CAPITULO DEZ



 


CAPITULO DEZ


 


Um mês. Já se encontrava com Gina há um mês, e o desejo não havia diminuído. Ela era tão diferente de qualquer outra mulher que conhecera... ela o apresentara a coisas novas como os cantores populares dos anos 50, um restaurante vegetariano em Whitechapel e aquela memorável quinta-feira quando foram ao mercado Birmingham de coisas usadas para que ela renovasse o estoque de sua barraca. Haviam partido ao raiar da madrugada e ela o informou exatamente para o que olhar. Ele então descobriu como era divertido negociar pechinchas.


Especialmente quando encontrou um conjunto de botões de baquelita a um ótimo preço.


- Podem ser de plástico. - disse Gina.


- Acho que não. O vendedor disse que eram de baquelita.


- Disse. A palavra "provavelmente" estava junto?


- Não. Mas então é uma infração a... - Ela colocou o dedo nos lábios dele.


- Hoje você não é advogado. E negociante de mercado. E precisa fazer um teste rápido e interessante para ter certeza do que está comprando.


Ele mordicou o dedo dela.


- Rápido e interessante, heim?


Ela ficou vermelha e ele sorriu. Adorava o modo como tinha a capacidade de deixá-la enrubescida.


Ela assumiu um tom professoral. Outra coisa que ele adorava. Gina era apaixonada por seu trabalho.


- Baquelita. Olhe e aprenda. - Deu pancadinhas num dos botões. - Ok, tem um som grave. Bom sinal. - testou o peso com a mão. - Mmm, pesado e mais denso do que o plástico. Você pode estar certo.


- Eu estou. – insistiu Harry.


- Teste da fricção.


- Fricção. – A palavra levantou toda a sorte de probabilidades interessantes. Ela sabia disso, pois ficara novamente vermelha, indicando que sabia o tipo de fricção a que ele se referia.


- Harry, estou tentando lhe ensinar algo. - Ela esfregou o botão na bainha de seu vestido e depois cheirou. - Sim. Tem o cheiro.


- De quê?


- Ácido carbólico. Baquelita cheira assim quando aquecida, e o plástico não. - Ela sorriu. - Você merece um prêmio por ter encontrado a melhor oferta do dia.


Ele a puxou pela curva do pescoço e perguntou junto à orelha dela.


- Qual? - Ela roubou um beijo.


- Nada que eu possa dar num espaço público, a menos que você queira ir parar num tribunal acusado de atentado ao pudor. Vamos ter de adiar até chegar em Camden.


Pela primeira vez desde a adolescência, ele não estava no controle. Ele se apaixonara pela mulher mais inadequada do mundo. Como sua madrinha, Natasha, Gina não se ajustaria a seu mundo. E se ele tornasse público o relacionamento de ambos, colocaria em risco tudo o que tivera tanto trabalho para construir.


Estava chegando a um ponto em que teria de fazer uma escolha. Sua carreira ou Gina. Exceto por saber que se sentiria miseravelmente triste sem qualquer um dos dois. Ele amava o seu trabalho. Fazer a real diferença na vida das pessoas. Gostava de carregar uma tradição familiar e desfraldar a bandeira por sua geração.


Mas ele também amava Gina. Amava sua vibração, sua independência e o modo como o fazia sentir-se. Ela não era a desmiolada que ele acreditara, mas também não se enquadrava no mundo conservador do qual ele fazia parte.


Droga. Sua vida estava se dividindo e de algum jeito ele teria de reunir as partes. Cabeça e coração. Deveriam novamente seguir a mesma direção. Mas como?


Naquela noite, Gina estava aconchegada a Harry na cama.


- Quer me contar o que o está preocupando a noite toda?


- Não estou preocupado.


- Harry, você mal me dirigiu a palavra esta noite. É o trabalho?


Ele sacudiu a cabeça.


- Deixa pra lá.


- Nada que possa aborrecer minha linda cabecinha? - perguntou ela.


Ao perceber a ironia em sua voz, ele se sentou.


- Desde quando sou paternalista com você?


Ela olhou bem para ele. Poderia recitar algumas vezes, no passado, mas naquela época ele mal notava a existência dela.


Evidente que ele sabia disso, pois pareceu culpado.


- Nunca desde que estivemos...


- Não nos vendo um ao outro. - completou Gina. - Ambos achávamos que não estávamos vivendo um relacionamento com futuro. Ninguém mencionava a palavra amor. - Ela acariciou o rosto dele. - Tudo bem, retiro o que disse. Então, o que está errado?


