R.A.B.



Londres
(1954-1956)


Estava de volta a Londres. Retornava ao velho quarto n`O Caldeirão Furado onde tinha morado por tantos anos antes dessas loucas aventuras das quais ainda tinha lembranças bem frescas.

Era quase como se tivesse voltado no tempo. Tudo tinha permanecido intacto, igualzinho a como era quando ainda trabalhava na Borgin&Burkes. Apenas o velho Tom parecia mais curvo e cheio de cabelos brancos do que nunca. Mas algo tinha mudado – e mudado mais do que qualquer um ali pudesse imaginar.
Ali, guardado sob os mais diversos e complexos feitiços de proteção, estava segura a Cruz de Hórus. Pronta para ser utilizada, e pronta para lhe conferir os mais extraordinários poderes e ensinar-lhe o segredo da imortalidade...

Tom não parava de verificar as páginas do velho livro esfarrapado, como se pudesse surpreender as palavras se rearrumando em coisas que fizessem sentido. Mas elas continuavam a ser um embaralhado confuso de símbolos que pareciam zombar dele...

Naquela tarde, porém, Tom tinha ido ao beco Diagonal e comprado a maior e melhor poção do amor que havia na loja, e se preparava para bebê-la. Certamente, valeria à pena ceder àquela fraqueza tola, apenas por uns minutos, apenas uns breves momentos para que pudesse entender...
Encarava a poção vermelho-morango que exalava um cheiro ácido que lembrava liquido para lustrar troféus, um aroma singular de comida que o fez lembrar das refeições no Salão Principal e o cheiro do mar, mas ainda sem coragem de toma-la. Suas experiências anteriores com amortentia não tinham sido agradáveis, e ainda temia comete alguma loucura...
Mas não haveria mal em se apaixonar por si mesmo, haveria? Não era suficientemente burro de mergulhar atrás de sua imagem e morrer afogado, mas afinal, era uma poção do amor, não era?
Então encheu-se de coragem e bebeu todo o frasco num gole só.

Uma sensação de calor se espalhou pelo seu corpo aquecendo cada pedacinho de seu coração, fazendo-o ter pensamentos absurdos, ridículos. O espelho lhe mostrava a imagem de sempre, mas de repente ele nunca tinha reparado como era bonito...
Então, admirando seu reflexo, compreendeu o que sentiam aquelas estagiárias idiotas, quando se reuniam só para vê-lo passar.

O que outras pessoas diriam se soubesse que Tom Riddle tinha sido tomado por uma súbita inexplicável vontade de beijar a si mesmo?

Alguns momentos depois, quando sua consciência voltava ao devido lugar (mas a paixão por si mesmo continuava intensa), Tom folheou desesperado o livrão, em busca do significado dos símbolos embaralhados. Por um momento, achou que a poção, de fato, tinha embaralhado seu cérebro. Mas então, antigas palavras ressoaram dentro de seu crânio como se as tivesse escutando naquele momento – e ele lembrou.

É impossível produzir ou reproduzir o amor. A Amortentia produz apenas uma imitação...

Furioso, arremessou o frasco vazio contra a parede.

Que grande perda de tempo!

Ainda se permitiu admirar a própria imagem (nunca tinha percebido quantos músculos suas vestes pesadas ocultavam) em diferentes ângulos antes de tomar o antídoto.

[...]

Nunca, em mais de trezentos anos de existência, O Caldeirão Furado tinha recebido correspondência do modo trouxa. De fato, o carteiro teve de passar muitas vezes por aquele número até encontrar um buraco escondido entre a parede de pedras lisas por onde presumiu que as cartas fossem colocadas. Saiu de lá ainda se perguntando porque, em trinta anos de serviço, nunca tinha reparado na existência daquele lugar.

