Entre a cobra e Luna



17. Entre a cobra e Luna

- E então, você aceita?

O garoto relutou. Mas não parecia nervoso – sequer tinha medo. Pelo contrário – sentia-se extremamente confortável naquela conversa.

- É pouco – disse finalmente – Quero mais do que isso.

Voldemort riu friamente, enquanto levava um cálice de prata reluzente aos lábios.

- Você pode ser grande, Harry. O que ainda está esperando?

- Não sei – o garoto respondeu simplesmente – Não é a hora certa, só isso.

Um clima amigável pairava no ar. Estavam sentados em poltronas antigas, cheirando a mofo como se tivessem sido compradas há séculos, em uma sala com iluminação suficiente para ver somente um ao outro. A cobra Nagini se esfregava pelos pés de seu mestre, enquanto Harry mexia na franja com os dedos, fitando a lareira.

- Seria muito mais fácil sem o velho, não seria?

- Não tenha dúvida – ele respondeu, ainda tentando achar respostas para suas perguntas no fogo.

- Então – disse Voldemort, apertando os dedos contra o braço da poltrona – Mate-o!



- Não! – gritou Harry, acordando de repente e percebendo que estava nadando em seu próprio suor.

- Por Merlim, Harry, o que foi? – perguntou a garota, ainda desnorteada por ter sido acordada com um susto.

- Nada – ele respondeu, deitando novamente – Foi só um pesadelo.

Mas, lá no fundo, ele sabia que não era um simples pesadelo.


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- Neville, pára – disse Hermione ansiosa, segurando a manga da blusa do amigo – Você realmente se lembra de onde ficam os calabouços?

- Claro que me lembro – respondeu o garoto.

- Bom, então... Vamos – ela disse, respirando profundamente – Salvem a Luna. Nós vamos por este lado. E... boa sorte!

O som quase não saiu de seus lábios e ela teve que fazer força para falar, mas assim que virou as costas, sabia que ela e Rony teriam que ser rápidos e precisos. Correndo em direções opostas, os dois grupos se separaram. Ron e Hermione seguiam o mais silenciosamente possível, por um corredor úmido e escuro que eles esperavam levá-los até o esconderijo de Voldemort e, assim, à cobra Nagini. O objetivo principal da missão era salvar Luna, mas se o horcrux fosse destruído, tanto melhor.

Rony brecou de repente e Hermione trombou em suas costas.

- Nossa! – ele disse, olhando a grande ponte e o abismo à sua frente.

- Anda! – Hermione disse, e ambos prosseguiram com cuidado – É só não olhar para baixo.

Rony fez uma careta e tentou fazer o que a namorada dizia. Um cheiro de esgoto infestava o ar, tornando a respiração um ato praticamente impossível. Abaixo deles, a uns cem metros, um lago imenso de água suja – ou coisa pior. Hermione teve a impressão de ter visto coisas estranhas se movendo lá dentro, mas procurou simplesmente se apressar ao invés de pensar no que poderia ser. Acima, um estreito buraco trazia para dentro a fraca luz da lua. Caminhavam pela ponte de pedra que estava, obviamente, sustentada por magia. Não havia outro jeito daquilo existir.

Quase cinqüenta metros depois, lá estavam eles do outro lado.

- Por onde você acha que é? – ele perguntou, olhando as três entradas na caverna, absolutamente iguais.

Hermione se aproximou lentamente e observou com atenção a primeira entrada, à esquerda.

- Esta não pode ser – ela disse – Vai na mesma direção dos calabouços. É provável que saia realmente lá.

Rony fez que sim com a cabeça. Olhou para trás – tinha a sensação de estar sendo vigiado, mas não havia ninguém.

- Esta do meio não é – continuou Hermione – Óbvia demais. Vamos, por aqui.

E, segurando a mão de Rony, o puxou para dentro da caverna à direita deles, em um breu sem fim.

- Cuidado – ela sussurrou – O chão está... pegajoso.

