Capítulo 1



- Então ainda não falou com ele?

- Hum? – Hermione Granger continuou a trabalhar em sua mesa de desenho, marcando traços divisores no papel com uma experiência adquirida ao longo de anos.

- De quem você está falando?

Seguiu-se um longo suspiro de censura. Ao ouvi-lo, Hermione teve de se esforçar para não rir. Conhecia muito bem Gina Potter, sua vizinha do andar de baixo, e sabia exatamente sobre quem ela estava falando.

- Do irresistível sr. Misterioso do 3B, Mione. Ele se mudou para cá há uma semana e ainda não trocou uma palavra com ninguém! É mistério demais para mim. Seu apartamento fica bem em frente ao dele e você nem tentou dizer "olá"? Pelo amor de Deus, mulher! Você precisa fazer alguma coisa!

- Tenho andado muito ocupada ultimamente. - Hermione levantou a vista e arriscou olhar para Gina, que estava andando pelo estúdio com ar impaciente, fazendo os cabelos ruivos balançarem com veemência.

- Mal notei a presença dele.

Gina revirou os olhos, parecendo não acreditar no que estava ouvindo.

- Não me venha com essa história, Mione. Notou a presença dele, sim.

Gina se aproximou da mesa de desenhos e inclinou-se por cima do ombro da amiga, então torceu o nariz. Nada além de algumas linhas azuis. Gostava mais quando Hermione começava a esboçar as figuras.

- Ele ainda nem pôs o sobrenome na caixa do correio. E ninguém o vê sair do prédio durante o dia. Nem mesmo a sra. Figg, e olha que ninguém escapa àquele olhar de falcão.

- Talvez ele seja um vampiro.

- Uau... - Intrigada com a idéia, Gina apertou os lábios. - Sabe que essa hipótese seria mesmo excitante?

- Excitante demais - anuiu Hermione, voltando a se concentrar no desenho, enquanto Gina retomava sua caminhada impaciente pelo estúdio, falando sem parar.

Hermione nunca se importara em ter companhia enquanto trabalhava. Na verdade, até gostava disso. Não era do tipo que gostava de isolamento e quietude. Talvez por esse motivo se sentisse tão feliz vivendo em Nova York, em um prédio de apartamentos cheio de vizinhos animados e, quase sempre, muito barulhentos.

Aquele tipo de coisa a satisfazia não apenas em nível pessoal, mas também servia de base para seu próprio trabalho.

De todos os moradores do prédio, Gina Potter era sua vizinha preferida. Três anos antes, quando Hermione se mudara para o prédio, Gina era uma enérgica recém-casada que acreditava plenamente que todo mundo tinha de ser tão feliz quanto ela. E felicidade, para Gina, era sinônimo de casamento.

Depois que se tornara mãe de Tiago, um adorável bebê de oito meses, Gina passara a se empenhar ainda mais em sua campanha casamenteira. E Hermione sabia muito bem que era a principal "vítima" da amiga.

- Nem mesmo o viu no corredor? - Gina quis saber.

- Ainda não.

Pensativa, Hermione pegou uma caneta e apoiou-a entre os lábios rosados e polpudos. Seus olhos expressivos eram de um profundo tom castanho quase everdeado, se, completamente verdes, seriam semelhante ao das águas de algumas praias privilegiadas ao redor do mundo. Os suaves matizes amarelados, que permeavam o estonteante tom de verde das íris, sugeriam a imagem das luzes do crepúsculo sobre o mar. Seriam considerados "olhos de tigresa", não fosse o fato de viverem constantemente iluminados por um brilho de bom humor.

- Acho que a sra. Figg está é perdendo a prática. Eu o vi sair do prédio durante o dia, o que elimina a "hipótese vampiresca".

- Viu mesmo? - Gina se aproximou dela no mesmo instante, com ar de interesse. - Quando? Onde? Por quê?

- Quando? De madrugada. Onde? Indo na direção leste da cidade. Por quê? Por causa de uma crise de insônia. - Decidindo entrar na brincadeira, Hermione girou a cadeira, mostrando um brilho de divertimento no olhar.

- Acordei cedo e fiquei pensando nos biscoitos que sobraram da festa da outra noite.

- Biscoitos atômicos - brincou Gina.