A carta era endereçada a Tom Servolo Riddle e o remetente vinha de uma rua trouxa de uma das áreas mais suspeitas da cidade – não que alguém ali além de Tom tivesse conhecimento desse tipo de local – e era escrita no estranho papel branco dos trouxas. As letras eram tremidas e infantis, e vinha recheada de erros de ortografia, como se quem a tivesse escrito não tivesse o costume de escrever com freqüência. Mas o que mais assustou seu destinatário foi mesmo o conteúdo e a assinatura no final:


Tom,

Eu sei que fazem muitos anos desde que nos encontramos pela última vez, e que as lembranças daquela noite não lhe devem agradar muito. Mas peço, por favor, que me encontre em nº54, Leprechaun Place apt.3. às onze horas desta noite. Tenho coisas muito importantes para lhe contar, e que não podem esperar por muito tempo – há coisas que sei sobre você que o espantariam também, e eu gostaria de esclarece-las devidamente. Por favor, venha desacompanhado.
Atenciosamente,

Amada Benson.



Chocado, Tom amassou o papel de carta grosseiro em que a carta viera redigida e jogou-a na lareira.

Como aquela trouxa maldita tinha conseguido seu endereço?

[...]

Leprechaun Place era, como Tom já sabia, um lugar tristemente decadente. Velhas casas outrora imponentes e ricas tinham se transformado em cortiços sórdidos e freqüentadas pelo pior tipo de gente da cidade.

O número 54 era pouco distinguível do restante das casas alugadas por quarto, cada qual especializado em um serviço escuso diferente. Ladrões, prostitutas, criminosos, assassinos e elementos desse tipo faziam do lugar um verdadeiro inferno na terra. No todo, Tom achava que Amada não poderia ter escolhido lugar pior para ir morar – e ao mesmo tempo, mais apropriado para oferecer os serviços que Tom suspeitava que ela oferecesse.

Às onze em ponto, então, aparatou silenciosamente na rua em frente, subiu as escadas estreitas e alcançou um corredor largo e sujo, que dava acesso a dezenas de portas iguais (de onde emergiam ruídos definitivamente suspeitos), todas velhas e meio quebradas, reforçando o aspecto decadente do lugar.
Impressionado, e ainda se perguntando como pudera por os pés ali por livre e espontânea vontade, bateu na porta número três polidamente e esperou que alguém atendesse.
A mulher que abriu a porta poderia ser qualquer uma, menos Amada Benson, ponderou Tom.

Seus longos cabelos louros estavam curtos, ralos e sem vida, e cheio de fios brancos, embora ela fosse alguns anos mais nova que Tom. Seu corpo, antes esguio e ágil, estava mudado para pior, embora não fosse exatamente feio. E o pior de tudo, ele avaliou, era o aspecto profundamente exausto de seu rosto jovem carregado de maquiagem. Seus olhos estavam fundos, opacos e vermelhos e grandes olheiras roxas os enfeiavam mais ainda. Ela vestia um vestido colante meio esfarrapado com um profundo decote e uma sandália de salto que deixavam seu conjunto extremamente vulgar.
Ao ver o antigo colega prostrado à sua porta, ela sorriu vagamente e disse simplesmente:
“Você sempre consegue ser incrivelmente pontual...”

O interior do quarto refletia exatamente o exterior. Uma grande cama de casal sem cobertas tomava quase todo o espaço, que era dividido também com uma cômoda quebrada e uma cama de criança, em cima da qual haviam brinquedos desmantelados. Uma porta abria para um pequeno banheiro e a luz estava acesa, como se alguém o estivesse usando. Assim que a porta do quarto se fechou, porém, a luz do banheiro apagou-se e a porta abriu, revelando seu ocupante.

Era um garotinho de uns dez anos, mirrado e baixinho, de cabelos muito pretos, pálido e de olhos escuros. Seu rosto era estranhamente familiar...

Seria possível que...?

