Capítulo 03: A Guarda Avançada



Capítulo 03: A Guarda Avançada


Tonks sorriu para Remo.


- Parece que vamos mesmo aparecer.


- E não só nós – sussurrou Remo, indicando discretamente Kingsley, que estava sentado entre Fudge e Umbridge.


O ministro estava completamente aturdido. Não conseguia compreender nada daquilo. Aquele livro descrevia coisas simplesmente absurdas: dementadores em Little Whinging, gente de Dumbledore vigiando Harry Potter, e não paravam de citar Aquele-que-Não-Deve-Ser-Nomeado... não poderia ser...


- Dolores – sussurrou ele – de onde vieram esses livros?


Umbridge estava igualmente tensa.


- Eles simplesmente apareceram na minha sala, com uma mensagem dizendo que deviam ser lidos para a escola, e que revelaria a verdade sobre Dumbledore e Potter. E explicou as regras do Ato Contratual Mágico. Mas, começo a pensar que se trata de um truque.


- Mas... as coisas que ouvimos... dementadores, Sirius Black, Mundungo Fletcher...


- Querem nos fazer acreditar numa versão fantasiosa dos fatos... – afirmou Umbridge, vacilante.


- Hem-Hem – fez Tonks – se já terminaram, eu gostaria de começar.


Fudge acenou com impaciência, e Tonks começou: 


Acabei de ser atacado por dementadores e poderei ser expulso de Hogwarts. Quero saber o que está acontecendo e quando vou sair daqui.


Harry copiou essas palavras em três folhas de pergaminho separadas, no instante em que chegou à escrivaninha de seu quarto às escuras. Endereçou a primeira a Sirius, a segunda a Rony e a terceira a Hermione.


Os amigos se entreolharam, tensos.


- Você estava realmente ansioso para ser respondido, não é? – murmurou Hermione.


- Achei que, depois dos dementadores, me falariam alguma coisa.


- Queríamos escrever – disse Rony – mas Dumbledore... eu queria saber por que ele nos proibiu de escrever para você.


- Eu também.


Sua coruja, Edwiges, estava fora caçando; a gaiola sobre a escrivaninha estava vazia. O garoto ficou andando para lá e para cá esperando a ave voltar, a cabeça latejando, o cérebro acelerado demais para adormecer, mesmo que seus olhos ardessem e coçassem de cansaço. Suas costas doíam do esforço de carregar Duda para casa, e os dois galos em sua cabeça, onde a janela e o primo haviam batido, estavam latejando com muita intensidade.


Harry acompanhou aquela narração, abismado, sua cabeça latejando. Como alguém poderia saber todos aqueles detalhes, se naquele momento, ele estava supostamente sozinho, trancado no quarto? Como era possível alguém ter criado um livro descrevendo isso... como se ele mesmo tivesse narrado ao escritor.


Ele andava para frente e para trás, roído de raiva e frustração, rilhando os dentes e fechando os punhos, lançando olhares furiosos para o céu vazio, exceto pelas estrelas, todas as vezes que passava pela janela. Os dementadores enviados para apanhá-lo, a Sra. Figg e Mundungo Fletcher seguindo-o em segredo, depois a suspensão de Hogwarts e a audiência do Ministério da Magia – e ainda assim ninguém lhe contava o que estava acontecendo.


E o quê, o que queria dizer aquele berrador? Que voz horrível era aquela que ecoou, de forma tão ameaçadora, pela cozinha?


Mais uma dúvida que pairava na cabeça sobrecarregada de Harry: o berrador que gritara “lembre-se da última”.


- Da última o quê?


- Da última vez que Você-Sabe-Quem atacou? – sugeriu Hermione.


- Da última vez que eles tentaram expulsar você? – sugeriu Rony.


- Eles nunca tinham tentado me expulsar antes.


- Talvez porque Dumbledore não tenha deixado...


Então, Hermione arregalou os olhos, como se tivesse tido uma epifania.


- Hermione, o que... – começou Rony, mas Tonks já voltara a ler:


Por que ele continuava preso ali sem informações? Por que todos o estavam tratando como uma criança malcomportada? Não faça mais mágicas, não saia de casa...


Deu um pontapé no malão da escola ao passar, mas, ao invés de aliviar a raiva, ele ficou pior, pois agora sentia uma dor aguda no dedão, para somar às outras no resto do corpo.


Ao passar mancando pela janela, Edwiges entrou farfalhando suavemente as asas, como um fantasminha.


— Já não era sem tempo! — rosnou Harry, quando a ave pousou com leveza em cima da gaiola. — Pode largar isso aí, tenho trabalho para você!


Os grandes olhos redondos e âmbar da coruja o miraram, com uma expressão de censura, por cima do sapo morto que trazia ao bico.


— Vem cá — disse-lhe o dono, apanhando os três rolinhos de pergaminho e uma correia de couro para amarrá-los à perna escamosa da ave. — Leve estas mensagens diretamente a Sirius, Rony e Hermione e não volte aqui sem respostas longas e completas. Se for preciso, não pare de dar bicadas neles até escreverem respostas de tamanho decente. Entendeu?


- Ah, ela entendeu – resmungou Rony, examinando o que restara dos cortes que Edwiges lhe fizera na mão.


