O [meu] Avesso



Cap. 8 - O [meu] Avesso

Depois que o vi partir senti minha garganta travar, como se estivesse subindo algo. Não quero ficar mais aqui, para todo lugar que olho só encontro tristeza, será que é nisso que vou me resumir? Nesses olhos sem brilho ou cor, nessas vozes que falham e pessoas que choram?
Meu Deus, eu nem estou me agüentando em pé... Apesar disso, meus pés me levavam cada vez mais rápido pra algum lugar, não era o caminho do salão comunal. Mas não havia condições de dar meia volta, eu não estou muito consciente pra ser sincera...

Sempre chega a hora da solidão
Sempre chega a hora de arrumar o armário
Sempre chega a hora do poeta a plêiade
Sempre chega a hora em que o camelo tem sede


Me encontro agora a frente do banheiro feminino, o banheiro da murta... Minhas mãos abriram a porta e antes que me desse conta, havia me trancado na mais distante das portas. Fecho a tampa do vaso e me sento ali, olhando pra porta, mas, se quer saber a verdade, não a enxergo. Alguma coisa ainda me prende no salão principal. Aquele olhar de despedida... Será que não vou mais poder vê-lo? Será que as últimas palavras serão aquelas? Merlim, será?
Acho que nunca me senti tão sozinha quanto agora. E eu não consigo desprezar essa sensação, é uma certa calma, é silêncio... Fechando os olhos, só ouço a minha respiração rápida, sinto meus olhos queimarem, e meu rosto molhado, meu cabelo sobre ele, sinto a frieza das minhas mãos segurando meus braços e o balançar do meu corpo, pra frente e para trás, num ritmo lento, amedrontado.
É como se nas minhas lágrimas, presentemente, pudesse me sentir. Soubesse aonde realmente cheguei com toda minha perseverança, soubesse o que é Hermione Granger. Eu sou... apenas alguém que, como qualquer outro, sente medo. Sou sonhadora, sou exigente e até perfeccionista. Sou alguém que nesse momento está triste e sentindo uma dor que teme não sarar. Sou, eu sou alguém que quer voltar no tempo. Eu quero parar de chorar em silêncio, parar de tremer.

O tempo passa e engraxa a gastura do sapato
Na pressa a gente não nota que a Lua muda de formato
Pessoas passam por mim pra pegar o metrô
Confundo a vida ser um longa-metragem
O diretor segue seu destino de cortar as cenas
E o velho vai ficando fraco esvaziando os frascos
E já não vai mais ao cinema


Todos viam seu sorriso calmo. Mas será que só eu vi além?! Ele tinha ansiedade... quase pude tocar em seu temor. É apenas um rapaz, não sabe nada da vida. Não o deixe sucumbir... Não deixe. Eu tenho tanto pra falar, não deixa... não deixa ele ficar lá. Deixaria todo meu orgulho de lado, caindo por terra, mas o que quer que você seja, olha mais uma vez por ele... Deixo-o volta.

Abri a porta e me dirigi para a pia, e pressionei a torneira. Naquele momento a água bateu nas minhas mãos e minhas mãos foram levadas ao meu rosto – logo depois de eu ter jogado água no espelho -, repeti esse movimento três ou quatro vezes. E então me olhei no espelho. Eu era apenas uma forma distorcida, com cabelos cheios... O nariz vermelho, quase da cor de sangue, meus olhos... meio embaçados. Com um suspiro, mais uma quantidade de água no rosto. Só queria que passasse logo. Quando me olhei novamente senti mais vontade de chorar, não o fiz.
***

O tempo tornara-se um amigo. Fazia as noites passarem rápido, mesmo quando eu não conseguia dormir.
Hoje é um desses dias. Nesse momento é que sinto a falta de companheiras de quarto... O olhar caindo no relógio de pulso acusa que já é tarde ou que já é cedo demais. Duas e dezessete. As velas do meu quarto ainda acessas, me recuso a apagá-las, verdade, nada está me incomodando mais que o sereno e o escuro.
É no escuro que acontece tudo? É aqui, nesse momento que mais sinto sua falta, das conversas... Não tenho quase ninguém aqui. As únicas coisas que me consolam são os estudos as rondas e meus afazes.

