A Cruz de Hórus (Parte II)



Cairo
(1950-1952)




O sol quente do Egito castigava sua pele pálida acostumada ao frio londrino. Mas ele não parou; continuou caminhando pela imensidão de areia dourada que se estendia à sua frente. Resolveu que era mesmo hora de tirar a longa e quente capa que usava nas costas – até seu poderoso feitiço de resfriamento estava perdendo o efeito.

Então, como numa tela de cinema, a imagem de uma grande cidade foi se avolumando à sua frente, erguendo-se imponente no horizonte.

Um trouxa metido a feiticeiro tentava fazer uma cobra se erguer de seu cesto seguindo o som de sua flauta. O homenzinho assustou-se ao perceber que a cobra abandonou seu posto e passou a seguir o estranho homem pelo mercado, até que ele virou-se e falou com ela!

Voldemort caminhou até uma passagem escura entre duas miniaturas de esfinge e bateu a varinha contra elas. As estátuas criaram vida e abriram um portal por onde pôde passar, que fechou-se logo em seguida às suas costas.

Naquele lugar, porém, o menos interessante eram os tecidos coloridos e os temperos cheirosos, realmente. Nem mesmo a Travessa do Tranco poderia conter tantos produtos curiosos, a maioria certamente não teria a venda permitida no Beco Diagonal.
Haviam múmias em tamanho real que rugiam e ameaçavam, escaravelhos mágicos que traziam sorte a quem os portasse, sarcófagos encantados para aprisionarem os inimigos e uma miniatura do Rio Nilo que prometia uma fonte inesgotável de água pura.

Mas Tom não se deteve naqueles itens peculiares - estava muito ocupado tentando encontrar o primeiro ponto assinalado no mapa que o levaria à tão sonhada Cruz de Hórus.

Era, surpreendentemente, um mapa bem simples, na verdade. Uma trilha tortuosa e comprida que serpenteava por todo o país, onde pequenos pontos tinham sido assinalados com números aleatórios, e aquele era o primeiro ponto. Ali, exatamente ali, em frente a uma fonte antiga que jorrava jatos de água borbulhante que desapareciam antes de tocar o chão em minúsculas gotas brilhantes.
Sentou-se e esperou alguma coisa acontecer... Mas nada aconteceu. Então perguntou-se se não tinha errado, se não seria um equívoco. Mas o mapa não poderia ser mais claro. Exceto pelo intrigante número 15 marcado em vermelho. Tom esperou por horas a fio, esperando que algo acontecesse...

A noite caiu, e as lojas fecharam. Ele deu-se conta de que estava num país estrangeiro onde não era capaz de entender uma única palavra da língua, sem lugar para ficar, e pensava em seriamente aparatar de volta para Roma quando uma luz verde emergiu das águas agora paradas da fonte de mármore à sua frente. Alarmado, Tom ergueu a varinha na altura dos olhos e se aproximou...

Um vulto estranho tomava forma através do véu trêmulo criado pela barreira líquida. Uma forma humana que logo se tornou reconhecível...

Mas como, em nome de Slytherin, esse cara pode ter me achado aqui?!

Era Alvo Dumbledore. Tom sentiu as ondas de ódio quente subindo por seu corpo, envenenando suas veias lentamente, afogando-o...

“Boa noite, Tom” – Disse o professor calmamente, saindo da fonte.
“O q-que você está fazendo aqui, seu maldito?” – Rosnou o jovem homem lívido de fúria, apontando a varinha trêmula para o velho.
“Eu sei o que você está pretendendo, Tom. Eu sei que você está em busca da Cruz de Hórus.”
“E o que você tem a ver com isso? Volte para seu lugar, velho pateta, e me deixe em paz!”

A imagem de Dumbledore parecia estranhamente distorcida e emitia um singular brilho verde-luzidio. O Professor continuou a falar tranqüilamente, com o habitual tom de voz calmo e sereno.