- Sim. E não consegui voltar a dormir até provar outro deles. Já que havia levantado e estava sem sono, decidi vir até aqui trabalhar um pouco e, em certo momento, acabei indo parar diante da janela. Foi quando o vi sair. Aliás, é impossível não notá-lo. Deve ter um metro e oitenta, mais ou menos. E aqueles ombros...

As duas reviraram os olhos, imaginando como deveria ser tudo aquilo de perto.

- Bem, ele estava carregando uma espécie de mochila de ginástica e trajava jeans e camiseta pretos. Portanto, deduzi que ele estivesse saindo para o trabalho, em alguma academia. Ninguém consegue ter aqueles ombros comendo batatinhas fritas e bebendo cerveja por aí, meu bem.

- A-ha! - Gina estalou os dedos no ar. - Você está interessada.

- Não estou morta, Gina. Ele é lindo de morrer. E como se não bastasse isso, aquele ar misterioso e o traseiro perfeito moldado no jeans justo... - Hermione levantou as mãos no ar. - O que mais uma mulher pode fazer, senão fantasiar?

- E por que só fantasiar? Por que não bate à porta dele e lhe oferece alguns biscoitos ou algo do gênero? Dê-lhe as boas-vindas como vizinha. Quem sabe, assim, conseguirá descobrir o que ele faz lá dentro o dia inteiro. Tente descobrir se ele é solteiro, no que trabalha... Se é solteiro... E o que... - Ela se interrompeu, levantando a cabeça, em alerta. - Tiago está acordando.

- Eu não ouvi nada. - Hermione virou a cabeça, mirando o ouvido na direção da porta. Concentrou-se, mas não ouviu nada. - Puxa, Gina, desde que deu à luz está com uma audição de morcego.

- Vou trocá-lo e levá-lo para um passeio. Quer vir também?

- Não, não posso. Preciso trabalhar.

- Nos veremos à noite, então. O jantar será às sete horas.

- Está bem.

Gina foi até o quarto de Hermione, onde havia deixado o filho dormindo, e o pegou no colo. Acenou para a amiga, ao passar pela porta do estúdio, e saiu em seguida. Hermione sorriu consigo. Gina podia até ser meio excêntrica, mas havia se tornado uma mãe maravilhosa.

Com uma careta, lembrou-se do jantar que teria pela frente. Um jantar tedioso com Frank, primo de Gina. Quando criaria coragem para dizer a Gina que parasse de tentar lhe arranjar um pretendente? Provavelmente no mesmo instante em que reunisse coragem para dizer o mesmo à sra. Figg, concluiu. E à sra. Peebles do primeiro andar. Por que as pessoas insistiam em manter aquela obsessão de ficar lhe arranjando pretendentes?

Estava com vinte e quatro anos, era solteiríssima e feliz por isso. Não que não pensasse em formar uma família algum dia. Como qualquer garota, queria ter uma casa confortável, com um jardim onde seus filhos pudessem brincar. Ah, e um cachorro... Sim, teria de haver um cachorro. Mas isso era coisa para o futuro. Gostava de sua vida no presente e não pensava em mudá-la. Não mesmo.

Mantendo os cotovelos sobre a mesa de desenho, apoiou o queixo sobre as mãos unidas e se permitiu olhar através da janela e divagar um pouco. Devia ser o ar da primavera, pensou, que a estava fazendo se sentir tão inquieta e cheia de energia.

Considerou a possibilidade de sair com Gina e o bebê para se distrair um pouco, mas logo em seguida viu sua amiga já no portão do prédio, saindo para seu passeio. Suspirou. Bem, não estava mesmo com vontade de sair.

"Então desenhe, Hermione Granger", pensou consigo, voltando a se concentrar na mesa de trabalho, onde os primeiros esboços de sua tira de jornal aguardavam ser terminados.

- Amigos e vizinhos - leu o título em voz alta.

Tinha uma mão bastante firme e treinada para desenhar, por isso os traços seguintes foram surgindo naturalmente, sem grande esforço. Sua mãe era uma artista de sucesso, reconhecida internacionalmente. Seu pai, o gênio recluso por trás das famosas tiras de jornal do personagem "Macintosh". Juntos, haviam transmitido a ela e aos irmãos o amor pela arte, o senso do ridículo e uma sólida formação.

