobby, relembrando amargamente os longos anos em que viveu servindo a imponente dama.

Harry entregou os destroços do pergaminho para Hermione, com um olhar indagador, após lê-los por alguns instantes.

“...venha sozinho...” – ela leu em voz alta –, e este aqui: “...no círculo de pedras azuis...” .

— Oras... isto não faz o menor sentido! – riu-se Rony – Não tem como saber...

Stonehenge! – bradou Hermione, estalando os dedos – O círculo de pedra dos druidas... é baseado em pedras azuis... só pode ser isso!

— Mas... de que diabos está falando? – o ruivo protestou, desnorteado.

— Fica aqui na Inglaterra... um lugar sagrado... palco de rituais antigos... já estive lá, nas minhas férias... após decidir estudar Runas Antigas... posso aparatar pra lá, se for preciso!

— Que raios de férias você costuma...

— Mione, pode me levar até lá? – Harry interrompeu o amigo.

— Imagino que sim, mas... Harry... não pode estar pensando em ir até lá, está? É obvio que se trata de uma emboscada!

O rapaz desviou o olhar e baixou a cabeça, passando a analisar distraidamente a tapeçaria que recobria um pequeno trecho do assoalho.

— Mas – a menina continuou –, é bastante óbvio também que é isso que você deseja, não Harry? Você quer cair na armadilha de Voldemort! Quer enfrentá-lo o quanto antes... está preparado pra isso?

— É claro que ele não quer, não é Harry? – disse Gina, levantando-se da cama e parando ao lado de Hermione, que encarava Harry.

— Só preciso que me deixe próximo ao lugar, Mione! É o meu destino... não posso fugir dele!

— Não vou deixá-lo ir sozinho, Harry! – ela aproximou-se dele e apoiou a mão espalmada em seu peito.

— Hei! Eu estou aqui! Também estou falando! – ironizou Gina, as duas mãos apoiadas na cintura.

— Não quero que se arrisque, Mione! É uma coisa que apenas EU devo fazer! – ele levantou sua mão e a apoiou sobre a da garota.

Ela fez a careta típica de quem tenta conter as lágrimas que insistem em aflorar aos olhos, baixou a cabeça, mordendo o lábio inferior que tremia muito e, avançando o passo que a separava do rapaz, passou seus braços por baixo dos dele e abraçou-o com força, apoiando a cabeça em seu peito.

— Ótimo! Tudo bem! Quando precisarem de mim, estarei lá embaixo, engraxando os sapatos da Madame Hermione Granger! – explodiu a ruivinha, dirigindo-se com o passo forte em direção à porta.

— Antes disto, Harry, posso lhe dar uma palavrinha?

A voz extremamente conhecida de todos, e dolorosamente saudosa para um deles em especial, repercutiu pelo recinto, congelando-os. Os quatro jovens e os dois elfos dirigiram o olhar para a parede oposta à janela que dava para a rua e depararam com os dois olhos extremamente azuis, parcialmente ocultos pelos oclinhos de meia-lua e adornados pelos vastos cabelos e barba de um tom prateado e reluzente.

— Professor Dumbledore! – o coro de vozes espantadas ecoou no ambiente.

* * *


A luz fraca da Lua crescente banhava a grama irregular que contornava uma incomum estrutura de pedras sobrepostas em forma de arco, ao seu redor, um casal de bruxos murmurava uma cantilena monótona, enquanto apontavam suas varinhas aleatoriamente para alguns pontos da passagem que se formava, como parte de um antiqüíssimo ritual.

— Severo! – sussurrou a mulher de longos cabelos loiros, que escapavam de baixo do capuz que ela usava acoplado à capa – Tem certeza que ele ainda não libertou a criatura?

Um olhar frio e pouco animador foi a única resposta que recebeu: o bruxo continuou com sua tarefa, quase que ignorando sua companhia. Ela continuou com a ladainha por mais alguns momentos, tentando se manter alheia aos acontecimentos que estavam por vir, mas aparentemente uma voz gritou mais alto em seu peito e ela não se conteve: avançou rapidamente em direção ao seu parceiro e o agarrou abruptamente pelas mangas de sua capa negra.

— Severo! Diga-me... eu te imploro! O m-mestre... irá cumprir o prometido? O m-meu Draco... poderá ir em segurança se lhe entregar o Potter?

— Narcisa! – respondeu, tentando livrar-se em vão dos braços da mulher desesperada – Como ousa duvidar do...

— Oras, Severo! Não sou uma idiota! Sei como o mestre age com aqueles que saem de seu circulo de confiança!

— Mas eu ainda pertenço a este círculo, Narcisa! Não tente me comprometer com a sua insegurança! – e, com um forte puxão, libertou-se do aperto que a bruxa lhe infringia.