O garotinho parecia completamente indiferente à presença estranha. Lançando um rápido olhar a Tom, sentou-se em sua cama e pôs-se a brincar com os brinquedos quebrados. Amada lançou um olhar enigmático em direção ao menino, e então falou:
“Ele é estranho. Faz as coisas acontecerem, sabe. Quebra vidros e tudo.”
Tom assentiu e começou a observar, curioso, o garoto brincar na cama. O menino continuava soberbamente indiferente a tudo.
“Eu achei que ele seria...” – Murmurou.
“Ele me faz lembrar você.” – Disse Amada, vagamente. “De quando você morava no Orfanato e costumava enforcar coelhos nas grades dos tetos, e causar surtos de catapora, e do dia em que você fez o Arthur melar as calças só porque ele te encarou.”
Tom se surpreendeu que ela ainda guardasse essas memórias. Mas Amada continuou:
“Eu nunca entendi realmente o que aconteceu naquela caverna. Acabei me conformando e me convenci de que você era um ser estranho,à parte dos comuns mortais como nós, de verdade. Até que veio o Ricky aqui e...” – Nesse momento, lágrimas discretas começaram a escorrer do canto de seus olhos – “ele é tão parecido com você... Vocês são alguma espécie de feiticeiros - bruxos, não são?”
Ricky tinha abandonado sua compostura e tinha os grandes olhos escuros – tão parecidos com os de Tom – fixos nos adultos que conversavam.
“Como foi que você me achou?” – Foi tudo o que pôde dizer.
“Algumas colegas minhas...” – Respondeu Amada vagamente, debruçando-se sobre Tom e desafivelando sua capa. “Você deveria se manter longe de lugares como este, já que tem opções...”

Ricky pareceu pressentir o rumo que a conversa iria tomar, e tornou a se trancar no banheiro.

[...]

Algum tempo depois Tom acordou com o barulho de uma sirene na rua lá fora, e percebeu que tinha passado mais tempo do que pretendia ali.
Amada dormia um sono profundo ao seu lado. Quando Tom tocou suas costas nuas para acorda-la, percebeu que ela estava gelada e rígida - morta.
Ricky observava Tom se vestir através da porta entreaberta do banheiro. Parecia muito assustado.
“Venha cá” – Ordenou Tom.
Ricky empurrou a porta lentamente e saiu. Encarou o estranho homem por alguns momentos antes de perguntar, a vozinha num sussurro fraquinho:
“Quem é você?”
“Eu não sei”
“Ela disse que você é meu pai” – Sussurrou o garotinho, apontando para a mãe morta na cama – “Você é?”
“Talvez” – E antes que pudesse se conter disse: – “Talvez eu seja.”
O menino permaneceu impassível.
“Fui eu que fiz isso” – Ele disse, apontando novamente para o corpo da mãe.
“Foi você que...?!” – Assustou-se Tom.
“Foi, sim. Eu consigo fazer essas coisas estranhas, mas nunca tinha matado ninguém antes.”
“Qual é o seu nome?”
“Ricky – Richard Benson.” – Ele respondeu, polidamente.

Menos um com esse sobrenome imundo...

Antes que pudesse se conter novamente, Tom se ajoelhou ficando da altura do garoto e tomou suas mãozinhas trêmulas. Uma sensação estranha, quente e fria, triste e alegre ao mesmo tempo, que o fez sentir como se borboletas voassem em seu estômago, invadiu seu corpo. Então, tomando o que seria a terceira atitude impensada daquela noite, estendeu a mão e acariciou os cabelos escuros – tão parecidos com os seus próprios. O menino fechou os olhos de prazer e sorriu imensamente satisfeito, como se tivesse uma longa fome saciada.
“Você vai me levar?” – Ricky perguntou, esperançoso.
“Não.”
Ricky pareceu ligeiramente frustrado.
“Você vai me deixar no orfanato?”

Não, não ia... Não podia deixa-lo lá... Não ia faze-lo sofrer tudo o que ele, Tom , tinha sofrido. Simplesmente não podia...

“Não.”
Ricky piscou confuso, mas antes que ensaiasse alguma resposta, Tom sacou sua varinha e apontou-a para o garoto. Parou por um instante, olhando no fundo daqueles olhinhos assustados.
Pela primeira vez, Tom Riddle hesitou. Fechou os olhos e pronunciou as palavras:
Avada Kedavra
O corpinho de Ricky caiu com um baque surdo no chão.