Acho que posso suportar não falar com você. Pelo resto da minha vida
Foi isso que me fez desembestar. Experimentar a fúria, me ofendi com aquela frase.

-Mas você não perguntou pra mim – murmurei quase inaudível.

O que não consegui perceber é que, novamente, aquele rapaz estava querendo me proteger. Acho que no fundo não consigo admitir isso. Não sou frágil, não quebro em uma queda. Por que afinal não posso ficar ao seu lado? Lutar por ele?
As horas continuam a passar. O sol já entra pela janela e chega ao meu rosto, não adianta mesmo ficar deitada aqui.
***

E assim fora um mês. O mais rápido e doloroso que já tivera presenciado. Eram notícias a cada dia, de mortes, ferimentos graves, mutilações, invalides, insanidade... Mais pessoas iam para aquele campo de batalha, e mais pessoas não voltavam. Não davam notícias, e dias depois, recebiam uma... não haveria volta. O medo era a companhia direta das pessoas. As aulas foram suspensas duas semanas depois da ida daqueles alunos. Nós comíamos apreensão e se antes fingíamos alegria, agora a primeira coisa a fazer depois de acordar era ler o jornal, era rezar para receber uma coruja e saber que seus entes ainda estão ao menos vivos.

Tudo passa e eu ainda ando pensando em você
Tudo passa e eu ainda ando pensando em você
Penso quando você partiu assim sem olhar pra trás
Como um navio que vai ao longe e já nem se lembra do cais
Os carros na minha frente vão indo e eu nunca sei pra onde
Será que é lá que você se esconde?
Tudo passa e eu ainda ando pensando em você


Nesse momento estou no salão principal, é manhã. Olhando a refeição associaríamos a um dia festivo, a um banquete. Entretanto ninguém se importa em que está parecendo, comemos sem prestar atenção ao que vai goela abaixo... Ninguém mais desfaça o olhar pra cima, ou algo assim e as corujas vêm...
Dou um suspiro, meus olhos diferente dos das demais pessoas, presos na mesa.

-Mione – Gina chama baixinho.

-Oi?

-Acho que é pra você - então olho pra frente, um coruja me olha em repreensão com uma das patas estendidas. Depois que lhe tiro o peso, esta sai voando depressa.

-É do Rony – falei quando vi a caligrafia.

Início do mês. Em algum lugar com árvores.

Mione,

Sem sermões, por favor. Sei que eu prometi escrever, mas sei também que você vai me perdoar, não é? Desde já, grato.
Escrevi, como você também deve saber, para simplesmente dizer que estamos bem. Que está, bom, está tudo em ordem. Aqui ainda é noite e agora que tive uma folga (assim como Harry) pude lhe escrever. Ele até parece outra pessoa, Mione... O que importa é que está tudo certo.
Você pode dizer a mamãe, para não se preocupar? Fala pra Lilá que eu gosto demais dela. Pode fazer isso? Diga a Gina que sonhei com ela e que estou com saudade. Não é preciso dizer que estou com saudades suas não é? E não se preocupe, vou ficar de olho no nosso amigo.
Ei, sabe que quando chega a noite sinto a falta das nossas discussões? Quase posso ouvi-la me mandar fazer os exercícios escolares... Será que algum dia vou superar isso?

A gente se vê logo,
Ron Weasley

P.s.: tem uma coisa a mais pra você.


