Epílogo



Ao chegar à casa, Marlene percebeu quão tarde era. O relógio da cozinha marcava 2h da manhã. Os olhos ainda derramavam lágrimas e a maquiagem outrora tão bonita, agora estava borrada. Escreveu um bilhetinho para a mãe, avisando que chegara tarde e que não tomaria café com todos, logo cedo.


Subiu as escadas até seu quarto, quis bater a porta, mas não poderia acordar os pais ou os irmãos mais novos. Contentou-se em fechá-la devagar e jogar a bolsa sobre o tapete de pelos, com violência. Olhou-se no espelho e balançou a cabeça negativamente. Agarrou a toalha no pendurador e foi até seu banheiro.


Com ajuda do removedor tirou toda a maquiagem dos olhos e o batom dos lábios. O choro cessara e seu rosto estava inexpressivo, nem feliz, nem triste, nem calmo, nem com raiva, era só um rosto cansado.


Despiu o vestido e arremessou-o no cesto de roupa suja. Encheu a banheira com água quentinha e sentou-se lá, relaxando o corpo. Fechou as pálpebras por alguns minutos.


“Queria perder o juízo e me afogar aqui de uma vez, ao menos a dor passaria.”


Mas ela não o fez. Ensaboou-se e logo depois saiu da água, enrolando-se no roupão. Pegou seu pijama macio e vestiu-o, indo em direção ao quarto. Sentou-se em frente à penteadeira e desfez o penteado, escovou os cabelos. Não cansava de se olhar no espelho e ver como sua imagem era infeliz.


Voltou ao banheiro e retirou as lentes, escovou os dentes... Finalmente poderia dormir, o dia acabara.


Deitou-se e cobriu-se, o calor do edredom a aconchegou, agarrou uma almofada com forma de coração e aninhou-a no peito, apagou o abajur e ficou a admirar o brilho das luzes da cidade pela janela da sacada, que estava com a cortina aberta.


Pensou quantos de seus colegas ainda estariam na festa, quantos teriam gostado da noite, quantos estavam em casa, felizes, quantos estavam tristes como ela... Entre suspiros e lágrimas silenciosas ela adormeceu, deixando as bochechas grudentas de água salgada.


***********************


O outro dia foi monótono, Marlene acordou próximo ao meio dia. Almoçou com os pais na casa de uma tia, estava totalmente sem humor, sem graça, sem vida...


Voltou para casa e falou com as amigas pela internet, com vontade de ter companhia, mas, ao mesmo tempo, sem querer ninguém ali consigo. Queria sofrer aquele momento, sozinha. Lily comentou que viajaria com James para França, como presente de formatura dos pais de ambos. Seu avião saia em quatro dias e que ainda estava à espera do visto. Catherine avisou que Remo estava começando a falar de noivado e ela estava ficando muito animada perante a possibilidade de se casar. Lene saiu de sua rede social naquele momento, abandonando o papo alegre e apaixonado das outras duas. Seu estágio de melancolia atingiu o ápice após o jantar. Na TV estava a passar sua série predileta, Downton Abbey, e mesmo assim não teve ânimo de assistir o baile de natal que ocorria no palacete da história. Sabia que hoje sua personagem favorita, Lady Mary, seria pedida em casamento pelo homem que amava, Matthew Crawley.


Subiu para o quarto e tentou ler uma revista. Não se concentrava. Ligou a televisão em um filme qualquer e resolveu assisti-lo. Adormeceu antes das 21h, infeliz e frustrada. 


***********


Toc Toc Toc


Foi a primeira coisa que ouviu. No mínimo estava a imaginar coisas. Fez de conta que não ouviu nada e fechou os olhos outra vez, agora sabendo que ainda era noite.


Toc Toc Toc


O barulho continuava, ela virou-se na cama, tentando ignorar o som irritante.


Toc Toc Toc


- Tô dormindo, mãe. – Ela gemeu sem humor.


