Enganos
Capítulo 4: Enganos
A família Granger Weasley havia voltado do jantar na Toca há algum tempo, e Hermione continuava insatisfeita com a conversa que tivera com Rony sobre Hugo. Não queria ferir os sentimentos do marido, mas a insegurança com relação à percepção do ruivo quando se tratava de entender os sentimentos dos filhos era grande. Rony continuava sendo uma porta quando se tratava de entender o que se passava com os outros, e Hermione não o recriminava por isso, pois sabia que ele não fazia por mal, mas deixar o filho sofrer para não magoá-lo era inadmissível.
Ela estava no escritório montado em sua casa, para ter privacidade quando trazia trabalhos do Ministério, quando Rony entrou dizendo que iria se deitar, e a esperava no quarto, com aquele olhar de cachorro triste, implorando carinho. Hermione percebeu que seria aquela uma da poucas oportunidades para conversar com o filho, longe do marido, nos próximos dias.
- Tudo bem – respondeu Hermione, com um olhar cúmplice para o ruivo. – Subo num minuto, só vou guardar essas coisas.
Rony sorriu e subiu dizendo que iria tomar um banho, e a esperava na cama.
Hermione aguardou alguns segundos para ter certeza de que Rony subira, e se dirigiu à sala com a esperança de encontrar o filho lá. Afinal, era o cômodo da casa preferido de Hugo, depois de seu quarto. Para seu desapontamento, ele não estava lá, portanto ela teria que arriscar e ir ao quarto dele sem que Rony percebesse.
Hermione subiu as escadas tentando fazer o mínimo de barulho possível. Atravessou o corredor, passando pela porta de seu quarto, chegando à porta que dava acesso ao quarto do filho, no fim do corredor.
- Hugo? – disse baixo, batendo na porta de leve. – Posso entrar?
A porta se abriu e Hugo encarou a mãe por alguns segundos. Abaixou os olhos, e permitiu a entrada da mãe, enquanto se encaminhava para sua cama.
Ele se deitou, e Hermione se sentou na beira dela, olhando de modo carinhoso ao filho.
- Podemos conversar? – perguntou.
- Tudo bem – respondeu Hugo, não dando muita atenção a mãe.
- Gina me contou o acontecido no jogo, e quando fui falar com você, seu pai disse que estava tudo resolvido. Mas só vou ficar tranqüila quando ouvir isso de você.
- Se papai disse que está tudo bem, devia acreditar nele. Nós conversamos e já resolvemos tudo.
Hermione notou um tom de desagrado no filho, mas ficou na dúvida se seria pelo fato dela não ter acreditado em Rony, ou por estar magoado com suas cobranças. Como queria resolver aquela situação, continuou:
- É que me preocupo com você. Não quero que fique triste com as coisas ditas por Lílian, ela estava de cabeça quente. Você sabe como sua prima pode ser explosiva de vez em quando.
- Sei. Não se preocupe, já falei com ela também, e está tudo resolvido.
- Sabe que pode falar o que quiser pra mim, não sabe? Se estiver chateado comigo, gostaria de saber.
- Não é nada, mãe. Está tudo bem. Apenas estou cansado. O jogo foi agitado e quero descansar – Hugo juntou toda a sinceridade possível e tentou sorrir para mãe.
- Está bem, então – Hermione levantou-se e se deu por vencida. Não adiantava continuar aquela conversa naquele momento. O melhor seria voltar a conversar com o filho num outro dia, quando a lembrança das palavras da prima estivesse mais fraca em sua lembrança, e ele poderia se abrir para ela. – Saiba que temos muito orgulho de você, e tenho certeza de que será bem sucedido na carreira que escolher.
Hugo deu um meio sorriso e fechou os olhos, dando a entender à mãe que iria dormir.
Bastou Hermione sair do quarto para que Hugo abrisse os olhos, levantasse e caminhasse até a porta, para ter certeza que a mãe fora a seu quarto. Havia tristeza em seu olhar quando retornou à cama.
- Será bem sucedido no que escolher – sussurrou ele. – Bela maneira de cobrar que eu tenho que escolher logo uma profissão. Ela pensa que eu sou idiota?
A conversa não tinha atingido o objetivo desejado por Hermione. Hugo estava mais indignado do que antes. Pelo visto, não era apenas Rony que tinha dificuldade em entender os sentimentos dos filhos. Afinal, Hermione nem reparara que tinha piorado as coisas ao invés de consertá-las.
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Harry, Gina e os filhos chegaram a sua casa logo após o jantar com a família Weasley na Toca, e embora Lílian tivesse se desculpado com Hugo e com toda a família durante o jantar, Harry continuava muito chateado com a atitude da filha. Por isto, resolveu não falar mais no assunto, até se acalmar.