Peguei o envelope franzindo a testa. O abri outra vez e ali estavam. Então era isso.
Estreitei meus olhos para saber onde tiraram aquilo. Gina se aproximou para ver melhor.
Atrás havia camas, era como um alojamento. E então, mais a frente, estavam Rony, Dino, Simas, Neville e Harry. O último de braços cruzados, erguendo a sobrancelha, um tanto impaciente, estava com uma blusa de gola alta e uma calça jeans, Rony apontava a varinha pra ele com um sorriso pertinente. Simas e Neville sorriam olhando de lado para os outros dois e Dino estava mais preocupado com o cabelo com um pode na mão. Olhando para frente Dino deixou o pode cair, chamando atenção dos outros. Eles sorriram ainda mais e passaram a se empurrar para ficar mais na frente. Harry, sem participar da brincadeira, apenas acenou.
Em uma outra, Harry encontrava-se sentado em uma cama, - a cama estava de lado - lendo um livro. E Rony deitado nela, de bruços, de frente para o fotografo. Rony acenou e bateu no braço de Harry, apontando pra ‘fora’ (da foto). Este deu uma olhada, deu de ombros e voltou a ler.

Nos entreolhamos. Gina tinha um pequeno sorriso. Não me atrevia a sorrir, eu era alívio. Por enquanto. Esse meu desejo... De que adianta? Não quero que ninguém me veja chorar, mas nada me impede. Eu não consigo me conter, não consigo me recriminar, eu não quero. Pego a carta, o envelope e antes que Gina me faça perguntas saio daquele lugar.
***

Tudo passa e eu ainda ando pensando em você
A idade aponta na falha dos cabelos
Outro mês aponta na folha do calendário
As senhoras vão trocando o vestuário
As meninas viram a página do diário
O tempo faz tudo valer a pena
E nem o erro é desperdício


Mais um mês.
Rony me enviou três cartas. Nelas, ele falava sucintamente de Harry e de tudo que ocorria onde quer que estivessem. Mandava junto, também, uma carta para entregar a Lilá. Na última – há mais de duas semanas -, dissera que não enviaria mais cartas.

Na tarde nublada de hoje, encontramo-nos (Lilá, Gina, eu, Parvati e Lívia) no salão comunal, sem nada pra fazer. Estou no sofá, Gina, Lívia e Parvati estavam no tapete e Lilá agora está andando de um lado para o outro.

-Vocês acham que

-Não, Lil – Partavi falou séria. – acho melhor você vir pra cá, senta com a gente.

-Prefiro ficar de pé.

-Então faz o favor de parar de se mexer? Está me deixando tonta – Gina murmurou balançando a cabeça.

-É que eu não consigo ficar em silêncio!

-Melhor se acostumar então – Lívia retrucou olhando a lareira.

Entendo Lilá e sua inquietação. Quero dizer, esse tempo parece nos deixar mais mórbidas que o próprio dia. Como se não bastasse não recebemos nenhuma notícia.

-Por que não vai ler um pouco? – dessa vez não fui eu que sugeri.

Lilá balançou a cabeça. – Não vou conseguir me concentrar – ela se dirigiu pra janela. - Queria estar em aula... – falei baixinho.

-Ao menos nossas cabeças estariam ocupadas – Gina concordou.

Anelei, aquilo era indiscutível. E passamos o resto do tempo caladas, talvez uma hora, não sei.

-Eles chegaram! - Lilá gritou e logo saiu correndo. Sem pensar muito, eu me levantei de um salto e a segui, correndo.

Só paramos depois de estarmos fora. Muitos estavam lá, como em uma legião. Com olheiras mais o sorriso grande persistente. Ouvi Lilá dar mais um grito e correr novamente, depois de um segundo ou dois entendi porque. Nesse momento ela estava agarrada em Rony, beijando todas as parte que podia alcançar e sorria muito, muito feliz. Rony a segurava pela cintura, enquanto esta agarrou seu pescoço. Depois que finalmente se soltam é a vez de Gina abraça-lo, eu ainda continuo parada no mesmo lugar.
Rony olha a frente e nossos olhos se encontram, ele sorri e olha pra trás por um momento, depois se voltou pra mim e aponta com a cabeça. Segui seu movimento e encontrei o que a tempo queria ver, os olhos mais verdes que se pode ter notícia...