Edwiges soltou um pio abafado, seu bico ainda cheio de sapo.


— Então vai andando — falou Harry.


Ela partiu imediatamente. No momento em que se foi, Harry se atirou na cama sem se despir e ficou olhando para o teto. Além de todos os outros sentimentos infelizes, ele agora sentia remorso por ter sido tão rabugento com Edwiges; era a única amiga que tinha no número quatro da Rua dos Alfeneiros. Mas ele a compensaria quando voltasse com respostas de Sirius, Rony e Hermione. 


Hermione suspirou, pesarosa.


Harry se sentia aborrecido. Não estava gostando de ter aquela noite narrada para a escola, e sentia uma raiva irrefreável de Dumbledore.


Seus amigos com certeza iriam responder depressa; não podiam ignorar um ataque de dementadores. Ele provavelmente acordaria no dia seguinte e encontraria três grossas cartas recheadas de solidariedade e planos para sua imediata remoção para A Toca. E com essa ideia reconfortante, o sono o venceu, sufocando outros pensamentos.


Harry voltou a indagar como poderiam estar ali todos os seus pensamentos. E, pelo visto, os amigos compartilhavam a mesma dúvida.


Mas Edwiges não regressou na manhã seguinte. Harry passou o dia no quarto, saindo apenas para ir ao banheiro. Três vezes naquele dia, tia Petúnia empurrou comida para dentro do quarto pela aba que tio Válter instalara três verões passados. Todas as vezes que Harry a ouvia se aproximar, tentava interrogá-la sobre o berrador, mas teria sido melhor interrogar a maçaneta, porque não obtinha resposta alguma. Afora isso, os Dursley se mantiveram bem longe do seu quarto. Harry não via sentido em impor a eles sua companhia; mais uma briga não resolveria nada, exceto, talvez, deixá-lo tão aborrecido que acabaria apelando para a magia proibida.


As coisas continuaram nesse ritmo durante três dias inteiros. Harry sentia-se invadido por uma energia excessiva que o impedia de se concentrar em qualquer coisa, momentos em que caminhava pelo quarto furioso com todo o mundo, por deixarem-no remoendo seus problemas sozinho; essa energia se alternava com uma letargia tão absoluta que era capaz de ficar deitado na cama uma hora inteira, olhando atordoado para o teto, sofrendo só de pensar, apavorado, na audiência no Ministério.


E se o condenassem? E se ele fosse expulso e sua varinha partida ao meio? Que iria fazer, aonde iria? Não poderia voltar a viver o tempo todo com os Dursley, não agora que conhecia o outro mundo, aquele ao qual pertencia. Será que poderia ir morar com Sirius, como o padrinho oferecera havia um ano, antes de ser forçado a fugir do Ministério? 


- O padrinho... – murmurou Fudge – Sirius Black! Como... que história é essa de Sirius Black convidar Potter para morar com ele? Esse livro não faz sentido.


- É o que estou dizendo, Ministro – disse Umbridge, vacilante – Devíamos desconsiderar tudo o que esse livro nos disser.


Será que dariam permissão a Harry para morar sozinho, sendo ainda menor de idade? Ou será que decidiriam por ele o local aonde ir? Será que sua infração do Estatuto Internacional de Sigilo fora suficientemente grave para mandá-lo a uma cela em Azkaban? Sempre que tal pensamento lhe ocorria, Harry invariavelmente se levantava da cama e recomeçava a caminhar.


- Quem pensaria que usar magia fora da escola mandaria alguém para Azkaban? – desdenhou Daphne Greengrass.


Harry não respondeu à provocação; continuava imaginando como aquele livro poderia descrever tudo aquilo.


Olhou para Rony, que parecia tão confuso quanto ele. Hermione parecia estar formulando uma teoria.


Os alunos murmuravam especulações, paralelo à leitura.


Os professores escutavam em silêncio, igualmente curiosos. Ao centro, Dumbledore também tentava formular uma teoria sobre a origem daqueles livros. Várias ideias lhe passavam na cabeça, uma mais improvável que a outra.


A mais provável era a que tornava a situação mais complexa.


Como é misterioso o tempo


Na quarta noite depois da partida de Edwiges, o garoto estava deitado em uma de suas fases de apatia, mirando o teto, a mente exausta e vazia, quando seu tio entrou no quarto. Harry virou lentamente a cabeça e olhou para ele.


Válter estava usando seu melhor terno e tinha uma expressão de enorme presunção.


- Já vi essa cara milhares de vezes – murmurou Harry, entediado.


— Vamos sair — anunciou.


— Como disse?


— Nós, isto é, sua tia, Duda e eu, vamos sair.


— Ótimo — respondeu Harry inexpressivamente, voltando a mirar o teto.


— Você não deverá sair do seu quarto enquanto estivermos fora.


— O.K.


— Você não deverá ligar a televisão, nem o som, nem nada que nos pertence.


— Certo.


— Você não deverá roubar comida da geladeira.


— O.k.


— Vou trancar sua porta.


— Pode trancar.


Seu tio não é muito esperto, não é? – disse Rony – Quer dizer, depois de todas as vezes que ele tentou trancar você, já devia saber que você sempre consegue escapar.