Mesmo depois de haver deixado a atmosfera de segurança da casa dos pais, em Maine, Hermione sabia que seria aceita de volta com todo carinho, se Nova York a rejeitasse.

Mas, felizmente, não fora o que acontecera. Havia mais de três anos que vinha apresentando suas tiras cômicas em um famoso jornal local e seu trabalho estava ganhando cada vez mais reconhecimento. Sentia-se orgulhosa disso, orgulhosa da simplicidade, do contexto agradável e do humor que conseguia criar com seus personagens, em situações vividas no dia-a-dia. Não tentava imitar a ironia de seu pai ou as sátiras políticas que ele costumava fazer. Seu estilo era outro. Para ela, a vida era uma fonte de risos. Entrar em uma fila quilométrica para ir ao cinema, encontrar um par de sapatos que combinasse com a roupa, sobreviver a outro almoço de negócios, esse tipo de coisa.

Enquanto muitos viam sua personagem, Emily, como uma criação autobiográfica, Hermione a via sempre como uma maravilhosa fonte de idéias, nunca como um reflexo de si mesma. Afinal, Emily era uma linda loira alta que vivia sempre com pro¬blemas para se manter nos empregos e para arranjar namorados.

Hermione, por outro lado, era morena, de estatura mediana, e tinha uma carreira bem-sucedida. Quanto aos homens, bem, eles não eram exatamente uma prioridade em sua vida para que ficasse se preocupando muito com isso.

Um ar de censura surgiu em sua expressão, fazendo-a estreitar os belos olhos castanhos ao se flagrar tamborilando a caneta, em vez de estar usando-a para trabalhar. Não estava conseguindo se concentrar. Passou a mão nos cabelos castanho-claros, mordeu o lábio bem delineado e deu de ombros. Talvez estivesse precisando mesmo parar um pouco e comer alguma coisa. Provavelmente um chocolate resolvesse seu problema.

Empurrou a cadeira para trás, colocando a caneta atrás da orelha, repetindo o gesto do qual vinha tentando se livrar desde a infância. Então deixou o estúdio ensolarado e desceu para o andar de baixo.

Seu apartamento dúplex era incrivelmente arejado e um pouco separado de seu local de trabalho. Aliás, fora justamente esse o motivo que a levara a ficar ali quando se mudara para Nova York. Um longo balcão separava a cozinha da sala, criando um espaço aberto e agradável para receber visitas. As janelas amplas permitiam que a luz do sol entrasse com vigor no ambiente, criando uma atmosfera saudável. Nos primeiros dias em que se mudara para ali, o único problema que tivera de enfrentar fora o barulho vindo da rua, que a mantinha acordada durante a maior parte da noite. Nova York nunca dormia, mas, aos poucos, ela acabara se acostu¬mando com isso.

Com seu andar elegante, outra característica herdada de sua mãe, Hermione encaminhou-se descalça para a cozinha. Tinha pernas esguias, adquiridas na época em que implorara para fazer aulas de balé, só para, pouco depois, enjoar e abandonar o curso.

Cantarolando baixinho, abriu a geladeira e examinou seu interior. Poderia preparar alguma coisa para si. Também havia tido lições de culinária na adolescência, e só se cansara delas quando sua criatividade começara a sobrepujar à de sua instrutora.

Suspirou, quando começou a ouvir aquele som que já estava se tornando familiar. Atravessando as paredes do prédio e o corredor, a música lhe chegou aos ouvidos com a mesma suavidade dos últimos dias. Triste e sexy, pensou ela. Era assim que definia aquela espécie de lamento do sax alto. O sr. Misterioso do 3B não tocava todos os dias, mas Hermione gostaria que ele o fizesse.

Aquelas lânguidas notas prolongadas surtiam um efeito estranho em seu ser. Uma espécie de emoção que ela não sabia explicar. Bem, talvez porque a música era sempre tocada com muita emoção.

Seria ele um músico em começo de carreira, tentando encontrar seu lugar ao sol em Nova York? Sem dúvida, devia ter sofrido alguma desilusão amorosa para tocar daquele jeito, pensou ela, enquanto tirava alguns ingredientes dos armários. Devia haver uma mulher por trás de todo aquele sentimentalismo. Provavelmente uma ruiva deslumbrante que o enfeitiçara com seus encantos sedutores, fizera-o abrir o coração e depois pisara nele, ainda vivo, vulnerável e pulsante, com seu salto de sete centímetros.

