Chegando ao fundo do poço



A CENA QUE SE PASSOU A SEGUIR transcorreu tão rápida que um observador que pudesse estar ali naquele momento teria deixado escapar algum detalhe importantíssimo se sequer piscasse seus olhos: ao ver a varinha apontada em sua direção, Harry girou rapidamente o corpo e atirou-se para trás, por sobre a cama, passando a um palmo da cabeça de Rabicho, tentando desesperadamente escapar de qualquer que fosse o feitiço que a menina executasse, percebendo, quando ainda estava voando pelo ar, sobre a cama, o clarão verde que brilhava às suas costas e, tão logo tocou dolorosamente o chão atrás de sua barricada improvisada, ouviu o grito pavoroso que Pedro Pettigrew soltou, ao ser atingido em cheio pela Maldição da Morte disparada pela terrível bruxa.
Apavorado, mas mesmo assim mantendo o sangue frio para pensar rapidamente, Harry lamentou não ter apanhado sua varinha antes de se entrincheirar daquela forma, mas enfiou a mão habilmente no chapéu que trazia preso à sua cintura e, sentindo entre os dedos a haste daquilo que procurava, levantou-se agilmente, escondendo a mão que segurava seu trunfo atrás das costas, e disse:
— Espere, Michelle! Se você me matar, não conseguirá de volta a horcrux de sua avó! – ele tentou uma última cartada, desesperado: sabia que se ela chegara até ali era porque deixara para trás, Hermione, Gina e Rony, que deveriam impedi-la de retornar ao dormitório, e a professora McGonagall que, a julgar pelo barulho que ouvira enquanto o agora falecido Pettigrew lhe contava seu segredo, deveria ter passado por maus bocados. Não, ele estava sozinho... e desarmado... e teria de usar de toda a sua astúcia para escapar com vida daquela situação.
— Eu não sou mais Michelle, seu idiota! – disse ela mantendo a distância, curiosa com o que o garoto pudesse estar escondendo às costas – Agora sou Margot Smith! E não preciso mais da minha horcrux: quando você estiver morto e o Lord das Trevas reinar sobre o mundo bruxo, eu terei todo o tempo necessário para encontra-la e guarda-la em lugar seguro!
— Lord das Trevas? Mas... eu não entendo... não foi Voldemort quem matou sua av... quem a matou?
— Sim! Mas tudo não passou de uma armação daquele maldito do Ramsey, ele descobriu sobre a minha horcrux e convenceu o Tom a matar-me, dizendo que eu havia roubado sua idéia para poder confronta-lo.
— Mas, você não esperava um filho dele?
— Ele esperou que John nascesse e o levou consigo, então atiçou Tom para testar se o feitiço da imortalidade realmente funcionaria, mas Tom jamais faria isso comigo se não tivesse sido iludido por Ramsey: eu sempre fui e sempre serei a sua mais fiel seguidora! E sempre fui a preferida do Riddle, desde os tempos da escola, mas aquele idiota do Ramsey traiu a todos nós, ele descobriu tudo... descobriu que eu também dividira a minha alma... e armou pra mim... se eu não tivesse feito uma horcrux... mas agora... você a recuperou para mim, só uma pessoa que tivesse a intenção de destruí-la poderia retira-la do cofre no quadro... eu lhe agradeço por isso, Potter... e eu também serei eterna... ao lado de Voldemort! – os olhos dela brilhavam insanamente.
— Mas... e sua neta, Michelle? Desde quando a possuiu? O que será dela?
— Desde aquele momento à beira do lago, Rabicho a estava controlando e eu não tinha forças para me manifestar, mas quando ela se livrou do controle dele eu a possuí e lancei o feitiço “Fumus Priori”, que o transfigurou momentaneamente em fumaça: eu sabia que precisaria dele vivo para fazer um acordo com o mestre, então abandonei temporariamente a mente da minha neta para conversar com você, mas depois a reassumi e fui atrás daquela ratazana idiota!
— Você é um monstro, como pode fazer isto com a Michelle...
— Isto não importa, e esta conversa já foi longe demais... – a bruxa percebera que o rapaz tentava ganhar tempo, e gritou novamente – Avada Kedavra!