Gina sugeriu que tomasse um banho e fosse se deitar. Ela se encarregaria de por os filhos na cama (como se algum deles precisasse ser posto), e se certificaria de que estava tudo em ordem.
Lílian, Alvo e James subiram para seus quartos, pois todos estavam todos muito cansados, deixando Gina na sala. Ela apagou todas as luzes, verificou todas as portas e subiu lentamente, tentando não fazer barulho. Quando estava acabando de subir as escadas notou, pela abertura na parte debaixo da porta, que a luz do quarto de Lílian estava acesa. Concluiu que a filha devia estar chateada, então resolveu conversar com ela.
Quando se aproximou da porta, escutou a voz de Alvo, conversando com a irmã.
- Você não devia ter dito aquilo. Devia aprender a se controlar. Deixou todo mundo chateado no jantar, e o papai mais ainda.
- Sei que fiz besteira tá, Alvo, mas acho que já recebi todas as broncas que merecia por hoje.
- Não quero te dar lição de moral, nem nada. Estou aqui como seu irmão. Você não devia magoar tanto as pessoas que gostam de você.
- Olha quem está falando de magoar. Espera até o tio Rony e a tia Hermione saberem que você e a Rose estão namorando. Aí você vai ver o que é magoar as pessoas.
Gina teve que por as mãos na boca pra conter o grito de surpresa que se formou dentro dela, enquanto seus olhos ficavam arregalados.
- Não fale do que não sabe, Lílian – respondeu Alvo, sem desmentir a irmã. Afinal, só teriam mais alguns dias de agonia até a verdade vir à tona. – Mamãe pode escutar, e a confusão seria enorme. Até o fim de semana tudo será resolvido, portanto fique de boca fechada.
- Não sei o porquê desse segredo. Aposto como todos iriam gostar, após o choque inicial, é claro. Vocês são os queridinhos da família. Acho que vocês só terão mais trabalho com o tio Rony.
- Esqueça isso e vá dormir – disse rispidamente Alvo. – E nem pense em tocar nesse assunto novamente. Isso é o que eu ganho por querer te ajudar.
Percebendo que o filho estava para sair do quarto, Gina correu para o seu, batendo a porta segundos antes de Alvo ganhar o corredor. Ela encostou o rosto na porta e pôde ouvir o filho passar, descendo em direção ao andar térreo. Ainda ofegante, devido à surpresa, ela se sentou na poltrona existente em seu quarto. Olhou para Harry, que dormia profundamente, e pensou se deveria acordar o marido para contar o que acabara de ouvir.
Sentiu-se um pouco intrusa, pois mesmo sem querer escutou um segredo de Alvo sem que ele soubesse, e imaginou se não seria melhor esquecer o assunto. Podia esperar o fim de semana quando, segundo o filho, tudo se resolveria. Mas uma coisa a preocupava: a reação de seu irmão.
Gina sabia do gênio de Rony, e o mais provável seria ele ter um enfarte quando Alvo e Rose contassem. Na melhor das hipóteses, avançaria nos dois, dizendo o quanto eles foram irresponsáveis, pois eram primos e isso não estava certo.
Gina achou melhor não acordar o marido. Harry já estava nervoso o suficiente, e aquela notícia só iria deixá-lo mais transtornado. Ela sabia quem era a pessoa mais indicada para ajudá-la a resolver o que fazer. Hermione sempre fora o membro da família Weasley mais centrado e lúcido, e com certeza saberia qual a melhor resposta para suas dúvidas.
Ela resolveu que iria conversar com a cunhada logo pela manhã, mas a procuraria no trabalho, para não deixar o irmão curioso. Ela tomou seu banho e resolveu dormir. Afinal, teria muito para resolver no dia seguinte.
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Hermione chegou ao Ministério fazia algumas horas e analisava alguns documentos em sua sala. O dia não estava sendo agradável, pois o café da manhã em casa tinha sido no mínino estranho. A conversa com Hugo não tinha surtido o efeito esperado, pois quase não conversara com ela durante o período entre acordar e sair para o trabalho.
Rose também não estava agindo da maneira costumeira. Normalmente, a filha fazia questão de falar com os pais para saber as atividades agendadas por eles, mas simplesmente ficara calada e pensativa durante todo o café da manhã.
Contudo, era outra coisa que a deixava mais curiosa. Um bilhete de Gina pedindo para ir até seu escritório, para conversarem, veio logo pela manhã, trazido por Ptolomeu, a coruja da família. Dizia que iria chegar ao escritório da amiga por volta das 10 horas da manhã, e perguntava se ela poderia recebê-la. Pedia que mandasse a resposta por Ptolomeu, e que não queria usar a rede de Flú porque queria privacidade para conversar.