Pronto, estava feito...

Sem saber o que pensar exatamente, soltou os dedos da mão ainda quente do menino que agarrara seu braço num derradeiro pedido de clemência, e saiu de volta para a noite.

Mas o que Lord Voldemort não ficou sabendo por muito tempo é que a Maldição da Morte não funciona se lançada contra alguém que tenha o mesmo sangue do assassino.

Um ano após esse incidente, a Sonserina ganhava mais um membro particularmente estranho.

[...]

Preciso de um lugar maior...
Foi o pensamento mais complexo que sua mente perturbada conseguiu elaborar assim que entrou no quarto bagunçado abarrotado de livros e objetos estranhos.
E de um elfo doméstico...

Deitou-se na cama, deixando os pensamentos vagos fluírem num fluxo de sentimentos e lembranças confusas.

Tinha feito o certo. Sabia que tinha...

Por uns momentos, porém, conseguiu enxergar a si mesmo e a Ricky sorrindo um para o outro, brincando, como uma família.

Família...

Uma coisa que nunca tivera. Não sabia como era ter. Mas sabia que era melhor se manter longe dos outros. Porque se gostasse de alguém, essa pessoa teria poder sobre si. Já tinha visto e conhecido o suficiente para saber que amar não era bom. Era ruim. Era péssimo...

Amor tinha matado sua mãe. Amor tinha feito Mérope o abandonar à própria sorte naquele orfanato infecto.

Pessoas faziam loucuras pelos amigos, família, pelas pessoas que amavam. Pessoas morriam por outras. Ora, qual era, afinal, o sentido de morrer por outra pessoa se você sequer estaria vivo para desfrutar de sua presença?

Então por que tinha se importado em matar Ricky? Porque não tinha simplesmente abandonado o garoto num orfanato como tinham feito com ele próprio?

Existiria algo pior do que a morte?

Pegou-se admirando a caveira com uma serpente saindo da boca na forma de língua, incrustada de esmeraldas verdes e brilhantes na capa do livro da Cruz de Hórus. Sentiu de repente um ímpeto irresistível de abrir o livro. Sabia que não adiantaria, que nunca ia conseguir entender aqueles símbolos complicados...

Então abriu a capa e folheou as primeiras páginas.

E lá dentro de sua alma sinos de glória soaram, saudando o novo ser que surgia a partir daquele momento, quando aquele homem deixou definitivamente de ser Tom Riddle para se tornar Lord Voldemort.
Seus olhos brilharam num fulgor vermelho mais intenso do que nunca...

[...]


“Você está diferente”
Foi tudo o que Avery Nott pôde dizer ao rever o antigo colega de dormitório.
De fato, se pudesse não estaria ali. Estava se sentindo imensamente desconfortável com aquela presença.
O Tom Riddle que tinha conhecido não era exatamente bonzinho, mas sua voz era humana e transmitia um certo calor, e possuía um bonito rosto perfeitamente olhável. O ser encapuzado com quem falava, naquele momento, porém, já não era uma presença muito agradável. Só podia imaginar o que Riddle tinha feito para ficar daquela maneira...
“Você também” – Respondeu Voldemort, secamente.
“É, bem, agora sou um pai de família” – Disse Avery, sorrindo amarelo – “E você?”
“Ninguém até hoje reivindicou minha paternidade” – Mentiu deslavadamente.
Avery riu novamente, desconfortável.
“Aos negócios, então?”
“Sim... Aos negócios.” – Murmurou Avery em resposta.
“Estive pensando em reunir nossos antigos amigos... Malfoy, Rosier, Dolohov...”
Avery permaneceu em silêncio, pensando no que Tom estava querendo, afinal, quando o chamara ali.
“Para...?”
“Ora, matar as saudades!” – Respondeu Voldemort, completando com uma risada rouca e vazia que demonstrava que tudo o que menos queria era matar as saudades.
Avery se levantou e fez menção de ir embora, murmurando palavras de despedida.
Mas antes que alcançasse a porta de saída, uma mão de longos dedos finos e frios se enrolou ao redor ao redor de seu pulso, e fez o futuro Comensal da Morte sofrer um intenso arrepio que percorreu sua espinha de cima a baixo.
“Eu ainda não esqueci do nosso Voto, Nott”. – Falou Voldemort, e sua voz soou fria e ameaçadora.
Lentamente, como um animal acuado, Avery retornou à cadeira.