“Para que você quer tanto poder, para que você quer a imortalidade?”
“Saia daqui. Saia daqui, estou lhe avisando...” – Voldemort respondeu; sua voz de puro veneno.
“Você não pode contra mim.” – E Dumbledore fez um movimento rápido com a mão direita e a varinha de Voldemort voou de suas mãos como se fosse feita de borracha, metros longe de seu dono.
O ódio cresceu, atingindo níveis inimagináveis...
“Por que você não me enfrenta como homem? POR QUE VOCÊ NÃO ME ENFRENTA, HEIN?” – Gritou o jovem Voldemort, desesperado de se ver sem varinha, fechando os punhos com força, cravando as unhas na palma das mãos.

Não queria mais saber, se não tinha sua varinha, nada o impedia de agir feito a criança que Dumbledore o tratava como, e se jogar sobre o velho bruxo, apostaria como poderia facilmente quebrar seus velhos ossos e transformá-los em farinha; machuca-lo para valer...
“Você não passa de uma criança confusa e solitária” – Dumbledore disse. – “Muito poder nas mãos erradas.”
“NÃO FALE SOBRE O QUE NÃO SABE!” – gritou novamente; o ódio tão intenso que sentia náuseas...
“Você luta contra sua própria raça; luta para exterminar um povo do qual você faz parte...”
“CALE A BOCA!”
“Veja no que você está se tornando, Tom Riddle. Você foi capaz de matar seu próprio pai...” – a voz do diretor então tornou-se sombria e melancólica e seu corpo que parecia feito de uma névoa esverdeada tremeu um pouco.

E então a ficha caiu.
Aquele não era... Não podia ser Dumbledore... Dumbledore estava a milhares de quilômetros de distância, não poderia aparatar, e de qualquer maneira, como poderia saber sobre o roubo do Mapa, como poderia saber do assassinato de seu pai? Sentiu seu auto-controle voltando aos poucos, mas decidiu se fingir de desentendido, queria saber o que diabo estava lhe acontecendo, afinal...

“Como você me achou aqui?”
“Tenho meus meios.”
“Que meios?”
“Informantes. Mas isso não vem ao caso... Precisamos conversar.”
“Como sempre, Dumbledore, muita conversa e pouca ação...”

Precisava ganhar tempo... Foi se aproximando do que quer que fosse aquele corpo etéreo, mas quanto mais se aproximava, mais a imagem parecia se distanciar, sem, porém, se mover, como se tentasse inutilmente alcançar o horizonte.
Sua varinha estava a centímetros do pé. As barras das vestes compridas a ocultaram e Tom murmurou um feitiço discretamente, dos feitiços sem varinha que andara praticando.
A convocação funcionou, e a varinha foi parar em sua mão estendida. O vulto reluzente de Dumbledore, no entanto não pareceu notar nada. Continuava a sorrir serenamente.
“E foi você também que matou Hepzibá Smith, não foi?”
“Para que quer saber?”
Mas antes que o espectro pudesse responder, Tom gritou:
Finite Incantatem!”
E então o vulto espectral deu um profundo gemido agudo e desapareceu, voltando para dentro de sua fonte, que se iluminou intensamente num clarão verde como o do Avada Kedavra e desapareceu.

Tom deslizou pela parede suja da loja às suas costas, ofegando nervosamente. Trêmulo, puxou o mapa do bolso de suas vestes e percebeu: O número 15 assinalado naquele ponto tinha desaparecido. Um novo número estava marcado em vermelho no próximo estágio da jornada. Um brilhante 21 marcado no caminho que deveria seguir.
Parou por um momento, percebendo que aqueles números não estavam ali por acaso, havia um motivo...
E o espectro de Dumbledore, falando tudo aquilo que ele mais odiaria que o professor falasse... Odiaria... Ódio. A projeção do que mais lhe causaria ódio. E quinze era isso, o número que simbolizava mal-entendidos, controvérsias, disputa, violências, fatalidades, o ódio.
Ele se levantou e cambaleou até a saída. Não fazia idéia do que o esperava, mas sabia que aquilo tinha sido só o começo...

[...]