Toc Toc Toc


- Me deixa mimir!!!!! – Nada mudou o Toc Toc Toc continuava.


- Tá! Tô indo!! – Marlene desistiu, levantou-se e tateou a mesinha em busca dos óculos. Foi até a porta do quarto e a abriu, não havia ninguém do outro lado. – Malditos irmãos pequenos!


Ia voltar para a cama, mas o som tornou a perturbá-la. Pensou em verificar a sacada. Abriu a porta de correr, de vidro, e viu um papelzinho e uma rosa, jogados displicentemente pela varandinha, além várias pedrinhas. Recolheu-os e abriu o bilhetinho.


Acho que é a primeira vez que escrevo uma cartinha de amor. Sempre me soou absurdo isso, mas agora, estranhamente, não me sinto ridículo ao fazer o mesmo, me sinto em paz, como se sempre tivesse a certeza de era o certo a fazer.


Ok, eu precisava te responder de algum jeito, mas não deu tempo, e eu me arrependo tremendamente de não ter percebido antes. Algo seu, sem querer, ficou comigo ontem. Caiu na grama e eu peguei, achei que sentiria falta e quis devolver. Mas aproveitando que estou aqui, quero pedir algo de volta. Levou embora com você ontem, e eu não posso viver sem ele, Marlene, devolve meu coração? Mas não aquele coração sem sentimento, eu quero aquele novo, aquele que você me deu e me tomou ontem, aquele que está apaixonado.


Um admirador não-secreto e apaixonado...


Preso à folha com um pedaço de fita transparente, estava sua pulseira prateada de brilhantes, uma que ganhara de Catherine no dia do amigo.


- Mas o que...


Achava tudo muito estranhamente maravilhoso. Quem estivera com ela na noite passada? Nigel... E Sirius. Desejou muito que fosse ele, tudo em sua cabeça girava em torno dele naquele momento, todas as peças do quebra cabeças convergiam para ele... Era fantasticamente incrível e completamente sonhador...


- Besteira! Desista, Lene, não foi dele e nem nunca seria. Sirius Black não escreve cartinhas de amor, não se iluda! – Ela se repreendeu, dando as costas para a sacada e entrando novamente no quarto com a carta e a rosa em mãos.


- Quem foi que disse? Que calúnia à minha pessoa!


Marlene berrou apavorada, largou tudo o que segurava, devido ao susto, e deu um pulo.


E lá estava ele. Sirius. Agarrado à planta trepadeira que crescia na parede lateral de seu quarto. Escalara os ramos da planta e ficara ali, pendurado a quase 5 metros do chão. Os cabelos que costumavam ser organizados estavam rebeldes e cheios de raminhos verdes. Trajava um jeans comum, uma camisa de malha branca e um agasalho xadrez, azul-marinho e vermelho, All Stars Chuck Taylors completavam o visual.


O brilho do luar permitiu-a distinguir a figura, embora seus olhos estivessem embaçados de sono


- Sirius! Pelo amor dos céus!!! O que está fazendo pendurado na minha sacada a essa hora da noite? Como entrou aqui??


- Seu irmão me deixou entrar pouco depois do jantar, pedi segredo. – Devolveu com simplicidade.


- Você é maluco! Foi você que me acordou?


- Foi. O plano inicial era largar as coisas aqui na sacada e ir embora, mas eu sou ansioso e não ia agüentar que você demorasse a responder. Também tinha a possibilidade de você não saber que era eu ou nem ler a carta, ela podia voar, sei lá. Fiquei vigiando lá do gramado, mas você não acordava, ai eu taquei pedrinhas... – Sorria inocente como se fosse algo comum e muito bom.


Marlene meneou a cabeça, sorrindo.


- Talvez eu não tenha acordado antes, porque está de noite, e de noite as pessoas normais dormem! E... Ah meu Deus! Sirius, estou de óculos, pijamas e pantufas de coelho! Pelos céus, que vergonha!