Poucos dias antes, havia inventado um contexto diferente para seu novo vizinho. Nele, o sr. Misterioso havia saído da casa de sua renomada família com dezesseis anos. Vivera nas ruas, tocando sax nas esquinas de Nova Orleans, uma de suas cidades preferidas, e recebendo alguns trocados por isso. Depois seguira em direção ao norte, enquanto aquela mesma família perseguidora, liderada por um tio insano, vasculhava o país à procura dele.

Não desenvolvera muito bem a idéia do motivo pelo qual eles eram perseguidores, mas isso também não importava muito. Ele estava buscando seu lugar ao sol no mundo, confortado apenas por sua música.

Também havia a possibilidade de ele ser um agente federal trabalhando disfarçado. Ou um ladrão de jóias internacional fugindo de um agente do governo. Ou, quem sabe, um serial killer à procura da próxima vítima.

Sorriu consigo, então olhou para os ingredientes que havia acabado de separar sem prestar muita atenção. Quem quer que ele fosse, ponderou com outro sorriso, pelo visto estava prestes a ganhar biscoitos feitos por ela.

O nome dele era Draco Malfoy. Não se considerava particularmente misterioso, apenas reservado. De fato, fora justamente o desejo de privacidade que o levara, ironicamente, a ir parar bem no coração de uma das maiores cidades do mundo.

Felizmente, seria por pouco tempo, pensou ele guardando o sax na maleta própria para o instrumento. Seria por pouco tempo. Com sorte, dali a alguns meses a reforma de sua casa na costa rochosa de Connecticut estaria terminada. Algumas pessoas diziam que o lugar parecia um forte, mas ele não se importava com isso. Pelo menos em um forte era possível se ter paz e silêncio durante semanas, caso fosse necessário. Além disso, ninguém podia entrar no local sem permissão.

Começou a subir a escada, deixando para trás a sala praticamente vazia. Costumava ficar ali apenas quando decidia tocar, pois a acústica do ambiente era ótima. Ou então para se exercitar, quando não tinha vontade de caminhar até a academia alguns quarteirões adiante.

O segundo andar era o local onde ele passava a maior parte do tempo. Mas felizmente aquilo não duraria muito, pensou mais uma vez. Tudo que precisava enquanto estava ali era de uma cama, um guarda-roupa, iluminação adequada e uma mesa de escritório com um tamanho suficiente para comportar seu notebook e os papéis de trabalho que ele costumava usar. Não quisera ter um telefone, mas sua agente insistira para que ele mantivesse pelo menos um telefone celular, para o caso de ela precisar entrar em contato com ele. Draco aceitara a idéia, mesmo não gostando dela.

Sentou-se à mesa de trabalho, satisfeito por seus pensamentos estarem mais claros depois do breve exercício com o sax. Luna, sua agente, andava preocupada com o progresso de seu último roteiro teatral. Mas, em sua mente, tudo já estava bem definido. A peça ficaria pronta quando tivesse de ficar, e nem um minuto antes. Fora assim que ele sempre trabalhara, e não seria àquela altura de sua carreira que iria mudar de atitude, devido ao nervosismo de uma agente.

O problema com o sucesso, pensou ele, era o nível de cobrança que ele trazia consigo. Ao fazer algo que as pessoas apreciavam, você era sempre cobrado a repetir o feito, só que de maneira mais rápida e mais eficiente. Draco não dava a mínima para o que as pessoas queriam. Elas poderiam arrombar as portas do teatro para ver sua próxima peça, laureá-lo com outro Pulitzer ou lhe pagar um caminhão de dinheiro. Nada disso era importante para ele. Também não dava a mínima para críticas. Se o público não gostasse, que fosse à bilheteria e exigisse seu dinheiro de volta.

Para Draco, o trabalho em si era o mais importante. E isso dizia respeito apenas a ele e a mais ninguém.

Financeiramente, estava seguro como sempre estivera. Luna costumava dizer que isso era parte do problema. Sem a necessidade ou o desejo de ganhar dinheiro para incentivá-lo, ele havia se tornado arrogante e indiferente ao público. Por outro lado, dizia ela, isso também era o que o tornava um gênio da criação teatral. Draco não se importava com nada, e isso era o que fazia seu trabalho ser tão especial.

