Decisão inquestionável



Capítulo 1: Decisão inquestionável


 


 


 


Caminhou devagar sobre a grama verde da encosta. Subiu a pequena colina e pode ver os longos campos à sua frente. Era uma quente e ensolarada tarde de primavera.


 


Uma brisa agradável roçava-lhe o rosto. Sua mãe insistira para que ela não saísse de casa naquele dia. Mesmo desobedecendo a sua mãe, ela saiu.


 


Mais alguns passos e chegou ao lugar que mais gostava daqueles campos: a sombra de um velho salgueiro. A árvore ficava mais afastada, às margens da divisa entre as terras do vizinho, que estavam cercadas por uma cerca branca.


 


Anos atrás ela costumava ir brincar ali, com Dora, a filha de sua madrinha. As duas cresceram juntas e tratavam-se por primas desde que se entendiam por gente. Elas adoravam correr sobre a grama, brincar e conversar sob a grande árvore. Sempre fugiam para aquele local, que era um refúgio, quase secreto, delas. Agora que as duas já eram adultas, Dora já não frenquentava mais o lugar. A prima estava ocupada demais com os preparativos de seu casamento com um homem mais velho, que era de uma das famílias mais respeitáveis da cidade, a qual as duas moças conheciam desde a adolescência. Dora fora cortejada pelo pretendente durante alguns meses e após dois anos de noivado, se casariam em alguns dias, ali mesmo em Helstone. Na véspera do casamento, fariam um jantar com as famílias dos noivos.


 


Ela nunca sonhou com o próprio casamento, talvez porque tinha aversão ao fato de se juntar a um homem pelo resto de sua vida, que possivelmente não amaria e que teria que respeitá-lo por ser o "senhor da casa". Não queria depender de ninguém. Se encontrasse alguém que realmente amasse e esse sentimento fosse recíproco, se casaria. Mas não ficava preocupada com casamentos com bons partidos, como a maioria das moças.


 


Sentou-se na grama, em meio às raízes e encostou-se no tronco da árvore. Não havia nada e nem ninguém ali. Somente a grama e o grande salgueiro, com sua copa balançando sob a brisa.


 


Como era bom estar ali. Sentia-se leve e feliz, como quando criança. Passou vários momentos alegres à sombra da árvore, com Dora. Ainda podia ver-se por ali, como em suas lembranças, correndo, rindo e brincando.


 


Abriu o livro que levara consigo e começou a ler. Esse era um de seus passatempos prediletos. Em casa, sempre fora forçada a costurar, bordar e aprender a tocar piano, que eram predicados básicos para uma mulher arrumar um bom pretendente e casar-se. Ali, sob o Salgueiro, lendo, ela era livre. Sentia que podia ser ela mesma, sem se preocupar com os bons modos ou com o que as pessoas poderiam pensar sobre ela.


 


Mesmo sendo bom estar em casa com os pais e Annie, a empregada que servia sua família há muitos anos e que praticamente a criou desde que nascera; nos últimos tempos via-se sob uma nuvem negra dentro daquelas paredes.


 


Seu pai era professor particular. Mesmo sendo um homem instruído, que estudara em uma das melhores universidades do país, não conseguia tantos alunos para lecionar, quanto antes, passando a receber menos dinheiro. As dívidas foram aumentando e se acumulando. Ele teve então que cortar, drasticamente, os gastos da família para honrar o pagamento das dívidas. Primeiramente quase todos os empregados da casa foram demitidos, ficando somente Annie, que aceitou continuar trabalhando por um salário inferior. Logo após as jóias, tapeçarias, obras de arte, o piano e a prataria, foram vendidos. Incluíram-se também, nessa venda, os melhores vestidos e pares de sapato, dela e de sua mãe. Até alguns dos livros de seu pai, tiveram que se desfazer. Mesmo não se importando com luxo e conforto, ela teve que admitir que a vida da família estava cada vez pior.


 


Sua mãe estava  preocupada com o que as pessoas poderiam estar comentando na cidade. Ali em Helstone, como uma boa cidade pequena, do interior do país, todos se conheciam, então não demoravam nem dois minutos para que todos soubessem de algo. Ela pouco se preocupava com os comentários das pessoas. O pai continuava tentando ser forte, mas ela sabia que as coisas não estavam sendo fáceis para eles. Tinha consciência de que ele estava se sentindo pressionado e rebaixado diante da família, amigos e conhecidos.