— Severo! – a voz dela já não soava mais com desespero, e sim como um pedido: um pedido que se faz a uma pessoa próxima, a uma pessoa íntima – Você sabe muito bem que... que ele poderia ser... poderia ser seu...

— Cale-se! – ele afastou-se dela como se tivesse receio de apanhar uma doença contagiosa – Nunca mais ouse falar comigo sobre este assunto, Narcisa! Não existe passado para nós... nunca existiu!

— Pelo menos me prometa que continuará protegendo o nosso... o meu... Draco! Como tem feito até agora, Severo!

— As promessas que fiz para você até hoje só me trouxeram complicações, Cisa... faça você algo por mim, agora... me esqueça, sim?

A mulher reteve-se, aparentemente magoada pelas palavras do outro, e ficou a observá-lo pelas costas, afastando-se lentamente, então, tomada de uma decisão repentina, correu novamente em sua direção e abraçou-o pelas costas, encostando seus lábios ao ouvido dele e sussurrando uma proposta quase inaudível:

— Talvez não exista um passado, Severo! Mas poderia haver um futuro... para nós... para nós três...

O bruxo virou-se bruscamente, escapando com violência da nova investida e, na ênfase de seu movimento, atirando a mulher ao solo.

— Já se esqueceu de seu marido, Cisa? Já se esqueceu daquele a quem escolheu para dar o nome ao seu filho? Da riqueza, que sempre contou tanto para você? Você sempre foi muito prática, não é mesmo? E continua sendo!

A bruxa, que já há algum tempo abandonara a pose e a altivez da aristocracia em que vivera a maior parte de sua vida, levantou um dos braços em direção ao outro, num gesto de súplica e, preparava-se para dizer alguma coisa quando o ruído de alguém desaparatando ali próximo chamou a atenção dos dois. Eles permaneceram estáticos, observando o breu da noite na direção do local da nova aparição, até que perceberam um vulto, de cabelos loiros iguais aos de sua mãe, se aproximando em sua direção.

— Nenhuma palavra sobre isso ao Draco, Cisa! Ou você perceberá que posso ser tão cruel e vingativo quanto o nosso mestre! – e, dirigindo-se ao jovem Malfoy – Bem a tempo! A passagem já está aberta!

* * *


Ali estava ele, com a mesma expressão bondosa e ao mesmo tempo firme, com que Harry o memorizara em sua mente, o longo chapéu cônico de veludo roxo adornando a cabeça de vasta cabeleira cor de prata, que se misturava às longas barbas, de mesmo tom, e que se perdiam por sobre o camisolão que fazia conjunto ao chapéu. A figura se destacava entre a moldura do quadro que Fineus Nigellus utilizava como ligação entre a Mansão dos Black e o escritório da diretora de Hogwarts. Sim, ali estava ele a observar, paciente e calmo, o pequeno grupo de bruxos adolescentes: o retrato de Alvo Dumbledore.

— Eu o tenho observado bastante nos últimos tempos, Harry! – disse a imagem do retrato – Apesar de você parecer fazer o máximo para me evitar.. tenho visto, em minhas andanças por outros quadros, e ouvido, geralmente na sala da diretora Minerva, as estórias sobre suas realizações e seus feitos e, não nego, sinto um profundo orgulho por isso!

— Eu... eu.. – Harry sabia que ele tinha razão: por um longo tempo evitara encarar, em forma de retrato, aquela figura amiga que foi arrancada tão brutalmente de seu convívio.

— Mas, vamos direto aos fatos! – continuou a figura, aparentemente não desejando constranger o garoto – Deduzo, pelo que ouvi falar, que você já tenha destruído todos os horcruxes criados por Voldemort, estou correto?

— S-sim... e-eu... – o rapaz agora encarava a imagem do professor, apesar de ainda sentir-se pouco à vontade. Gina havia retornado sobre seus próprios passos e mantinha-se, igualmente aos demais, em profundo silencio e prestando enorme atenção nas palavras trocadas entre os dois.

— Um deles estava em você próprio pelo que fiquei sabendo... Sim, sim... realmente eu estava muito velho mesmo, Harry... Isto me fugiu completamente... a cobra, como lhe disse uma vez... achei que fosse ela...

— P-professor Dumbledore... o senhor está... o senhor realmente está...

— Morto, Harry! Definitivamente! Como também lhe disse uma vez, não há feitiço que possa reverter a morte! Mas, pela posição que ocupava, tenho esse privilégio de ser, digamos assim, imortalizado em um retrato, e poder procurá-lo às vezes e, quem sabe, aconselhá-lo na importante decisão que está prestes a tomar.

— Lamento tê-lo evitado professor... eu...

— Eu o compreendo, Harry! Mas isso não vem ao caso agora, o livro de Gryffindor... você conseguiu chegar ao último feitiço?