“Podemos ser aliados.” – Disse Voldemort, baixinho.
Averu ergueu uma sobrancelha, incrédulo.
“E o que eu teria a ganhar com isso?”
“Você, nada, porque me deve lealdade eterna de qualquer maneira.”
Avery estremeceu ligeiramente ante um novo arrepio. Os dedos queimavam sua pele de uma maneira estranha. Começava a se arrepender de um dia ter conhecido aquele homem...

Voldemort sacou a varinha do bolso das vestes e deu um puxão no braço de Avery, fazendo a manga deslizar e mostrar o antebraço. Avery debateu-se tolamente, tentando se afastar daquele ser sinistro.
“Não seja idiota, eu não vou matar você!”
Um feitiço sussurrado da parte de Voldemort, e Avery sentiu uma sensação estranha no antebraço esquerdo, como se agulhas o furassem, e lentamente um desenho negro foi surgindo em seu braço, queimando dolorosamente como um ferro em brasa.
Alguns minutos depois, uma caveira com uma cobra saindo pela boca como uma língua, a assim chamada Marca Negra, estava desenhada permanentemente em sua pele.
“O q-que é isso?” – Gaguejou Avery, puxando o braço para si e massageando a recém-nascida tatuagem.
“Acho que você tem mais experiências com marcas desse tipo do que eu” – Disse, sorrindo maldosamente. – “Devia estar mesmo satisfeito; voltou a ter alguma coisa decorando o braço.”
Os dois bruxos se encararam calados por um momento.
Voldemort fitou o antigo colega profundamente, e antes que este pudesse desviar o olhar, pôde sentir seus sentimentos e emoções num fluxo confuso que aprendera a decifrar com perícia.
Avery estava com medo. Apavorado. Em pânico.
“Com medo?” – Perguntou maliciosamente.
“N-não, claro que não...” – Gaguejou o outro nervosamente.
Os lábios finos de Voldemort se abriram num sorriso cruel.
“Vou lhe dar um conselho, Avery; não minta para mim...”
O Comensal estremeceu, mudo. Daria qualquer coisa para sair aparatando dali...
“Você quer uma prova do meu poder? Eu lhe darei!” – Disse Voldemort, encarando Avery fixamente.
“Chame a velha turma e alguns novatos, se puder, e me encontre aqui amanhã no mesmo horário.” – Completou, e fez um sinal com a mão o dispensando.

[...]

Era mais um dia comum para Ernestina Tatler, Chefe da Seção de aurores do Ministério da Magia. De fato, desde a queda de Grindewald, seus subordinados não tinham muito o que fazer, então acabavam se ocupando com trabalhos que não deveria estar fazendo, como investigar tentativas de bruxos muito obtusos de cruzar acromântulas com kappas, ou criar lobisomens ou tentar reduzir um dragão ao tamanho de um cachorro e leva-lo para passear na praia ou até mesmo de dar poção polissuco (!) para um bicho-papão.
Mas no fim das contas, não havia realmente nada para fazer àquele horário, duas horas antes de seu expediente acabar, e os jogos de cartas já tinham perdido a graça, de modo que Ernestina Tatler resolveu ir para casa terminar seu relatório sobre os prisioneiro de Azkaban, avaliando que um novo Senhor das Trevas no poder bem que viria a calhar, porque seus aurores estavam ficando preguiçosos e mal-acostumados.
Mas quando saiu pela porta emperrada daquela velha cabine telefônica que dava entrada ao Ministério, percebeu um movimento nas sombras, e treinada como era para perceber presenças estranhas e ameaçadoras ocultas, rapidamente sacou a varinha e empunhou-a à altura dos olhos, seu sexto sentido captando movimentos e cheiros no ar que pudessem identificar seu perseguidor.
“Quem está aí?” – Gritou para o vazio.
Ninguém respondeu.