- Talvez ele pensasse que eu não poderia usar magia dessa vez – murmurou Harry, entediado. Aqueles capítulos na residência dos Dursley já estavam começando a ficar enfadonhos.  


Tio Válter encarou Harry, abertamente desconfiado dessa falta de oposição, em seguida saiu pisando forte e fechou a porta ao passar. Harry ouviu a chave girar na fechadura e os passos do tio descerem pesadamente a escada. Alguns minutos depois, ouviu as portas do carro baterem, o ruído de um motor e o som inconfundível de um carro deixando rapidamente a entrada da garagem.


Harry ficou indiferente à saída dos Dursley. Tanto fazia os tios estarem ou não em casa. Não conseguia sequer dirigir suas energias para se levantar e acender a luz. O quarto ia escurecendo depressa, mas ele continuava deitado, apurando os ouvidos para escutar os ruídos da noite pela janela que mantinha o tempo todo aberta, esperando o momento abençoado em que Edwiges voltaria.


- Depois de tantos dias, você ainda esperava por uma resposta – murmurou Hermione, pesarosa.


Harry assentiu. Estivera ansioso por respostas e pensava que, em algum momento do verão, teria que recebê-las.


A casa vazia rangia por inteiro. Os canos de água gargarejavam.


Harry permaneceu nessa espécie de estupor, sem pensar em nada, imerso em infelicidade.


Então, com toda a clareza, ele ouviu um estrondo lá embaixo, na cozinha. Sentou-se imediatamente, escutando com atenção. Os Dursley não poderiam ter voltado, era cedo demais, e, de todo o jeito, ele não ouvira barulho de carro. Fez-se silêncio por alguns segundos, em seguida vozes.


- Será que é o pessoal do Ministério?  - indagou uma das colegas de Astoria Greengrass.


- O título do capítulo é A Guarda Avançada – ponderou Astoria.


- Mas para que uma guarda? – indagou outra amiga de Astoria.


- Para o santo Potter – resmungou uma voz arrastada e mal-humorada atrás delas.


Draco voltara da Ala Hospitalar, a boca parara de arder, embora ele tomasse um grande gole de suco de abóbora, antes de se sentar entre Crabbe e Goyle, próximo a Astoria e suas amigas. Rony o observou rindo.


- Eu seria capaz de dar um abraço em quem azarou o Malfoy.


- Mesmo que fosse alguém da Sonserina? – indagou Hermione, ainda olhando os alunos à volta de Draco.


- O quê? – Rony se virou para Hermione.


- Eu percebi que, onde o Malfoy está sentado, qualquer um de outra mesa que tentasse azará-lo seria visto; então, só pode ter sido alguém da mesa da Sonserina.


- Mas por que alguém da Sonserina faria isso com ele? – indagou Rony, incrédulo.


- Talvez nem todos eles concordem com o que Malfoy e os amigos deles dizem – ponderou Hermione. 


Ladrões, pensou, deslizando para fora da cama e ficando em pé – mas, uma fração de segundo depois, lhe ocorreu que ladrões falariam em voz baixa, e quem estava andando pela cozinha certamente não estava preocupado com isso.


- Então, devem ser bruxos – sussurrou Antônio Goldstein, monitor da Corvinal.


- Será que são do Ministério? – indagou Miguel Corner.


- Mas o Ministério não precisaria montar uma guarda avançada para levar o Harry Potter – disse Padma Patil, ao lado de Miguel – Era só usar uma Chave de Portal, ou conectar a lareira deles à Rede de Flu.


- É mesmo – concordou Miguel – Então, a tal guarda avançada não é do Ministério.  


Ele apanhou a varinha sobre a mesa de cabeceira e ficou de frente para a porta do quarto, escutando com a máxima atenção. No momento seguinte, Harry se sobressaltou ao ouvir um forte estalo e ver sua porta se escancarar.


Harry notou os alunos apreensivos, como se estivessem acompanhando uma história de suspense, ansiosos pelo que aconteceria em seguida.


De fato, pensou consigo, aquilo era como acompanhar uma história muito envolvente, ainda que fosse muito estranho, por ser a sua história.


 O garoto ficou parado, imóvel, olhando através da porta aberta para o patamar escuro, fazendo força para ouvir, mas não houve nenhum outro som.


Ele hesitou um instante, depois saiu rápida e silenciosamente do quarto e foi até a escada.


Seu coração parecia ter disparado para a garganta. Havia gente parada no hall escuro embaixo, cujas silhuetas a luz da rua recortava ao entrar pelo vidro da porta; oito ou nove pessoas, todas, até onde Harry conseguia ver, olhando para cima.


- Quem será? – Harry ouviu os colegas indagarem.


- Será que é o pessoal do Ministério?


- Será que são os amigos do Potter?


- E a tal Ordem da Fênix? Será que são eles?


— Baixe a varinha, garoto, antes que você arranque os olhos de alguém — disse uma voz baixa e rouca.


O coração de Harry bateu descontrolado. Reconhecia aquela voz, mas não baixou a varinha.


— Professor Moody? — perguntou hesitante.


Olho-Tonto Moody viu, pelo olho mágico, todos de toda direção o encararem.


- Você! – exclamou Fudge – também está metido nisso.