O próximo ponto no mapa marcava uma velha casa numa vila bruxa na periferia do Cairo. Chegar até ali não tinha sido fácil; incluíra um longo e desconfortável percurso no lombo de um camelo e uma travessia de um trecho de rio num barquinho precário que quase o fizera perder um pé para um crocodilo. Mas, enfim, ali estava, encarando o casarão de aspecto colonial que se destacava em meio ao conjunto de pobres casinhas humildes de tijolos de barro cozido, fazendo o se sentir três mil anos no passado. Era inegável, porém, que o local emitia uma espécie de força de atração mágica, como se algum gás invisível tivesse sido lançado no ar e o fizesse ficar mais pesado. Era difícil até de respirar com tanta magia no ar...

Ele se aproximou da entrada da pequena vila cautelosamente, consciente de como sua aparência destoava do local, de sua pele pálida agora vermelha do sol tão diferente da pele morena daquele povo; suas roupas pesadas e quentes que ele se negava a retirar embora o calor inebriante o fizesse sentir tonturas e suar como nunca havia suado na vida.
Decidiu investigar melhor o local antes de entrar na casa e então andou pelas ruelas estreitas e sufocantes em busca de alguém que lhe desse informações. Um simples feitiço tradutor seria suficiente...

Mas estranhamente não encontrou vivalma em nenhum lugar ali. Agora que prestava atenção, realmente, não ouvia nenhum som além do distante vento batendo contra os coqueiros ou das aves que passavam vez por outra no céu, emitindo grasnidos roucos que se pareciam horrivelmente com grasnidos de abutres.
Intrigado, Tom tentou espiar por uma das janelinhas de uma das casas mas descobriu que elas estavam todas enfeitiçadas contra bisbilhoteiros. Mas continuava a não ter nenhum morador, aparentemente, por ali. A vila tinha um certo ar de abandono, mas era imaculadamente limpa e algumas poucas casinhas tinham jardins bem-cuidados, o que sugeria presença humana.

Certo, certo, isto está ficando ridículo!

Irritado, começou a correr pelas ruelas, batendo nas portas e janelas das casas, mas sem ouvir nenhum ruído de presença humana que não fosse o eco de seus passos e os berros raivosos que começou a dar. Verificou o mapa várias vezes e novamente, não poderia ter sido mais claro.

Então voltou para o início da cidade, resolvido a voltar outro dia; quem sabe todos tivessem saído em caravana, ou qualquer coisa que o valesse. Qual não foi sua surpresa, porém, ao constatar que se descobrira incapaz de achar o caminho de volta.

“Oriente-me” - Ordenou à varinha.

Mas o fluxo de magia poderosa que envolvia o local interferiu na magia de sua varinha e esta apenas girou desordenadamente na sua mão antes de desaparecer numa baforada de fumaça negra.
“O q-que...? Como...?”
Encarou a palma da mão vazia onde até pouco antes sua varinha tinha rodado, e agora, não tinha restado nada dela. Procurou no chão em volta, nos bolsos, tentou um feitiço convocatório sem varinha mas nada adiantou. A varinha parecia simplesmente ter se perdido em outra dimensão.
Confuso e amedrontado, entrou na grande casa colonial que se revelava à sua frente, surgida de repente. Então compreendeu novamente...

Era uma casa completamente em ruínas, suja e mal cuidada. Ratos e insetos passeavam pelo chão imundo. Tom começou a subir a escada, ainda onde tinha ido parar sua varinha. A escada rangeu ameaçadoramente sob o seu peso.

O segundo andar era ainda mais, se possível, acabado. Um longo corredor se estendia à sua frente, revelando uma série de portas trancadas. A última, porém, estava aberta. Pressentindo alguma coisa ruim, mas sem ter como escapar dali, se adiantou lentamente e empurrou a ultima porta.

Foi revelado um quarto no mesmo estado do resto da casa, uma cama de casal quebrada com uma cortina manchada de algo que parecia horrivelmente com sangue, flutuando fantasmagoricamente embora a janela estivesse fechada e pregada com tábuas.
No momento em que Tom colocou os dois pés corajosamente dentro do quarto, a porta bateu e trancou-se às suas costas. Gemendo apavoradamente e lamentando mais do que nunca o sumiço misterioso de sua varinha, parou para analisar o aposento em que se encontrava.

Precisava de uma saída...

Mas antes que tivesse tempo para pensar em como poderia escapar ileso da enrascada em que se metera, um flash de luz verde foi lançado sobre ele, saído de dentro do grande espelho emoldurado que mostrava a sua própria imagem apavorada, e então sentiu que morrera.