Esse treinamento que dão aos aurores é realmente bom - Ponderou o homem oculto pelas sombras da tarde que já se transformava em noite e enchia a luz dourada e faiscante do sol poente pelas trevas escuras e pesadas.

Voldemort estava em cima do telhado da velha loja quebrada em frente à cabine telefônica e observava a mulher que tinha a varinha empunhada e andava em círculos, caçando-o alucinadamente. Era uma sorte que ela tivesse resolvido sair mais cedo, porque ele tinha passado o dia todo plantado naquele telhado, observando o vai-e-vem no Ministério, tentando marcar alguém relativamente importante, mas cuja morte não despertartia suspeitas contra a sua pessoa – e suas pernas estavam realmente começando a doer de ficar naquela posição.

Ernestina, por sua vez, não conseguia se livrar da sensação de estar sendo observada. Mas como após dez minutos de vigília, não tivesse surpreendido ninguém que pudesse lhe ameaçar, contrariou seu rígido treinamento e guardou a varinha no bolso do cós de sua calça trouxa.

Foi um erro.

Antes que pudesse identificar sequer a direção daquele feitiço mudo, sentiu a varinha escapar-lhe e voar para longe de seu alcance.
E então seu perseguidor revelou-se. Um homem alto, magro e encapuzado pulou do telhado como um gato, aterrissando sem barulho no chão. Antes que pudesse expressar qualquer reação, o homem ergueu a própria varinha e um clarão de luz verde foi tudo o que viu antes de desfalecer morta no chão sujo da rua.

[...]

Era uma casa pequena e soturna no centro da Londres Trouxa, mas contava com inúmeros feitiços à sua volta que não a permitiam ser identificada por quem Voldemort não quisesse.
A mobília era pouca, mas de um bom-gosto que ninguém pensaria que aquele homem possuísse. Além do ar um tanto sombrio exterior, nada ali denotava a personalidade de seu proprietário.
Móveis de madeira escura e tapetes persas (Voldemort tinha que abençoar o bendito prêmio da Ordem de Merlin) combinavam perfeitamente bem com as paredes repletas de livros estranhos, mas que não destoavam do ambiente sóbrio. Uma lareira quentinha tornava o ambiente até mesmo aconchegante. A única coisa estranha no lugar era uma cobra – uma cobra enorme, uma naja de quase dez metros – enrolada numa bizarra imitação de animal de estimação em frente à lareira, aquecendo-se do inverno frio que se anunciava.

Voldemort entretia-se lendo o último exemplar do Profeta Diário cuja principal manchete era “Chefe da Seção de aurores assassinada brutalmente – ainda sem suspeitos”, imaginando quem seria o otário que pagaria por aquele crime, bebericando uma xícara de chá e esperando o momento em que seus futuros Comensais da Morte apareceriam para uma reuniãozinha, achando-se brilhante pela idéia da Marca Negra.

A bem da verdade, a idéia nem era exatamente sua – o feitiço era ensinado no livro da Cruz de Hórus, provavelmente o mesmo utilizado por Grindewald para marcar seus Darknights, mas Voldemort também achava que uma caveira com uma língua de cobra era um símbolo muito mais legal do que uma cruz em chamas.

Mas o Morsmordre nem de longe era a coisa mais interessante ensinada naquele livro. Porque Voldemort tinha finalmente aprendido como dividir a alma mais de uma vez, e naquela mesma noite após a morte de Amada e Ricky, tinha transformado o Anel de Servolo em sua segunda Horcrux. Podia ter feito o mesmo com o restante dos objetos, mas resolveu guardar aquele processo para mortes realmente significativas – sua alma, afinal, não era um bolo para ficar sendo repartida assim à toa. E decididamente matar Ricky tinha sido uma morte significativa, muito mais do que a morte de Ernestina Tatler, por exemplo.