- Obrigado por avisar – ele respondeu, puxando com força uma das pernas, cujo pé tinha ficado grudado segundos antes. Não fazia a menor idéia do que tinha ali e, sinceramente, não queria saber. Agora estavam muito, muito fundo na fortaleza construída por Voldemort. Estranharam o fato de não haver Comensais montando guarda, mas agradeceram internamente por simplesmente estarem com sorte. Precisavam fazer um esforço descomunal para pensarem somente no que estavam fazendo, e não no que estava acontecendo com Luna ou lá em cima, enquanto Voldemort estava recepcionando quem ele pensava ser Harry Potter.


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Fred, Jorge e Neville seguiam muito sem jeito pelo sinuoso corredor que este último já conhecia, quando estiveram ali e Luna foi raptada.

Vozes.

Rapidamente, e sem saber como, esconderam-se atrás de algumas rochas quando quatro Comensais passaram por eles. Estavam rindo, mas tudo o que os três conseguiram distinguir foram as palavras “Potter”, “como ousa” e “ridículo”.

- Caramba, essa foi por pouco – sussurrou Neville, enquanto esperava mais alguns momentos até ter certeza de que os Comensais tinham realmente ido embora – Ué, mas cadê vocês?

- Estamos aqui – disse Fred, saindo debaixo da capa de invisibilidade de Harry.

- De onde veio essa capa? – perguntou Neville bravo.

- Nós trouxemos – os gêmeos responderam em uníssono.

- E por que não me avisaram? Se esconderam sozinhos aí e eu fiquei do lado de fora, correndo o risco de ser pego?

- Realmente, você teve sorte – brincou Jorge – Mas deveria ter me lembrado do quão burros são esses Comensais. Vamos?

Os três continuaram andando pelo corredor.

- Como você sabe que eles são burros? – perguntou Neville, extremamente chateado.

- Oras, são Comensais, não são? – respondeu Fred – Se não fossem burros, seriam qualquer outra coisa.

- Ah... ok – disse Neville apreensivo, olhando para o caminho que os Comensais foram, atrás deles – Acho que eles não devem voltar. Mas, em todo o caso, melhor nos apressarmos.

E os três continuaram descendo, vez ou outra Fred e Jorge reclamando do cheiro, enquanto Neville se esforçava para não demonstrar o quão nervoso estava, e com medo.


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- Pois é, eu vim – disse Minerva, transfigurada em Harry – Onde está Luna?

Voldemort não respondeu, apenas continuou observando o garoto à sua frente, tão indefeso. Esperaria até quando pudesse para ver o que ele faria. Mal desconfiava que, enquanto isso, cinco adolescentes estavam dentro de seu esconderijo procurando a garota e outros com o intuito de matar sua cobra de estimação.

Mas Minerva não podia deixá-lo desconfiar. Tinha que dar tempo aos garotos.

- Onde estão seus Comensais? Não precisa mais deles?

- Quer que eu os chame para brincar com você, Harry Potter?

- Não, obrigado – respondeu – Já tiveram o suficiente, eu acho, das últimas vezes que tentaram.

Voldemort riu maliciosamente, sem tirar os olhos do garoto.

- Você é atrevido, Potter – respondeu friamente – O que quer, de fato?

- Já disse. Entregue-me a garota.

- E por que eu faria isso?

- Porque não precisa dela. É a mim que você quer.

- Não seja tão prepotente, garoto! – disse Voldemort – Como sabe que a garota não está morta?

A Profa. Minerva oscilou. Afinal de contas, não era Harry, e sim ela, que estava ali conversando com Voldemort. E sabe-se lá como Harry responderia uma pergunta dessas. Ela olhou sem querer nos olhos de Voldemort e sentiu uma sensação esquisita invadir-lhe a mente. Não podia... virou os olhos. Ele riu.

- Você... não sabe – sussurrou Voldemort, e junto com a sua voz veio um vento gelado do céu, e de repente Minerva percebeu que ele o estava conjurando com um simples aceno de mão.

Será que ele viu?, ela pensou, mas não havia tempo para “serás”.


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- Rápido, Rony, veja, uma luz! – sussurrou ofegante a garota, vendo uma luz, ainda que fraca, logo à frente. Seria a sala de Voldemort? Tão fácil assim?

Apertaram o passo e logo chegaram perto da porta, que estava semi-aberta. Observaram pela fresta uma sala mal iluminada, com livros, estantes e poltronas velhas. À frente da porta, uma lareira. Ao lado, uma entrada para o que parecia ser um outro quarto. E, à sua direita...