Estava leve, solto, sentiu que não existia mais fisicamente. Então o medo inundou seu ser; será que estava morto? E sua Horcrux, onde estava, que teria acontecido?

Não queria morrer, não, não, não era fraco, não...
Medo.
Angústia.
Sentia-se preso à liberdade e à leveza aterradora que achou que precedia a morte...
Não, por favor, não quero morrer...
Sentiu os olhos lacrimejarem quando se dava conta de que tinha acontecido, o que mais temia; tinha morrido, tinha perecido, sucumbido à leviana fraqueza da morte.
Mas... Espere um pouco...
Se estava morto, porque sentia as lágrimas grossas e quentes escorrerem abundantemente sobre seu rosto?
Então se ergueu, e o pânico tomou seu ser novamente. Viu a si mesmo deitado no chão, lívido e imóvel, rígido e gelado como um cadáver, os olhos fechados e a boca entreaberta de susto. Ergueu as mãos na altura dos olhos, mas descobriu que não era mais que uma consciência incorpórea, a alma já tão destroçada do jovem homem semi-morto no chão.

O que você mais teme?

Soou uma voz calma e distante, suave e andrógina; Tom não poderia dizer se ela pertencia a um homem ou a uma mulher, mas sentiu um imenso prazer em ouvi-la, como a música mais suave que seus ouvidos já tivessem um dia sido agraciados em ter acesso...

Eu temo a Morte!
E por que você teme a Morte?
Eu temo o que não conheço!
Mas se você morresse, passaria a conhecer a Morte.
Mas eu não quero conhece-la!
Você não tem vontade de morder o Fruto Proibido? Saciar a Suprema e Derradeira Curiosidade?
Eu sou a Serpente, não sou a Eva! Deixe-me retornar!
E para que queres retornar? Para viver tua vida mesquinha em busca de glória e poder? Não podes ter o que deseja...
Como podes saber que não conseguirei?
Porque nenhum outro antes de ti conseguiu!
Mas nenhum antes de mim tentou! Deixe-me tentar...

A voz silenciou por um momento. Então retornou mais profunda e envolvente do que nunca:

Sabes que não poderá ser imortal até se tornares mortal por completo. Não se pode negar algo que nunca existiu.
E o que tenho que fazer para me tornar mortal por completo?
Amor. Para se tornar mortal você deve primeiro sentir amor, e então será um mortal completo e poderá se tornar imortal.

E nesse momento, a consciência voltou ao corpo, e ele se sentiu sólido e firme novamente. Sua varinha surgiu no ar e caiu ao seu lado com um baque surdo. E Tom compreendeu...
Ódio
Medo
Os sentimentos mais primários, aqueles que faziam parte do ser humano... Aquilo que ele evitava a todo custo...
O que viria a seguir?
O mapa pareceu responder à sua pergunta. Assinalado no próximo ponto, havia um “12” pintado em vermelho.
Sabendo o que aquilo significava, se levantou e andou cambaleante até a saída, não se admirando de encontra-la totalmente desimpedida.

[...]

Faziam três dias que não dormia e pelo menos dois que não comia nada. Ainda assim, achou forças para continuar em sua jornada. Achou que se talvez deitasse a cabeça num travesseiro, poderia perder a coragem e a vontade, poderia desistir...

Uma intensa dor de cabeça lhe doía como uma ferroada insistente, mas Tom não ligava. Na verdade, nada parecia lhe importar, a não ser a imensa paisagem que se estendia até o limite de suas vistas, uma vasta extensão de areia que refulgia à luz pálida do luar.
O deserto à noite era realmente frio e não tinha nenhum sinal de vida por aquelas áreas.

