Do Outro Lado



I



Ela olhou para os lados. Ao lembrar-se, teve um arrepio involuntário. Gina se perguntou com quão irresponsabilidade e infantilidade ela pode ter tido ganas de perder a virgindade com um assassino cruel e perverso... Mas ao mesmo tempo se lembrando de com havia gostado daquilo, de como havia sido tão satisfatoriamente exaustivo e prazeroso, voraz e incessante... Fora sim, um pouco violento, somente sobre uma capa estirada sobre uma mesa... Mas fora bom, fora ótimo. Foi o momento de sua glória... O momento da verdadeira metamorfose que a transformara finalmente em mulher. E ela gostara... gostara muito. Era uma nova sensação... Ela finalmente era importante. Ela era a amante de Lord Voldemort.

Gina suspirou fundo, meio que satisfeita consigo mesma, mas meio aborrecida... Sentia agora como dera um tiro no escuro, como cuspira ao vento, nadara contra a correnteza... Sentia que podia não estar mais ali para se lembrar disso. Sentiu um espasmo de culpa, de medo. Sentiu nojo de si mesma... Como pudera...? Como pudera ser tão idiota? Ele estivera se aproveitando dela, agora entendia...

Mas sempre que ela pensava nisso ela se lembrava de como ele sabia o que ela estava pensando, como se fossem um só, não tinha como não se arrepender. Se ele se aproveitara dela, fora porque ela deixara... E o que ela mais queria agora é tê-lo de volta...

Seu primeiro pensamento foi "Gina, sua tarada.", mas depois fechou os olhos e segurou o choro.

Ela tornou a colocar a carta na gaveta e dessa vez puxou um recorte amarelado do Profeta Diário. Ela sorriu ao observar a cena da foto que se movimentava tumultuada. Agora ela a achava engraçada.

Numa rua de Hogsmeade, ensolarada e clara de sol matutino, encontrava-se um bando excepcionalmente estranho vestido de preto tentando fugir cheio de caixas nos braços... À frete, sem nenhuma proteção que lhe cobrisse o rosto, estava Voldemort lívido e mais pálido do que o de costume, olhando meio desapontado, por causa do fracasso do plano, e meio furioso, por alguém tê-lo fotografado. Ele puxava a capa de uma figura igualmente vestida totalmente desorientada no meio do tumulto para que ela corresse... Essa criatura tonta que não correra era ela.

Gina se segurou para não rir - isso certamente atrairia alguém para o quarto e isso era o que ela menos queria no memento.



Ela levantou-se da cama completamente nua e foi até o banheiro silenciosamente escovar os dentes e tomar um banho. Abriu as torneiras de água morna e virou-se para o espelhinho da pia para lavar o rosto nela e escovar os dentes. Saiu do banheiro para pegar uma muda de roupas e olhou para a cama. Deu um sorriso - ele ainda estava dormindo. Passou reto, verificou se a porta estava realmente trancada. Deu um muxoxo baixo - é claro que ele não seria tão descuidado a ponto de não trancar a porta. Andou até o guarda-roupas e retirou uma braçada de vestes limpas e pretas, como de costume.

Tornou a passar pelo arco da porta do banheiro silenciosa, por onde saía uma nuvem de vapor, deixando-a entreaberta. O espelho estava embaçado e a banheira já estava cheia. Ela molhou o pé esquerdo devagar, com receio da água, sonolenta. Se inclinou para frente para fechar a torneira e fechou os olhos, sentindo o calor das águas tocar sua pele. Quando ia se endireitando, um par de mãos segurou-a por trás, fazendo-a assustar-se.

- Tom, seu idiota - esbravejou ela mantendo a voz baixa, vendo seu reflexo na água. - Quer me matar do coração?

Ele não respondeu. Recostou-se nas suas costas e cheirou seus cabelos. Ela sentiu um arrepio já conhecido e virou-se para olhá-lo. Já estava vestido com sua calça, mas ainda tinha o peito nu. Parecia completamente acordado.

- Não sei como você consegue acordar tão rápido, eu ainda estou dormindo - falou suavemente, sem conseguir conter um bocejo, recostando-se e o abraçando folgadamente. Ele não recusou seu abraço e pousou as mãos em sua cintura, depois Gina levantou o rosto e deu-lhe um beijo - Agora preciso tomar meu banho e você precisa voltar para seu quarto, caso contrário vão começar a desconfiar de nós dois.

Ela entrou na banheira e relaxou. Ele sentou-se na beira dela e ficou observando Gina.

- Eu sou prioridade máxima por aqui, não tenho que dar satisfações para ninguém - retrucou com displicência.

- Tudo bem, convencido, mas se te vêem saindo do meu quarto a essa hora da manhã o que é que você vai dizer? - disse ela de olhos fechados.

- Vou dizer que não é da conta dele e vou perguntar o que é que estava fazendo no corredor a essa hora da manhã - respondeu calmamente.

Gina riu.

- Sério? E o que é que a gente faz com aquela formalidade toda na frente dos outros de "sim, mestre", "perfeitamente, milorde" se alguém descobre? - disse ela sorrindo, ainda de olhos fechados.

Ele não respondeu de imediato, mas ela não viu a sua expressão porque continuava sem ver nada. Quando respondeu sua voz não seca nem zangada, tampouco, mas parecia estar achando alguma graça naquela conversa.

- Você quer mesmo que eu vá embora, heim? - disse, rindo pelo nariz. - Tudo bem, então, vou deixar a rainha tomar seu banho sossegada. - E, pelo barulho no chão, havia se levantado e dado alguns passos já.

- Alto lá - disse Gina, abrindo os olhos. - Não está se esquecendo de nada, não?

Ele sorriu, retrocedeu e deu lhe um beijo longo.

- Nos vemos no café da manhã, então - disse ele, saindo do banheiro meio que se espreguiçando-se.

Gina tornou a fechar os olhos. Não podia negar que estava feliz. Fazia quase um ano e meio desde que chegara e não pensara nenhum dia em ir embora dali. Parecia que as coisas estavam indo bem para o lado dela. Ela era amante do maior e mais poderoso assassino do mundo mágico e ainda por cima que já a havia torturado antes, mas ele não levantara a mão para ela, e muito menos a varinha, desde que ela voltara. Ela achava até que ele estava sendo maravilhoso com ela. Fizera um bom trabalho... Ah, sim... fizera.

Ela deixou-se afundar para molhar os cabelos e prendeu a respiração sob a água por um bom tempo. Levantou-se quando se sentiu exausta, sentou-se e tirou a água dos olhos. Ele estava sendo bom demais para ela, até. Não batia com o assassino frio e cruel que ela conhecera a vários anos atrás. Ela sorriu novamente ao pensar que fizera bem em ter uma conversa franca com ele já no primeiro momento de acertar as coisas no seu novo "emprego". Desde aquele dia seu comportamento para com ela mudara. Parecia acreditar que ela se tornara uma mulher merecedora de respeito, porque tinha coragem e personalidade. Ela realmente mudara, pensou com satisfação. Gina não era mais a menininha boba de dois anos atrás, agora era uma mulher com garra e determinação. Ela sempre fora inteligente o bastante para aprontar armadilhas para pegar alguém, mas nunca precisara usar realmente e, agora, Voldemort e ela juntavam as cabeças para planejar os passos da Ordem das Trevas e ele tinha prazer em informar que todo estava correndo perfeitamente bem desde que ela tinha juntado-se a eles. Ela não gostava de sair e se expor, só de planejar os próximos esquemas e planos dos Comensais e de Voldemort, naturalmente; a última vez em que saíra em missão o plano não funcionou cem por cento e ela e Voldemort, junto com um grupo de Comensais encapuzados foram fotografados saqueando uma loja de produtos raros para poções. A foto saiu no Profeta Diário, o que foi realmente um problema, pois Voldemort aparecia completamente desmascarado e puxava a capa da roupa dela para que ela corresse, que estava mascarada e encapuzada, mas todos que olhassem bem perceberiam mesmo na foto em branco e preto que a Comensal da foto tinha cabelos ruivos. E isso, como ela sabia, atrairia atenção para ela, Gina Weasley, desaparecida a um ano e meio. Ela descobrira isso uma semana depois de quando entrara para a Ordem das Trevas.

Era um dia de inverno, ela se lembrava, depois de descer para o café da manhã, onde os Comensais diurnos da turma cinco estavam todos comendo sonolentos e conversando sobre a final de Quadribol ou sobre a próxima vítima, sentados na grande mesa comprida do salão do castelo. Tom estava na outra extremidade da mesa, já havia terminado sua refeição e recostava-se para ler o jornal que uma coruja parda havia acabara de trazer.

Gina passara a manteiga no pão descansadamente e começara a comer, pensativa. Fora quando ele abriu a página do meio e soltou um breve assobio, fazendo alguns Comensais olharem, inclusive ela.