— O-o senhor sabe? Bem... eu... na realidade...

— Então é imperativo que conclua o livro, Harry! Só então estará preparado para enfrentar Voldemort de igual para igual, e ter alguma chance de derrotá-lo!

— Mas... professor Dumbledore... não sei quando terei outra chance como esta... digo, a situação atual apresenta um caminho direto até Voldemort! Se não a aproveitar, não sei quando poderá ocorrer outra chance igual e...

— Que demore cinqüenta anos, Harry! Não pense que poderá escapar dele incólume por mais uma vez, se não estiver estar devidamente preparado para enfrentá-lo! Quero que me prometa isso Harry!

O jovem bruxo abaixou a cabeça quase que imperceptivelmente, aparentemente pesando o pedido que acabara de ouvir, olhou rapidamente para Hermione, talvez pedindo o conselho e apoio que estava tão acostumado a receber. Então mirou novamente aqueles profundos olhos azuis, a decisão já tomada:

— Não posso lhe fazer esta promessa, professor Dumbledore!

— Então... creio que todo o meu esforço, até agora... foi em vão!

Um longo silencio se instaurou no recinto, o retrato do falecido diretor continuou a mirar fixamente seus olhos nos de Harry, mas nada fez para quebrar aquele instante de desconforto, nem ele nem mais ninguém, até que, após pigarrear, o garoto continuou:

— Não é meu desejo decepcioná-lo, professor Dumbledore, mas não creio que haja diferença em enfrentar ao Voldemort neste momento ou sabe-se lá quando: estou determinado agora... como jamais estive... sei e sinto que posso sair vencedor deste confronto!

A figura do retrato analisou a expressão no rosto do bruxinho por um instante e, em seguida, empinou sua cabeça, como se olhasse para uma pessoa que lhe parecia enorme a seus olhos, como costumava fazer quando seu peito se inflava de orgulho e admiração por alguma coisa ou alguém.

— Então, Harry, pelo menos uma promessa eu lhe peço: – ele aguardou um sinal de confirmação do bruxinho, então continuou – prometa-me que não abrirá mão da companhia de seus amigos, eles o seguiram e auxiliaram até agora, bem mais além do que qualquer pessoa pudesse imaginar. Não os prive de acompanhá-lo nesta reta final: tenho certeza de que eles lhe serão de grande ajuda!

— Sim, professor Dumbledore! Eu lhe prometo isso! – e seus olhos ficaram levemente marejados, provavelmente, imaginou ele, pelos resquícios de fumaça que haviam ficado no ar, após Draco ter queimado o pedaço de pergaminho.

— Ótimo, Harry! Ótimo! Ah, só mais uns breves conselhos, de um velho que se esqueceu do que é o sangue quente da juventude correndo pelas veias: a senhorita Granger tem informações importantes a lhe passar sobre a criatura que Voldemort libertou no Ministério: ouça-a com atenção! E... a senhorita Weasley... acredito que tenha também um pequeno segredo a lhe contar: dê-lhe esta oportunidade!

— Claro, professor Dumbledore! Claro! – respondeu-lhe Harry, com um sorriso e, retribuindo-lhe o sorriso, apesar de demonstrar uma fisionomia de profundo cansaço, a imagem do retrato virou-se a sumiu pela escuridão do quadro, provavelmente retornando para o conforto de sua cadeira em seu próprio quadro, em Hogwarts.

* * *


Narcisa Malfoy abraçava o filho com exagero, desmanchando seus cabelos e beijando-lhe as faces com descontrole. Aqueles últimos tempos a haviam machucado profundamente, deixando-lhe marcas irreparáveis: sem saber o paradeiro do filho, com o marido em Azkaban convertido em pedra, e com aquele a quem seu coração pertencera um dia a desprezá-la.

— Me solte, mulher! – afastou-se Draco – Não há tempo para isso!

— Tem razão Draco! – rosnou Snape – Você deverá esperar até o Potter chegar... considerando que ele realmente venha... então você e Cis... sua mãe, deverão romper a passagem e aguardar que ele os siga!

— Ele virá! Pode ter certeza! – respondeu o loiro, então um breve tremor tomou seu corpo – E a coisa? Vai estar lá?

— Sim! Mas não se preocupe, deixarei uma chave de portal para que fujam em segurança... Tem certeza de que o Potter virá?

— Já disse que sim... parece muito preocupado com isso... Snape! – havia ironia na voz do garoto.

O bruxo lançou-lhe um olhar gelado, que extirpou o tom irônico do rosto do garoto, fazendo-o recuar alguns passos e voltar para os braços da mãe.

* * *


— Geórgia? Que diabos é isso? – indagou Rony.