Continuou caminhando abrindo caminho entre as trevas com a luz intensa e brilhante de sua varinha. O mapa indicava latitudes e longitudes exatas e não havia meio de errar a localização. Parece que quem elaborara aquele mapa não estava preocupado com a dificuldade de achar o caminho, mas com os obstáculos interiores de quem fosse atrás de sua jornada. Como a misteriosa voz lhe dissera, aquelas provas tinham a função de tornar mortal aquele que buscasse a imortalidade; fazer a pessoa sentir o que é ser humano na sua forma mais intensa, como que para compensar...
Tinha sido uma sorte ele não ter caído nas armadilhas que ele mesmo se armara. Como sucumbir às palavras odientas de Dumbledore, ou se entregar ao seu próprio medo, que o aguardava à sua espreita, sempre, irreversível, dominador...

Calculou sua localização nas estrelas como aprendera nas aulas de astronomia e achou o local exato. Exausto, caiu de joelhos esperando que algo acontecesse. Nada aconteceu. Lentamente sua varinha foi se apagando, como se seu poder estivesse diminuindo diante de tamanho desespero e cansaço...

O frio e a escuridão o envolviam, mas não mais que a firme determinação que sentia. Queria terminar isso, queria que fosse rápido, porque sabia o que viria a seguir... Sentiu o sono voltando, dominando seu corpo exausto e dolorido das dezenas de quilômetros caminhados naquele dia. As estrelas foram se apagando; a brilhante lua cheia foi se tornando minguante quando suas pálpebras que pareciam pesar toneladas foram se fechando lentamente. O sussurro do vento cantou sua canção de ninar, afagando seu rosto como uma mãe carinhosa que colocasse seu filhinho para dormir, embalando-o num abraço gelado e cortante...

Então se lembrou de sua missão, e teve forças para ignorar o sono tão prazeroso que se anunciava e olhou para frente, tentando distinguir algo além de areia fofa em meio às sombras. Ali havia algo, sim, que não reparara antes: um montinho semi-destruído coberto de rala vegetação, parecendo um grande castelo de areia que algum menino travesso tivesse passado por cima, deixando apenas as ruínas.

Tom se aproximou da estranha construção que não tinha mais de um metro e meio de altura, mas não esperou que nada acontecesse. Ajoelhou-se novamente, dessa vez tomado de nova determinação e cavou na base, desesperadamente, tentando achar uma entrada, qualquer uma que fosse para algo que instintivamente sabia que deveria estar ali...

Uma estreita passagem oca se revelou na areia maciça. Não era mais do que um buraco escuro, mas não estava ali por acaso. Era uma sorte que estivesse tão magro; escorregou com facilidade para a passagem subterrânea totalmente escura cujo ar viciado e poeirento não melhorou sua condição física. Acendeu a varinha novamente.

Percebeu que deveria estar muitos metros abaixo da superfície, porque era uma câmara de formato estranho e úmida, como se estivesse abaixo do lençol freático.
A sala era única, havendo apenas um corredor em linha reta por onde deveria seguir. Semi-incosciente, enxergando apenas o caminho escuro, entrou pelo corredor. Assim que deu os primeiros passos naquela direção, porém, o buraco na pirâmide em ruínas se recompôs e a areia voltou para o lugar como se nada tivesse acontecido, deixando-o preso e isolado ali dentro até que completasse a sua missão. Tom prosseguiu caminhando pelo corredor de areia dura como cimento, onde hieróglifos desconhecidos tinham sido gravados. Um feitiço tradutor revelaria o significado daquelas inscrições, mas Tom passou por eles sem sequer olhar, não precisava, não havia necessidade, ele sabia o que o aguardava no final daquele túnel...

Quando chegou no final, tropeçando sobre os próprios pés e ofegando intensamente, entrou numa outra câmara menor de pedra. A abertura por onde passou também se fechou, deixando apenas uma parede lisa de rocha fria e escura. Haviam esqueletos humanos ali. Estava bastante claro que a sua probabilidade de sair vivo dali era muito pequena.

Uma grande escultura de águia tinha sido erguida sobre uma pilastra e reluzia embora não houvesse nenhuma fonte de luz ali. Quando Tom entrou e se ajoelhou, prostrado aos pés da águia com olhos de rubi, seus olhos vermelhos brilharam. Ele pedia sangue.

Tom puxou uma faquinha de prata de sua bota e fez um grande e profundo corte no braço, e abafando um gemido de dor, deixou o liquido escarlate escorrer até os pés da estátua. Logo uma poça de sangue tinha se formado aos seus pés, mas Tom não ligou. Alguma coisa tinha sido ligada dentro de si, unindo sua própria alma com a magia do local, fluindo em ondas de magia negra.