- Você devia ler isso, Weasley - dissera ele, fazendo-a erguer as sobrancelhas de surpresa. Ele rasgara a página e levantara-a acima da cabeça, que ela puxara para si com um Feitiço Convocatório.

Ela pegara o recorte de jornal, curiosa, e abrira-o. Bem no alto da página havia uma pequena foto sua e uma manchete: "Gina Weasley, desaparecida." Ela arregalara os olhos de surpresa e soltara uma exclamação sem som enquanto lia a curta notícia.


Gina Weasley, filha caçula de Molly e Arthur Weasley, da seção de Mau Uso dos Artefatos dos Trouxas do Ministério da Magia, está desaparecida desde terça-feira da semana passada. Weasley, que estava noiva de Harry Potter, já havia sido pega sete meses antes pelos Comensais da Morte, que a torturaram acreditando que ela soubesse do paradeiro do noivo. Seu irmão mais novo, Ronald Weasley, também fora apanhado e torturado a menos de uma semana atrás e encontra-se em estado crítico no Hospital St. Mungus para Doenças e Acidentes Mágicos.

O Sr. Potter não foi encontrado para comentar sobre o assunto, já que todos sabem que ele está escondido d'Aquele-Que-Não-Deve-Ser-Nomeado em algum lugar. Os irmão que conseguimos contatar disse que a última vez que a viram foi em casa, onde ela os estava esperando voltar do hospital, onde estavam visitando o irmão. O quarto dela estava revirado, mas fora isso não houve sinal de lutas.

A família teme que ela tenha sido apanhada novamente e pede para quem tiver qualquer suspeita do seu paradeiro que escreva para a redação do
Profeta Diário.


Gina enfezara-se e corara.

- "O quarto estava revirado", ora, que mentira! Foram só algumas roupas... Francamente! E por que é que o Harry não falou para eles? Ele sabia muito bem onde eu estava indo.

Os Comensais olharam curiosos para ela.

- Bem-vinda à família mais odiada do mundo - dissera Tom do outro lado, erguendo a sua taça e dando uma breve risada, enquanto os outros Comensais davam risadinhas abafadas.

É, ela lembrava-se bem disso. Afundou-se novamente na água morna da banheira, pensando como é que se acostumara a viver assim, odiada por toda a comunidade sã da magia.

Passou mais uma grande tempo filosofando sabre o rumo que tomara sua vida e acabou chegando a conclusão de que não poderia ter sido melhor, mesmo porque seus familiares ainda pensavam que ela estava desaparecida ou morta, mas nunca imaginariam que ela estava metida com o mesmo grupo que a estava causando pânico por aí. Ela divertiu-se pensando na expressão de cada um se soubesse que ela não era mais virgem, também. Deu boas gargalhadas sozinha, imaginado a expressão de Harry. Ele bem que merecia saber, pensou Gina, com cruel satisfação.

Nunca mais vira ele também, pensou ela. Isso era o ruim, pensou, mudando a expressão do rosto, ficando séria, encolhendo-se. Harry obviamente pensava que nunca mais a veria, mas deve ter deparado com ela na última foto do Profeta Diário. Para ela isso era arrasador, nunca mais falar com a família ou com os amigos. Apenas isso.

Ela não gostava de discutir com Tom os planos para matar Harry. Ele não fazia perguntas e ela agradecia por isso. Gina achava que ainda sentia alguma coisa pelo ex - não comentava isso com ele, claro, seria demasiado tola em fazer uma coisa dessas. Por isso repreendia-se em silêncio, raivosa consigo mesma por ter coragem de uma reação assim. Não era isso que ela queria.

Terminou de tomar seu banho, enrolou-se toalha, vestiu suas vestes negras e arrumou a cama. Ficou sentada pensando se deveria entrar em contato com alguém do seu passado enquanto não dava a hora do café da manhã. Quando finalmente deu a hora, ela despertou de seus pensamentos e colocou sua capa para descer. Estava realmente na dúvida, mas tentou não pensar nisso nos dias que seguiram. E ela conseguiu.


II



Gina estava recordando tudo isso com um pouco de nostalgia. Alguma coisa restara nela e não queria sair.

Ela lembrava-se bem desse dia, em que ficara pensando na banheira, se questionando do rumo que sua vida tomara... Na época ela pensara que tinha feito bem, mas agora... ela também pensava que tinha feito bem! Isso... não poderia ter sido melhor! Ela queria que não acabasse nunca. Mas acabara. O sonho acabara. Sua vida acabara. Tudo... tudo que ela tinha se perdera e ela teve que recomeçar do zero.

Ela prendeu a respiração, pensando em desenterrar mais velhas recordações. Era isso que ele tinha vontade de fazer... mas será que suportaria? Ela não estava com vontade de derramar lágrimas de saudade. Não, o dia não estava pedindo tristeza... Mas o que fora ela durante todo esse tempo? Uma mulher triste e quieta, trancada em seu mundo de nostalgia que ninguém mais via. Ela estava conseguindo sobreviver assim, de um jeito horrível. Ela pensava que sobrevivera, mas na verdade não vivera. Morrera com ele. Morrera...

Ela tornou a fechar os olhos, deixando-se levar nas recordações que penetravam na sua cabeça com mais facilidade do que ela pensava que era possível...



Ela já esperava quando a porta se abriu e fechou. Ela estava de pé em cima da cama, encostada na parede fria de pedras atrás da cortina, escutando atentamente. Ela ouviu os passos lentos e cautelosos dele se aproximar do lugar onde ela estava, até ver os sapatos pretos aparecerem no seu campo de visão. Foi quando ela pulou.

- Ei, que di...! - ele exclamou, irritando-se por alguém tê-lo assustado, quando ela saltou da cama e o agarrou por trás, furtando a sua capa. - O que é que você está fazendo? - perguntou desconfiado, enquanto ela desprendia o fecho de prata de sua roupa.

Ela deu alguns passos para trás para impedi-lo de pegar a capa de volta e passou por cima das próprias costas. Depois de tê-la prendido na jaqueta jeans (que trouxera de casa), mirou-o com um olhar sinistro e levantou o capuz.

Ele franziu a testa, não entendendo, com um sorrisinho torto.

- Que foi? - ele tornou a perguntar, desentendido.

Ela subiu na cama e ficou de pé, olhando para ele do alto. Depois, quando falou, sua voz soou etérea e sobrenatural, misteriosa...

- Quero ver o mundo por cima... Assim, eu queria saber como é ter poder. - Ela não sorriu, os olhos arregalados para ele.

Tom fez uma cara estranhíssima e pensativa, retribuindo o olhar de Gina. Depois seu rosto se descontraiu e ele deu uma risada abafada pelo nariz, perguntando:

- Eu não sou assim. - Ele tinha as mãos na cintura, como se avisando alguma coisa.

Ela olhou por um breve momento, depois pulou no pescoço dele, que quase caiu para trás. Ela riu também.

- Gina, você não andou bebendo, andou? - perguntou ele achando graça do comportamento dela.

- Não faria diferença, não é? - perguntou ela ao seu ouvido.

- Bem, suponho que não. Mas você está parecendo tão... idiota - concluiu ele, fazendo um gesto de impaciência com as mãos - Eu não sou tão idiota assim.

Ela riu de novo. Com um sorriso misterioso no rosto, ela perguntou:

- E como é que você faria? - Sua voz era a de alguém que parecia estar apenas brincando, mas ele olhou-a com os olhos frios como duas pedras de gelo e ela sentiu um vestígio de um medo que não sentia a dois anos.

Ele virou-se de todo para ela de um jeito calmo mas terrivelmente ameaçador, que instintivamente deu um passo para trás, mas mesmo assim ele segurou os braços dela com força e empurrou-a na parede. Prensada, imobilizada, ela o fitou com os grandes olhos castanhos arregalados de espanto, imaginando o que teria dito de errado. Ele a apertava com tanta força na parede fria de pedra que chagava a doer. Não era natural dele fazer coisas assim depois que eles começaram a ter um caso, mas ela parecia ter feito algo ruim.

- Assim... - respondeu ele de um modo gélido e ríspido. Então aproximou-se rápido e beijou-a de um modo tão frio e dominador, como da primeira vez, que ela sentiu náuseas. Ela nunca mais recebera um beijo assim, e aquela sensação toda que já havia sentido da primeira vez voltou com intensidade dobrada, talvez porque agora ela confiava nele. Ela sentiu como se estivesse tendo suas energias sugadas pela boca e não podia fazer nada. Parecia estar sendo contaminada com algo letal. Quando ela tentou se desvencilhar ele segurou-a com mais força e continuou o beijo frio e sem paixão, mais violento e mais voraz de que antes. Ela sentiu-se novamente como se estivesse se afogando, se perdendo num nevoeiro, no escuro... Foi quando as lágrimas começaram a escorrer de seus olhos e começou a sentir-se realmente sufocada e inebriada que ele parou e deixou-a respirar. Seu coração batia com tanta força que ela podia ver seu peito pular. Ele a assustara, a avisara... Então ela olhou-o.