Tudo cresce e o início
Deixa de ser início
E vai chegando ao meio
Aí começo a pensar que nada tem fim


Falando francamente quando eu o vi, ali com um sorriso débil... Eu corri o mais rápido que pude até ele, não enxerguei nada. E então parei a sua frente, olhando-o. Ele estava sento assistido por Lupin e Tonks. Não sei quanto tempo fiquei ali, apenas conseguia encará-lo, com os olhos lagrimejantes de felicidade.

-Demoramos um pouco mais para voltar, esse rapaz teve que ter alguns cuidados especiais – Lupin falou por fim.

-Já disse que estou bem – ele disse. – Eu só –

E então eu o abracei, com força. – Dá próxima vez que brigarmos... Juro que te mato antes de você dar um passo pra bater a porta da sala – o ouvi sorrir contra mim.

-Não vai haver próxima vez, mocinha – ele falou me fitando. – Prometo – disse dessa vez secando minhas lágrimas.

Tudo que consegui foi abraça-lo novamente. – Senti tanto medo.

-Shii. Tudo passou, está bem? Tudo passou.

-Agora veja se o convence a dar uma passada na enfermaria, querida – Tonks me deu uma piscadela.

Olhei pra Harry sem entender, este apenas cruzou os braços, olhando pra cima como se Tonks não estivesse se referindo a ele. – Quero distância de enfermaria, Ok?! – ele retrucou quando encontrou meu ar indignado. Continuei o olhando, ele ergueu as mãos. – Passei mais de uma semana desacordado, não fiz nada além de descansar. Acha mesmo que preciso de repouso? - ergui a sobrancelha em resposta. Harry revirou os olhos. – Só uma olhada. Não vou passar a noite lá, não adianta. Quero comer algo decente – falou andando a minha frente com os braços atrás da cabeça.

-Harry você tem certeza que não precisa de ajuda? – Lupin perguntou preocupado erguendo um pouco a voz. Ele olhou pra trás com ar reprovador. –Tudo bem, sem mais paparicos.

-Queria ter ido ajudar – disse ao seu lado.

-Não, você não sabe como foi terrível.

-Porque foi terrível não significa que eu fosse fraquejar – nós entramos no castelo.

-Não quis dizer isso.

-Quando você disse que preferia nunca mais falar comigo, pude subentender isso - ele suspirou. – talvez eu não fosse apta o suficiente.

Ele se virou bruscamente pra me encarar. – Não é nada disso.

-Acho que eu nunca vou entender – continuei escarninha, onde estava aquela promessa de nunca mais brigar?

E então eu senti as mãos dele apertando meus braços. – Escuta! – ele quase gritou e agora eu estava encostada a uma parede, não pude deixar de me assustar. – Aquilo era um inferno. Pra todo lugar que se olhava só se encontrava desgraça! Não havia lugar seguro, nós nem dormíamos com medo de ataques – ele socou a parede próxima a minha cabeça. – Sabe quantas pessoas inocentes ficaram naquele lugar e não vão voltar?! Sabe quantos pais, filhos, amigos morreram naquela coisa? Sabe quantas pessoas vi morrer? Quantas morreram em meus braços?! E era de tudo isso que eu quis te livrar! Eu não queria que você visse, não queria que você sofresse mais – Harry ainda tinha olhar travado no meu, outra vez suas mãos apertavam meus braços. – E EU NÃO TE ACHO FRACA – quis me encolher enquanto sentia sua força aliviar sobre mim. - Não acho que seja fraca – continuou olhou para o chão. - É que... Não conseguiria ver mais um amigo se ariscar, ter a chance de perder você – balançou a cabeça. – Não agüentaria, não sou tão forte quanto vocês pensam... Isso é tudo.

O deixei ir. Preferi não falar, nem sabia o que dizer...
*********
(continua)
**********
Oi!
Um cap. bastante idiota.
A Música é da Ana Carolina - O Avesso dos Ponteiros (a acho uma graça^^)
Yasmin com essa história de song...

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