- Estou – resmungou ele, sem dar mais explicações, quando Tonks voltou a ler:


— Não sei bem quanto a “Professor” — rosnou a voz — nunca cheguei a ensinar muito tempo, não é mesmo? Vem até aqui, queremos ver você direito.


Harry baixou ligeiramente a varinha, mas não afrouxou a mão, nem se mexeu.


- Esperto – rosnou Olho-Tonto, sorrindo. Dolores Umbridge Fez uma careta para o rosto cheio de cicatrizes do ex-auror. Ele, certamente estava envolvido com Dumbledore. 


Tinha muito boas razões para desconfiar. Recentemente passara nove meses em companhia de alguém que achava que era Olho-Tonto Moody e acabou descobrindo que não era ele, mas um impostor, que ainda por cima tentara matá-lo antes de ser desmascarado.


- Você lembra?


- Era um prisioneiro fugitivo, como o Sirius Black.


- Um Comensal da Morte.


- Que aconteceu com ele?


Fudge olhou de um lado para o outro, apreensivo. Não, aquilo não poderia ser verdade. Crouch Jr era apenas um louco, que escapara do cárcere do pai por acaso, e decidira agir por conta própria. Mas ele dissera com clareza que seu mestre o libertara, e citara Pedro Pettigrew...


Não, não poderia ser verdade.


Mas, antes que pudesse decidir o que fazer, uma segunda voz, ligeiramente rouca, flutuou até o alto da escada.


— Tudo bem, Harry. Viemos buscar você.


O coração do garoto deu um salto. Reconheceu aquela voz também, embora não a ouvisse havia mais de um ano.


— Professor Lupin? — exclamou incrédulo. — É o senhor?


O coração de Umbridge também deu um salto também, mas de desprezo. Então, aquele lobisomem esfarrapado também estava ao lado de Dumbledore. O mesmo que fora professor, antes de Moody. Dois ex-professores de Defesa Contra As Artes das Trevas. O que Dumbledore estaria tramando?


Remo não deu atenção a Umbridge; conversava com Tonks.


- Parece que Harry ainda me vê apenas como ex-professor.                                 


- Bem, é o que você é, não é? – disse a bruxa.


- Sim, mas para ele, deveria ser mais do que isso. Conheci e ajudei Harry, fui amigo dos pais dele, assim como Almofadinhas. E ele e Almofadinhas têm um vínculo forte.


- E você gostaria de criar um vínculo com ele, também? – adivinhou Tonks.


Remo assentiu, antes que Tonks continuasse:


— Por que estamos todos parados no escuro? — disse uma terceira voz completamente desconhecida, de uma mulher. — Lumus.


- Ah, vou aparecer! – exclamou Tonks.


A ponta de uma varinha acendeu, iluminando o hall com luz mágica. Harry piscou. As pessoas embaixo estavam amontoadas ao pé da escada, olhando-o com atenção, algumas até esticando o pescoço para vê-lo melhor.


Remo Lupin era quem estava mais próximo de Harry. Embora ainda jovem, Lupin parecia cansado e bem doente; tinha mais cabelos brancos do que quando o garoto se despedira dele, e suas vestes estavam mais remendadas e gastas que nunca. Ainda assim, ele olhava para Harry com um grande sorriso, que o garoto tentou retribuir apesar do seu estado de choque.


Tonks parou de ler, e encarou Umbridge. Sabia que era culpa dela que o amigo não conseguisse mais emprego; a professora apenas retribuiu o olhar com desprezo.


 — Ahhh, ele é igualzinho ao que eu imaginei — disse a bruxa que segurava no alto a varinha acesa. Parecia a mais jovem do grupo; tinha um rosto pálido em feitio de coração, olhos escuros e cintilantes e cabelos curtos e espetados, roxo berrante. — E aí, beleza, Harry?


— É, vejo o que quis dizer, Remo — disse um bruxo negro e careca parado no círculo mais externo do grupo; tinha uma voz grave e lenta e usava um único brinco de ouro na orelha — ele é a cara do James.


Fudge parecia mais desconcertado do que nunca. O que aquela gente estava fazendo na casa de Harry Potter? E por alguma razão, aquele último bruxo lhe parecia familiar.


Kingsley Shacklebolt permaneceu estático, mas uma ruga de preocupação surgiu em sua testa.


— Exceto pelos olhos — disse a voz asmática de um bruxo de cabelos prateados mais ao fundo. — São os olhos de Lily.


Olho-Tonto Moody, que possuía longos cabelos grisalhos e um nariz a que faltava um pedaço, observava Harry, desconfiado, apertando os olhos díspares. Um era muito pequeno, escuro e arisco, o outro, grande, redondo, azul elétrico – o olho mágico que podia ver através de paredes, portas e da nuca do próprio Moody. 


O Moody real olhava para Dumbledore, confuso.


- Que ideia é essa, Dumbledore? – sussurrou – Está revelando toda a operação.


- É parte da leitura, pelo visto – explicou Dumbledore, calmamente – Já esperava que acontecesse. 


— Você tem certeza que é ele, Lupin? Seria uma grossa mancada se levássemos um Comensal da Morte fazendo-se passar por Harry. Devíamos perguntar a ele alguma coisa que só o verdadeiro Potter saiba. A não ser que alguém tenha trazido um pouco de soro da verdade.