Ela espantou-se a constatar que ele sorria docemente. A pressão que estava sobre seu corpo cessou e as mãos que apertavam seus braços soltaram. Ela suspirou aliviada, mas ainda assustada.

- Então... viu como age Lord Voldemort? Aprendeu? - avisou ele calmamente, fitando-a.

Ela sentiu um pequeno impacto familiar ao som daquele nome. Era tão normal para os bruxos se assustarem com aquilo que ela nem lembrou que andava dormindo com o próprio fazia dois anos e meio e que estava prensada na parede por ele, mesmo porque ela o chamava de Tom e os Comensais de Lord das Trevas. Abriu a boca para responder, mas então caiu em si. Ele não estava ameaçando-a, mas sim mostrando a ela que seria difícil alguém se passar por ele. Mas ela não achara graça nenhuma.

- Não...tem...graça! Você realmente me assustou agora - exclamou com fúria, tentando se desvencilhar. Ele olhava-a com um olhar curioso.

- Você... - ele hesitou, estupefato - Você se assustou ao som do meu nome? - disse quase rindo.

Ela aturou com paciência.

- É, bem, o costume... Mas você percebeu? - perguntou tímida, meio envergonhada, tentado disfarçar fazendo força para se soltar.

Ele começou a rir, fazendo-a corar. Ela reteve os olhos nele irritada.

- Ora, se fosse você no meu lugar você também acharia estranho - retrucou ela irritada - Em toda a minha vida, as únicas pessoas que eu ouvia dizer o seu nome era Dumbledore, Harry e Hermione... E olha lá, não era sempre...

Mas ele continuava rindo e essa risada depois se transformou numa gargalhada fria e sem emoção. Mas de repente ele se calou - ela pisara no seu pé.

- Gina, qual é? Mas que coisa! - exclamou ele, olhando com os olhos apertados para ela.

- Eu já disse para você não dar essa risada medonha - sibilou ríspida, apontando um dedo na cara dele. - Ela dá arrepios! - disse entre os dentes, passando as mãos pelos braços.

Ele sorriu e pegou-a de jeito, que não resistiu e caiu no seu feitiço rapidinho, e ele nem estava usando a varinha.

Dois minutos depois eles já estavam abraçados na cama se beijando, ela com a jaqueta desabotoada, deixando a mostra seu sutiã. Os dois iam entrar em algo muito mais sério quando bateram na porta. Os dois pararam de dar os beijos ruidosos, paralisados, escutando. Foi quando bateram novamente na porta. Eles se entreolharam, as bocas ainda coladas, então ela se levantou.

- Já vai! - disse em voz alta, tentando esconder a tensão. Ela mantinha os olhos pregados nele, assustada. Se alguém o encontrasse ali, toda a armação que vinham atuando a dois anos iria por água abaixo. Ela fechou os olhos, tentando se controlar por alguns segundos, para pensar no que fazer.

- Suba na cama. Eu cuido disso - disse entre os dentes, num sussurro. Então virou-se para o pequeno corredor e foi em direção à porta. Respirou fundo mais uma vez e abriu-a.

Ela começou a atuar, iria usar um tom frio e indiferente, como se estivesse levemente curiosa, mas também não demonstraria nenhuma emoção em especial.

- Sim?

Rabicho abriu a boca para falar, mas engoliu as palavras e mirou-a de alto a baixo. Depois perguntou, uma leve insinuação na voz roufenha.

- Estava esperando alguém, Weasley? - perguntou, pousando os olhos na sua blusa desabotoada. Ela fechou a cara e virou-se de lado.

- Não. Eu estava para entrar no banho - respondeu secamente, apressando-se em abotoar a jaqueta velha. - E então, o que veio fazer aqui, Perebas? - e ela sentiu satisfação ao ver que ele fizera cara feia de ser chamado assim.

- Ah, claro... - ele parecia de repente estar se lembrando do que viera fazer ali - Bem, estamos procurando o Lord das Trevas, está acontecendo uma confusão lá em baixo e não o encontramos em nenhum outro lugar do castelo...

- E o que ele estaria fazendo no meu quarto? - cortou ela muito seca, lançando a ele um olhar faiscante. - O que está querendo insinuar?

- N-nada - respondeu ele com a voz esganiçada. - Eu só pensei que... Ei...! - ele parou, olhando-a com uma expressão estranha. Ela cerrou as sobrancelhas. - Por que você está usando a capa dele?

Ela gelou: esquecera-se de tirara a capa! Ela agora estava encurralada e Rabicho iria descobrir. Ela estava pensando o mais rápido possível em como sair dessa quando ouviu um barulhinho de discordância atrás dela. Então viu no rosto de Rabicho seu espanto e soube o que tinha acontecido.

- Talvez seria porque ela seja... minha amante? - respondeu a voz de Tom muito seca, vindo do escuro corredor ás suas costas.

Rabicho recuou dois instintivos passos, lívido. Gina olhou rapidamente para trás com uma expressão espantada.

- O que você está fazendo? - sibilou com raiva. - Está entregando tudo!

Ele mantinha os olhou fixos em Rabicho, que suava tanto que corria o risco de derreter, mas então virou-os para ela.

- Ora, vamos, Gina... Eu não estou entregando nada. O Rabicho aqui já desconfiava, não é Rabicho? - perguntou cinicamente, fazendo o outro recuar mais um passo.

Tom não sorria. Passou uma mão por trás dos cabelos dela e desprendeu sua capa, pegando-a de volta. Depois que a havia soltado, jogou nas próprias costas e tornou a virar-se para Rabicho, que parecia paralisado de medo.

- Então? Nega que você já desconfiava? - perguntou num tom frio, jogando a cabeça para trás num sinal de superioridade. Depois deu uma risadinha irônica e deu um pequeno passo em direção ao servo que estava pálido como um pergaminho. - Parabéns, você descobriu! - disse, fazendo um pequena reverência.

Rabicho parecia espantado de mais para dizer alguma coisa. Tom começou a andar em círculos ao redor dele.

- Por que é que Gina Weasley caiu no grupo cinco, não é mesmo? Por que é que ela conseguiu um quarto na Ala Oeste, no mesmo corredor do quarto do Lord das Trevas? Por que é que ele some de vez em quando e ninguém pensa em procurar no quarto da Comensal da Morte mais bonita do grupo, não é? Por que será? - insinuou venenosamente. Gina se perguntou porque é que Rabicho ainda não tinha desmaiado. Ele não era tão forte assim.

- Sabia que você é um Comensal tão insignificante que não faria diferença nenhuma se você desaparecesse? - Rabicho engoliu em seco - Digamos que você só serviu para me entregar os Potter, mas nem isso fez direito, porque se não eu não ficaria treze anos sem poder, não acha? Mas você teve sua utilidade. - acrescentou dando um olhar de esguelha para a mão de prata que Rabicho ostentava sobre a capa.

"Mas se eu lhe matasse, eu teria dificuldades para explicar aos Comensais decentes onde você haveria de estar... Ou então eu poderia lhe mandar para uma missão super secreta e dizer que você fracassou", comentou, fingindo estar pensando seriamente nesse caso. Gina sabia que era para pôr medo e sentiu vontade de rir, mas isso certamente cortaria o barato.

Ele ainda deu mais algumas voltas ao redor de Rabicho, depois parou de frente para este.

- Decidi - anunciou sombriamente. Ele pegou a varinha de dentro do bolso e começou a girá-la entre os dedos, brincando.

Rabicho deixou escapar um gemido abafado.

- Agora, escute aqui; se eu souber que você deu com a língua nos dentes você pode se considerar morto, ouviu, Rabicho? Tenho sido muito paciente em relação a você. E se eu souber que andou duvidando de Gina novamente...

Apontou para o meio dos olhos do homenzinho na sua frente, que deixou escapar outro gemido e apertou os olhos com força.

- Nossa, essa foi cruel - comentou Gina, não se contendo e sorrindo da porta de seu quarto. Ele olhou para ele e deu uma piscadela divertida, antes de tornar a se virar para Rabicho.

- Você disse que estava havendo uma confusão lá em baixo, Rabicho? Aonde, exatamente? - perguntou eficiente.

Rabicho abriu um dos olhos devagarinho, cauteloso. Depois respondeu, gaguejando.

- N-no... sa-salão...

- Para de gaguejar, seu monte, e responda de uma vez! - ordenou Tom em voz alta a suficiente para fazer o outro desmaiar.

- N-no salão das refeições - falou de uma vez, a voz aguda e esganiçada. - Lestrange e Nott estão se matando lá em baixo e não querem saber de ninguém para faze-los parar - disse, antes que fosse interrompido.

- Certo... Lestrange e Nott, aqueles cabeças-duras... Bom, você já serviu sua utilidade, agora... - Rabicho tornou a apertar as olhos com força, encolhendo-se - Obliviate!