Mais uma vez, o feixe de luz verde cortou o ambiente rapidamente e, ao chegar ao local onde Harry estava postado, encontrou apenas as partículas de seu corpo desagregadas pelo feitiço “Corpóreum Dispersare”, que ele executara não verbalmente, atravessando aquela nuvem de fuligem e atingindo em cheio o espelho horcrux, escondido às suas costas, e que enclausurava a metade da alma de Margot Smith. Houve uma grande explosão, que atirou os dois contendores atordoados para longe, enquanto centenas de estilhaços do objeto destruído voavam em todas as direções.
— Maldito! – gritou a megera em corpo de menina, levantando-se ainda zonza – Bem que me alertaram que você era um miserável intrometido! – e, completamente desequilibrada, mirando-lhe a varinha pela terceira vez, gritou – Morra, Harry Potter!
Harry, ainda precariamente apoiado na parede às suas costas, conseguiu ser mais rápido que sua agressora, apontou sua mão direita para a figura, que estava prestes a lhe atirar uma Maldição Imperdoável e, com um dedo em riste, mentalizou a palavra mágica do feitiço não verbal aprendido recentemente no Livro da Vida de Godric Gryffindor: “Congelium!”, e um raio de luz azul celeste saiu de seu braço estendido, atingindo a menina possuída e aprisionando-a instantaneamente em um bloco de gelo.
No segundo seguinte, quase que simultaneamente ao o feitiço de Harry, Minerva McGonagall, amparada ao batente da porta, com os cabelos e roupas desalinhados e um grosso fio de sangue lhe escorrendo pelo rosto, soltou um jato de luz alaranjada da varinha que mantinha apontada para as costas da inimiga, ocasionando uma nova explosão que espatifou o bloco de gelo, fazendo com que o corpo de Michelle, preso pelo feitiço anterior, desabasse no chão.
— P-Potter! – assustou-se Minerva – O que? E-Eu... não entendo!
Então os dois viram o espectro de Margot Smith, já conhecido por Harry, erguer-se do corpo inerte no chão, e começar a dissipar-se com um guincho de horror, extinguindo-se em seguida.
— Professora Minerva! – gritou Harry, dando a volta na cama – A senhora está bem? E Michelle... ela está...
— Michelle perdeu os sentidos! – informou a bruxa, após ajoelhar-se ao lado da menina para examina-la – Mas, Margot se foi... para sempre... pelo que posso conceber... n-não imaginei que você pudesse realizar um feitiço... estando desarmado! A força conjunta de nosso ataque foi demais para ela... e o Pettigrew? – disse ao observar o pacote inerte e envolto por cordas sobre a cama.
— Também está morto! E, desta vez, de verdade... ele recebeu a Maldição da Morte que era destinada a mim!
— Que horror, Harry! Que horror! – limitou-se a dizer a diretora.


No dia seguinte, Harry terminara de visitar seus amigos na Ala Hospitalar: Hermione com um braço quebrado e reclamando que não poderia segurar um livro enquanto a poção “emenda-osso” de Madame Pomfrey não fizesse efeito, Rony aguardando que seus cabelos e sobrancelhas, queimados por um feitiço de combustão, crescessem novamente, e Gina que, apesar de continuar com o mesmo físico, pesava mais de duas toneladas, após o feitiço gravitacional que recebera de Michelle; quando a professora McGonagall entrou na enfermaria, apoiada em uma bengala, para tomar a poção prescrita pela curandeira, e disse, respondendo à pergunta silenciosa dos presentes:
— Michelle recebeu um golpe mental muito forte, não se lembra de quem é... – disse com pesar – Deverá ficar por muito tempo no Saint Mungus, torçamos para que ela não tenha danos permanentes.
Apesar de não serem as melhores, esta noticia alegrou um pouco ao grupo: pelo menos a garota, que já sofrera com a tragédia de ter seus pais mortos, estava fora de perigo e, quem sabe um dia, voltaria a levar uma vida normal.
— Precisamos tomar mais cuidado! – disse Hermione – Estão se multiplicando os casos de espiões e marionetes de Você-Sabe-Quem infiltrados em Hogwarts!