Ele suspirou.


- Nada. Por que não me contou sobre o seu trabalho no museu?


- Isso não tem nada a ver.


- Você está fugindo da pergunta.


- Não estou no banco dos réus.


- Eu sei. Só estava perguntando. Daisy mostrou as suas vitrines no museu. Eu li o artigo que redigiu. É evidente que você ama o seu trabalho e tem um dom para explicar às pessoas. Fiquei fascinado com um texto no qual conta sobre a vida de um alfaiate na Londres vitoriana. Aos doze anos como criado, executando tarefas humildes durante dois anos e depois mais cinco anos como aprendiz. Ainda pior, os costureiros trabalhavam das seis da manhã à meia-noite para fazer três camisas ao dia.


- E recebiam dois centavos e meio por cada uma. E ainda tinham que comprar a linha. - disse Gina. - As condições de trabalho eram aterrorizantes. Sete casas por camisa e, se não fizessem direito, não recebiam nada. Eles literalmente trabalhavam até os seus dedos estarem no osso.


Ele concordou.


- E as pessoas que compravam e usavam as roupas não sabiam das condições escravocratas e anti-higiênicas nas quais elas eram produzidas.


Harry entendia claramente. O que ela não esperava, considerando o que fazia para viver.


- Pelo que eu saiba, promotores não se preocupam com esse tipo de coisa.


Ele riu.


- Bem, na verdade, nem sempre atuo como promotor. Posso atuar nos dois lados de um caso.


- Aceitaria um caso se soubesse que a pessoa é culpada?


- Intelectualmente seria até um desafio, mas não, não aceitaria o caso. Estaria moralmente arruinado.


- Então nunca lutaria contra Golias?


- Não se Golias estivesse do lado certo. Pense bem, se alguém processasse uma escola dizendo ter escorregado no gelo enquanto carregava seu bebê...


- Mas a escola deveria manter os caminhos seguros.


- Gina, se estivesse levando Daisy em seus braços para a creche quando ela era um bebê. Você estaria atrasada. Neve e gelo se acumulavam sob os seus pés. Você preferiria correr ou andar?


- Andar, é claro. Não é seguro correr no gelo. E eu usaria um carrinho de bebê, pois, se escorregasse, não deixaria o bebê cair.


- Exatamente. Nesse caso, a mulher tinha um recorde de atrasos na escola. Ela escorregou porque estava correndo, a escola havia limpado adequadamente os caminhos. Mas ela não prestou atenção, desviou-se do caminho e escorregou. O bebê não sofreu nada. Ela tentou reclamar por ter se ferido nas costas. Mesmo depois do acidente, a mulher continuou chegando atrasada à escola e correndo ao longo do pátio.


- Talvez ela tivesse outra criança para entregar primeiro.


Harry olhou-a.


- Essa é uma das razões pelas quais as pessoas dividem a condução para a escola. Para evitar atrasos. Mas ela não era boa em planejar seu tempo e queria que outros pagassem por isso. - Ele sorriu. - Tem certeza de que não é uma advogada disfarçada?


- Eu quase fui.


- Como assim? Quase foi? Foi a faculdade de direito na qual ingressou antes de cursar a escola de artes?


Maldição! O homem era esperto. Tinha uma boa memória. Ela mencionara algo, há séculos.


- Sim. Algumas matérias... - Ela interrompeu-se. As lembranças traziam infelicidade. Ela se esforçara para seguir o sonho de seu pai e ingressar na prática familiar. Mas detestava a advocacia. Iria fracassar. Ela não queria isso.


- Não era algo para mim. - disse finalmente.


- De fato, o mundo da lei não é adequado a todos. Seus pais são advogados?


- Meu pai e meu irmão mais velho são. Minha mãe e meu irmão do meio são contadores.


- E você achou que deveria seguir os passos deles? - Ela aquiesceu.


- Não há nada de errado nisso.


- Não há?


Sob o ponto de vista dela, havia bastante coisa errada. E essa era parte do problema com Harry.


- Não se pode viver o sonho de outra pessoa, Harry. Olhe para si mesmo. Está se afundando numa maratona ridícula para se igualar ao seu avô e ser um dos mais novos membros do Conselho de Advogados da Rainha. E por qual motivo? Por causa de alguma promessa feita quando ainda era menino?


- Não é esse o problema.


- Sim, é sim. Você está seguindo aquilo que a família inteira espera. Nunca quis ser professor de história ou capitão de um navio?


O maxilar de Harry endureceu.


- Não. Eu quis ser advogado, e eu sou um dos bons.