Rabicho abriu os olhos espantado antes do feitiço atingi-lo, então fez uma cara de paisagem extremamente boba, então olhou para o mestre na sua frente, já com a varinha abaixada e arregalou os olhos de ansiedade. Gina sorriu do batente da porta - era impressão dela ou o seu adorável amante estava se tornando menos impiedoso?

- Meu amo...?! Eu estava te procurando... - disse Rabicho numa voz estranha. Ele piscava estranhamente e parecia estar se perguntando o que acontecera com o tempo em que encontrara seu mestre.

- Eu sei Rabicho... Está tendo uma confusão lá em baixo, eu sei - disse com uma voz calma, mas meramente entediada.

Rabicho espantou-se.

- Como é que o senhor sabe? - perguntou curioso. Tom lançou a ele um olhar avaliador, como se perguntando como é que tem coragem de perguntar alguma coisa a ele, mas respondeu, com uma leve irritação.

- Um pouquinho de Legilimancia responderia sua pergunta, idiota...

Rabicho corou depois que o mestre se virou e seguiu pelo caminho que levava a sala de refeições. Gina se perguntou se deveria segui-los, depois decidiu-se, entrou, pegou sua capa e os seguiu de longe. Eles passaram pelos escuros corredores de pedra frios, ao longe um barulho de uma algazarra que ia aumentando de acordo com o que iam avançando. Tom olhou para trás quando ouviu os passos de Gina ecoando mais atrás, mas não demonstrou nenhuma emoção em particular e tornou a virar-se para frente. Quando desceram as escadas, muitos gritos se tornaram audíveis, junto com estampidos de feitiços e guinchos de alegria. Gina sentiu-se levemente nauseada.

Ele deu uma paradinha antes de abrir a porta, jogou a cabeça para trás e entrou. Rabicho parou assim que cruzaram a porta. Gina seguiu Tom assim que ele entrou e parou com a visão.

No mínimo uns quarenta Comensais estavam reunidos, todos uivando e assobiando, incentivando ou duelistas, que atiravam violentos feitiços uns nos outros em cima da mesa. Os Comensais mais afastados do centro da mesa e mais perto da porta se calaram assim que Tom entrou.

Ele mirou Lestrange e Nott com os olhos em chamas, uma expressão ameaçadora deformando seu rosto. De acordo com o que ele avançava, os Comensais iam se calando, até que o salão estava quase totalmente silencioso. Ela segui-o pelo caminho que estava sendo aberto quando ele passava. Quando chegou perto da mesa, viu que dois Comensais tentavam manter Bellatrix longe da mesa, mas estavam tendo dificuldades para fazer isso, já que ela chutava e esperneava, urrando de fúria. Os dois chegaram perto da mesa no mesmo momento em que Nott rendia Lestrange com uma Maldição Cruciatus. Gina pode ver o sorriso pressuroso e cruelmente satisfeito de Nott quando o outro se inclinou sobre a mesa, berrando de dor; mas o sorriso foi rapidamente varrido do rosto dele assim que Tom começou a aplaudir. Nesse momento o salão fez um silêncio total, tenso, de modo que os aplausos soaram ameaçadores. Nott baixou a varinha lentamente, branco como papel.

- Ótimo...! Perfeito! - a voz de Tom ressonou calmamente pelo salão silencioso - Realmente maravilhoso exemplo de respeito entre os Comensais da Morte. Estou... fascinado! - completou sarcástico, os aplausos solitários ainda ecoando pelas paredes de pedra.

Fez-se silêncio absoluto ao som dessas palavras, quebrados apenas pelos aplausos sarcásticos de seu mestre. Até Bellatrix parara de se espernear e estava observando a cena boquiaberta. Os bruxos que a seguravam soltaram-na com o choque.

- Então? O que foi que aconteceu com o regulamento dos Comensais de nunca brigar entre si? - perguntou calmamente, olhando de Nott para Lestrange, que ainda estava caído sobre a mesa. Os dois se entreolharam e nem pareceram que estiveram brigando a momentos atrás. Nott abriu e fechou a boca varias vezes, como se não conseguisse falar. Lestrange apoiou os braços na mesa e tentou erguer-se, soando frio.

Nesse momento, Bellatrix fez um movimento rápido, se desvencilhou dos braços dos Comensais que a estiveram segurando e subiu na mesa também. Ela correu até Nott, passando pelo marido sem olhar, e deu um belo chute na canela dele (nessa hora ouviram-se muitos "hummm"s). Obviamente que estava fora de si - seu punhos cerrados e sua boca crispada de raiva. Gina olhou para Tom; ele sorria vagamente e balançava a cabeça em sinal de incrédula desaprovação.

- Certo, Bella, você já bateu, agora desça daí que eu cuido disso... - disse divertido, mas Bellatrix parecia não ter ouvido e continuava a dar pontapés e murros em Nott. Tom ergueu uma sobrancelha. Gina se segurou para não rir; embora soubesse que a hora não pedia isso, nunca vira ninguém da Ordem das Trevas ignorar Tom completamente.

- Certo, seu monte de merda...! Você... vai... pagar... caro por ter machucado o... meu... marido... - resmungava ela entre os dentes enquanto esmurrava Nott, que tentava se esquivar, espantadamente lerdo.

"Muito bem Bella, eu cuido disso. Eu sei que o Nott merece apanhar mas... BELLATRIX, EU DISSE PARA PARAR!" berrou com raiva. Tirou a varinha do bolso e agitou-a, sendo que milésimos de segundos depois Bellatrix Lestrange aterrissava no meio dos Comensais da Morte, no chão frio. Ela lançou um olhar amargurado a Tom, depois para Nott, mostrou-lhe a língua, então levantou-se, os olhos cheios d'água, e saiu pela porta da Ala Norte, batendo-a ao passar.

Ele tornou a olhar para os dois, então disse numa voz baixa e venenosa:

- Estou decepcionado com vocês dois. Acho que precisamos ter uma conversa... - disse entre os dentes, fazendo os dois tremerem. - Vamos! Agora mesmo, andem, para a minha sala - sibilou fazendo uma sinal com a cabeça, apontando a varinha para os dois. Lestrange se levantou, os lábios tremendo e lançou uma olhar irritado a Nott, mas este não olhou, apenas desceu da mesa com a cabeça baixa e as mãos nos bolsos. Gina achou que eles se pareciam com duas crianças de briguinha que acabara de levar um xingão do pai. Ela segurou o riso com toda a determinação quando Nott passou por ela cabisbaixo, depois Lestrange com uma expressão aterrorizada, mas não conseguiu evitar um sorrisinho.

Quando Tom se virou com a varinha apontada para os dois, porém, olhou para Gina e retrucou de mal humor e ríspido:

- Eu não estou achando engraçado, Weasley - o que fez o sorriso dela embaçar rapidamente.

Ele e os dois Comensais da Morte subiram as escadas de vagar, enquanto o resto deles abriam caminho, todos olhando com cautela. Então ele se virou, no topo da escada e olhou todos ele com uma expressão horrenda.

- E se eu souber de outra briga nas próximas três semanas, todos vão ficar três dias sobrevivendo só de água. Estejam avisados. - E virou-se novamente para recomeçar o caminho que tinha parado.

Assim que os passos dos três desapareceram no corredor, todos os Comensais desataram em falar, todos abafados. Alguns saíram rapidinho do local, assim com Gina, que foi para a sala de projetos ver se conseguia pensar em alguma coisa e aproveitar para deixar um bilhete a Tom.

Passou lá a tarde toda, até que já tivesse terminado a programação de terça-feira todinha e tentou pensar em algo em que preparar para a entrada em Hogwarts em uma importante missão no mês seguinte. Apenas o que atrapalhou sua concentração foi os berros de Nott e Lestrange, que ficaram ecoando sinistramente pelo castelo por umas três horas. Sabia que eles ficariam dias presos nas masmorras...


III



Ela acordara as três horas da manhã sentindo-se estranha. Ela permaneceu como estava, os olhos fechados, escutando a tempestade bater na vidraça ao alto da parede do quarto, sentindo a luz dos relâmpagos passar pelas suas pálpebras. Ele não fora dormir com ela essa noite; a cama parecia estranhamente vazia. Ela sentou-se, esfregou os olhos e mirou a lareira, onde algumas brasas ainda piscavam avermelhadas no meio das cinzas. O endredon não estava conseguindo impedir o frio de se impregnar em sua pele e ela estava se encolhendo, o corpo arrepiado. Sem conseguir enxergar direito na escuridão do quarto, iluminado apenas por algum relâmpago que ousava riscar o céu, ela pegou sua varinha no tampo do pequeno criado-mudo de madeira ao lado de sua cama e apertou-a com a mão, uma sensação estranha de mal-estar se espalhando pelo seu corpo, os olhos apertados pelo ruído monstruoso de um relâmpago.