A professora lançou um olhar envergonhado para a janela da enfermaria, fingindo contemplar o crepúsculo que bordava o céu ao longe. Harry, pensativo, coçava distraidamente sua cicatriz.
Então, passados alguns instantes em que cada um ruminou rapidamente os fatos ocorridos recentemente, a atenção destes voltou-se para Harry, pois todos ainda se mantinham muito preocupados com ele, uma vez que o percebiam muito modificado após o encontro que tivera com Rabicho, mostrando-se bastante abatido e silencioso, como se tivesse perdido a alegria de viver, até com Gina ele estava mais reservado. Todos tentaram arrancar-lhe alguma pista sobre o suposto “segredo” que o comensal lhe havia confidenciado, mas sem sucesso.
— Vocês devem se recuperar, agora... – esquivava-se ele –...quando chegar o momento oportuno, conversaremos sobre isto.
E, como que lendo o pensamento dos companheiros, o bruxo disfarçou e, dirigindo-se para a porta da enfermaria, disse:
— Vou até a cabana do Hagrid para ver como está o Bichento, afinal de contas, se não fosse por ele talvez eu não estivesse aqui. – e, olhando para uma Hermione toda orgulhosa, retirou-se.


Já havia escurecido, quando Harry saiu para os jardins e dirigiu-se para a choupana do meio-gigante, ele caminhava distraído pela noite, quando percebeu, na orla da Floresta Proibida, um ser incomum, aparentemente emitindo uma luz própria prateada e seu corpo era de coloração muito branca, já sua conhecida, mas havia uma outra criatura junto ao Patrono desta vez, meio homem, meio animal. Harry se aproximou e o imponente cervo sumiu floresta adentro, num galope gracioso, então ele reconheceu o seu acompanhante: era Firenze, o centauro.
— Professor Firenze! – cumprimentou Harry, aproximando-se – que criatura era aquela? O senhor a conhece? Estava conversando com ela?
— Olá Potter! Era um Patrono, há muito tempo não apareciam nas proximidades do castelo, os poucos que existem habitam no coração da Floresta Proibida, onde as criaturas malignas se concentram, eles se alimentam da maldade deles, são seus inimigos naturais, aquele é o líder do bando.
— E porque então ele tem sido visto com tanta freqüência aqui em Hogwarts?
— Pelo que pude entender, há uma força maligna muito grande entranhada nas terras de Hogwarts já há algum tempo, estas criaturas estão sendo atraídas por esta aura maligna que, aparentemente, vem crescendo ultimamente.
— Uma força maligna? Em Hogwarts? Ele deve estar enganado, professor Firenze!
— O ser humano pode se enganar com freqüência, Potter, mas estas criaturas não se enganam... olhe para o seu interior e verá que tenho razão!
— São muito interessantes... – divagou observando o local por onde a criatura se embrenhara – Gostaria de saber mais sobre eles.
— Verdade? Muito curioso, pois este aqui estava demonstrando um interesse muito particular por você!


Quando seus amigos tiveram alta da Ala Hospitalar, foram para a masmorra que Harry habitava, e o encontraram junto a Bichento, treinando sem muito sucesso o feitiço de controle da mente, a jovem Fawkes já arriscava alguns pequenos vôos de um lado a outro.
— Não adianta! – queixou-se ele – Ele simplesmente não entende as instruções que lhe passo!
— Se ao menos você falasse a língua dos gatos... – lamentou Rony.
Todos se entreolharam, abismados de não lhes ter ocorrido tal idéia antes.
— Como pude ser tão... tão... idiota! – explodiu Hermione – É claro que a sua maior afinidade é com as cobras!
Harry não sabia se considerava aquilo como um elogio ou não, mas teve que concordar com a amiga:
— Tem razão, Mione! Creio que valerá a pena testar o feitiço com serpentes... pode vir a ser útil contra Nagini.
— Mas, você vai conseguir compartilhar o mesmo corpo que guarda uma parte da alma de Você-Sabe-Quem? – argumentou Rony – E o problema da dor na cicatriz?
— Não acredito que terei este problema com ela – e desviou seu olhar de Gina, que o encarava –, além disso, já a habitei antes... em meus pesadelos... – disfarçou.