Hermione respondeu que não haveria nenhum problema, e estaria esperando Gina no horário marcado.
Rony questionou o porquê de tanto segredo e qual seria o motivo da conversa. Chateada com a indiferença da filha e mau humor do filho, Hermione acabou sendo um pouco grossa com Rony, dizendo que não sabia. Não era adivinha, e se Gina queria privacidade deveria ter os motivos dela. Acabaram tendo uma pequena discussão, com Rony dando a entender que a esposa devia estar naqueles dias por estar tão irritadinha, o que deixou Hermione furiosa.
A manhã terminou com ela saindo de casa nervosa com Rony e chateada com os filhos, ou seja, uma desgraça total. Ainda havia a conversa com Gina, que pelo tom da carta não deveria ser boa notícia.
Às dez em ponto Gina bateu em sua porta, e foi recebida com um caloroso abraço. Embora estivesse sorrindo, Hermione notou um ar preocupado no semblante da amiga, e teve certeza no mesmo momento de que suas suspeitas eram reais.
- Bom dia, amiga, tudo bem? – disse Hermione preocupada. – Recebi seu bilhete. Algum problema?
- Tudo bem, Hermione – respondeu Gina. – Mas preciso te contar uma coisa. Acredito que você seja a pessoa mais sensata para me ajudar, embora o assunto tenha a ver com você, Rony e Harry também.
Hermione ficou assustada com as palavras de Gina. Notando a preocupação que se formou no rosto de Hermione, Gina tratou de acalmá-la.
- Calma. O assunto é sério, mas podemos resolver tudo. Na realidade, será um pouco chocante para a família toda, mas se realmente for verdade, não existirá muito o que fazer. Sente-se, vou te contar tudo.
Gina contou a Hermione tudo sobre a conversa entre Alvo e Lílian, e a reação da amiga não foi diferente da sua. Ficou abismada, principalmente por nunca notar nada além de uma grande amizade entre os dois. Pediu que Gina contasse toda a história novamente, e que tentasse se lembrar dos detalhes da conversa.
- Então ele não negou que estivesse namorando a Rose? – perguntou Hermione, ainda incrédula com o que ouvia.
- Não – respondeu Gina. – Mas também não confirmou. Minha preocupação é com a reação do Rony. Sabe como ele é estourado e protege a Rose.
- É verdade. Ele pode enlouquecer se só souber dessa estória na hora em que Rose e Alvo resolverem nos contar. O melhor é prepararmos o terreno antes. Contudo, ainda acho melhor falarmos com Lílian para termos certeza dos fatos.
- Tudo bem – respondeu Gina. – Só não podemos demorar, Alvo disse que tudo estará esclarecido no fim de semana. Temos no máximo uns três dias.
- Concordo. Não temos tempo a perder. Será que Lílian está em casa? Podíamos ir até lá agora.
- Com certeza está, mas acho melhor que Alvo não esteja, senão pode desconfiar. Vamos fazer o seguinte, vamos para minha casa, e se Alvo estiver lá peço pra ir até o Beco Diagonal, comprar algumas coisinhas – Gina deu aquele sorriso maroto, de quando fazia suas artes quando era criança. – Tenho uma lista enorme lá em casa de coisas que preciso, isso nos dará bastante tempo para conversar com Lílian. O que acha?
- Perfeito. Um plano digno de uma Weasley.
- Então vamos, temos que resolver isso logo.
Elas aparataram do Ministério, aparecendo segundos depois em frente à porta da casa de Gina, próximo à Toca.
Gina entrou e chamou por Alvo. Segundos depois, o garoto apareceu na sala sorrindo para a tia e correndo para abraçá-la.
- Tudo bem, tia Hermione? – disse Alvo. – A Rose veio com você? Onde estão os outros?
- Vim só, querido – Hermione olhou para Gina, sugerindo que aquilo já servia para comprovar as suas suspeitas. – Preciso resolver alguns assuntos com sua mãe.
- Alvo – disse Gina. – Poderia ir ao Beco Diagonal pra mim? Eu e Hermione estamos querendo fazer um jantar para seu pai e seu tio, se não comprar já os itens dessa lista não será possível, e preciso discutir algumas coisas com sua tia ainda.
Gina conjurou uma lista que estava na cozinha, e Alvo ficou desanimado ao vê-la. Sem dúvida, iria perder a tarde inteira com aquilo.
- Você pode almoçar por lá, querido. Tome. Aqui tem dinheiro suficiente para as compras, e para o seu almoço – Gina retirou uma sacola de moedas e a entregou ao filho.