 


Resolver deixar os problemas de lado, pelo menos por enquanto, e voltar a sua leitura.


 


Os minutos foram se passando e ela continuou absorta no livro. Percebeu, a certa altura, que começou a escurecer. Desviou o olhar do livro e percebeu que nuvens cinza se formavam no céu. Iria chover.


 


Levantou-se, limpou as vestes e caminhou, com o livro nas mãos.


 


Gotas começaram a cair e ela acelerou o passo. Desceu a colina e conseguiu ver a sua casa, mais adiante. A chuva começou a aumentar, de modo que quando adentrou o quintal de casa, já estava toda molhada. Passou correndo pela jardim e foi direto para a porta de trás da casa.


 


- Senhorita Granger! - Falou Annie espantada, assim que ela entrou na cozinha e fechou a porta. - Onde estava? Sua mãe a procura.


 


- Lendo. - Disse simplesmente, sem se importar muito com o fato de sua mãe estar atrás dela. Depois lembrou-se que chovera e que estava com o livro nas mãos. Abriu o para ver se estava molhado. - Annie, coloque o perto do fogo, para secar, por favor.


 


Estendeu o livro para Annie.


 


- Sua mãe e seu pai lhe aguardam na sala de estar. - Falou-lhe Annie, após pegar o livro. - Querem lhe comunicar algo.


 


- Vou lá então, descobrir o que de tão importante aconteceu...


 


Saiu da cozinha, atravessou a sala de jantar, que antigamente ostentava uma bela pintura acima do aparador e os talheres de prata à mesa durante o jantar; e adentrou a sala.


 


Sua mãe estava sentada no sofá, bordando. O pai, de pé, diante da lareira, observando o seu relógio de bolso. Os dois desviaram o olhar do que faziam para olhá-la.


 


- Hermione, filha. - Disse a mãe ao vê-la. - Onde estava? Fiquei preocupada.


 


- Estava lendo. - Respondeu, dando alguns passos a frente.


 


- Veja só, esta toda molhada! - Disse a mãe alarmada.


 


- É só chuva. - Falou ela despreocupada. - O que tem a dizer-me?


 


A mãe buscou o olhar de seu pai, e este pareceu ponderar antes de dizer:


 


- Hermione, o que tenho para lhe dizer... bom... não vai ser fácil...


 


- Comece do começo, papai. - Disse ela.


 


- Você sabe que aqui em Helstone, não estou conseguindo quase nenhum aluno... há as dívidas...


 


Ele fez uma pausa, foi até a poltrona e sentou-se.


 


- O senhor Black, sugeriu que eu aproveitasse novas oportunidades...


 


- E do que se tratam essas oportunidades? - Ela questionou. Até agora não entendia aonde o pai queria chegar com aquela conversa.


 


- Novos alunos. - O pai respondeu. - Ele tem uma lista de vários alunos que se interessaram pelas minhas aulas.


 


- Papai, isso é maravilhoso! - Ela disse sorrindo.


 


- Ai é que está o problema, filha. - O pai disse, parecendo receoso. - Essa nova oportunidade de emprego não é aqui... em Helstone.


 


- E onde seria? - Ela perguntou.


 


- Em Milton. - Disse o pai.


 


- Mas... o senhor não... não pode aceitar... - Ela disse, confusa. Como assim em Milton? Mal ouvira falar dessa cidade antes. Sabia que ficava ao norte do país e só.


 


- Eu aceitei. - Falou o pai, a encarando.


 


Hermione olhou para o pai e depois para a mãe, sem entender.


 


- Mas...


 


- Vamos nos mudar para Milton. - Disse o pai.


 


- Não, eu não vou! - Ela disse.


 


- Filha, seu pai já decidiu. - A mãe disse tristemente. - Vamos vender a casa.


 


- Não pode recusar o convite, pai? - Ela perguntou. Tinha que haver alguma maneira de ficarem ali.


 


- Até poderia, filha, mas entenda... há dívidas... os credores... não podemos ficar....


 


Ela abaixou o olhar. Não podia crer que aquilo estivesse acontecendo. Deixar a cidade que nasceu e cresceu, parecia horrível. Nunca isso, sequer, passou por sua cabeça.


 


- Mãe, o que a senhora acha sobre isso? - Perguntou Hermione.


 


- Não há outro jeito...


 


- Mas eu não aceito isso! - Hermione disse nervosa.