Quando ela abriu os olhos, apontou a varinha para a lareira decidida e murmurou "Incêndio!", que na mesma hora irrompeu em chamas, iluminando o quarto amplo, definindo as sombras. Ela sentiu-se muito mal de repente. Sua cabeça girava e ela sentia náuseas. Gina pegou seus chinelos e caminhou até o banheiro, com fraquezas e calafrios.

Ao entrar, mirou-se no espelho e viu seu rosto pálido e sombrio se contorcer de mal-estar. Seus lábios estavam brancos e seus olhos pareciam um pouco fundos. Foi a última coisa que ela viu antes de correr para o vaso sanitário e vomitar.

Os braços tremendo, fraca, ela se arrastou até a pia para lavar o rosto e escovar os dentes. Gina não sabia o que estava acontecendo. Ela não poderia ficar doente agora, não tinham curandeiros no castelo e seria demasiado arriscado alguém acompanhá-la até o St. Mungus para Doenças e Acidentes Mágicos. Se ela chegasse mesmo a desenvolver uma doença, ou ficaria muito ruim ou estaria em realmente sérios problemas; e nisso ela não queria pensar... não agora.

Ela fechou os olhos deprimida e começou a chorar baixinho. Será que deveria contar a Tom? Será que ele tomaria medidas segurar de tratá-la? Ela não sabia se ele gostava realmente dela ou do corpo dela. Que ela faria se lhe contasse e ele decidisse procurar outra amante e despachá-la? Gina sabia bem que ele era capaz de fazer isso. Dos dois anos que eles dormiam juntos, a vida pessoal dele ainda era completo mistério para ela... Ela não poderia saber...

Sentindo-se péssima, ela voltou para a cama, o tempo todo se perguntando se deveria ir até o quarto dele e contar o que estava sentindo. Mas então o medo que ela tinha dele impediu-a de fazer isso. Ela pensou pela primeira vez nesse assunto. Será que ele gostava dela? Gostava realmente dela? Ela não sabia se gostava dele...

Em dois anos ele sabia mais a respeito dela do que ela dele. Ela não sabia o que se passava na cabeça dele, mas, por outro lado, ele sabia de todos os sentimentos dela por causa da Legilimancia que ele sabia aplicar. Era estranho ficar ao lado de uma pessoa por dois anos e não saber quase nada dela, a não ser que gostava de matar qualquer um que entrasse no seu caminho. Ela se sentiu um pouco culpada - ela saíra dos braços de Harry Potter para cair nos braços de Voldemort, seu pior inimigo, que já fora o dela também. Ela já o odiara...

Mas agora ela não sabia o que sentia por ele, mas não era ódio. Era quase... amor? Mas na sua mente sentia alguma coisa que não deixava-a pensar que era isso, que simplesmente era impossível amar um assassino completamente sangue-frio que já a torturara uma vez... Ela apenas se sentia atraída, era isso.

Mas será que era só isso? A estranha sensação que dava nela quando lhe fitava os olhos por muito tempo... Não conseguia sentir-se sozinha, desprotegida. O que era isso? Certamente que ela não sentia isso no seu primeiro ano em Hogwarts - mas, aliás, pensou Gina, detendo os olhos inevitavelmente na tapeçaria ilustrada com um desenho de uma serpente verde e prata da Sonserina, na parede logo acima da escrivaninha, não poderia sentir o mesmo pelas páginas de um diário. Ou podia?

Ela queria que ele se preocupasse com ela...

Gina deitou a cabeça nas pernas encolhidas quando outra onda de tontura assaltou-a. Ela desesperou-se mais ainda. Ela queria ajuda, queria alguém que escutasse o que ela estava sentindo... Mas quem?

Ela levantou a cabeça dos braços, distraída. "Mione", disse uma vozinha no fundo de sua cabeça. Era isso! Ela poderia falar com Mione. Mas como fazer isso sem que Tom descobrisse?

Ela pensou... Pensou e chegou a uma conclusão.

Levantou-se de um salto, mas parou abruptamente, porque isso fez uma dor forte como uma agulhada espetar na sua cabeça. Continuou o que iria fazer andando mais de vagar. Caminhou até a escrivaninha, ascendeu uma vela, pegou uma pena, abriu um tinteiro e puxou um pedaço de pergaminho. Começou a rascunhar uma carta, a caligrafia nervosa e apressada.


Querida Mione,

Como vai indo? Espero que não se assuste tanto com a minha carta. Eu não estou morta. Isso pode parecer um choque para você, uma revelação dessas, assim, de repente... Eu gostaria, porém, de pedir para que você não conte nem mostre a carta para ninguém, muito menos para Rony, isso é muito importante para mim. Se alguém descobre que andei me comunicando com você, daí sim eu sou uma mulher morta... Não, não é drama.

Eu morro de saudades de todos vocês, principalmente de você e do Rony e, claro, de papai e mamãe também. Como vão eles? Ah, como vão os gêmeos? Ouvi dizer que a loja deles anda indo muito bem. Depois eu lhe explico porque os Comensais da Morte nunca encostaram um dedo naquela loja, mas pode ter certeza de que isso tem dedo meu. Eu ainda adoro todos vocês, mas acho que não nos veremos novamente assim tão cedo. Mas, me conta, o Rony já lhe pediu em casamento? Já? Não? Quero saber.

Devo confessar que eu fugi de casa mesmo, depois de uma briga com o Harry, a dois anos atrás. Tenho certeza de que você não vai gostar e saber onde eu estou... Não, definitivamente não vai gostar. O Harry sabe, não entendo porque ele mentiu - eu sei de tudo, claro, saiu no
Profeta Diário. Mas, se você não descobrir por essa carta, como eu sei que é capaz, pergunte a ele que saberá lhe responder. Ele deve ter ficado frustrado, "coitado"... Mas eu quero mais é que ele se dane, desculpe o vocabulário.

Não posso falar tudo que gostaria numa carta; embora as chances sejam remotas, ela pode ser interceptada. O que eu queria mesmo é poder conversar cara a cara com você. Você poderia estar n'A Toca ás oito e trinta da noite, quarta-feira, sozinha? A questão é que eu estou muito doente e não posso ter certeza de que certa pessoa irá me ajudar... Por favor, eu preciso de sua ajuda!

Eu não estou pedindo permissão para mandar esse correio, nem de usar o Pó de Flú quarta, então, seja discreta. Se alguém descobre, vai me render horas de Maldição Cruciatus (é verdade que tenho algumas prioridades, mas nunca se sabe). É, bem, se me pegam... Embora a melhor coisa que eu já fiz na vida foi fugir para cá! Mas não me ignore por isso, eu ainda não mato trouxas e (desculpe a expressão) "Sangue Ruins".

Acho que já escrevi demais. Em todo caso, não responda a carta - seria demasiado arriscado para mim. Ainda preciso levar a carta ao corujal sem que ninguém me veja. Felicidades para você.

Com saudades,

Gina Weasley.



Ela releu o rascunho e então começou a passar a limpo caprichando o máximo possível na caligrafia. Quando terminou, dobrou-a muitas vezes e lacrou-a.

Rapidamente ela colocou o robe, os sapatos de couro de dragão, a capa para se proteger do frio e abriu a porta do quarto com cautela. O corredor da Ala Oeste do segundo andar estava deserto. Com as pontas dos pés, passou deslizando pelo chão de pedras até alcançar a escada, mas a tempestade lá fora fazia tanto barulho que não fez diferença o ruído que ela fazia com os pés. Na calada da noite, a escuridão quebrada apenas pela luz dos relâmpagos violentos que entravam pelas pequenas vidraças ao alto e que estavam sendo chicoteadas pelas águas da chuva, Gina descia apressada pela escada escura, em direção ao saguão. Quando estava para abrir a porta, porém, um barulho de vozes vindas do Salão de Refeições a impediu de escancarar a porta. Ela estacou, escutando.

- ...é realmente estranho. Quem aquela ruivinha metida a besta pensa que é? - dizia uma voz fina e irritada. A pessoa falava baixo, como se temesse estar sendo vigiada. Então outra voz, dessa vez mais grave e mais preocupada murmurou.

- Ela é G.W. - disse outra voz prontamente. - Está com ciúmes, Bella? - perguntou a mesma voz, esta masculina e arrastada, que ela sabia bem de quem era.

- Ora, é claro que não! - retrucou a vozinha irritada. - O Lord das Trevas dá autoridade para quem ele quiser, só acho que...

- Eu não falava sério - cortou a outra voz. - É, você não viu porque saiu daqui com raiva depois que ele te jogou de cima da mesa, mas ela estava sorrindo... Então ele olhou para ela e disse que não estava achando graça. Só isso! Ele estava furioso, porque não a atirou longe também? Quero dizer, eu o conheço bem, isso não faz sentido... Essa história está soando estranha...