Sem ter como negar o favor a mãe, Alvo conformou-se e, pegando o saco de dinheiro, preparou-se para aparatar.
- Sua irmã está em casa? – perguntou Gina, antes que Alvo aparatasse.
- Sim. Está lá em cima, em seu quarto – respondeu, aparatando em seguida.
- Vamos lá – disse Gina a Hermione. – Quanto antes resolvermos essa situação, melhor.
As duas subiram as escadas, atravessaram o corredor, e Gina bateu na porta do quarto de Lílian, que disse um “pode entrar” bem abatido.
- Bom dia, querida, tudo bem? – disse Hermione, olhando Lílian deitada em sua cama, desanimada.
- Oi, tia, a senhora por aqui? – disse Lílian, levantando-se para cumprimentar Hermione. – Espero que tenha me perdoado com relação ao lance com o Hugo. Eu realmente falo demais às vezes.
- Não se preocupe Lílian, sabemos que não falou por mal. Sei que gosta demais do seu primo.
- O caso é que não estamos aqui pra discutir isso, filha – disse Gina, precisamos ter uma conversa muito séria com você.
Lílian se assustou com o tom da mãe e sentou-se em sua cama, enquanto Gina e Hermione conjuravam cadeiras para se sentarem.
- O caso é que ontem à noite eu vim aqui para ver se estava tudo bem com você, antes de dormir, e escutei sua conversa com Alvo – começou Gina. – E precisamos saber se o que você disse é verdade.
- A senhora escutou minha conversa com o Alvo? – disse Lílian indignada. – A senhora não tinha esse direito. Ele vai me matar.
- Não vai não porque ele não precisa saber – Gina respondeu a filha. – E quanto a não ter direito, a culpa não foi minha, pois não foi por querer. Se era um segredo, vocês deviam ser mais cuidadosos.
- Mas o que vem ao caso, Lílian, é que precisamos saber se isso é realmente verdade. Temos que preparar seu tio pra essa notícia. Ele sabe ser um trasgo de vez em quando, e pode magoar muito a todos – Hermione tentou passar à sobrinha a importância daquela informação, e o quanto uma reação explosiva poderia ser maléfica para todos.
- E o que eu tenho a ver com isso? – perguntou Lílian. – Falei aquilo, mas nunca tive certeza se eles estão namorando ou não.
- Mas o que te levou a achar que eles estavam namorando? – perguntou Gina.
- Nesse último ano, eles pareciam cheios de segredos, além de viverem grudados o tempo todo – respondeu Lílian. – Rose andava suspirando pelos cantos, e quando dizíamos que ela estava apaixonada ficava vermelha como um pimentão. Lógico que negava, mas como só a víamos com o Alvo, deduzimos que eles estavam juntos. O engraçado é que Alvo nunca negou, mas também não confirmava o namoro. Acho que Rose não queria assumir antes de falar com o tio Rony.
- Mas você já os viu juntos? – perguntou Gina.
- Na realidade, não – respondeu Lílian. – Mas os dois andam juntos desde o segundo ano, quando entrei pra escola, e que eu saiba nenhum dos dois nunca namorou ninguém.
- Mas isso não prova nada – respondeu Hermione. – Acho precipitado falarmos alguma coisa com o Rony.
- Contudo a frase que o Alvo disse me deixou em dúvida, afinal se tudo estará resolvido no fim de semana, é sinal que eles realmente têm um segredo – Gina concluiu. – Seria possível que Rose estivesse namorando outra pessoa, Lílian?
- Não existe a remota chance de ser outra pessoa além do Alvo – respondeu Lílian, resignada. – Rose nunca se interessou por ninguém. Na escola, só havia o Alvo e os estudos.
Hermione e Gina se entreolharam incrédulas. O mais provável era que os dois estavam realmente juntos, e não havia outra saída, tinham que preparar Rony e Harry para a notícia, mas como elas não faziam nem idéia.
- Obrigada, filha – disse Gina, acariciando o rosto da filha. – Agora deixe com a gente. Não conte nada ao seu irmão.
- O que vocês vão fazer? – perguntou Lílian. – Acho que vocês deveriam respeitar a decisão deles, se realmente se gostarem.
- Não se preocupe, Lílian – respondeu Hermione. – Faremos de tudo para preparar seu pai e seu tio para a notícia – Gina se levantou, beijou o topo da cabeça da filha, e fez sinal para Hermione, chamando-a para sair.
Elas desceram até a cozinha e Gina, certificando-se da presença apenas das duas no andar de baixo, fechou a porta e se virou para Hermione, dizendo:
- O que você acha?
- Acho que não temos certeza de nada, mas não podemos arriscar – respondeu Hermione. – Se uma notícia dessa for dada a Rony de surpresa, não faço nem idéia de qual seria a reação dele. Só penso que seria, no mínimo, desastrosa.