— Harry, que forma assume o seu Patrono? — perguntou Lupin.


— De veado — respondeu Harry, nervoso.


— É ele mesmo, Olho-Tonto — confirmou Lupin.


- Ninguém sabia disso até agora? – disse Rony, surpreso.


- Não contei para ninguém.


Muito consciente de que todos continuavam de olhos fixos nele, Harry desceu as escadas, guardando a varinha no bolso traseiro das jeans enquanto descia.


— Não guarde a varinha aí, garoto! — berrou Moody. — E se pegar fogo? Bruxos mais sabidos que você já perderam as nádegas, sabe! 


Harry riu, mas foi um dos poucos. A maioria pareciam enojados com a ideia de alguém perder a nádega em um acidente com a varinha.


- Alastor, nunca ouvi falar de um bruxo que tenha sofrido um acidente desses – riu-se Dumbledore.


- Medidas de segurança elementares no uso da varinha – resmungou Olho-Tonto – Ninguém mais se importa, um dia pode acontecer. 


— Quem é que você ouviu dizer que perdeu a nádega? — perguntou interessada a bruxa de cabelos roxos.


— Não se preocupe com isso, e você guarde a varinha longe do bolso traseiro! — vociferou Olho-Tonto. — Medidas de segurança elementares para o uso da varinha, ninguém se preocupa mais com elas. — E saiu mancando para a cozinha. — E estou vendo você — disse, irritado, quando a mulher girou os olhos para o teto.


Harry e os alunos riram, porque Tonks passara a imitar a voz de Olho-Tonto quando lia suas falas.


Lupin estendeu a mão e apertou a de Harry.


— Como é que você tem andado? — perguntou, examinando Harry atentamente.


— Ó-ótimo...


- Você não estava exatamente ótimo – disse Rony.


- Acha que eu ia reclamar agora que eles iriam me buscar? – resmungou Harry.


Harry mal podia acreditar que aquilo estivesse mesmo acontecendo. Quatro semanas sem nada, nem o menor indício de um plano para removê-lo da Rua dos Alfeneiros e, de repente, um bando de bruxos inesperados em sua casa como se isso já estivesse combinado há séculos. O garoto correu os olhos pelas pessoas que rodeavam Lupin; todos continuavam a observá-lo com avidez.


Sentia-se muito consciente de que não penteava os cabelos havia quatro dias.


- Não faz a menor diferença – brincou Gina – O seu cabelo é impossível de pentear – e passou a mão pelos cabelos do garoto, que sentiu um arrepio.


— Eu... vocês estão realmente com sorte que os Dursley tenham saído... — murmurou.


— Sorte nada! — disse a mulher de cabelos roxos. — Fui eu que os tirei do caminho. Mandei uma carta pelo correio dos trouxas dizendo que estavam entre os finalistas do Concurso do Gramado Mais Bem Cuidado da Grã-Bretanha. Eles estão a caminho da festa de entrega do prêmio neste momento... ou pensam que estão.


Harry e os amigos entreolharam-se, e então, caíram na risada.


- Mas como é possível que tenham acreditado? – indagou Hermione – Quer dizer, estavam no meio de uma seca.


- Eles são vaidosos o bastante para acreditar nisso – disse Harry, olhando com gratidão para Tonks. 


Harry teve uma visão passageira da cara do tio Valter quando descobrisse que não havia concurso algum.


— Vamos embora, não vamos? — perguntou ele. — Logo?


— Quase imediatamente — disse Lupin — vamos só aguardar o sinal verde.


— Aonde vamos? Para A Toca? — perguntou Harry, esperançoso.


— Não, não para A Toca — respondeu Lupin, conduzindo Harry para a cozinha; o grupinho de bruxos os acompanhou, ainda examinando o garoto, cheios de curiosidade. — Arriscado demais. Montamos o quartel-general em um lugar difícil de encontrar. Levou algum tempo...


- Que história é essa de quartel-general? – vociferou Fudge, tenso.


Mas Dumbledore apenas acenou para que Tonks continuasse.


Olho-Tonto Moody agora estava sentado à mesa da cozinha, tomando goles de um frasco de bolso, seu olho mágico girava em todas as direções, apreciando os muitos aparelhos que os Dursley usavam para poupar trabalho.


- Bem curiosas, as coisas que eles usam – comentou Arthur Weasley, ao lado da mulher – Já estive lá, uma vez – explicou descontraído a Fudge e Umbridge, que o ignoraram.


Ao lado deles, Percy tentava não olhar para a família. 


— Este é o Alastor Moody, Harry — continuou Lupin, apontando para o bruxo.


— É, eu sei — respondeu Harry pouco à vontade. Dava uma sensação esquisita ser apresentado a alguém que ele achava que conhecia havia um ano.


— E essa é Ninfadora...


— Não me chame de Ninfadora — pediu a jovem bruxa com um arrepio — sou Tonks.


— Ninfadora Tonks, que prefere ser conhecida apenas pelo sobrenome — concluiu Lupin.


- Se você tivesse um nome como o meu, também ia querer ser chamado de Lupin – resmungou Tonks.