Vamos, acabe logo com isso...

Estava perdendo muito sangue, sabia que não podia sustentar aquela situação por muito tempo. Mas o deus estava com sede e exigia seu tributo antes de entrar em ação.

A águia bebia o sangue avidamente... E então despertou. Seus brilhantes olhos de rubi brilharam na escuridão e fizeram contato com os castanhos apavorados de Tom Riddle que definhava em torno de uma poça de seu próprio sangue. Em seguida, ele sentiu pela segunda vez que só podia estar morto.

Era uma dor absurda, inimaginável, superava em milhares de vezes qualquer cruciatus que tivesse jamais sentido. Seus berros de agonia foram abafados pelas paredes maciças da construção ao seu redor.

Nunca, jamais, ele tinha certeza, qualquer ser vivo já tinha sentido dor semelhante. Nem se tivesse sido cortado aos pedacinhos, picado vivo ou se ardesse numa fogueira de fogo eterno. Seus nervos estavam em chamas, cada célula de seu corpo clamava por perdão pelo pecado que tivesse sido cometido para que recebesse tal castigo. Era demais, demais, não podia suportar... E então Tom ouviu a voz maldita e abençoada, a voz mais doce e mais deliciosa...

“Quer mesmo continuar com isso?”
“Não, me deixe em paz...”
“Você não quer o alívio? Quer prosseguir com essa loucura?”
“Me deixe, me deixe sofrer...”


A dor se tornou mais intensa, se é que isso era possível. A voz zombava dele, zombava de seus gritos roucos e perturbados...

“Você sabe, pode fazer com que isso acabe se quiser...”
“Não... Eu preciso...”
“Vamos, Tom, você sabe o que fazer... Não pode agüentar mais tempo...”
“Eu não vou desistir... Falta tão pouco...”
“Não, Tom, falta muito. Você tem a eternidade toda para sofrer.”

Era verdade, ele tinha a eternidade para sofrer... Podia apenas... Quem sabe não fosse tão ruim? Nada podia ser pior que aquilo...

“Você é um dos mais persistentes. Mas vocês acabam desistindo, sempre, no final...”


Tom rolou no chão, escondendo o rosto no chão empoeirado, tentando pensar em alguma coisa, mas todo o seu cérebro estava ocupado processando os sinais nervosos de dor. Não podia morrer, não agora...

O tempo se arrastou, mas a dor não passava, nenhuma trégua sequer. Lá fora a lua foi substituída pela esfera brilhante do sol e tornou a surgir no horizonte mais três vezes antes que a voz se manifestasse novamente. Dessa vez havia mais do que a amarga zombaria.

“Você realmente está disposto a continuar nesse caminho, não está?”
“Estou.”
“Por que busca tanto algo que não pode ter?”
“Se não posso ter, então por que existe?”
“Há coisas com as quais simplesmente não devemos ter com.”
“Não tenho medo.”
“O que pretende quando alcançar o final dessa jornada?”
“Imortalidade e poder”
“Mas para que?”
“Para que as pessoas me respeitem pelo que sou.”
“Você é louco”
“Suponho que eu tenha ultrapassado a tênue linha entre a loucura e a razão.”
“Você acha que está acima do bem e do mal?”
“Eu quero ser superior a isso. Eu não quero o bem ou o mal, eu quero o poder.”
“E por que eu deveria permitir que você saísse daqui?”
“Por que eu não posso morrer enquanto estiver aqui, a menos que eu desista, e eu não vou desistir”


E nesse momento, seu corpo foi liberto das correntes de dor, e o alívio o invadiu de uma forma tão avassaladora que finalmente pôde descansar, e dormir pelo que lhe pareceram eras.

Três dias depois o corpo de Tom Riddle finalmente despertou do estado de quase coma em que se encontrava. Perturbado, o jovem homem se levantou lentamente e sentiu no corpo as marcas de quase uma semana seguida de tortura. Todos os seus ossos e músculos ainda doíam pelo sono no chão duro e seu estômago implorava por alimento.
Cambaleante, caminhou até a saída aberta e mancou para fora, onde aparatou de volta para a cidade.