- Concordo com você. Acho que Harry, depois do choque inicial, iria digerir melhor a notícia, mas acho bom prepará-lo também. Não custa nos precavermos – disse Gina.
- Tudo bem. Mas como iremos fazer isso? – perguntou Hermione. – É um assunto muito delicado.
- Acho que o melhor é tirarmos todo mundo daqui de casa, podemos mandá-los para a Toca, e você vem pra cá com o Rony, como convidados de um jantar só para os casais. Depois de jantarmos contamos tudo bem devagar, tentando não assustá-los – respondeu Gina.
- Temos que pensar como iremos contar a eles. Tenho muito medo da reação de Rony.
- O melhor é pensarmos com calma. Marcamos o jantar para amanhã à noite, para termos algum tempo para decidir isso.
- Certo, então – respondeu Hermione.
Hermione e Gina permaneceram em silêncio por alguns segundos. Olhavam-se, esperando que uma delas tivesse a coragem de fazer a incomoda pergunta que rondavam suas cabeças.
- O que você acha disso tudo? – perguntou Gina, reunindo coragem. – Acha certo? Acha que eles podem ser felizes juntos?
- Se é certo eu não sei, mas se eles realmente estiverem apaixonados não existe muito que fazer não é? – Hermione não parecia muito segura de si. – Veja os nossos casos, esperamos, e esperaríamos mais ainda, o tempo que foi necessário para ficarmos com as pessoas que amávamos. Se o amor deles for sincero como os sentimentos que tínhamos, nada será capaz de separá-los.
Gina sorriu. Afinal, sabia exatamente do que a cunhada estava falando. Esperara quase sete anos para finalmente poder ter um relacionamento com Harry, e sabia que tinha valido a pena, pois era o homem da sua vida. Como Hermione, se apaixonara pelo marido desde o momento que o conheceu, e nada podia mudar isso.
- Você tem razão, Hermione. Se eles realmente quiserem ficar juntos, têm a minha aprovação.
- Também concordo. Contudo, é melhor que não fiquem sabendo do nosso conhecimento de seu segredo. Vamos preparar Harry e Rony, e deixá-los à vontade para nos contar quando acharem necessário.
- E dá pra entender o receio deles, não é, Hermione? – Gina riu. – Ter o Rony, ou o Harry como sogro não deve ser fácil.
Hermione riu, pois entendera perfeitamente o que Gina disse. Tanto o marido, como Harry não eram exemplos de sensibilidade, e provavelmente seriam sogros difíceis.
Com tudo combinado, Hermione se despediu da cunhada, e voltou para o Ministério para finalizar alguns assuntos antes de ir pra casa e falar com Rony sobre o jantar. Só precisava se controlar para não deixar que Rose soubesse da ciência dela com relação ao segredo de seu namoro.
Para a sorte de Hermione, Rose estava completamente alheia à tudo. Independente do canto da casa onde estivesse, seu olhar atento foi substituído por um desfocado e pensativo. Hugo foi para a casa de um amigo, e quando voltou para o jantar, ela ainda andava sem prestar atenção em nada.
- Não cansou dessa vida de zumbi?
- O quê?
- Esquece.
Ela o mirava sem sequer lembrar da pergunta. Rony, em seu dia de preparar o jantar – com auxílio mágico e da filha, claro –, queria evitar uma briga entre irmãos outra vez, e disparou:
- Pare de perturbar a sua irmã. Você também não cansa de sair de casa todos os dias para fazer sei lá o quê, e ninguém fica te interrogando por isso.
- É diferente! Fico com meus amigos. Ela tá o dia todo muda e cega...
- Hugo, vá arrumar algo de útil pra fazer até a gente terminar o jantar – disse, em um tom de zombaria.
O garoto se sentiu injustiçado pelo suposto protecionismo e a insinuação de que era um desocupado. Assim, saiu batendo os pés.
- Crianças... – murmurou Rony, preparando as saladas.
- Obrigada por me defender, papai – ela sabia o quanto ele gostava desse tipo de referência. – Mas o que ele tinha dito?
- Uma pergunta que vou repetir a você agora. Não fiquei aqui o dia inteiro, mas a observo desde que voltou para cá. Afinal, você não se cansou dessa vida de zumbi? Onde está a menina alegre e esperta que criei?
- Ainda está aqui. Só ando meio distraída. Você já sabe porque.
Como o argumento não o convenceu de todo, ele insistiu:
- Alguém chateou você? Seu irmão eu sei que não conta, vocês não se levam a sério.
- Certas brincadeiras dele me deixam chateada sim. Mas acabo relevando uma hora ou outra.