- Você teria sido bom em qualquer coisa que escolhesse. A sua voz é fabulosa. Poderia ser um astro em pelo menos uma dúzia de países, caso se tornasse um cantor.


- Eu não queria ser cantor ou astro internacional. Eu queria ser advogado.


- Queria mesmo? Ou foi alguma coisa que disseram quando você estava no seu carrinho de bebê? Harryzinho, herdou o nome do avô, retrato escarrado do velho, compelido a ser idêntico. É claro que ele será advogado e irá quebrar os mesmos recordes.


- Eu acho - disse Harry - que é hora de eu ir para casa, antes que eu diga algo do qual iremos nos arrepender.


Ele se vestiu em silêncio. E não a beijou antes de partir. Gina não fez nada para impedi-lo. Magoada por ele sequer ter discutido o assunto e ter menosprezado seus pontos de vista.


Quando a porta se fechou atrás dele, ela se sentou e abraçou os joelhos. Talvez tivesse acabado de solucionar o problema de ter Harry Potter em sua vida. Ou talvez tivesse cometido o maior erro de todos.


Na manhã seguinte, os olhos de Gina estavam pesados. Ela arrumou a barraca como sempre, mas o entusiasmo a abandonara. Sentia-se culpada a respeito de Harry.


Ao meio-dia, procurou um canto tranqüilo e telefonou.


No segundo toque:


- Potter.


- Harry, é Gina.


- Sim. - Voz gélida.


- Eu lhe devo desculpas por ontem à noite. - Silêncio. - Eu lamento.


- Hã-hã. - Ela suspirou.


- Você não está facilitando as coisas.


- Não gosto de ser tratado como um debilóide. Como se eu não fosse capaz de fazer minhas próprias escolhas.


- Não foi isso o que eu disse.


- Não? Como não? Eu só me tomei advogado porque isso me foi dito desde o berço. Fui condicionado, como os cães de Pavlov.


- O que eu quis dizer é que você é o tipo de pessoa que honra cada promessa que faz. Que coloca as necessidades da família em primeiro lugar. Seria capaz de sacrificar os próprios sonhos se achasse que isso faria seu avô feliz.


- Ele morreu antes que eu pudesse convidá-lo a me ver no tribunal.


- Mas aposto que nesse dia você fez um brinde a ele. E seria contra o seu senso de honra desistir de tudo depois que ele morreu, mesmo que não quisesse ser advogado.


- Eu queria ser advogado, Gina. E ainda quero. Eu gosto do que faço para viver.


- Prender as pessoas.


- Quando elas merecem isso, sim. Gina, pense um pouco. Existem pessoas que estão desesperadas em busca de uma vida melhor, vêm para cá nas condições mais apavorantes e perigosas, trabalham por bem menos do que o salário mínimo, e não reclamam, pois ao menos, trabalhando aqui, conseguem mandar alguma ajuda para as suas famílias. São vítimas das pessoas que as deviam estar ajudando.


- É com isso que está trabalhando agora? Imigração ilegal?


- Sim e não. É o caso de um chefe de quadrilha, mas não posso dizer mais nada.


Era óbvio que Harry lutava pelas vítimas de injustiça social. E era apaixonado pela causa. Acreditava estar fazendo o certo.


Talvez ela tivesse sido injusta com.ele. Havia imputado a ele os mesmos defeitos dos advogados que haviam trabalhado na sua causa, e o confundido com as pessoas que encontrara quando estudara advocacia.


- Lamento, não quis insultar você ou ferir o seu orgulho.


- Oh, além do mais, sou melindroso agora?


- Na verdade, para alguém cujos modos são impecáveis, você não está aceitando minhas desculpas graciosamente. - Irritada, ela desligou.


Logo depois, recebeu uma mensagem de texto.


No seu apartamento às 19:30. Levarei o jantar.


Aceito. Obrigada. Ela respondeu.


Como sempre, ele foi pontual.


- Você nunca é espontâneo? Nunca lhe ocorreu chegar um pouco mais cedo ou mais tarde?


- Quando você chega atrasado, significa que está desconsiderando o tempo da outra pessoa. Isso significa ser mal-educado e arrogante. E, se chega mais cedo, vai acabar esperando e desperdiçando o próprio tempo, ou pressionando a outra pessoa. De qualquer modo, essas não são as minhas definições para espontâneo.


- E qual é?


- Estava esperando você perguntar. Sua cozinha, por exemplo, é um lugar que me deixa muito espontâneo.


Sim, ela lembrou aquela noite.


- Então, vamos comer antes que esfrie?