- Bem – disse Remo – Pelo visto, eu sou conhecido pelo sobrenome no livro.


Tonks examinou e releu o livro, confirmando o que Remo apontara.


- Talvez seja porque o livro é do ponto de vista do Harry – disse Tonks – Quer dizer, ele conheceu você como o professor dele.


— Você também iria preferir se a tonta da sua mãe tivesse lhe dado o nome de Ninfadora — murmurou Tonks.


— E esse é Kingsley Shacklebolt — disse ele indicando o bruxo negro e alto, que fez uma reverência. — Elifas Doge. — O bruxo de voz asmática fez um aceno com a cabeça. — Dédalo Diggle...


- O quê?! – berrou Fudge, sem se importar que todos o olhassem; estava concentrado em Kingsley, ao lado dele e de Umbridge.


“Você?! Mas o que você... não, não pode ser... DUMBLEDORE!”


Fudge se virou para o diretor.


- Você está fazendo isso, não é? É um truque para me fazer desconfiar de um dos aurores mais confiáveis do Ministério... É claro! Você planejou tudo isso. Pois eu não acredito. NÃO ACREDITO!


Mas, depois de perceber que todos o observavam, Fudge se recompôs lentamente, enquanto Kingsley discretamente aliviou-se.


Tonks discretamente retomou a leitura:


— Já nos encontramos antes — esganiçou-se o excitável Diggle, deixando cair a cartola roxa. — Emmeline Vance. — Uma bruxa de ar imponente acenou a cabeça coberta por um xale verde-água. — Estúrgio Podmore. — Um bruxo de queixo quadrado e chapéu cor de palha deu uma piscadela. — E Héstia Jones. — Perto da torradeira, uma bruxa, de faces coradas e cabelos negros, deu um adeusinho.


Podmore, pensou Fudge. Este também trabalha no ministério, será que...


- Não – sussurrou Fudge – não pode ser verdade.


 Harry cumprimentou com um aceno de cabeça cada bruxo, à medida que foram apresentados. Desejou que olhassem para outra coisa ou pessoa que não fosse ele; era como se repentinamente o tivessem feito subir a um palco.


Ficou imaginando também por que havia tantos bruxos presentes.


— Um número surpreendente de pessoas se apresentaram como voluntárias para vir buscá-lo — disse Lupin, como se tivesse lido os pensamentos de Harry; os cantos de sua boca mexeram ligeiramente.


- Claro – sussurrou Draco Malfoy para os amigos – Tudo pelo santo Potter.


- Que será que vão fazer com ele? – perguntou Goyle, confuso.


- Vão levar ele para esse esconderijo – disse Draco, pensativo – Aposto que é o quartel-general de alguma organização contra o Lorde das Trevas.


Então, logo vamos saber a localização desse lugar. 


— Ah, foi, quanto mais melhor — disse Moody sombriamente. — Somos a sua guarda, Potter.


— Estamos só esperando o sinal de que podemos partir sem perigo — disse Lupin, espiando pela janela da cozinha. — Temos uns quinze minutos.


— Muito limpos, não são, esses trouxas? — comentou a bruxa chamada Tonks, que corria os olhos pela cozinha com grande interesse. — Meu pai é nascido-trouxa e é um velho porcalhão. Suponho que isto varie como acontece entre os bruxos?


- Quase todos os bruxos acham que trouxas são todos parecidos – murmurou Hermione, rindo.


— Hum... é — respondeu Harry. — Escute... — começou virando-se para Lupin — que é que está acontecendo, não recebi uma palavra de ninguém, o que o Vol...?


Vários bruxos soltaram estranhos assobios; Dédalo Diggle deixou cair a cartola outra vez e Moody vociferou:


— Cale-se.


— Quê! — exclamou Harry.


— Não vamos falar nada aqui, é arriscado demais — disse Moody virando o olho normal para o garoto. Seu olho mágico continuava focalizando o teto.


— Pombas — acrescentou zangado, levando uma das mãos ao olho mágico. — Não para de prender desde que aquele desgraçado o usou.


- Eh – anunciou Tonks, sorrindo – Aviso que a próxima cena pode ser meio nojenta.


E com um ruído grosseiro de arroto, bem parecido com o que se ouve quando se puxa um desentupidor de pia, ele tirou o olho.


- Aaaghh!


Harry riu das pessoas enojadas à volta. Lilá Brown tinha uma careta de nojo, e as meninas do primeiro ano pareciam mareadas.


­— Olho-Tonto, você sabe que isso é nojento, não sabe? — falou Tonks em tom de conversa.


- Muito – exclamou uma menina do segundo ano.


— Me arranje um copo d‘água, por favor, Harry — pediu Moody.


O garoto foi até a lavadora de louça, apanhou um copo limpo e encheu-o de água da torneira, ainda seguido pelos olhares dos bruxos. Essa incansável observação estava começando a irritá-lo.


- Acho que as pessoas veem você como a esperança de vencer Você-Sabe-Quem – explicou Hermione.


Mas Harry franziu a testa. Continuava não gostando de ser observado o tempo todo.