E tinha sido aquilo que provavelmente que tinha deformado seu antes belo rosto – mas ele não se importava. Já tinha ido a época em que se utilizava de seus atributos físicos para conquistar admiradores. E de qualquer forma, desse jeito metia muito mais medo do que seu antigo rostinho angelical, e era melhor assim. Apenas sentiria falta das filas de mulheres suspirando atrás de si...

Naquele momento, porém, quando o grande relógio de pêndulo bateu onze horas, um, dois, três, quatro pessoas aparataram consecutivamente do lado de fora da sua porta, e alguns segundos depois, bateram na porta com a aldrava de prata em forma de serpente.

Eram quatro homens encapuzados e de aspecto sinistro. Nott, Rosier, Lestrange e Dolohov, três antigos colegas de quarto e um desconhecido qualquer que parecia ainda mais indeciso sobre se deveria estar ou não ali.
“Boa noite, meu amigos” – Saudou Voldemort, abrindo um sorriso frio e permitindo a entrada dos homens na casa.
O grupo se reuniu alguns metros atrás de Voldemort, encolhendo-se uns juntos dos outro como que se aquecendo – mas a lareira já estava dando conta do recado, então provavelmente eles estivessem tentando, instintivamente, se proteger de algo.
“Ora, não tenham medo!” – Falou Voldemot, irritado. “Como pretendem conversar encolhidos aí como um bando de cãozinhos sem dono?”
Os homens se afastaram, visivelmente constrangidos e cada um tomou um lugar na comprida mesa da sala de jantar, que também contava com uma lareira aconchegante e paredes cobertas de livros até o teto.
“Hunter!” – Chamou Voldemort, e um elfo doméstico muito velho e de aspecto cansado apareceu imediatamente na sala de jantar, prestando uma profunda reverência ao seu Senhor e batendo com a testa enrugada no chão de carpete vermelho.
“Sirva umas bebidas para nós.” – Ordenou, e o elfo tornou a desaparatar, aparatando segundos depois com uma bandeja com cinco copos e uma garrafa de Vinho dos Elfos.
Voldemort tomou seu cálice e o analisou por um momento, como se achasse alguma coisa muito interessante ali. Então tomou um gole e o sorveu lentamente antes de se pronunciar:
“Vocês devem estar se perguntando porque eu os chamei aqui?”
Os homens assentiram timidamente, sem tocar nos copos de bebida às suas frentes.
“Vou direto ao ponto, então. Vocês querem ser meus amigos?”
Os Comensais olharam incrédulos uns para os outros, aparentemente tentando entender o que um pedido como aquele significava. Voldemort tomou mais um gole do vinho antes de se dar conta de que eles não tinham entendido ainda o teor daquela conversa.
“Ah... Acho que vocês ainda não entenderam. Por amigo eu quero dizer isto” – E com um puxão brusco na manga das vestes de Avery, exibiu a Marca Negra que brilhava intensamente, negra como as trevas mais profundas.
A ficha dos homens pareceu cair, finalmente. Uns fingiram não sentir nada, outros estremeceram ligeiramente. O único a expressar outra reação foi Dolohov, o convidado, que empertigou-se na cadeira e falou, altivamente:
“E o que eu ganharia com isso?”
Voldemort riu debochadamente.
“Engraçado, Sr...?”
“Dolohov. Antony Dolohov.”
“Engraçado, Sr.Dolohov, mas é a segunda vez que me perguntam isso.”
E então apontou a varinha para a estante mais alta da sala de estar, e convocou uma grande sacola amarrada que envolvia um objeto de formato muito estranho. Então ele a abriu, e o que tirou de dentro quase fez os homens darem gritinhos apavorados.
Era a cabeça de Ernestina Tatler, e seu pescoço decepado ainda pingava sangue grosso. Segurando-a pelos cabelos ensangüentados, atirou a cabeça na mesa, que rolou até Dolohov, os olhos mortos fixos e vidrados no bruxo apavorado.
Voldemort ergueu a mão ensangüentada até a boca e lambeu dedo por dedo, com gosto, bebendo o sangue como se fosse o mel mais doce.
“É isso que você tem a ganhar.”