Um barulho abafado de um copo sendo colocado em cima da mesa chegou aos ouvidos de Gina. Tom tinha que saber disso, pensou ela rapidamente, se tinha gente desconfiando deles... Mas depois, com uma sensação estranha, lembrou-se que não poderia estar escutando aquilo. Mas então a voz fina recomeçou a falar e ela voltou novamente a atenção para as pessoas dentro do salão.

- Sabe, Lúcio, eu acho que ele protege ela por algum motivo. Só não imagino qual possa ser.

Fez se silêncio lá dentro, como se os dois estivessem pensando. Gina arriscou olhar pelo buraco da fechadura. Do outro lado do salão, ela viu Bellatrix Lestrange sentada onde Tom costumava-se sentar segurando uma xícara, com uma cara emburrada e, mais adiante, na próxima cadeira, Lúcio Malfoy, com os cabelos bagunçados, batucava com os dedos sobre a madeira da mesa com impaciência. Então este se levantou, bocejou e despediu-se de Bellatrix, saindo pela porta que dava à Ala Leste. Bellatrix ficou mais um tempo sentada, terminando de beber o conteúdo de sua xícara. Quando um trovão particularmente alto encheu o salão, ela levantou-se - Gina pode notar que ela não estava trajando roupas de dormir - e saiu para a cozinha, voltando logo em seguida para subir a escada que levava até a Ala Norte.

Sentindo-se novamente nauseada, Gina recuou lentamente, espiou para os lados e tomou a escada que levava à Ala Norte. Seguiu o resto trajetória até o pequeno corujal particular sem encontrar ninguém, prendeu a carta na perna de uma coruja parda e pediu para entregar assim que a chuva cessasse. Na volta também não encontrou ninguém. Como se uma nova esperança soprasse para ela, sentiu-se melhor. Dentro de dois dias estaria vendo sua melhor amiga de novo, mesmo que essa idéia ainda lhe desse um pouco de receio.


IV



Assim, as oito e quinze da quarta-feira, Gina saia da sala de planejamentos com um sorriso no rosto. Isso significava que o plano dela dera certo e Tom não iria aparecer no castelo até as nove e vinte e que ela poderia usar a lareira do quarto dele sem ser interrompida. Como ele confiava nela - Gina supunha que confiava -, ela não se preocupava com problemas do tipo de uma troca de senha ou um feitiço de alarme.

Às oito e vinte ela ouviu-o chamar Rabicho para dizer que estaria fora e, depois que ele se distanciou, chamou-a discretamente para dizer que ela tinha esquecido uma blusa no seu quarto, para ela passar lá quando desse. O plano funcionara melhor do que ela esperava, já que ela tinha deixado a blusa lá na noite passada de propósito. Embora fizesse muito tempo que não utilizasse sua fraca técnica da Oclumência, precisou usa-la essa noite enquanto mentia descaradamente. Ele se despediu sem rodeios e desaparatou.

Gina seguiu calmamente para o corredor da Ala Oeste e verificou se ninguém estava olhando. Como se meramente estivesse passando para ir para o seu quarto, que era, provavelmente, o cômodo do castelo que ela mais se sentia confortável devido ao tempo que ela ficava lá. Mas sua carga horária já havia terminado, ela poderia ir onde bem entendesse sem ter que dar satisfações, embora se fosse pega tentando entrar no quarto do Lord da Trevas seria difícil explicar o que estava fazendo, mesmo que a justificativa da blusa valesse para ambos, um outro Comensal da Morte não saberia o que raios a peça de roupa estaria fazendo lá e a resposta verdadeira estava fora de questão.

Ela parou em frente a porta depois de certificar-se de que ninguém a estava observando, então disse a senha - sangue de barata - e entrou. Novamente teve uma visão ampla do quarto que ela bem conhecia a muito tempo agora, que era ainda maior do que o dela e, supostamente, de qualquer outro Comensal. Tinha um belo armário de mogno ao lado da porta da mesma madeira e que era um banheiro (incomparavelmente maior que o da suite dela) na parede de frente para a porta, uma cama com longas cortinas de veludo verde escuro com detalhes em prata (coisa de sonserino, pensou ela na primeira vez que entrara ali) na frente, uma escada em caracol que dava para o terraço da torre oeste que ela sabia que existia atrás da porta semi-oculta por uma tapeçaria a alguns passos à direita da cama, no pequeno corredor da porta de entrada. No outro lado do quarto havia uma mesa ampla com gavetas que suportava tanto projetos, mapas e plantas, como penas, vários frascos de tintas e diversos rolos de pergaminho em branco atulhados, sem falar nos livros; à direita desta, existia um canto onde um par de sofás e uma mesinha estavam colocados, sobre um magnífico tapete, que estavam ali para "tratar de assuntos sigilosos"; mais adiante, para a esquerda do móvel, havia um cabide quase invisível de tantas peças de roupas que estavam penduradas no momento, o que fez ela rir por um momento. Logo ao lado tinha um grande espelho onde dava para se mirar por inteiro e próximo, no canto colocado na diagonal, um tapete fofo de lã em pelo que ela adorava, em frente à lareira, também posicionada na diagonal, de canto.

Gina olhou bem para ver se Nagini não estava por ali, tirou os sapatos e pisou no tapete, tirou sua varinha do bolso e deixou-a cair sobre ele também passando a mão num saquinho com a boca amarrada fortemente com um cordão em cima da estante da lareira que ela tinha certeza que continha Pó de Flú desde a primeira vez em que vira - e acertara. Sentou-se, olhou no relógio na parede ao lado, espichou a cabeça dentro da lareira, pegou um punhado do pó verde e brilhante e atirou-o lá dentro, que emergiu instantaneamente em chamas esmeraldas.

- A Toca - falou, numa voz alta e clara.

Foi uma sensação muito engraçada. Ela sentia o corpo onde estava, mas sua cabeça parecia estar percorrendo quilômetros, girando. Ela fechou os olhos, tonta - nunca gostara tanto assim de viajar com Pó de Flú. Quando sentiu que desacelerava, abriu os olhos lentamente.

O que ela viu fez ela ter uma estranha reação: cada objeto que tinha na casa onde morara por quase toda a vida estava praticamente intacto, nada fora do lugar, tudo como sempre fora... E isso fê-la sentir-se estranha, uma mistura de saudades e desprezo. Fora ali que ela crescera, fora ali naquela mesma sala que Harry terminara com ela...

Seus olhos então se viraram para a porta, onde alguém entrava de vagar e silenciosamente. Ela pode distinguir a silhueta sombria de Hermione, que, ao notá-la, abriu um imenso sorriso. Então selou a porta com um feitiço e apressou-se a ir para frente da lareira, sorrindo.

- Gina! Que bom. Pensei que talvez pudesse ser um trote - falou Hermione parecendo feliz em vê-la, mas um pouco nervosa.

- Você está com uma aparência ótima, Mione. - falou. Gina observou que ela se parecia muito menos com uma garota e muito mais com uma mulher. Seus cabelos, embora ainda fossem armados, estavam mais claros e mais lisos do que eram. Estava alguns poucos centímetros mais alta e seu rosto era bastante determinado, porem ainda mostrava um pouco daquele ar de inteligente que ela sempre passava.

- Você também está diferente, mas não está com uma cara muito boa - disse a amiga tom com de quem pede desculpas. - Como você está passando?

Gina fez uma careta de desdém.

- Nada bem. Minha saúde anda vacilando de uns três dias para cá. Mas, mudando de assunto, o que você fez com o resto do pessoal? - perguntou com cautela e curiosidade.

Hermione deu uma risadinha baixa.

- Não se preocupe, estão todos dormindo. - E com um sorriso maroto acrescentou - Minha poção do sono nunca falha.

Gina abriu um grande sorriso também com a malandragem da amiga.

- Se não for muito incômodo - disse Gina, agora mais séria -, eu gostaria de pedir para você falar comigo, aqui. É que eu preciso estar atenta caso alguém apareça... Você sabe, eu não tenho permissão para falar com você. - Hermione pareceu entender bem a gravidade da coisa e concordou com a cabeça, então Gina continuou - Você deve dizer "Basilisk Hall, Ala Oeste, quarto número Quinze". Anotou?

Hermione, que já havia pego um pedaço de pergaminho, concordou com a cabeça, concentrada no que estava escrevendo.

- Pode voltar e me dê dois minutos no máximo - disse Hermione numa voz eficiente que deixou Gina segura.

- Não demore. Temos exatamente quarenta minutos até que ele volte...

- Ele? - perguntou Mione, erguendo as sobrancelhas, curiosa.

- É, bem, depois eu te explico. Ah, e não tente vir até aqui, não vai dar certo. Também será impossível rastrear, entendeu? Até logo. - E puxou a cabeça da lareira.

O quarto de Tom tornou a entrar em foco. Gina puxou a varinha e ascendeu a lareira para continuar mirando o fogo por alguns instantes, antes que a cabeça de Mione aparecesse nele.