Continuou sentado à mesa, pensativo. Porém, logo despertou do devaneio e passou a mão por entre os cabelos loiros. Seus olhos, de um azul-acizentado intenso, perscrutaram as últimas palavras que havia digitado. A expressão séria e os lábios ligeiramente apertados denotavam sua concentração.

Com os ruídos característicos da rua chegando-lhe aos ouvidos, Draco estava tendo de se esforçar mais para voltar a penetrar na alma do homem que ele havia criado no texto mostrado na tela do computador. Um homem que lutava desesperadamente para superar os próprios desejos.

De súbito, o incômodo som da campainha o fez praguejar, desconcentrando-o mais uma vez. Pensou em continuar ali e não dar atenção, mas sua noção da natureza humana o fez mudar de idéia, ao concluir que provavelmente o intruso continuaria insistindo até obter uma resposta. Por isso, decidiu despachá-lo de uma vez por todas.

Imaginou que se tratasse da senhora do andar térreo. Aquela com olhos de águia, que parecia viver bisbilhotando a vida de todos. Ela já havia tentado abordá-lo por duas vezes quando ele estava saindo para o clube à noite, mas não tivera êxito. Draco sempre fora muito bom em escapar àquele tipo de situação, mas aquela insistência já estava começando a aborrecê-lo. Seria melhor bancar o mal-educado de uma vez e deixar que ela saísse falando mal dele, afinal, não era do tipo que se importava com isso.

Porém, ao espiar através do olho mágico, não se deparou com a mulher corpulenta que ele havia imaginado estar ali, mas com uma bela morena de cabelos castanhos e lindos olhos castanhos-esverdeado.

O que diabos ela poderia querer? Reconheceu-a como uma vizinha do mesmo corredor, cujo apartamento ficava quase em frente ao que ele estava ocupando. Depois de haver sido deixado em paz por quase uma semana, imaginara que a situação fosse continuar assim. O que, em sua mente, faria dela a vizinha perfeita. Mas, pelo visto, enganara-se mais uma vez.

Ainda aborrecido por ter sua paz perturbada, abriu a porta e apoiou-se nela. - Sim?

- Olá. - Oh, Deus, ele era ainda mais bonito de perto, pensou Hermione, contendo a vontade de suspirar.

- Sou Hermione Granger, sua vizinha do 3A - apresentou-se com um sorriso amigável, indicando a porta de seu apartamento.

Draco se limitou a arquear uma sobrancelha.

- Pois não?

Um homem de poucas palavras, concluiu Hermione, mantendo o sorriso. Desejou que ele se distraísse pelo menos por um instante, para que ela pudesse esticar o pescoço e dar uma espiada no interior do apartamento. Claro que não poderia tentar fazer isso com aquele olhar perscrutador centrado bem em seu rosto, sem nenhuma indicação de que iria se desviar.

- Eu o ouvi tocar há alguns minutos. Trabalho em casa e, você sabe como é... O som atravessa as paredes.

Se ela fora até ali para reclamar do barulho, não iria conseguir nada, pensou Draco. Ele tocava quando sentia vontade de tocar, e isso não mudaria devido à mera reclamação de uma vizinha, por mais encantadora que fosse ela.

Continuou a observá-la com atenção. Nariz arrebitado, lábios polpudos, sensualmente curvados...

- Geralmente esqueço de ligar o aparelho de som quando estou trabalhando - continuou ela em um tom animado, interrompendo os pensamentos de Draco. - Por isso gosto de ouvi-lo tocar. Dino e Parvati ouviam Vivaldi durante a maior parte do tempo. Não deixa de ser agradável, mas se torna monótono quando isso é a única coisa que você ouve o dia inteiro. Eram eles que ocupavam o apartamento antes de você se mudar. Dino e Parvati - acrescentou ela, indicando o apartamento atrás dele.

- Eles se mudaram para White Plains, depois que Dino teve um caso com uma vendedora da Saks. Bem, ele não chegou a ter um caso de verdade, mas parecia estar pensando na possibilidade. Por isso Parvati deu-lhe o ultimato: se não mudassem de cidade, ela pediria o divórcio. A sra. Figg deu seis meses de prazo para os dois continuarem juntos. Particularmente, acho que eles vão conseguir resolver o problema.