A ruivinha analisou longamente a reação do amado, então concluiu:
— É alguma coisa que ele te disse, não é? O Pettigrew... Se abra com a gente!
Mas o bruxo se desvencilhou da menina, recusando-se a tocar naquele assunto. A única pista que ele revelou, mais tarde, para Gina, e somente por se tratar dela, foi:
— Pettigrew estava junto com Voldemort, quando ele matou meus pais!


Os dias que se seguiram transcorreram rapidamente, finalmente Harry conseguira ter sucesso, treinando o feitiço de controle da mente em cobras, que Hermione especializara-se em conjurar com sua varinha. Numa certa manhã de domingo, no quintal da choupana de Hagrid, após realizar uma verdadeira façanha, que consistiu em fazer com que uma serpente atravessasse velozmente por um pequeno aro em chamas, o bruxo sentou-se ao lado de Gina, que se divertia atirando petiscos para Bicuço, o hipogrifo rebatizado como Asafugaz, e, chamando Rony e Hermione com um gesto, para que se aproximassem, disse:
— Precisamos descobrir a localização da próxima horcrux.
— Talvez Você-Sabe-Quem a guarde com ele – sugeriu Rony –, afinal de contas, o próprio Rabicho te disse que ele sabia que você as estava juntando.
— Pode ser que tenha razão, Rony! – concordou Harry – Fui muito idiota em contar tudo pra Michelle, ela deve ter passado um relatório completo para o Voldemort!
— Mas ele não sabe que você destruiu a verdadeira Tiara de Rowena Ravenclaw! – alertou Gina.
— Sim, temos esta vantagem. – concordou Harry – Ele deve achar que ela continua segura, aqui em Hogwarts.
— Mas não acredito que ele tenha removido a outra horcrux pra perto dele – opinou Hermione –, seria muito mais fácil para um inimigo destruí-la, num confronto direto. Não! O máximo que ele pode ter feito é aumentado a segurança do local onde está escondida!
— E quem seria suficientemente louco para acha-lo e confronta-lo? – insistiu Rony – O único bruxo que ele temia era o Dumbledore, e agora que ele está...
— Aí é que você se engana, Rony! – os garotos estavam tão absortos na conversa que não perceberam a figura enorme de Hagrid se aproximar – Existe uma pessoa que V-Vold... Voldemort... teme... e esta pessoa está aqui... na minha frente... e se chama Harry Potter! – e, diante do olhar incrédulo do quarteto, o grandalhão concluiu – Se não fosse verdade, porque acham que ele não teria vindo pessoalmente até os portões do castelo e explodido tudo? Sem o Dumbledore para confronta-lo?
— Talvez tenha razão, Hagrid! – Hermione se manifestou após um longo silêncio do grupo – Afinal de contas, ninguém causou tantos prejuízos a ele como o Harry, é lógico se pensar que ele não queira se expor.
Hagrid agradeceu o apoio com um sorriso, e retirou-se para o interior da cabana, onde começou a preparar um chá.
— Malfoy! Ele sabe onde fica o esconderijo de Voldemort – Rony continuou a insistir – Vamos obriga-lo a nos contar!
Ninguém se entusiasmou em dar seqüência naquela conversa, até que, aproveitando que se havia tocado no nome de Malfoy, Hermione falou, cheia de melindres.
— Harry... tem uma coisa que eu quero lhe dizer há algum tempo...
— Parece ser uma coisa que eu não vou gostar muito de ouvir!
— Provavelmente... é sobre o Snape...
— O que é que tem aquele assassino e covarde?
— É que... por mais que eu me esforce para pensar o contrário...
— Desembuche!
— Pois bem... nada me tira da cabeça que... naquela noite... no Largo Grimmauld... ele queria te avisar sobre... a Michelle!
Harry mirou o rosto da menina como se estivesse olhando para uma aberração.
— O que?
— Não me pergunte, que eu não sei explicar o porquê, mas... tudo se encaixa, não é?
— Você só pode estar brincando!