- Puxa - ela exclamou, girando os olhos e investigando o quarto admirada. - É seu?

Gina deu uma risada breve e sem emoção, o que se pareceu estranhamente com a risada que Tom costumava dar.

- Quem dera, minha amiga, quem dera... Não repare na bagunça - disse com uma careta -, geralmente é bem mais arrumado, mas é que estamos sobre pressão, as coisas estão ficando cada vez mais complicadas e ele não deixa o elfo doméstico entrar aqui... - completou com um ar de riso. - Bom, seja bem vinda ao quarto de Lord Voldemort - disse sem hesitar, predizendo a reação da outra.

Foi quase como ela imaginara. Mione ficou pálida e fez uma cara assustada, os olhos arregalados.

- Mas, Gina... O que é que você está fazendo no quarto dele? - sibilou entre os dentes.

Gina deu um sorriso enviesado.

- Você deveria ter perguntado o que nós estamos fazendo aqui... Certo, digamos que eu tenho permissão para entrar aqui - disse Gina numa voz inexpressiva, parada e calma, mas que tremeu um pouco ao continuar - ...mas eu não deveria estar usando o Pó de Flú.

Mione pôde não ter entendido, mas consentiu, tentando disfarçar a preocupação.

- Mas não se preocupe - disse, fazendo um gesto de impaciência com as mãos, despreocupada - Nessa hora ele deve estar no Eire procurando por um pequeno grupo de membros da Ordem da Fênix que saíram para procurar Jimmy Stewart e vai levar uns quarenta minutos até que ele descubra que foi uma pista falsa e volte explodindo coisas de raiva... e você estará a milhares de quilômetros daqui. Só espero que ele não ponha a culpa em mim, se bem que isso quase nunca acontece... Ele acha que existem Comensais mais estúpidos do que eu, e com razão! Se bem que... dessa vez fui eu - terminou, encolhendo os ombros.

Hermione ficou calada por um tempo, depois falou com uma voz desapontada.

- Você é um deles, então? Você é realmente um deles?!

Gina não soube que tipo de resposta irônica deveria dar, então apenas concordou com a cabeça. Mione parecia que fora estapeada e mirava a amiga com os olhos tristes.

- Ora, vamos, não me olhe assim! São todos maníacos idiotas! Menos ele, é claro, o único que pensa nesse lugar... Você acha que eu faria amizade com sonserinos? Bem, Narcissa é esnobe; Bellatrix é uma chata escandalosa; outras são tão estúpidas quanto Crabbe... Faz dois anos que eu não converso com uma mulher, Mione. Eu nunca saio a serviço, não gosto. Eu sei fazer as Maldições Imperdoáveis, mas nunca usei. Entende que ainda sou um membro da Grifinória?

Hermione mirou-a por poucos instantes antes de sorrir novamente.

- Tudo bem. Só que eu não posso negar que fiquei desapontada com você, Gina. Mas... é claro que você pode contar comigo.

Gina sentiu-se aliviadíssima e disposta a contar tudo o que estava se passando para Hermione.

- Eu entrei em contato com você porque eu ando passando muito mal ultimamente. Eu não posso sair daqui para ir ao hospital, obviamente pensam que eu estou morta. Eu apenas queria uma opinião de algum amigo esperto para mim ter uma idéia do que se passa e poder tratar pessoalmente. - disse ela, fazendo Hermione corar de orgulho.

- Eu posso tentar descobrir... O que você está sentindo, exatamente? - perguntou a outra num tom sério, porém descontraído.

Gina suspirou e começou a narrar os sintomas de sua misteriosa doença. Quando terminou, Hermione fez uma cara pensativa e séria, que deixou Gina preocupada.

- E febre? - perguntou a amiga indecisa, depois de pensar um pouco.

- Baixa e contínua por algumas horas ao dia, principalmente quando vai caindo a tarde - esclareceu Gina, tensa.

Hermione tornou a fechar a cara, pensando. Então, depois de um tempo, ela levantou os olhos para a amiga com uma cara estranha e resmungou alguma coisa.

- Mas... seria impossível... Só se... não, não poderia...

- O quê, Mione? O que não poderia? - perguntou Gina nervosa, sentindo o coração palpitar no peito com a força de um cavalo.

Hermione continuou com a cara estranha, mas encarou Gina de um modo fixo.

- Você poderia não estar realmente doente - disse a outra, parecendo não acreditar nas próprias palavras.

Ela esperou. Então, de repente, viu nos olhos da amiga o que vinha lhe atormentando transparecer, então Mione perguntou o que ela mais temia em toda essa vida:

- Você não poderia estar grávida, poderia? - Sua voz soava nervosa.

Gina sentiu a cor esvair do seu rosto. Será que era isso que estava acontecendo? Será que ela estava grávida? Todos os sintomas batiam, agora que Mione sugerira... Podia ser possível, claro, mas também podia acontecer... Burra, não se precavera, não fizera nada para evitar... e ela não era estéril... ele tampouco.

Alguma coisa em Gina deve ter deixado Hermione preocupada, porque ela perguntou:

- Gina, você está bem?

Gina tornou a erguer os olhos, horrorizada, o coração batendo à mil, as mãos tremendo.

- ...Eu poderia. - disse numa voz baixa e desesperada. Hermione não entendeu, porque baixou as sobrancelhas de um modo confuso. - Quero dizer, eu poderia estar grávida - disse ela nervosa e Hermione abriu a boca chocada -, mas isso não podia acontecer... definitivamente não poderia acontecer...

Fez-se silêncio. Então finalmente Hermione pareceu ter recuperado a fala.

- Gina, quem? - perguntou desesperada. - Um Comensal da Morte?

Gina sacudiu a cabeça com impaciência, sentindo algo entalar na garganta.

- Não! Meu Deus, não! É pior, muito pior... O pior deles... - sua voz se perdeu no desespero que sentia.

- V-você quer dizer que...? - começou a perguntou incrédula, mas foi cortada.

- É, é. Porque acha que eu disse que tenho permissão para entrar aqui? - disse desesperada, bagunçando os cabelos com a mão sem querer. Ela viu Hermione ficar pálida novamente e boquiabrir-se realmente chocada.

- Não acredito que... que você deixou ele te tocar, Gina! - disse Hermione, a incredulidade estampada visivelmente em seu rosto.

- Se ele me tocou foi porque eu deixei. Aliás, foi eu quem comecei, para dizer a verdade. E vou admitir, foi útil. Olha onde eu estou! Mas, por favor, não me ponha mais para baixo do que já estou. Eu sou maior de idade - retrucou Gina nervosa, meio impaciente.

Hermione ergueu as sobrancelhas, obviamente pensando que não era hora de brincadeiras.

- E o que é que você vai fazer? Contar a ele? - perguntou Hermione displicente, ainda com vestígios de descontentamento na voz.

Gina forçou uma risada.

- Você não conhece Tom Riddle melhor do que eu... - comentou, embora isso não lhe agradasse em nada. Continuou mirando a amiga com os olhos vagos. - Suponho que... se eu contar ele me mata; se eu fugir ele me mata; se eu não contar ele descobre e me mata também. Que chances eu tenho?

Gina pensou bem. Hermione olhou no fundo de seus olhos e perguntou calma:

- Você não se importa de morrer, não é? Mas agora...

- ...mas agora eu espero um filho que não pode morrer comigo. É, você entendeu.

Mas a expressão no rosto de Hermione não era nada animadora. Gina sentiu algo entalado na garganta.

- Olha, eu não te culpo por odiá-lo, eu também já o odiei, lembra? E ainda odeio-o quando ele diz que ainda não desistiu de matar vocês todos, mas... mas eu consigo perdoar todos os momentos de angústia que ele me causa quando o vejo entrar pela porta. Ele já se tornou parte da minha vida, e agora ele é pai de um filho que eu provavelmente carrego aqui dentro. Eu não escolhi que ele me quisesse, Hermione... Quem sou eu para mudar isso? Poxa, aqui eu tenho coisas que nunca tive. E sou realmente boa no que faço.

Hermione olhou para o chão, pensando meio desconcertada. Gina pensava vagamente no que acabara de dizer. Sim, aquilo saíra de sua boca e era verdade... Mas ela não sabia se acreditava.

- É, você tem razão... - disse Hermione, tornando a levantar os olhos para ela. - Eu também não escolhi gostar do idiota do seu irmão.

As duas se entreolharam um pouco, depois caíram na risada.

- Ah, claro - disse Gina com a voz fraca, limpando os olhos com as costas das mãos - ...continuamos bobas, pelo jeito...

- É que certos traços nunca mudam - falou Hermione sabiamente, mas sorrindo com malícia. - Mas vamos mudar de assunto. Estou vendo que faz tempo que não corta o cabelo - observou Hermione com um olhar de aprovação.

- É, bem, eu sempre quis deixá-lo crescer, mas mamãe nunca deixava, então eu estou aproveitando. Aqui ninguém da palpite no tamanho do meu cabelo - disse com um sorriso. - O seu também está diferente, Mione.