— Não é Geórgia, é Górgona, Rony! – respondeu Hermione com impaciência – É um monstro mencionado na mitologia grega... muito perigoso: com asas e serpentes no lugar de seus cabelos... dizem que seu olhar transformava as pessoas em pedra.

— E porque acha que é uma dessas que o Você-Sabe-Quem surrupiou do Ministério? – insistiu o ruivo após coçar o queixo por um instante, tentando absorver a informação.

— Não será porque a tal criatura transformou a Umbridge em pedra e vivia num ninho nas alturas que só dava pra ir voando? – interferiu Gina, colocando também a mão no queixo, remedando o irmão – Dããã...

Rony abriu a boca e fez menção de responder, mas Hermione continuou sua explicação, dirigindo agora para Harry:

— Pelo que pesquisei, são criaturas terríveis, Harry! E são imortais! Na verdade, Medusa, a górgona que ficou mais conhecida, era mortal... mas, segundo a lenda, eram três irmãs: Esteno – a violenta, Euríala – a errante e Medusa – a dominadora.

— Bem... talvez Harry tenha sorte e essa seja a tal da Medusa – incentivou Rony –, aí você pode matá-la...

— Segundo a história, Medusa já foi morta... sua cabeça foi decepada – interrompeu-o Hermione – e, até onde se sabe... restam então as outras duas e, uma delas estava aprisionada no Departamento de mistérios há séculos... Harry! Você está muito calado... está me ouvindo?

— Hã? Sim, sim, claro... você tem razão Hermione! – assustou-se o bruxinho.

— Harry, quer prestar atenção, por favor? Você ouviu o professor Dumbledore: é importante que absorva as informações que tenho pra lhe passar! – ralhou a garota.

— Não era o professor Dumbledore... era apenas o seu retrato... – Rony tentou ajudar.

— Você tem que fazer com que ela olhe para sua própria imagem – disse Hermione, ignorando o ruivo –, é a única maneira de neutralizá-la!

— Tudo bem, Mione! Já entendi! Agora vamos, já está anoitecendo e já protelamos isso por muito tempo!

— Agora? – espantou-se Rony – Está pensando realmente em ir agora... à noite... no escuro... e se arriscar a encontrar com essa... coisa?

— Na verdade, prefiro ir sozinho... eu e Mione, já que só ela pode aparatar diretamente para o lugar... não quero que se arrisquem...

— Pois é, Harryzinho – interrompeu Gina, sarcasticamente –, mas, apesar desta sua preferência recente pela Mioninha, não vai se livrar de nós assim, tão facilmente!

— Gente! Por favor, parem com isso! – irritou-se Hermione – Começo a achar que estamos sendo vítimas de algum feitiço de desunião ou coisa parecida. Não seria a primeira vez que Voldemort tenta enfraquecer seus inimigos causando a discórdia entre eles!

— Não se preocupe, Hermione! – disse Gina, com o olhar frio sobre Harry – Só há uma pessoa enfeitiçada aqui!

— Agora chega! – foi a vez de Harry explodir – Eu e Mione estamos indo, quem quiser nos acompanhar que venha em silencio!

Todos se levantaram a ajeitaram suas capas de viagem, segurando-se aos braços da garota que encaminharia a todos para o lugar em questão.

CRAQUE! – os quatro se desmaterializaram num estalo e, após uma breve viagem nada confortável, pousaram numa pequena estradinha de terra batida, defronte a uma placa colocada pelos trouxas que trazia escrito ”STONEHENGE”, logo acima de uma seta que apontava para um morro próximo.

— Achei melhor desaparatarmos a uma distância segura – justificou-se Hermione –, assim teremos tempo de nos organizar.

Eles começaram a caminhar sob a luz da Lua crescente, as varinhas em punho e procurando manter o maior silencio possível, até que Gina segurou o braço de Harry e o fez ficar um pouco para trás dos demais:

— Harry, tem uma coisa que preciso lhe dizer! – disse Gina.

— Depois falamos, Gina... também tenho algo a lhe dizer...

— Não! Não é sobre isso... é sobre o livro de Gryffindor... enquanto você estava na Floresta Proibida eu... bem... eu li o último feitiço!

— Leu? Mas, como... como...

— Fawkes abriu a passagem para mim... ela é legal e... a gente se dá bem!

— E...

— Deixa eu te ensinar... antes de chegarmos ao topo... vai lhe ser útil!

O garoto assentiu com um sinal de cabeça, e a ruivinha, deixando seus sentimentos conturbados de lado, passou a narrar ao garoto, enquanto subiam a encosta do pequeno morro, os ensinamentos que aprendera no livro de Gryffindor, sem saberem que, um pouco mais acima, ao final da estrada, uma figura sinistra e toda vestida de negro, como havia sido sua vida e como era sua alma até então, os aguardava, com propósitos que o mais bem informado dos mortais, até então, desconhecia.

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