Dizendo isso, mostrou um prato com uma simpática decoração com detalhes amarelos cheio de biscoitos de chocolate cobertos por um plástico protetor, próprio para alimentos.

- Estes biscoitos são para você - disse, estendendo o prato na direção dele.

Draco abaixou a vista para olhá-los, dando a Hermione a breve oportunidade de espiar a sala vazia atrás dele. Pelo visto; ele não tivera condições nem mesmo de comprar um sofá, pensou ela. Então os introvertidos olhos azuis-acizentados voltaram a fitá-la.

- Por quê?

- Por que o quê?

- Por que me trouxe os biscoitos?

- Bem, fui eu mesma que os fiz. Às vezes, cozinho para arejar um pouco a cabeça, quando não estou conseguindo me concentrar no trabalho. Na maioria das vezes, é cozinhando que eu consigo relaxar o suficiente para voltar a trabalhar. Mas se eu ficar com tudo isso, acabarei comendo tudo sozinha e vou me detestar por isso. - O brilho bem-humorado continuou presente nos olhos castanhos.

- Não gosta de biscoitos?

- Não tenho nada contra eles.

- Então, sirva-se - falou Hermione, entregando o prato a ele. - E bem-vindo ao prédio. Se precisar de alguma coisa, estou sempre por aqui. - Indicou a porta do outro apartamento com um gesto vago. - Se quiser conhecer os outros vizinhos, também poderei apresentá-lo a eles. Moro aqui há alguns anos e conheço todo mundo.

- Não quero conhecer ninguém - respondeu Draco, dando um passo atrás e fechando a porta.

Hermione ficou ali parada por algum tempo, atônita com o que acabara de acontecer. Em seus vinte e quatro anos de vida, nunca alguém havia fechado a porta em sua cara, mas, mesmo tendo acabado de passar pela experiência, felizmente concluiu que aquilo não a afetara tanto assim.

No entanto, teve de se conter para não bater à porta e pedir seus biscoitos de volta. Não iria descer tão baixo, disse a si mesma, girando decididamente sobre os calcanhares e encaminhando¬se para seu apartamento.

Agora sabia que o sr. Misterioso era irresistivelmente atraente, que tinha o corpo de um deus grego e também que ele era tão mal-educado quanto uma criança de dois anos necessitada de umas boas palmadas no traseiro. Mas tudo bem, tudo bem. Iria sobreviver àquilo e aprender a ficar longe do caminho dele.

Não bateu a porta de seu apartamento, para não dar a ele o gostinho de ouvir e deduzir que ela ficara irritada. Mas ao se ver no ambiente seguro de seu apartamento, virou-se para a porta e fez uma porção de caretas, mostrando a língua e mexendo as mãos ao lado das orelhas. E isso a fez se sentir incrivelmente melhor.

Contudo, a questão principal era que ele havia ficado com seus biscoitos, seu prato de sobremesa preferido e com uma boa dose do seu bom humor. E tudo isso sem que ela sequer soubesse o nome dele!

Draco não se arrependia das atitudes que tomava. Nem por minuto. Tinha quase certeza de que sua rudeza propositada manteria sua atraente vizinha a distância por algum tempo. A última coisa que precisava era do comitê local de boas vindas reunido à sua porta, principalmente sendo este liderado por uma bela morena falante, falante até demais, e com olhos de fada.

"Droga!", praguejou ele, em pensamento. Em Nova York, era de se supor que as pessoas ignorassem os vizinhos. Ao se mudar para ali, tinha quase certeza de que esse era o comportamento vigente, mas, pelo visto, enganara-se.

A sorte era que ela era solteira, segundo Draco pudera notar, pois se tivesse um marido, o pobre coitado provavelmente já estaria maluco com toda aquela tagarelice. O fato de ela trabalhar em casa e de haver deixado claro que estaria sempre por ali não era um detalhe lá muito agradável.

Como se não bastasse, também fazia os biscoitos de chocolate mais apetitosos que ele já tinha visto, isso também não era nada promissor. De fato, era quase imperdoável.

Conseguiu ignorar os biscoitos por algum tempo enquanto trabalhava. Na verdade, era capaz de ignorar até mesmo um holocausto nuclear quando assunto em questão era lidar com palavras em um texto. Entretanto, assim que Draco se desconcentrou voltou a lembrar-se dos biscoitos que havia deixado na cozinha.