Hermione sorriu.

- É, parece que ele está mudando sozinho... Eu estou gostando da forma que ele está tomando, o único problema é que ele está clareando. - terminou com desagrado.

- Ah, mas está bom assim - falou Gina sincera. - Mas, me conta, como estão todos por aí? - perguntou descontraída, tirando sua capa e virando-se para atirá-la sobre a cama.

- Ah, bem. Levando a vida fugindo dos seus simpáticos amiguinhos... - disse com desdém. - Mas fora isso estão todos bem. Fred e Jorge estão faturando uma nota na loja deles; Percy estava discutindo política agora a pouco na cozinha com seu pai (ele ainda está morando em Londres, mas sempre passa aqui quando dá); Gui pediu Fleur Delacour em casamento, acredita?; Carlinhos ainda anda na Romênia, não sei o que anda fazendo; sua mãe ficou mais calada depois que você desapareceu mas já está quase completamente recuperada; Rony continua reclamando de tudo; Harry - mas parou, fitando Gina - Bom, Harry ainda não te esqueceu.

Gina suspirou com irritação.

- Bom, diga a ele que me esqueça.

Hermione olhou-a com um olhar meio bravo.

- Não é assim tão fácil. Ele acha que é o culpado de você ter ido parar aí e ele ainda te...

- Ah, mas ele é o culpado - retrucou Gina ainda mais irritada. - Se ele não tivesse terminado comigo eu não estaria aqui! À propósito, diga a ele que eu agradeço muito por essa oportunidade - acrescentou com ironia.

- Gina, você não toma jeito, não é? Acho que a convivência com os maus elementos estão afetando seu cérebro. Você não era assim! - disse Hermione sorrindo contra vontade. - E, bem, você disse que estamos na lendária Basilisk Hall?

Gina concordou com a cabeça. Nessa hora uma mosca particularmente chata começou a zunir nos ouvidos de Gina e a impedia de falar toda vez que ela abria a boca.

- Ah... acho que você... se meteu... com a pessoa... errada - dizia Gina entre os dentes tentando acertar o inseto enquanto ele provocava subindo e descendo e Hermione ria.

Gina tateou o tapete a procura da varinha. Quando pegou-a, mirou bem e amaldiçoou "Avada Kedavra". Fazia meses que não praticava a maldição, nunca contra outras pessoas, claro, mas dessa vez foi algo totalmente diferente de algo que ela já tivesse experimentado: um jorro muito mais forte do que ela estava acostumada de luz verde ofuscante saiu da varinha e ela foi empurrada para trás com a pressão. Por um momento pensou que finalmente pegara o jeito, mas então pensou bem e endireitou-se abismada, praguejando.

- ...Infeliz. Burro, idiota, infeliz! Essa não é minha varinha - disse lentamente, tentando explicar para Hermione. - Infeliz dia para o imbecil esquecer a varinha!

De repente ela congelou. Isso significava que teriam menos tempo. Ele poderia aparatar a qualquer momento.

- Oh-oh, estamos ferradas - disse sem demonstrar muita preocupação. Tentava não passar muito nervosismo para a amiga. - Escuta - continuou mais séria - se quiser falar comigo de novo tente Basilisk Hall, Ala Oeste, quarto número Dezessete, OK? Sempre por volta das seis e das sete da tarde. Agora vá rapidinho.

- Cuide-se - disse Hermione simplesmente e, com um estalo, desapareceu.

Bem em tempo. Gina achou uma grande sorte, porque em cinco segundos alguém aparatava às suas costas.

- Eu estava imaginando quanto tempo levaria para você vir buscá-la - falou despreocupada, erguendo a varinha e virando-se para olhá-lo. - E não me venha com "como foi que você conseguiu pegar" porque foi você que esqueceu.

- É... eu sei. - disse simplesmente, aproximando-se para pegar.

Gina levantou-se e encarou-o. Sua capa estava coberta de neve.

- Tom, eu estava pensando... Acho que nos passaram uma informação falsa. A Ordem da Fênix não poderia ter mandado um grupo para a Irlanda, eles precisariam de no mínimo três dias para descobrir onde Stewart está... Poderia?

Ele ergueu uma sobrancelha.

- ...Não - disse finalmente. Ele arreganhou os dentes furioso.

Gina começou a rir.

- Então quer dizer que vocês ficaram em baixo da neve por quinze minutos... - e riu mais - por nada?

- É realmente muito engraçado - disse ele secamente, mirando-a com os olhos em fendas.

- Ah! - ela deu ombros - Olha aqui, estou morrendo de medo dessa sua cara de mau. - Deu um puxão na gola da roupa dele e beijou-o. Ele não recusou, embora ainda parecesse estar furioso.

Quando deram um tempo no ato, ela comentou.

- Seu quarto está uma bagunça.

- ...o inútil daquele elfo doméstico...

- ...que você não deixa entrar aqui.

Ele abriu a boca para falar alguma coisa mas hesitou, então abanou a cabeça e riu.

- Ah, nada... Você venceu. - Então seu tom de voz se tornou mais sério. - Agora eu preciso ir buscar o resto de grupo cinco.

Ele deu outro beijo nela.

- Ah, posso te esperar aqui? - ela perguntou, sorrindo maliciosamente.

- É claro - respondeu, com um sorriso ainda mais safado. E desaparatou.

Gina tornou a sentar-se no tapete, observando o fogo com melancolia. Deitou-se e começou a desabotoar a blusa sem pressa. Ela desejou que ele voltasse logo, porque agora não tinha mais ninguém com quem conversar. Distraída, fechou os olhos e, sem querer, adormeceu.


V


Parecia que estivera apagada, mas não dormira nada. Ela começou a retomar a consciência aos poucos porque sentiu-se estranha, com calor. Aos poucos ela foi tentando abrir os olhos, sonolenta. Estava suando. Ao abrir os olhos ela se descobriu que ainda se encontrava no quarto de Tom. Olhou no relógio da parede e, com um solavanco na barriga, observou que passava da meia noite. O fogo da lareira ainda crepitava alegremente ao seu lado. Ela ia olhar para o outro lado quando uma voz fê-la parar como estava.

- Você está doente, Gina?

Ela olhou para a direção de onde tinha vindo a voz dele, da cama. Ele estava lá, sentado, encostado na cabeceira da cama, desnudo da cintura para cima, lendo alguma coisa. Ela encarou-o, virando-se de barriga para baixo.

- Doente? - fingiu estar estranhando a pergunta.

- Você está com febre - informou ele sem rodeios, levantando-se da cama e colocando o pedaço de pergaminho na mesinha ao lado.

- Eu? Com febre? - repetiu ela com o coração batendo forte, tentando por tudo não demonstrar que sabia de algo.

- É - disse ele distraído, aproximando-se. - Você não tem idéia do que possa ser?

- Hum, não... Como eu poderia saber? - respondeu ela nervosa.

Ele chegou do lado dela, descalço, e ela olhou para cima para fitá-lo, então sentou-se. Ele também sentou-se no tapete, de frente para ela.

- Temos que descobrir o que é isso - disse ele repentinamente sério, olhando-a.

- Vai ver não é nada - disse Gina rapidamente.

- Eu também quero que não seja nada, mas não podemos saber. Pode ser mais sério que imaginamos. - Gina observou um pouco de rara preocupação passar pelo seu rosto e sentiu-se imensamente grata por isso.

Ela, ao mesmo tempo em que se sentia feliz por saber que ela tinha alguma importância para ele, sentia-se agora um pouco distante, sentia-se sozinha. Tinha medo que ele descobrisse que ela estava mentindo para ele.

Alguma coisa em seu rosto fez a expressão no rosto dele mudar. De repente ele pareceu muito cansado, embora seu rosto de aparência jovem não combinasse com o sentimento. Ele olhou para ela demoradamente mas sentia que ele não estava tentando ler seus pensamentos. Depois, como se chegassem em um acordo em silêncio, ela deu um impulso para frente e se aconchegou nos seu braços. Ele não disse nada por um tempo, apenas sentindo o calor dela, absorvendo mais um problema para tratar...

- Pode não parecer, mas eu me preocupo com você, Gina - disse com uma voz cansada no ouvido dela.

Gina arrepiou-se: seria isso uma espécie de declaração? Será que ela ouvira direito? Ele estava dizendo que se preocupava com ela?! Fechou os olhos, tentando não pensar em nada, tentando amá-lo...

- Eu me preocupo mais com você do que me preocupei com qualquer outra pessoa... - continuou ele vagamente, por cima da cabeça dela.

Ela se afastou um pouco, fitou-o por um instante, observando seu rosto, sua beleza. Beijou-o... e assustou-se ao sentir que seus lábios estavam mais quentes que os dela.



Nota: Comentem!!!!!!! Antes q eu me arrependa...

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