- Fica bonitinha de roupa de dormir... – Ele comentou com zombaria.


- Há, há há. Muito irônico! Agora sai daqui antes que meu pai te veja, Sirius! – A menina pediu.


- Lene, são 3h da manhã, relaxa! Vem comigo, vou te mostrar uma coisa...


- Não, Sirius. Não vou fugir de casa!


- Mas se é aqui no seu terreno... Vem, Lene. Eu te seguro, vem logo.


Ventava frio do lado de fora. Ela correu até o banheiro e pegou um robe quentinho, enrolou-se nele e voltou para fora do quarto.


- Tá, o que eu faço? – Questionou cheia de medo.


- Espera, deixe-me descer. – Esperou um pouquinho. – Tá. Agora, põem o pé direito ali e o esquerdo deixa na sacada. – Ela o obedeceu, agarrando-se à planta. – Agora desce o outro pé e coloca-o mais em baixo na parede.


Ela tentou, mas a pantufa escorregou. O galinho frágil em que se apoiara quebrou e ela caiu.


- Socorro, Sirius!


Antes que pudesse berrar mais ele a segurou no colo.


- Calma, madame. Se cair, do chão não vai passar.


- Belo pensamento. – Ironizou. – Agora vamos logo, está muito frio aqui.


- Você manda. – Sirius colocou-a no chão e saiu caminhando pelo gramado do quintal, com ela a seu lado. Andaram por um tempo, no limite do terreno havia uma jardineira, com várias rosas.


- Espero que não se importe, Lene, peguei uma daqui. Não consegui nenhum lugar que as vendesse a essa altura do ano. Muitas formaturas, todos presenteiam as garotas com buquês. – Sorriu envergonhado. – Aquela flor solitária me pareceu tão pouco e tão pobre para você.


- Tudo bem, eu nem... Eu nem esperava nada... – Confessou corando.


- Eu sei. – Olhou para o chão, sem graça. – Eu... Eu comprei algo para ficar no lugar do buquê.


- Sirius... Não precisava, sério!


- Tá, mas eu quis dar.


- Por que me trouxe aqui?


- Não sei... Gosto de conversar com você e de ter sua companhia, sem contar que queria olhar as estrelas junto com você.


- Que... Legal. – Ia dizer romântico, mas se interrompeu no meio da frase.


Sirius ficou calado por um tempo. Ambos encaravam o céu, em silêncio. Depois de um tempinho, a viu tremer de frio.


– Quer voltar?


- Se não tiver mais nada que ver...


Ele a puxou para si e aninhou-a à seu lado enquanto voltava para o quarto dela.


- Espera aqui. – Pediu ele, deixando-a em baixo da sacada e escalando a trepadeira outra vez. Subiu na varandinha e estendeu as mãos para ela.


- Tá louco? Você vai cair!


- Suba na trepadeira, escale um pouco e agarre minha mão que eu te puxo para cima.


- Você é um completo sem–noção, Sirius. – Marlene falou rindo. Fez o que ele a orientou. Em um momento estava abraçada à planta que cobria a parede de seu quarto, em outro, pendurada pelo lado de fora da varanda do quarto, com os pés espalmados na parede e as mãos agarradas as de Sirius.


Com um puxão ele a trouxe para cima, ela apoiou-se na barra metálica da sacada e “pulou” para dentro da varanda, colando-se ao corpo de Sirius.


- Foi uma boa aventura. – Murmurou sem fôlego devido à proximidade que estava dele, sem beijá-lo ou abraçá-lo, apenas segurar-lhe as mãos ásperas.


- O que é a vida sem algumas loucuras? Fugir do quarto em plena madrugada, pela planta da parede da casa, na companhia de um amigo/admirador não–secreto apaixonado me parece um bom jeito de começar as férias de verão... – Ele riu do próprio comentário e Lene o acompanhou.


- E se é... É um ótimo jeito. – Comentou por fim.