- Você está me enrolando.
Ela parou de cuidar do molho do macarrão e ficou alerta às palavras do pai, mesmo sem encará-lo.
- Nenhum imbecil tocou em um fio de cabelo seu, certo?
Em resposta, balançou a cabeça negativamente.
- Rose, me diga a verdade! – bradou.
Nervosa, largou involuntariamente a colher de madeira dentro da panela.
- Ninguém me desrespeitou, se é isso que quer saber!
- Você entendeu muito bem...
- Entendi. A resposta é não. Eu nunca deixaria que chegassem perto de mim sem o meu consentimento.
Ele se acalmou e continuou a cortar tomates e repolho. Ou melhor, fazer a faca trabalhar sozinha. Rose tentou tirar a colher ensopada de molho e quase queimou a mão ao fazê-lo. Momentos depois, com a ponta dos dedos ardendo, recordou-se de que não estava mais proibida de fazer magia fora da escola.
Em pouco tempo, acabaram o jantar em um silêncio complacente. Enquanto comia, a última frase da filha rondava os pensamentos de Rony. De repente, ele ateve-se aos detalhes contidos nela e se engasgou.
- Rony! Você está bem? O que foi?
- Uma almôndega e a nossa filha – disse, ainda tossindo. – Na hora eu nem me toquei, mas agora a minha ficha caiu, Rose! Então você deixou que chegassem perto? Por vontade? Eu não conheço mais você se me responder sim para uma coisa dessa!
Alarmada e custando a imaginar como ele concluiu aquilo, Hermione o segurou, fazendo-o sentar na cadeira outra vez.
- Que história é essa?
- Papai resolveu interpretar mal o que eu falo, é só isso! E se vocês me dão licença, vou para o meu quarto.
Ruidosamente, ela subiu as escadas sem hesitar. Rony tentou correr atrás dela, porém a esposa o conteve. Notando o clima pesado e a indecisão da mãe sobre como agir, Hugo se adiantou:
- Posso subir pra falar com ela, mãe?
- Meu anjo, faria isso por mim?
- Claro. Ela deve estar nervosa. E antes que pergunte, eu não sei o que aconteceu.
- Tudo bem.
Exibiu um sorriso triste para o filho, forçando o marido pelos ombros a permanecer em seu lugar. Mesmo nervoso e prestes a fazer qualquer bobagem, teve medo de machucá-la se tentasse se esquivar. Quando estava sozinhos, explodiu:
- Ela não é a filha que educamos, Hermione. Fizeram lavagem cerebral na menina!
- Você pode ser mais claro ao invés de falar esses absurdos?
- Perguntei se algum cafajeste fez mal a ela. Depois falou que ninguém chegaria perto se ela não quisesse! Então é porque alguém chegou e ela deixou!
- Francamente... – resmungou, levando as mãos à cabeça. – Interpretação de texto não é bem o seu forte, Rony. Pare de acumular pensamentos negativos. Especialmente os maliciosos sobre a nossa Rose! Ela não é mais um bebê, e eu espero que você finalmente tenha percebido. Mas ela só quis dizer que sabe se defender e apenas permitiria uma aproximação caso estivesse apaixonada.
Pensando no conselho como uma pequena preparação para a conversa do dia seguinte, o observou com um certo pesar.
- Pode não ser um bebê, mas a idéia de vê-la com um... cara qualquer acaba comigo. Imaginá-la saindo de casa para namorar, depois casar e ficando longe da gente, pra sempre...
- Rony, dramatizar a situação é inútil. Você sabia que em algum momento, nossos filhos sairiam da nossa proteção. Só esqueceu de um detalhe. Eles continuarão a nos amar. Isso também é eterno, meu amor. Rose está passando por um período difícil de amadurecimento, procure compreendê-la e apoiá-la. Foi bom perguntar se alguém a maltratou, e agora podemos ficar tranqüilos quanto a isso.
Eles se abraçaram. Rony estava perdido como uma criança assustada, no imenso receio de perder sua filha. Como todo pai, não sentiu o tempo passar quando o assunto eram seus pupilos. Hermione mantinha sentimentos semelhantes, porém buscava a sensatez na maioria das vezes para se sustentar emocionalmente.
No caminho para o quarto, Rony se desculpou com Rose. Ainda abraçado à Mione, explicou o que sentiu e a garota compreendeu, secretamente mortificada pelo remorso de mentir e ver o quanto ele sofreria com a notícia. Notando a sombra no olhar dela, contudo apreendendo que não tinha relação com o pai, evitou fazer mais perguntas. Supunha, com um tanto de dúvida, conhecer a resposta para aquele estranho comportamento dela.