— Antes fosse! E tem outra coisa... Gina me contou que, naquela noite em que ficou nos aguardando dentro da mansão dos Black, e o Draco apareceu – ela olhou para Gina, procurando buscar apoio –, ele contou à ela que aparentemente havia sido resgatado do covil de Você-Sabe-Quem por um benfeitor desconhecido e, bem... ele disse que na casa em que ficou preso em seguida, havia um brasão da Família Prince!
— E daí?
— Daí que, como já lhe disse há algum tempo, Eileen Prince era a mãe de Snape, com um trouxa chamado Tobias Snape... já esqueceu do Príncipe Mestiço?
— Se o que você está me dizendo for verdade, só posso chegar a uma conclusão! – disse o rapaz levantando-se e começando a andar em círculos.
— Qual?
— Não podemos mais confiar no Malfoy!


Naquela noite, durante o jantar no Salão Principal, Harry recebeu uma notícia que aparentemente mostrava que a sorte estava virando para o seu lado. Havia acabado de consumir o prato principal e se preparava para se deliciar com a sobremesa, quando percebeu um movimento fora no normal na mesa dos professores: Tonks, que havia se tornado uma espécie de auror fixa para a defesa da escola, adentrou pela porta lateral que era usada para o acesso dos professores e cochichava ao ouvido de Minerva McGonagall, que imediatamente passou a suposta novidade para o professor Flitwick que, alternadamente olhava de Tonks para Harry, na mesa da Grifinória.
— Aconteceu alguma coisa! – Hermione cutucou Rony, que não se apercebera do fato, entretido que estava em degustar se pudim de frutas.
Logo em seguida, a diretora da escola levantou-se e, acompanhada por Tonks, dirigiu-se à mesa onde se encontrava “o Eleito”.
— Posso lhe dar uma palavrinha lá fora, Potter? – e, apontando para Hermione, Rony e Gina, complementou – Vocês três também! – e seguiu em direção à saída do Salão Principal, sem sequer esperar por alguma resposta.
Os quatro se entreolharam, apreensivos e, logo em seguida, levantaram-se e saíram do salão, Rony aproveitou, para levar consigo, a pequena tigela de pudim que ainda não conseguira terminar de comer.
Ao chegarem ao saguão, observaram Tonks postada à porta de uma sala próxima, sinalizando para que eles se dirigissem para lá.
— Aconteceu algo grave? – perguntou Gina preocupada, assim que alcançaram a metamorfamaga.
— Não, apenas um fato novo, que pode interessar a Harry. Minerva lhes contará, enquanto eu fico aqui para afastar curiosos.
O pequeno grupo entrou na sala, no que, imediatamente a professora McGonagall se dirigiu a Harry e falou, enquanto torcia as mãos, nervosa.
— Tonks recebeu uma notícia do Ministério: houve um ataque a um trouxa... mas ele viverá... apesar do que lhe aconteceu...
— Como assim? O que lhe aconteceu? – indagou Rony, enquanto engolia a última fatia de sua sobremesa.
— Ele ficou desfigurado... seu atacante... mordeu-lhe todo o rosto... pobre coitado!
— Greyback! – exclamou Gina, cobrindo a boca com as duas mãos – Ele atacou o trouxa da mesma forma que fez com o Gui!
— Lamento concordar que tenha razão, Srta. Weasley! – respondeu a diretora.
— Tudo bem que se trata de uma atitude monstruosa de um dos seguidores de Você-Sabe-Quem – opinou Hermione –, mas, qual é o motivo de tamanha preocupação? Quero dizer, sabemos que, infelizmente, diversos ataques vêm ocorrendo desde que o Lord das Trevas retornou!
— Bem, Srta. Granger – a diretora respondia para Hermione, mas seus olhos estavam fixos em Harry –, é que... este fato... ocorreu na... Albânia!
À exceção de Harry, os outros três jovens se entreolharam, sem saber direito o motivo da preocupação, mas o Menino-Que-Sobreviveu detectou imediatamente a extensão daquela notícia.
— Berta Jorkins sumiu na Albânia! – Hermione se pronunciou, após algum tempo de reflexão, enquanto fitava o semblante de Harry para conferir se suas suspeitas estavam corretas – Foi lá que o Rabicho se encontrou com Você-Sabe-Quem, e onde ele se fortaleceu!