[...]

Um brilhante número seis marcava a próxima e última fase do desafio que o levaria até a Cruz de Hórus. O problema é que ele estava marcado justamente no mesmo local onde a Cruz deveria ser achada. E Tom não podia imaginar o que o número que simbolizava o amor poderia ter a ver com o final. Ódio, Medo, Dor... e por fim, Amor. Haveria de ser algo pior do que aquela tortura terrível?

Assim mesmo, Tom foi atrás da última parte de sua caçada pela Cruz de Hórus.
Analisando os primeiros desafios, percebeu que o tempo todo foi desafiado a parar sua busca caindo em armadilhas criadas por si mesmo. Quantas vezes não tinha pensado em matar o espectro de Dumbledore, quando estava tomado pelo ódio? E sabia que se fizesse isso, estaria matando sua própria consciência, que era o que projetava a imagem do que mais odiaria. Se matasse sua consciência, morreria junto. E não tinha quase cedido à curiosidade, o que não lhe custara vencer o medo da morte? E o pior, aquela dor insana que o tomara, todo o seu corpo clamando por alívio...
Tom sorriu. Não tinha desistido. Prosseguiu até o final. E agora seria recompensado.

O próximo local indicado no mapa era mais uma pirâmide. Mas essa pirâmide era das grandes e estava inteira, erguendo-se muitos metros acima do solo. Era um monumento realmente imponente.

Aquela pirâmide era das abertas aos turistas, mas não era permitida a entrada de ninguém ali. O máximo que se podia fazer era escala-la e tirar meia dúzia de fotos da paisagem, como faziam os alegres trouxas ao redor, com suas máquinas fotográficas penduradas no pescoço.

Tom esperou o anoitecer, quando todos tinham ido embora. A maioria das pirâmides tinham sido saqueadas ou tiveram seus objetos expostos em museus, mas aquela, que era um pouco menor e despertava menos interesse, além de parecer ser especialmente protegida (dizia a lenda que quem entrasse ali teria um morte muito dolorosa), não atraia tanta gente. Quando se aproximou, percebeu que sua entrada partia do mesmo princípio que a anterior: teria de cavar para entrar.

Quando entrou, percebeu que realmente nenhum saqueador tinha ousado perturbar o seu segredo. Muitos sarcófagos estavam dispostos em um círculo na antecâmara, todos reluzentes de ouro e pedras preciosas. Um corredor ligava essa “sala de estar” a muitas outras salas e salões, cada um parecendo dedicar-se a um membro da família. Havia até mesmo uma salinha com um sarcófago só para o cachorro.

Mas o que buscava não estava ali, tampouco na sala maior dedicada aos sarcófagos de puro ouro maciço e diamantes do chefe da família e de sua esposa, repousados contra a parede, parecendo sorrir em sua busca desesperada. Tentou procurar alguma pista, mas não achou nada. Sentiu-se bobo.

Mas tinha chegado até ali, não tinha?

No momento em que voltava para a antecâmara, viu um minúsculo pontinho preto no círculo iluminado no chão exatamente à sua frente. Um pequeno escaravelho que tinha parado junto consigo. Curioso, abaixou-se e pegou o inseto para examina-lo mais atentamente. O bichinho se debateu, e então lhe deu uma ferroada, fazendo com que Tom o soltasse de volta ao chão. Mas o inseto não fugiu, continuou parado à sua frente com as anteninhas se mexendo, como se o encarasse. E então, quando Tom deu mais um passo à frente, passando por cima do escaravelho, o inseto colocou-se na sua frente. Parecia firmemente decidido a impedir seu caminho.

“Saia do meio, bichinho nojento.” – Falou, sorrindo.
Então estendeu o pé para esmagar o escaravelho. O inseto não se moveu, mas quando Tom pisou-o, uma barreira invisível fez com que seu pé parasse no ar, impedindo-o de matar o escaravelho.
“Ora...?
Então Tom virou-se, e o escaravelho foi junto, na sua frente, parecendo guiá-lo pelos corredores tortos. Ao passar pela última câmara com o casal de nobres que deveria ter construído aquilo, o escaravelho se arrastou por um minúsculo buraco na parede, onde nem um dedo seria capaz de entrar.
“Como quer que eu entre aí?” – Perguntou para o nada, em voz alta.