— Saúde — saudou Moody, quando Harry lhe entregou o copo. O bruxo pôs dentro o olho mágico e empurrou-o com o dedo para cima e para baixo; o olho girou em volta do copo, encarando os bruxos, um a um. — Quero ter uma visibilidade de trezentos e sessenta graus na viagem de volta.


— Como vamos chegar... a esse lugar a que a gente está indo? — perguntou Harry.


— Vassouras — disse Lupin. — É o único jeito. Você é jovem demais para aparatar, eles devem estar vigiando a rede de Flu e vai nos custar mais do que a nossa vida montar uma chave de portal sem autorização.


— Remo contou que você é um bom piloto — disse Kingsley Shacklebolt com sua voz ressonante.


— É excelente — confirmou Lupin, consultando o relógio. — Em todo o caso, é melhor você ir fazer a mala, Harry, queremos estar prontos para partir quando recebermos o sinal.


— Vou ajudá-lo — ofereceu-se Tonks, animada.


Ela acompanhou Harry de volta ao hall e subiu a escada, olhando para tudo com muita curiosidade e interesse.


— Que lugar engraçado — comentou. — É um pouco limpo demais, entende o que quero dizer? Um pouco estranho. Ah, agora está melhor — acrescentou quando entraram no quarto de Harry e acenderam a luz.


O quarto do garoto era certamente muito mais desarrumado que o resto da casa. Confinado nele havia quatro dias, de muito mau humor, Harry não se dera o trabalho de arrumá-lo. A maioria dos livros que possuía estava espalhada pelo chão, onde ele tentara se distrair com cada um deles e os jogara para o lado; a gaiola de Edwiges precisava ser limpa, e estava começando a feder; e seu malão estava aberto, deixando à mostra uma mistura confusa de roupas de trouxa e vestes de bruxo que haviam transbordado por todo o chão à volta.


- Eu não tive muita motivação para arrumar o quarto – falou Harry, mal-humorado.


Harry começou a recolher os livros e a atirá-los apressadamente no malão.


Tonks parou diante do armário para olhar criticamente a própria imagem no espelho do lado interno da porta.


— Sabe, acho que roxo não é bem a minha cor — comentou, pensativa, puxando uma mecha dos cabelos espetados. — Você não acha que me dá um ar meio doentio?


— Hum — começou Harry, espiando a bruxa por cima do seu livro Os times de Quadribol da Grã-Bretanha e da Irlanda.


— É, dá — concluiu definitivamente Tonks.


Ela apertou os olhos em uma expressão preocupada, como se estivesse tentando se lembrar de alguma coisa. Um segundo depois, seus cabelos tinham mudado para rosa-chiclete.


- OOOHHH!


- Como ela faz isso? – perguntou Lilá, curiosa, a Hermione.


- Acho que ela vai explicar em seguida.


— Como é que você faz isso? — perguntou Harry, boquiaberto, quando ela reabriu os olhos.


— Sou metamorfomaga — respondeu ela, voltando a olhar para o espelho e virando a cabeça para poder ver o cabelo de todos os lados. — O que significa que posso mudar minha aparência à vontade — acrescentou ao ver a expressão intrigada de Harry no espelho às suas costas. — Nasci assim. Recebia as melhores notas em Esconderijos e Disfarces durante o treinamento para auror, sem nem precisar estudar, foi muito legal.


- Uau! – exclamou Lilá – Deve ser incrível poder fazer isso. Eu queria poder deixar o cabelo.


- E eu queria mudar o meu nariz – disse Parvati, sonhadora – e, quem sabe, as minhas orelhas.


Então, as meninas olharam para Hermione.


- O que foi?


- Você não vai dizer “ah, francamente” e falar que isso é bobagem?


- Na verdade, eu às vezes queria mudar um pouco de aparência – admitiu ela.


- Eu gostaria de deixar esse meu nariz menor – admitiu Rony, apontando para o próprio nariz comprido. 


— Você é auror? — perguntou Harry, impressionado.


Ser caçador de bruxos das trevas era a única carreira em que ele pensara seguir quando terminasse Hogwarts.


- Se tem uma coisa que você faria de melhor, é caçar bruxos das Trevas – disse Fred.


- Já que é o que você faz de melhor desde o primeiro ano – disse Jorge.


- Ele também seria um excelente jogador profissional – comentou Gina - melhor até do que Vitor Krum.


- Pensei que esse fosse o seu sonho, maninha.


— Sou — confirmou Tonks, com orgulho. — Kingsley também é, mas é mais graduado que eu. Eu só me formei há um ano. Quase levei bomba em Vigilância e Rastreamento. Sou muito trapalhona, você me ouviu quebrar aquele prato quando chegamos lá embaixo?


— Pode-se aprender a ser metamorfomago? — perguntou Harry, erguendo-se e esquecendo completamente que estava fazendo a mala.


Tonks deu uma risadinha abafada.


— Aposto que você até gostaria de esconder essa cicatriz, às vezes, hein? — Seus olhos focalizaram a cicatriz em forma de raio na testa do garoto.


— Gostaria — murmurou Harry virando as costas. Não gostava de gente olhando para a cicatriz.


- Depois de todo esse tempo, ainda é muito irritante – admitiu Harry. Sentia-se como uma peça em exposição.