Harry e a professora McGonagall concordaram com um sinal de cabeça.
— Então, o fato do Lobo estar por lá... – agora era Gina que tentava decifrar o sentido daquilo tudo –... seria porque... existe algum lugar naquele país que tenha uma ligação forte com Você-Sabe-Quem?
— Certamente, Gina! – continuou Hermione – E, o fato de haver comensais ainda naquela região só pode significar uma coisa: ele possui alguma coisa valiosa por lá... uma horcrux!
— Exatamente, Mione! – emendou Gina – Isto prova uma coisa: o Lord das Trevas enviou um de seus capangas pra lá para...
— Para ele trazer a horcrux para o Você-Sabe-Quem tomar conta dela pessoalmente! – completou Rony, triunfante.
— Não, Ronald! – inquietou-se Hermione – Isto quer dizer que eu tinha razão: Lord Voldemort aumentou a segurança de seu tesouro! – Rony teve um calafrio ao ouvir a namorada proferir aquele nome.
— Mas Fenrir cometeu um erro! – finalmente Harry se manifestara – E Voldemort não tardará em tentar corrigi-lo, talvez até fazendo o que Rony está sugerindo! – o ruivo deu um largo sorriso de satisfação – Não posso perder tempo, tenho que ir imediatamente para a Albânia, e encontrar este lugar... antes que Voldemort o faça!
— E nós iremos com você! – disseram Gina e Hermione ao mesmo tempo.
— De jeito nenhum! – a professora McGonagall foi categórica – Não permitirei que nenhum de vocês três corra este risco! – ela incluíra Rony em sua contagem – Seus pais os confiaram à minha responsabilidade cientes de que eu não permitiria que pusessem suas vidas em perigo!
— Mas o Harry não pode ir sozinho, professora, é muito perigoso! – relutou Gina.
— Eu irei com ele! – a voz de Tonks se sobrepôs às demais, ninguém havia percebido que ela mantivera a porta parcialmente aberta e ouvira o debate deles – Sou a pessoa mais indicada: sou uma auror, e darei a minha vida, se for necessário, para que Harry seja vitorioso nesta missão.
Houve um momento de silencio, em que todos puderam sentir a força que emanara daquelas palavras da bruxa. Então, Harry se dirigiu a ela e, com um sorriso, disse:
— Agradeço a sua ajuda, Tonks, mas espero que não seja necessário dar a sua vida por esta causa!
Neste momento, vindo do corredor, Bichento entrou correndo na sala e se atirou nos braços de Harry – aparentemente a sentinela mantida pela bruxa de cabelos cor de chiclete não fora o suficiente para impedir que o bichano se desse conta do que ocorria naquele aposento.
— Você também quer ir, Bichento? – Harry dirigiu-se para o animal, carinhosamente – Tudo bem, acho que poderá ser de grande ajuda para nós!
— Beleza, Harry! – animou-se Tonks – Não percamos mais tempo, Minerva pedirá que alguém siga em nossa retaguarda, caso precisemos de ajuda!
— Entrarei em contato com Alastor imediatamente! – disse a diretora.
— E, como irão viajar? – perguntou Rony – A Albânia fica muito longe para desaparatar!
— Tenho um velho amigo que creio que poderá nos auxiliar... – respondeu Harry – um velho amigo chamado... Bicuço!


O ar frio da madrugada cortava as vestes da dupla de bruxos que cruzava o continente, montados num imponente hipogrifo, como se fossem navalhas de gelo, um terceiro membro – da família dos felinos – seguia mais confortável, escondido sob o blusão do rapaz. A experiente metamorfamaga conjurara um feitiço de velocidade no animal alado, que faria com que chegassem próximo ao seu destino antes do raiar de um novo dia.
Ao pousarem numa clareira que existia na borda de uma floresta, próxima à aldeia em que o trouxa fora atacado pelo lobisomem, Bichento saltou do lugar privilegiado em que viajara e embrenhou-se na mata.
— Vamos aguardar um pouco – orientou Tonks –, ele deve ter ido buscar informações!