 


- Hermione! Já decidi, não adianta se opor! - O pai disse em tom mais alto.


 


Ela o olhou, mas não respondeu. O pai era a autoridade da casa, mesmo não gostando, ela tinha que obedecer.


 


- O senhor Black está com um possível comprador para a casa. - Disse o pai, mais calmo. - Se tudo der certo, poderemos pagar boa parte das dívidas com o dinheiro da venda e comprar as passagens do trem para Milton.


 


- Quando vamos? - A mãe perguntou.


 


- Creio que até o inverno, talvez um pouco antes...


 


- Com licença. - Disse Hermione. Virou-se, travessou a sala e subiu as escadas, caminhou pelo corredor e entrou em seu quarto.


 


Não podia acreditar no que estava acontecendo. Poucas horas atrás ela nunca poderia imaginar, que quando voltasse para casa, o pai lhe daria notícias tão desagradáveis.


 


Sentou-se na beirada da cama e olhou para a janela. Ainda chovia lá fora.


 


Ouviu batidas na porta.


 


- Pode entrar.


 


Era Annie.


 


- Annie, você soube? - Ela perguntou.


 


- Sim, senhorita Granger, eu soube. - Annie disse.


 


- O que vai ser de mim, Annie?- Hermione perguntou. - O que vai ser de mim lá, sem você?


 


- Eu pretendo ir também, se os senhores permitirem...


 


- Annie, não faça isso! - Hermione disse se pondo de pé. - Não precisa estragar sua vida também, não por nós.


 


- Trabalho para a sua família desde que seus avós eram vivos... a vi nascer... não posso deixá-los ir sem mim.


 


- Ah, Annie... - Disse Hermione chorosa. Ela abraçou a mulher e depois disse. - Como ficará sua família?


 


- Meus parentes entenderão.


 


Annie não era casada e nem tinha filhos. A única família que tinha eram dois irmãos, ambos casados, e suas respectivas mulheres e filhos.


 


- Como será nossa vida lá? - Perguntou, voltando a se sentar na beirada da cama. Era uma pergunta mais para si mesmo, do que para Annie.


 


Ouviram-se novas batidas na porta.


 


- Entre. - Disse Hermione.


 


Sua mãe entrou no quarto.


 


- Com licença, tenho trabalho a fazer. - Disse Annie, saindo do aposento.


 


Hermione olhou para a mãe. As duas se olharam por alguns segundos, até que ela desviou o olhar. Estava triste, a notícia a pegara de surpresa. Afinal era uma notícia completamente desagradável, do ponto de vista dela.


 


- Filha, entenda seu pai. - A mãe disse. - Está fazendo isso pelo bem da nossa família... por nós.


 


- Deixar Helstone será pior do que se ficássemos... - Falou Hermione observando o chão. Sua mãe continuava de pé, perto da porta. - Milton é muito longe daqui, não conhecemos ninguém lá.


 


- O senhor Black conhece e nos ajudará...


 


- Do que o senhor Black pode entender? Sequer tem esposa ou filhos. - Ela disse irritada. - Vive lecionando ou viajando. O que ele poderia saber sobre família? Ou sobre lar?


 


- Não fale assim, Hermione. - A mãe a repreendeu. - O senhor Black é amigo da nossa família há muitos anos. É um homem respeitado e um bom amigo de seu pai desde que estudaram juntos. Ele já nos ajudou muito antes... você bem sabe.


 


Ela não respondeu. As palavras da mãe eram verdadeiras. Conhecia o senhor Black desde que era criança. Lembrava-se dele em muitas reuniões e festas de sua família, mas já fazia alguns anos que não o via.


 


A mãe saiu do quarto, sem dizer mais nada, a deixando sozinha com seus pensamentos. Iriam embora e isso já era fato. O que ela queria descobrir era como seria deixar Helstone e ir morar em outra cidade, onde não haveria amigos com quem visitar e conversar.




****

Primeiro capítulo da fic.


Espero que gostem e comentem!


Até o próximo! 

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Comentários (2)

  • yasmim maia

    Ansiosa pra ler o segundo capitulopelo primeiro cap essa fic vai ser muito boa

    2011-05-12
  • Kary

    Já estou desesperada para ler o segundo capítulo ! Só com esse primeiro já dá para sentir que a estória promete fortes emoções. Amo estórias de época <333 Pleaseeeeeeeeee não demore a postar o segundo capítulo 

    2011-05-09
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