- A cobra! – disse Rony, e Hermione fez um “shhhhh”, tampando a sua boca.

- Fica quieto, Rony! – ela sussurrou – E agora, o que faremos?

- Eu ia te perguntar exatamente isso – ele respondeu, tirando a mão dela de sua boca.

- Veja, a cobra está dormindo.

Nagini estava enrolada em um canto, sobre um tapete amarelo luxuoso, mas extremamente sujo e destruído, certamente pelo ambiente úmido em que deveria estar há anos. A única luz na sala era o fogo da lareira e isso era tudo o que teriam.

Silenciosamente, Hermione tirou a varinha do bolso e a segurou, esperando um sinal que não sabia qual era. Rony observava apreensivo enquanto a cobra se mexia devagar, virando a cabeça para eles...

- Impedimenta! – gritou Hermione, antes que a cobra pulasse na direção dela e de Rony, e Nagini parou suspensa no ar. Um milésimo de segundo a mais e eles estariam mortos. Os olhos da cobra fitavam os dois com extremo ódio e Hermione sabia que a azaração não duraria muito tempo.

- Rony, rápido, venha! – e os dois se precipitaram para dentro do quarto, ficando horrorizados com o que viram atrás da porta.

- Luna! – gritou Rony com os olhos arregalados, ignorando totalmente a cobra ao seu lado – E agora?

- Meu Deus, os meninos estão nos calabouços! – se desesperou Hermione – Eles ficarão procurando Luna e perderão a noção do tempo! Vão ser pegos!

- Temos que avisá-los! – disse Rony, tão desesperado quanto Hermione, vendo a garota loira desacordada no chão, amarrada por cordas. Seus cabelos estavam totalmente encardidos.

- Rony, não há tempo! – disse Hermione, olhando para o machado preso às costas de Rony – Vamos, mate Nagini, e levamos Luna!

- Não! – disse Rony, tendo uma idéia de repente – Se matarmos Nagini, chamaremos a atenção de Voldemort! Eles serão pegos e nós também, e aí não terá Luna, nem ninguém...

- Tá bom, tá bom! – explodiu Hermione, andando de um lado para o outro, aflita – Fique aqui, eu vou avisá-los.

- O quê? – perguntou Rony ainda mais horrorizado – Eu não vou ficar aqui, Hermione, e você não vai sozinha até lá embaixo e...

- Rony – disse a garota, segurando seus ombros – Fique aqui. Não há tempo. Confie em mim.

E, sem dar tempo de dizer qualquer outra coisa, Hermione saiu correndo pela porta e deixou parado de pé um Rony desesperado, entre a cobra e Luna, apertando os olhos com as mãos. O silêncio pairava no ar. Ele decidiu contar mentalmente os gols daquele ano na Copa de Quadribol, tentando disfarçar o enorme medo que estava sentindo, e que achava não ser possível sentir até então.


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As masmorras daquela fortaleza nunca pareceram tão distantes, e Hermione sentia o fedor gelado rasgar seus pulmões enquanto corria desesperadamente em direção ao grupo que deixara horas atrás. Sem tempo a perder, decidiu arriscar e entrar pela caverna à esquerda depois da ponte, e por sorte chegou ao mesmo local que havia estado dias antes, com os outros.

Olhou para todos os lados à procura de Neville e os gêmeos, mas nada encontrara. As masmorras estavam cheias de pessoas e seres desmaiados, presos provavelmente por terem desobedecido Voldemort. Ela estava sozinha e teria que tomar um cuidado extremo para não ser vista ou chamar a atenção. Escondida atrás de uns rochedos perto da entrada de onde veio, ela avistou ao longe três vultos magros e presumiu que fossem os garotos. O lugar era enorme e a distância entre os extremos também.

O mais rápido e silenciosamente que pôde, esgueirou-se por uma trilha que ia de entrada em entrada, indo em direção ao que ela acreditava serem Neville, Fred e Jorge. Ao chegar mais perto, pôde ver que eram mesmo os garotos e acenou desesperada – não havia tempo a perder.