Ele havia trazido comida tailandesa; ela dividiu em dois pratos e sentaram-se à mesinha.


- Então, você acha que as pessoas devem seguir seus sonhos?


- Sim, é melhor fazer algo que se ama, e fazer bem, do que fazer alguma coisa só para agradar alguém e nunca atingir seu potencial pleno.


- Então por que sua família foi tão dura com Luna a respeito da faculdade de artes?


- Porque, quando ela falou em cursar a faculdade de artes, pensamos que ela iria fazer o que sempre fizera: começar algo novo para depois ficar entediada e abandonar. E, quando nos convencemos de que ela estava fazendo algo que realmente amava, ela desistiu.


- Porque engravidou.


- Muitas pessoas conseguem estudar e cuidar de seus filhos. Ela poderia ao menos ter cursado meio período. Mas nem mesmo tentou. E agora não está se esforçando o bastante. Trabalhar na sua barraca é acomodação. Como todos os outros trabalhos que ela arranjou. Ela fica ao sabor dos ventos, e espera que aconteça o melhor. Talvez, quando Daisy começar a freqüentar a escola, ela decida voltar à faculdade.


Ela já havia retornado. Mas Gina prometera não contar nada e agora entendia o motivo: Luna queria provar a si mesma primeiro e depois a toda a família, já que todos compartilhavam a opinião de que ela não era persistente.


- Então acha que trabalhar numa barraca de mercado é acomodação. É isso o que pensa sobre mim?


- Depende. Se você ama o trabalho que desempenha no museu, então o trabalho na barraca pode ser visto como acomodação, por não conseguir um emprego de expediente integral como curadora, ou como consultora de figurino para novelas dramáticas. Ou o que for que realmente deseja, então, sim, está desperdiçando sua paixão.


- Empregos de expediente integral como curadora de museu são muito difíceis de conseguir.


Especialmente com uma mancha em seu nome como a que possuía.


- E quanto a dar aulas?


- É a mesma questão.


E, novamente, o mesmo problema não mencionado.


- E como figurinista?


Ela fez uma careta.


- Eu não teria paciência com essas atrizes que se fazem de estrelas e também não quero fazer réplicas. Quero trabalhar com tecidos antigos verdadeiros. Aprendi muita coisa no museu. Trabalhei em roupas que, de outra forma, só teria visto na vitrine.


Ele a estava desafiando, da mesma forma como ela o havia desafiado na noite anterior. E ela então pôde entender por que ele se colocara na defensiva: ela também não gostava de ter de justificar suas escolhas.


- Mas eu também gosto da barraca. De ajudar as pessoas a escolherem roupas que mostrem sua personalidade.


- Mas por que uma barraca no mercado, e não uma loja?


- Porque então eu teria de desistir do meu trabalho no museu. Ou empregar pessoas para trabalhar na loja, ou para escolher roupas no mercado de Birmingham por mim, e eu gosto de escolher meu estoque. Teria mais despesas e precisaria cobrar mais. Isso afastaria vários dos meus clientes regulares. E adoro a atmosfera do mercado. O mercado não é só um lugar brega e barato.


- Não me entenda mal. Quando digo que Luna está desperdiçando seu talento trabalhando numa barraca de mercado, isso não tem nada a ver com valores esnobes. Apenas creio que, se você não coloca paixão naquilo que faz, então está fazendo a coisa errada. E a vida é muito curta para se desperdiçar.


- Então não vamos mais desperdiçá-la. Vamos parar de brigar.


Ele abriu os braços.


- O ditado diz: "Faça amor, não faça guerra...".


 


 


 


 


 


 


Agradecimentos especiais:


 


Feh Potter: obrigado pelo elogio, agradeço muito, e fico bastante feliz que esteja gostando. Beijos e até a próxima.


 


Ginny M. W. Potter: não se preocupe e pode cobrar sim, mas garanto que logo a historia vai aparecer. Mais um capitulo postado e espero que goste tanto quanto os outros. Beijos e até a próxima.


 


issis: o passado da Gina vem em breve, eu garanto e quanto a demora, tive duas semanas de cão, mas agora estou de férias da faculdade e tenho um pouco mais de tempo. Beijos.


 


Juh Sparrow: realmente esse Harry é bem diferente e muito interessante, assim como a ruiva. Quanto as suas fics eu já dei uma olhada hoje antes de postar aqui na floreios e vi que você tem duas fics e uma pelo menos já concluída, vou ler essa primeiro, pelo resumo aprece ser bem interessante. Beijos.


 


 

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