Harry concordou com a cabeça, meio inseguro: apesar da fazer quase sete anos que vivia entre a comunidade bruxa, ainda lhe causava estranheza certos fatos, como a naturalidade com que a sua companheira de jornada aceitara a companhia de um gato, e ainda lhe dava todo o crédito possível. Como que para coroar sua dúvida, poucos segundos depois, o felino retornou com uma enorme ratazana, ainda viva, presa em sua bocarra: o felino parou ao centro da clareira, sacudiu violentamente o bicho em suas presas e, após seu refém soltar um longo guincho, soltou-o suavemente ao solo e ficou a observa-lo correr, apavorado, em direção ao leste, embrenhando-se na mata. Bichento, então, caminhou alguns passos na mesma direção em que o roedor se evadira e, olhando para a dupla de bruxos que o observava, soltou um breve miado.
— Jóia! É por ali, Harry! – disse a bruxa.
O garoto deu um sorriso de satisfação e seguiu, juntamente com os demais componentes de sua equipe, mata adentro. Andaram por cerca de uma hora pela mata fechada, sempre seguindo o bichano que, vez ou outra capturava um dos moradores da floresta e conseguia novas informações sobre o seu destino, corrigindo seu curso, quando necessário.
Então, a um certo ponto, Bichento estancou sobre seus passos e arrepiou todos os pelos de suas costas, sem, no entanto emitir nenhum som.
— Tudo bem, gatinho – disse Tonks –, daqui pra frente é por nossa conta! – e, sacando de sua varinha, fez um gesto para que Harry fizesse o mesmo.
Eles avançaram por cerca de duzentos metros, então avistaram uma parede de pedras, muito antiga e com vários tipos de plantas trepadeiras crescendo em toda a sua extensão. Harry olhou para cima, e viu que havia um telhado, em péssimo estado e completamente camuflado pela grande quantidade de folhas e galhos quebrados que se acumulara sobre o mesmo durante o passar de incontáveis anos.
Tonks fez sinal para que Harry a acompanhasse e dirigiu-se para a direita, como que tentando contornar a construção, ele olhou rapidamente para trás e constatou que Bichento já não mais os acompanhava. Quando alcançaram o extremo oposto da primeira parede que descobriram, pode-se avistar uma entrada para o interior da construção, não havia porta, a mesma deveria ter se deteriorado com a ação do tempo. Os dois seguiram em absoluto silêncio até a soleira da mesma e perceberam que se tratava de um acesso para o porão da antiga casa, com uma tosca escada com degraus esculpidos na pedra, descendo para as profundezas daquela relíquia arquitetônica.
Não havia o que conversar ou planejar, a única ação a ser tomada ali era seguir os degraus e ver onde iam dar, e assim fizeram os dois num comum acordo silencioso. Quando atingiram o pavimento inferior, puderam observar que a atmosfera não era muito diferente daquela que haviam visto na superfície: o mato tomava conta de tudo e um cheiro forte de bolor impregnava o ar, então, repentinamente, os dois pararam estáticos, ouviam vozes, vozes vindas de um local mais abaixo de onde se encontravam. Harry olhou à toda a sua volta, imitando a ação da auror que o acompanhava, então percebeu, bem à sua esquerda, atrás de um enorme monte de entulho que desabara do pavimento logo acima, uma outra passagem, ele fez um gesto para a bruxa, que o seguiu até o local.
As vozes agora soavam mais fortes e, aparentemente estavam no meio de uma inflamada discussão, ouvia-se a voz de uma mulher, que era a que mais se destacava, de um homem, que quase não falava nada, e uma terceira voz, que mais parecia uma mistura de rosnados e latidos, com certeza pertenciam a Fenrir Lobo Greyback.
Havia um novo lance de escadas ali, em condições bem mais precárias que a primeira, mas Harry continuou descendo, sentindo a respiração de Tonks em sua nuca.
— Não há o que discutir, Fenrir. É uma ordem do Mestre! – dizia a voz de mulher.
— Ninguém ficará sabendo! – a voz do homem que respondia parecia uma seqüência de latidos – Além do mais, era só um trouxa que veio xeretar por aqui!
— O Ministério ficou sabendo, é capaz de sair até no Profeta Diário! – insistia a mulher – Você recebeu suas ordens, retorne para receber o castigo do Mestre, e nós retiraremos seu tesouro para guardar em um lugar mais seguro!