Agradeceram a Hugo por acalmá-la e foram dormir. Quando a intenção era somente essa, Rony mal encostava no travesseiro e estava roncando. Mesmo desconfiando que ele demoraria para fazê-lo, resolveu disparar o convite de uma vez, antes de qualquer sono dar o ar da graça:
- Eu e Gina combinamos um jantar para amanhã na casa dela. Somente para casais. Molly e as crianças ficarão felizes com isso. Vamos estar juntos no domingo, mas parece que quanto mais se reunem, mais querem fazer isso de novo, não é? Nem sentirão nossa falta de noite. Tudo bem pra você?
- Sim. Algum motivo em especial?
- Estarmos entre amigos é um ótimo motivo.
- Eu sei, Mione. Perguntei porque poderia ter uma data que esqueci, talvez.
- Sua memória não costuma falhar com isto. Não tanto assim.
- Mas a interpretação...
- Você ficou ofendido com isso? Estávamos nervosos, eu não queria magoá-lo.
- Não ofendeu. É verdade mesmo.
- Vivo brigando com você para não se diminuir, e acabo dizendo algo assim!
- Sei que não foi sua intenção. Você convive muito comigo, acabou pegando a mania de dizer coisas dignas de um trasgo de vez em quando.
Ela o olhou com espanto. Logo depois, ele a beijou e repetiu que estava tudo bem. Eles discutiram mais e após um bom tempo, realmente a situação se abrandou. Haviam coisas importantes a se pensar.
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Harry estranhou demais a repentina decisão de aprontarem aquele jantar. Especulou mentalmente se a atitude teria relação com o comportamento estranho de Alvo, ou ainda a falta de freios de Lílian. Afinal, sabia por Rony e Hermione que Rose e Hugo estavam nas mesmas condições de apatia e rebeldia, respectivamente.
Com a determinação de Gina a dizer que seria bom reservarem um tempo para conversarem apenas entre eles, por serem muito ligados, ele resolveu não questioná-la uma segunda vez. Argumentou com Rony sobre suas suspeitas, e os dois concordaram do quanto o evento era anormal.
- Costumamos fazer isso, mas justo agora? De repente?
- Elas estão armando, cara. E deve ser problema.
- Se for, deve ser um bem complicado. Gina não me contou, mas ainda acho que é sobre o Alvo. Aliás, ele a Rose estão muito parecidos ultimamente. Pensei ser só nos estudos, apesar de sua menina ser mais aplicada.
- Verdade. Muito juntos, muito iguais. Estão escondendo alguma coisa.
- E se a Rose estiver namorando mesmo, Rony? O que você vai fazer?
- Vamos pegar o próximo caso ali, ver se precisamos espancar um infeliz e aí você vê o que eu vou fazer se você estiver certo.
- Quanta inflexibilidade! Ela não é mais um bebê!
- Você diz isso porque a Lílian nunca quis saber de namoro sério. Sempre era uma brincadeira.
- Eu me preocupo mais com as coisas “não sérias” da Lílian, se você quer saber. Entendo o que você tá sentindo, mas a Rose nunca vai te dar tanto trabalho. Lílian me deixa mais louco com o quadribol e aquele temperamento impossível dela. Quem me dera conseguir ajudá-la direito com isso.
- Espero não ter trabalho com a Rose. O mesmo trabalho que o Sr. Granger não teve nem de longe com a Hermione.
- Então vamos trabalhar, porque prever o futuro quando o assunto é nossos filhos é uma ótima ilusão, mas não resolve nossos problemas aqui, infelizmente.
Rony seguiu o amigo meio inconformado, porém consciente de que ele tinha razão. O trabalho ocupou a mente deles o suficiente para voltarem a se preocupar com o inesperado encontro quando estavam saindo do Ministério. Rony nem se abateu para procurar Hermione, pois Harry o advertiu da possibilidade dela ter saído intempestivamente para ajudar Gina. Ou conversar mais.
Quando chegaram cada um em sua casa, esperando ter a missão de levarem os filhos para a Toca, viram que a única incumbência deles era se arrumar um pouco mais. O argumento “ninguém vai ligar sobre como nos vestimos” não foi aceito por Gina e Hermione. Na verdade, elas até os dispensariam da tarefa caso a situação fosse diferente. Queriam-nos relaxados para suportar melhor a notícia, e um banho cumpriria isso muito bem.
Todos os resmungos possíveis terminaram na porta da casa dos Potter. Eles adoravam estar juntos. Por isso, as duas demoraram um certo tempo para dizerem suas reais intenções. Esperaram eles comerem – Mione se lembrava amargamente como acabara o último jantar de sua família –, e ficavam se entreolhando para definir sileciosamente quem começaria a falar.