Continuou pensando neles durante horas, ao se vestir e enquanto massageava a nuca dolorida depois de horas sentado no mesmo lugar, em uma postura que sua professora do terceiro ano fundamental, irmã Minerva McGonagall, classificaria como "deplorável".

Por isso, quando foi à cozinha buscar sua merecida latinha de cerveja, não conseguiu deixar de olhar para o prato sobre a mesa. Abriu a latinha, tomou um gole de cerveja e continuou olhando para os biscoitos, pensativo. E se provasse alguns deles? Afinal, não havia motivo para jogá-los fora, se já havia deixado bem claro para Hermione Granger que não estava interessado em amizades.

Evidentemente, ela iria querer o prato de volta, e ele teria de esvaziá-lo de alguma maneira. Foi então que provou um deles e gemeu baixinho, aprovando o delicioso sabor. Depois comeu outro, com um suspiro de pura apreciação.

Quando já havia comido quase duas dúzias, foi que se deu conta do que estava fazendo e praguejou. Olhou para o prato quase vazio com um misto de autocensura e de indignação. Então foi para a sala e pegou seu sax. Seria mais saudável fazer uma breve caminhada antes de ir para o clube.

Ao abrir a porta, ouviu Hermione se aproximando com passos firmes pelo corredor. Com ar de desagrado, ele deu um passo atrás, deixando apenas um pequeno vão aberto na porta. Mesmo a certa distância, ouviu a voz dela e arqueou uma sobrancelha ao notar que ela estava sozinha.

- Nunca mais! - protestou Hermione. - Nem que ela me ameace de morte. Nunca mais passarei por essa tortura novamente! É isso, e ponto final!

Draco notou que ela havia mudado de roupa. Estava vestida com uma pantalona e um blazer pretos, por cima de uma elegante blusa de seda lilás. Um par de brincos de argola dourados deixaram-na com uma aparência mais sensual.

Continuou falando sozinha, enquanto abria a bolsa do tamanho de um envelope do correio.

- A vida é curta demais para ter suas horas desperdiçadas com uma pessoa tão insuportável. Ela não vai me fazer isso novamente. Sei como dizer "não", e é isso que farei da próxima vez. Preciso apenas praticar um pouco, só isso. Onde diabos está aquela chave?

O som de uma porta se abrindo atrás dela a fez se sobressaltar e virar-se de repente. Draco, notou que os brincos que ela estava usando não eram totalmente iguais e imaginou se aquilo seria um novo tipo de moda ou falta de atenção mesmo. Porém, ao se lembrar de que ela não estava conseguindo encontrar uma chave dentro de uma bolsa menor do que a palma de sua mão, optou pela última hipótese.

Hermione parecia refrescada, como se houvesse acabado de sair do banho, deixando para trás uma nuvem de um perfume maravilhoso. E o fato de Draco haver se sentido afetado por isso, deixou-o ainda mais aborrecido.

- Espere um pouco - pediu a ela, então voltou ao apartamento para pegar o prato.

Hermione não tinha a mínima intenção de ficar ali esperando. Finalmente encontrou o esconderijo da chave: no canto do bolso interno, onde ela mesma a havia colocado justamente para se lembrar de onde encontrá-la quando fosse necessário.

Draco conseguiu alcançá-la antes que ela entrasse. Saiu do apartamento pouco depois e fechou a porta atrás de si. Em uma mão, trazia a maleta do sax e na outra o prato onde Hermione havia colocado os biscoitos.

- Aqui está - disse a ela, jurando a si mesmo que não iria perguntar o que provocara aquele brilho de indignação nos olhos dela. Se o fizesse, era bem capaz que ela passasse a meia hora seguinte contando a história a ele.

- De nada - ironizou ela, aceitando o prato.

Estava com a cabeça doendo, depois de haver passado as duas últimas horas ouvindo a conversa monótona de Frank, primo de Gina. Mas do que estava reclamando?, pensou com sarcasmo. Afinal, agora estava sabendo tudo sobre o mercado de ações e sobre as aplicações mais seguras que poderiam ser feitas nele. Levada pelo mau humor, decidiu dizer poucas e boas ao sr. Misterioso.