Nesse momento, respondendo à sua pergunta, uma passagem subterrânea se abriu, e uma escada se revelou oculta. A escada desceu em caracóis até muito fundo, e Tom trilhou os degraus ainda sendo conduzido pero escaravelho. Ao chegar no fundo, só viu uma pequena sala circular onde mal caberiam duas pessoas, e no centro, iluminado por dois archotes de Fogo Eterno azulado, um baú de madeira tosca. Uma águia tinha sido talhada na tampa e a fechadura de prata tinha o formato de um olho de hórus.

A Cruz de Hórus!

Emocionado, abriu o baú. O que encontrou foi...

Um livro?

Um livro velho, grosso, empoeirado e em frangalhos, escrito em pergaminho. Na capa esfarrapada, um símbolo brilhava. Uma caveira verde feita de esmeraldas incrustadas com uma cobra saindo da boca como uma língua brilhando fantasmagoricamente. O que mais o assustou naquilo tudo, porém, era a língua. Não estava em grego, egípcio, hieróglifos, latim ou qualquer língua arcaica ou moderna conhecida. Era uma confusão de símbolos obscuros que pareciam dançar e zombar de sua confusão. Nem mesmo um feitiço tradutor pôde resolver aquele enigma. E o pior de tudo: Todas as páginas marcadas no alto com um número seis bastante claro.

E então Tom lembrou-se do significado do número: O amor. Teria de sentir amor para compreender aquelas palavras.


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ÊÊEÊÊ!! The end! Finalmente esse capítulo gigantesco terminou hehehe…
Bom, o que posso dizer? Primeiro, eu disse não gostei nem desgostei desse capítulo. Ele foi divertido de escrever, sabe, eu não tinha exatamente muita coisa planejada em relação à busca pela Cruz de Hórus, eu fui escrevendo e as idéias foram surgindo... Eu sei que é estranho, mas quando eu sento para escrever as imagens vão surgindo na minha mente, a coisa vai sendo construída e talz... Muito louco haha...
Espero que tenha ficado claro a razão da busca da Cruz de Hórus ser norteada por esses sentimentos intensos. Pra quem não entendeu, eu explico: A pessoa vai trilhando os caminhos no mapa e tem que sentir intensamente e vencer as principais características humanas, os sentimentos “básicos” de uma pessoa. Resumindo, como fala a Voz, você tem primeiro que ser mortal e sentir isso intensamente antes de se tornar imortal, e a falta da varinha também é para a pessoa se sentir “impotente” (não nesse sentido, seus maldosos ), uma vez que conseguida a Cruz de Hórus, a pessoa terá muito poder nas mãos.
Ahh... A Voz. O que era aquela voz fdp que ficava tentando desencaminhar o Tom? Chamem do que quiser, pode ser a consciência dele, Deus, Hórus, ou só uma alucinação de uma mente desesperada. Vocês entenderam o princípio da coisa, né?
E por fim, será que o Tom vencerá o Grande Desafio que pra ele é sentir amor? O cara passou por coisas terríveis e o mais difícil pra ele é... amar. Foda, isso, né? Bom, vamos ver como ele vai lidar com isso.
E por último: Uma palavrinha sobre a importância e o significado daqueles números no mapa. Cada um deles tem um significado, sei lá se vem da cabala ou da numerologia, eu não me aprofundei muito no assunto. Para isso existe o Google ^^.
Mas não são números quaisquer, eu dei uma pesquisada, se alguém tiver saco pode ir lá conferir, eu perdi os links...
Mais uma vez obrigada pela paciência de monge que tiveram de ler isso e...
COMENTEM!!!
Os agradecimentos de sempre... Belinha, Miss Robsons e galera que comentou. Mesmo esquemão: 5 comments (ou + hehe) = 1 capítulo. Preciso de reconhecimento (ou de xingamentos), afinal eu passei 4 horas na frente do pc escrevendo isso. Obrigadinha ^^

Beijos,

Lillith Riddle.

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