- Estava tudo ótimo, irmãzinha – disse Rony, ensaiando um arroto.
- Seu estômago me dá a resposta disso todas as vezes, Roniquinho.
- Quando você vai desistir desse apelido?!
- Quem sabe quando você crescer mais um pouco, eu penso nisso com carinho – retrucou, piscando um olho e o irritando.
- Vocês são impossíveis! O sujo falando do mal lavado.
- Harry, eu já desisti há muito tempo de intervir nisso. Francamente, eles me deixam desanimada às vezes!
- Tão certinhos vocês dois, não é? Que inveja! – ironizou Gina.
- Ah, nem vale a pena discutir. Agora estou muito tranqüilo, porque eu e Harry achamos que você e a Hermione nos chamaram aqui para jogar uma bomba nas nossas cabeças! No final das contas, foi um banquete maravilhoso...
- Não é uma bomba, você tem razão.
- Mas é importante – emendou Hermione. – Desde que Rose e Alvo voltaram de Hogwarts, estão muito esquisitos, calados e querendo ficar sozinhos. Tentamos descobrir e nada adiantou.
- Até que eu ouvi uma conversa entre Alvo e Lílian antes de ontem. E isso nos deu uma ligeira suspeita sobre o que está acontecendo de verdade.
- Por favor, parem de fazer rodeios! É grave? O que eles estão escondendo?
Rony se exaltou. Harry mal conseguia pensar, tantas eram as suposições trágicas a lhe passar pela mente.
- Eles estão namorando – disparou Hermione, séria.
- Quem? Quem tá dando em cima da minha filha? Diz o nome do desgraçado que eu vou lá e o ensino a sair das fraldas antes de querer dar uma de macho...
Harry deu um soco nas costas do amigo. Não com a intenção de feri-lo, mas para chamar a sua atenção. Rony se surpreendeu e dirigiu sua cólera a ele:
- Pirou? Queria ver se fosse a Lílian que estivesse namorando escondido um desconhecido...
- Rony, acorda! Hermione disse que Rose a Alvo estão namorando. Eles estão juntos. Preciso ser mais claro ou você já entendeu? – disse, em um tom grave.
De nervoso, o ruivo passou a desesperado e sem chão. Harry simplesmente assumiu uma expressão taciturna e pôs-se a refletir sobre o assunto. Com o silêncio, Gina se animou a falar:
- Eles são primos, nós sabemos o quanto isso pode ser desastroso. Mas se eles estão apaixonados, não podemos impedi-los.
- Se formos contra eles, o que pode ser um fogo de palha se transformará em algo muito forte. E devemos nos ater ao nosso exemplo. Nós sabíamos com quem queríamos passar o resto da vida, e outras pessoas não conseguiram interferir nisto. Suportamos tantos obstáculos, precisamos impô-los aos nossos filhos também?
Eles continuaram quietos.
- Falem alguma coisa. Qualquer uma. Sabemos o quanto é difícil para vocês, para nós também foi... – continuou Hermione.
- Uma bomba. Para mim, está sendo. Vocês duas aceitaram isso rápido demais – disse Rony.
- O meu pesar é não entender porque eles não nos contaram – acrescentou Harry.
- Se pudessem ver a cara de vocês, talvez entendessem. Nós estamos chocados, imaginem eles ao descobrir um sentimento deste!
- Gina, amor entre primos pode ser coisa de criança. Dá e passa.
- Do jeito que eles estão, realmente acredita nisso, Harry?
Ele levou as mãos à cabeça. Rony voltou a se indignar.
- Não quiseram contar, mas hoje mesmo precisamos conversar com eles. Saber se isso é verdade...
- Claro que é, Rony – cortou Hermione. – Lílian nos confirmou. E de qualquer forma, é melhor esperar que eles nos contem.
- Podemos dar indiretas que os encoragem. Mas não chegar e dizer que ouvi uma conversa. Quando eles se sentirem seguros, virão até nós buscar apoio e já estaremos preparados para isso. O que acham?
- Uma bobagem! Se não falaram até agora, é porque querem continuar nos enganando. Melhor falar tudo de uma vez.
- Também concordo com elas, Rony. Se tentarmos abordar o assunto, eles podem negar o que está acontecendo ou ficarem com mais medo ainda. As coisas precisam ser naturais. E como andam prestes a explodir, certamente não demorará muito.
- Segundo Alvo, neste final de semana tudo estaria resolvido. Então, não precisaremos esperar tanto – concluiu Gina.
Todos pareciam estar de acordo. Rony, oprimido pelos olhares dos três, tomou uma decisão imediata e disse calmamente:
- Sim. Até o final de semana, o assunto terá um ponto final. Vamos esperar.
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