— Não acredito em você, Bellatrix. O Mestre confia em mim, ele nunca mandaria me substituir! – defendia-se Greyback, mas sua voz revelava que ele não acreditava realmente no que estava falando.
Então, ao final da escada, Harry pode ver o rosto da mulher que matara seu padrinho Sirius, há quase dois anos atrás, à sua frente encontrava-se o terrível lobisomem que atacara Gui Weasley no ano anterior, em sua forma humana, ele se encontrava posicionado à frente de uma abertura circular no chão, uma espécie de cisterna ou coisa parecida, e do lado esquerdo dos dois havia um outro homem, que Harry não conhecia. Tonks tocou levemente o ombro de Harry com uma das mãos, como a insinuar que ele não se precipitasse pela presença da odiada Sra. Lestrange, mas de nada adiantou sua preocupação, o Lobo repentinamente levantou o rosto bem alto, como se captasse o cheiro dos intrusos no ar, com suas narinas dilatadas, então seu olhar se fixou no rosto de Harry, parcialmente encoberto por uma das pilastras de sustentação do aposento.
— Intrusos! – rosnou ele.
Demonstrando uma capacidade digna de uma caçadora de bruxos das trevas, Tonks enfiou o braço que empunhava a varinha por sobre o ombro de Harry e bradou:
— Encarcerous!
O feitiço se destinava a Bellatrix Lestrange, certamente a auror julgara que ela seria a mais perigosa dos três oponentes, mas o outro bruxo, que era seu marido, Rodolfo Lestrange, assustou-se com o grito de Fenrir e deu um salto para frente da mulher, recebendo o feitiço e caindo ao chão logo em seguida, completamente amarrado pelas cordas conjuradas.
Bellatrix sacou de sua varinha e disparou o temível raio verde, em direção aos dois, mas que estourou na coluna de pedra, arrancando-lhe metade da circunferência. Harry caiu para o lado, com o rosto sangrando pelos estilhaços que haviam voado em todas as direções, então pôde ver Greyback se aproximando rapidamente, com os dentes à mostra e uma expressão feroz.
— Impedimenta! – berrou, mas o feitiço bateu no homem e não teve efeito, apenas o fez retroceder alguns passos.
Enquanto isto, Tonks revidava o ataque de sua tia, disparando uma seqüência arrasadora de feitiços, que obrigou a outra se entrincheirar atrás de um monte de pedras.
— Sectumsempra! – atacou Harry, conseguindo ficar de joelhos, mas o feitiço apenas arremessou o Lobo até a borda da cisterna, tendo um efeito bem inferior ao que ocorrera a Draco, no ano anterior.
A outra dupla de duelistas continuava a trocar feitiços habilmente, até que, ao perceber que Bellatrix se abrigara sob uma grossa laje de pedra que oscilava perigosamente no teto, devido à seqüência de explosões, Tonks mirou em sua base e gritou, decidida:
— Bombarda! – a explosão trincou a pedra que se partiu com seu próprio peso e caiu em cima da bruxa, esmagando-a.
Ao mesmo tempo, Harry já de pé, apontou seu instrumento mágico pela terceira vez para Fenrir, que não usava varinha, e bradou:
— Petrificus Totalus!
O corpo do meio homem meio animal, enrijeceu-se instantaneamente, e ele tombou para trás, sendo engolido pelo buraco do poço existente às suas costas.
— Muito bem, Harry! – disse Tonks, exausta, apoiando-se nos seus ombros – Acho que esta partida está resolvida!
Os dois correram até a beira da cisterna, pulando por cima do corpo imobilizado de Rodolfo Lestrange e mirando o buraco em que Fenrir Lobo Greyback havia se precipitado.
— Não dá pra ver o fundo! – disse Tonks, acendendo uma forte fonte de luz na ponta de sua varinha.
— E Bellatrix?
— Morta! – respondeu a bruxa com convicção – Nem que ela tivesse dividido a alma dela em mil pedaços, conseguiria escapar desta. – ao seu lado, deitado ao chão, ouviu-se um lamento do bruxo viúvo.

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