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Desculpadesculpadesculpadesculpadesculpadesculpadesculpa...
Eu seeeeeii que Voldemort não tem filho!
Eu seeeeeii que é uma puta clichêzada ele não poder matar o filho...
E eu seeeeeii que R.A.B. provavelmente é o Régulus, mas eu tenho essa idéia desde o primeiro capítulo da fic, e não pude resistir, não pude mesmo.
No mais, acho que foi um capítulo bem auto-explicativo. Tivemos a cena engraçadinha do Tom apaixonado por si mesmo e o cheiro de sua Amortentia.
A idéia do cheiro de mar (alusão àquela caverna em que ele encontrou a Nagini) foi da Belinha Black (que também tem uma fic sobre o Tom, chamada “Corine, a explicação de tudo”- podem ler, é boa hehe), então, daremos os devidos créditoa a ela ^^.
O cheiro de líquidos para lustrar troféus é bem óbvio, assim como o cheiro do Salão principal de Hogwarts. O assassinato meio sem sentido da Chefe da Seção (nunca sei se é Sessão com ss ou com ç) de aurores, pro Tom (só consigo chamar ele assim, agora) exibir pros seus “amigos”. Depois, vemos os primeiros Comensais, o lar, doce lar do Voldie, seu elfo-doméstico velho de pobre hehe e mais demonstrações de um caso grave de psicose.
Sobre a cruz de Hórus, receio que ela seja deixada meio de lado por uns tempos, mas foi ela que “ensinou” o Tom a fazer mais de uma horcrux, o que deformou (que pena!) seu belo rostinho.
Mas o mais importante de tudo foi o “amor” do Tom. Deixa eu explicar, antes que me denunciem por propaganda enganosa, já que eu digo que faço um Tom fiel aos livros e nada bonzinho. Bem, não concordo com esse ato horrível dele, por mim ele teria pegado o menino pra criar e dado-lhe todo amor do mundo, mas nós sabemos que ia ser uma merda se isso acontecesse. Então o Tom amou pela primeira vez, não exatamente o Ricky, mas ele sentiu amor, por isso ele se “importou” com o menino o suficiente para manda-lo para um lugar que ele acha que é melhor do que o orfanato: a morte. Tente ver pelo lado dele também, né? Apesar dele achar que não existe nada pior do que a morte, ele quis popar o filho do sofrimento e a humilhação que ele próprio passou.
Eu tinha planejado uma morte ainda mais trágica pra Amada, envolvendo pílulas anti-depressivas e overdose por heroína, mas eu achei que seria pós-moderno demais, então ficou por isso mesmo.
Ah, e eu demorei mais com esse capítulo por três motivos: Primeiro, eu andei super ocupada estudando Álgebra, Química, Trigonometria e Biologia (antes de morrer eu ainda descubro qual é a utilidade de se conhecer os fenômenos que ocorrem com as cromátides irmãs de cromossomos homólogos durante a primeira fase da Prófase I da Meiose de uma célula Eucarionte) mas, anyway, eu tenho que passar de ano. Também andei sem criatividade, e o pior de tudo é que eu nem consegui arrancar os cinco comentários hehe... Tudo bem, tudo bem, eu gosto de escrever, que seja...
Agradecimentos à Morgana Black, Miss Robsons, Belinha, e o pessoal que fez a caridade de comentar aí em baixo ^^
Beijos,
Lillith Riddle

p.s.: Nota de autora mais comprida, essa, né? :P

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Comentários (1)

  • Jane Yang

    essa historia esta cada vez melhor, mas so nao entendi uma coisa... ele conseguiu matar o Ricky ou nao. pelo que eu entendi, ele nao conseguiu, porque nao podia matar alguem do mesmo sangue, no entanto ele matou seu pai e seus avos...

    2012-07-06
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