- Hermione! – gritou Neville, e os gêmeos olharam em direção à garota, surpresos. Hermione olhou em volta para ver se alguém tinha ouvido o grito de Neville e, qual não foi sua surpresa ao perceber que, sim, tinham ouvido. Pelo menos uma dúzia de Comensais vinha em suas direções, a poucos metros deles.

Uma armadilha.

- Rony... – ela sussurrou, se sentindo a mais burra das pessoas por ter deixado o namorado sozinho, sem saber o que estava acontecendo. E, virando-se para os garotos, gritou – Fujam, é uma armadilha! Luna não está aqui, fujam!

Mas os três já estavam apontando suas varinhas contra os Comensais e disparando seus feitiços, que pouco faziam efeito frente a tantos.

- Hermione! – gritou Fred, enquanto fazia um Comensal cair ao som de “Expelliarmus!” – Pegue!

E, em um gesto que poderia ter custado sua vida, o rapaz jogou para Hermione a capa da invisibilidade do Harry que estava com ele.

- Onde quer que eles estejam, salve-os! – gritou com desespero no olhar, se referindo a Rony e Luna. Hermione olhou desesperada de Fred para os Comensais, enquanto Jorge e Neville seguravam as pontas. Não queria deixá-los ali lutando sozinhos e com clara desvantagem.

- Vá! – ordenou Fred por fim, antes de receber um raio vermelho no peito e ser lançado a quatro metros de onde estava.

- Não! – gritou Hermione, mas olhou para o lado exatamente no momento em que Fenrir Greyback vinha em sua direção com os olhos cheios de morte. E, vestindo a capa de invisibilidade, ainda deu tempo de estuporá-lo antes de voltar correndo para onde Rony, Luna e a cobra estavam.


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- Você é um tolo, Harry Potter – sibilou Lord Voldemort, enquanto fazia ventar tão forte que Minerva caiu para trás. O uivo era ensurdecedor.

- Opa! – disse Tonks em cima da colina para Lupin, descendo rapidamente para deter o pior. Os dois desceram correndo ao ver que Voldemort poderia atacar Minerva.

- Pensa mesmo que seria fácil enganar Lord Voldemort, Dumbledore? – ele sussurrou ao vento, como se esperasse que a mensagem chegasse ao seu destino.

E, virando-se para o corpo caído no chão à sua frente, apontou a varinha e gritou:

- Avada Kedavra!


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Hermione estava suando por baixo da capa de invisibilidade ao chegar no mesmo local que deixara Rony há alguns minutos.

- Idiotas.

Ela olhou para a direção de onde vinha a voz e viu Rabicho segurando Luna nos braços, acenando com desdém no rosto e aparatando um segundo depois. No chão, Rony estava caído, ao lado de Nagini, que jazia morta com o machado cheio de sangue sobre os dois.

- Rony? Ah, meu Deus, Rony! – gritou Hermione, caindo de joelhos ao lado do garoto, colocando a cabeça sobre o peito e constatando que ele estava vivo. Precisava sair dali. Rabicho sabia, Voldemort descobriria a farsa.

Limpou as lágrimas do seu rosto e, apertando o mais forte que podia seu corpo contra o de Rony, aparatou fora dali.

- Hermione! – gritou Lupin surpreso e ao mesmo tempo exasperado, vendo a garota surgir aos seus pés – O que aconteceu?

- Ele só está desmaiado – ela disse sem ar no pulmão e o rosto cheio de sangue – Nagini está morta. Rabicho levou Luna - o ar em seu corpo fora o suficiente somente para dizer tais frases.

- Ele descobriu tudo – disse Tonks chorando – Minerva está morta.

Hermione levou a mão aos lábios parecendo que ia vomitar, mas era somente uma sensação de pura impotência, desânimo e horror diante de tudo o que estava acontecendo.

- Os garotos! – disse Lupin apontando para o alçapão no jardim, enquanto Neville vinha acompanhado de Jorge e Fred, ainda cambaleando.

- Eles estão vindo! – gritou Neville com terror nos olhos, segurando com força as roupas de Lupin – Os lobisomens! Muitos deles, no mínimo cem!

Lupin olhou para Tonks e, sem ter a menor dúvida sobre o que deveriam fazer, ordenou:

- Aparatem nos portões de Hogwarts. Agora.

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