- Sabe o que faria o “ótimo jeito” virar um “excelente jeito” ? – Sirius inquiriu-a.


Ela não respondeu. As mãos ágeis dele largaram as suas. Uma a puxou pela cintura, com delicadeza, e a outra, acariciou sua bochecha rosada.


- Se você aceitasse ser minha, minha e só MINHA namorada, Lene. – E a beijou.


Não houve a urgência de sempre. O beijo que trocaram era calmo, repleto de sentimento. O estômago de Lene revirou de emoção. Sirius não a agarrava. Sirius a beijava, a amava, e transmitia tudo isso por uma união de lábios. Não sentiu vontade de provocá-lo como sempre, ou de fazê-lo querê-la, ele já a queria e, mais ainda, já a tinha.


Não foi necessário usar palavras para retribuir o carinho dele com aquele contato, apenas o fato de corresponder ao beijo já bastava.


Lene percebeu que, como não havia pressa em contato físico ou urgência de beijos, seu fôlego durou por muito mais tempo e a sensação maravilhosa daquele momento especial pode ser mais apreciada.


Um bom tempo depois, quando realmente não era mais possível evitar o ar, Lene quebrou o beijo, relutante.


- Ok. – Ela murmurou e Sirius sorriu, beijou-a as mãos delicadamente e acariciou os cabelos negros e sedosos que amava.


- Ok. Boa noite, Lene. – Foi em direção a sua “escada particular”. – Até amanha, MINHA namorada. – Desceu a trepadeira com uma habilidade incrível, piscou para Lene lá de baixo e saiu em direção ao portão com as mãos nos bolsos do jeans.


- Boa noite, Six. MEU Six, meu amor... – Marlene murmurou da porta da sacada, com as mãos apertadas no colo e um sorriso, de pré-adolescente apaixonada, nos lábios.


Antes de fechar a porta de vidro, abaixou-se para recolher a rosa caída. Ao lado da flor estava uma caixinha de veludo negro. Ao abri-la, encontrou um espaço para dois anéis, um masculino e outro feminino. Ambos eram de ouro, em um pode ler “Porque seu amor...” e outro o completava “é minha maior riqueza.”
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N/A: Missão cumprida!!!
Consegui fazer o epílogo do jeito que imaginei de princípio. Ok, estou muito feliz por essa fic ter dado certo, pelos comentários que eu recebi e tudo o mais.
Os planos agora são: terminar a minha long-fic e começar a preparar a segunda temporada dela.
Eu espero mesmo que essa fic tenha agradado. Comentários são muito bem vindos.
Até uma outra fic, beijos
Morgana Pontas Potter.
P.S: A série favorita da Lene existe de verdade, com o mesmo nome e mesmos personagens, e é de autoria do roteirista inglês Julian Fellowes. Eu adoro essa série!!! *-* Just perfect!!! *-*
 

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Comentários (3)

  • Bru Mckinnon Black

    Magina!!! Eu já comecei a ler a fic De Um Jeito Especial, mas estou sem tempo, só li os 2 primeiros caps. mas achei super legal!!!Eu super apoio a ideia de mais fics Six/Lene, e saiba que se você escrever serei a primeira a ler, viu???Espero que escre a proxima fic logo, mas por enquanto vou tentando arrumar tempo para ler De Um Jeito Especial!!!Bjs 

    2014-05-03
  • Morgana Pontas Potter

    OWNNN. Brigada!!!Valeu por acompanhar os capítulos, eu tinha a ideia da fic, mas se você não tivesse comentado e pedido postagem, acho que não teria terminado a song nem feito o epílogo.Estou esperando por você na fanfic De Um Jeito Especial, em que também há muito caps Sirius/Lene.Talvez eu faça outra fic para esse shipper, estou começando a gostar dele...Valeu de novo.Morgana Pontas Potter 

    2014-04-25
  • Bru Mckinnon Black

    Ameiii!parabéns pela fic, ela ficou muito boa!bjs 

    2014-04-25
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