- Ouça, se não quer fazer novas amizades, tudo bem. Não preciso mesmo de mais amigos - declarou ela, balançando o prato para enfatizar o que dizia.

- Na verdade, tenho tantos no momento que estou querendo me livrar de alguns deles. De qualquer maneira, não havia motivo para você ser tão rude. Tudo o que fiz foi me apresentar e lhe oferecer alguns malditos biscoitos!

Draco teve de se esforçar para se manter sério.

- Malditos biscoitos deliciosos - confessou ele, arrependendo-se assim que viu um brilho de divertimento surgir nos olhos dela.

- È mesmo?

- Sim.

Dizendo isso, ele seguiu pelo corredor em direção à saída, deixando-a surpresa com aquela reação.

Foi então que Hermione decidiu seguir seu impulso, um de seus hobbies preferidos. Destrancou rapidamente a porta de seu apartamento e deixou o prato sobre a mesinha de centro. Em seguida, saiu novamente e trancou a porta. Então começou a seguir o sr. Misterioso, esforçando-se para não fazer nenhum barulho ao andar.

Seria um ótimo roteiro para uma nova aventura de Emily, pensou ela, contendo a vontade de rir. Claro que seria preciso criar um contexto onde Emily estivesse completamente apaixonada, concluiu, enquanto tentava descer a escada com rapidez e na ponta dos pés. Uma atitude como aquela não poderia ser justificada como normal, advinda de uma mera curiosidade. Teria de ser algo mais intenso, uma espécie de paixão desenfreada.

Ofegante sob o efeito de uma intensa expectativa, flagrou-se com a mente repleta de possibilidades. Ao sair do prédio, olhou rapidamente para os lados.

Ele já se encontrava no meio do quarteirão. Uma boa distância, concluiu Hermione, começando a segui-lo e disfarçando um sorriso.

Em seu lugar, claro que Emily manteria um ar de mistério, escondendo-se atrás de postes e nas esquinas, para o caso de ele se virar de repente e...

Com um sobressalto, escondeu-se de repente atrás de um poste, quando a "vítima" de sua perseguição arriscou um olhar por sobre o ombro. Levando a mão ao peito, Hermione inclinou-se ligeiramente para frente a tempo de vê-lo virar a esquina.

Aborrecida por haver decidido usar saltos em vez de sapatos mais confortáveis para o jantar, ela respirou fundo e seguiu na mesma direção onde ele havia virado.

Seu vizinho caminhou durante vinte minutos, até Hermione sentir os pés em chamas e todo aquele ânimo inicial se desfazendo como uma nuvem assaltada por um sopro insistente. Teria ele aquela mania de caminhar todas as noites pelas ruas com o saxofone?

Talvez não fosse apenas mal-educado, mas também maluco. Provavelmente fora liberado de algum hospício naqueles últimos dias, e por isso não sabia ao certo como se dirigir às pessoas de uma maneira normal.

A família abastada e cruel o mantivera em uma espécie de cativeiro, afastando-o do resto do mundo para que ele não reivindicasse seus direitos sobre a herança da avó falecida, que morrera sob circunstâncias suspeitas, deixando toda sua fortuna para o neto. Por fim, era provável que todos aqueles anos de cativeiro, tendo de lidar com um psiquiatra corrupto, haviam-no deixado meio amalucado.

Sim, seria exatamente isso que Emily deduziria, chegando à conclusão de que somente seu amor puro e dedicado seria capaz de curá-lo. Então todos os amigos e vizinhos tentariam dissuadi-la, tentando mostrar os riscos que ela estaria correndo. Mas Emily, sendo Emily, iria até o fim.

E antes que o sr. Misterioso pudesse...

Hermione parou de repente, quando ele entrou em um clube chamado Delta's.

Finalmente, pensou ela, afastando os cabelos para longe do rosto. Agora, tudo que precisaria fazer seria entrar ali, encontrar um canto escuro onde pudesse se ocultar e ver o que aconteceria em seguida.


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Como prometido Capítulo 1 postadinho people! *-*
Desculpa qualquer erro!

Gostaria de agradecer aos comentários! Estou mtoooo feliz! :D

Prometo não demorar para att! o/

Espero que tenham curtido o cap! e espero q comentem e votem! ;D

até mais buddies! ;*

xoxo - Lay ~




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