— Bom, acho que você vai ter de aprender pelo método difícil. Os metamorfomagos são realmente raros, a gente nasce com o dom, não o adquire. A maioria dos bruxos precisa de uma varinha ou de poções para mudar a aparência. Mas temos de ir andando, Harry, devíamos estar fazendo as malas — acrescentou ela, se sentindo culpada ao verificar a bagunça que havia no chão.


— Ah... é — concordou o garoto, catando mais alguns livros.


— Não seja burro, vai ser muito mais rápido se eu... Fazer malas! — exclamou a bruxa, agitando a varinha com um movimento longo e amplo que abarcou o chão.


Livros, roupas, telescópio e balança, tudo levantou voo e se precipitou rápida e desordenadamente para dentro do malão.


Vai ser o primeiro feitiço que eu vou aprender quando fizer dezessete – disse Rony, os olhos brilhando com a ideia de nunca mais ter de arrumar as coisas.


— Não ficou muito arrumado — disse Tonks, se aproximando do malão e espiando a confusão ali dentro. — Minha mãe tem um jeito para fazer as coisas entrarem arrumadinhas – e até consegue que as meias se enrolem sozinhas... mas nunca aprendi como é que ela faz... é uma espécie de sacudida rápida com a varinha. — Ela experimentou esperançosa.


Uma das meias de Harry começou a se ondular lentamente, mas tornou a se achatar em cima da montoeira existente.


— Ah, deixa pra lá — disse Tonks, fechando a tampa do malão — pelo menos está tudo dentro. Isso aí está pedindo uma limpezinha, também. — Ela apontou para a gaiola de Edwiges. — Limpar. — Penas e titicas desapareceram. — Bom, agora está um pouquinho melhor – nunca peguei o jeito desses feitiços domésticos. Certo... está tudo aí? Caldeirão? Vassoura? Uau! Uma Firebolt?


Os olhos da bruxa se arregalaram ao pousar sobre a vassoura na mão direita de Harry. Era o orgulho e a alegria do garoto, um presente de Sirius, uma vassoura de categoria internacional.


Draco estremeceu de inveja. Harry Potter sempre tinha tudo melhor do que ele.


— E eu ainda voo numa Comet 260 — comentou Tonks, com inveja.— Ah, deixa pra lá... a varinha continua no bolso da jeans? As duas nádegas continuam inteiras? O.k., vamos. Locomotor malão.


O malão de Harry ergueu-se alguns centímetros do chão. Segurando a varinha como se fosse a batuta de um maestro, Tonks fez o objeto atravessar o quarto e sair pela porta à frente deles, a gaiola de Edwiges na mão esquerda. Harry desceu a escada atrás da bruxa levando sua vassoura.


De volta à cozinha, Moody recolocara o olho, que girava tão rápido depois de limpo que Harry se sentiu enjoado só de olhar.


- É mesmo nojento – Harry ouviu Romilda Vane sussurrar, olhando Olho-Tonto.


Ele e Hermione lançaram um olhar de censura à garota.


Kingsley Shacklebolt e Estúrgio Podmore examinavam o microondas e Héstia Jones dava risadas com um descascador de batatas que encontrara ao examinar as gavetas. Lupin estava endereçando uma carta aos Dursley.


— Excelente — exclamou ao ver Tonks e Harry entrarem. — Temos mais ou menos um minuto, acho. Talvez fosse bom irmos para o jardim e aguardarmos prontos. Harry, deixei uma carta avisando aos seus tios para não se preocuparem...


— Eles não vão se preocupar — respondeu Harry.


—... que você não corre perigo...


— Assim eles vão ficar deprimidos.


—... e que você os verá no próximo verão.


— Preciso?


Receio que precise, pensou Dumbledore, até que se torne maior de idade.


Lupin sorriu, mas não respondeu.


— Venha aqui, garoto — disse Moody com rispidez, acenando com a varinha para Harry se aproximar. — Preciso desiludir você.


— O senhor precisa o quê? — perguntou o garoto, nervoso.


— Feitiço da Desilusão — explicou Moody erguendo a varinha. — Lupin disse que você tem uma Capa da Invisibilidade, mas ela não vai cobri-lo o tempo todo que estiver voando; o feitiço vai disfarçar você melhor. Agora...


Uma Capa de Invisibilidade, pensou Draco, incapaz de conter a inveja. Potter realmente tinha tudo.


- Tudo bem – sussurrou Pansy, como se lesse os pensamentos de Draco – é só pedir uma para o seu pai, bem melhor que a do Potter.


O bruxo deu uma pancada forte no cocuruto de Harry e ele teve a curiosa sensação de que Moody acabara de quebrar um ovo ali; um filete gelado pareceu escorrer pelo seu corpo a partir do ponto em que a varinha batera.


— Bem bom, Olho-Tonto — disse Tonks em tom de admiração, olhando para a cintura de Harry.


O garoto baixou os olhos para seu corpo, ou melhor, para o que fora seu corpo, porque não parecia mais o dele. Não estava invisível; mas simplesmente assumira a cor e a textura exatas do eletrodoméstico às suas costas. Ele parecia ter se transformado em um camaleão humano.


- Deve ser legal – ponderou Simas Finnigan, olhando os próprios braços como se os imaginasse invisíveis. Dino Thomas deu uma risada.


— Vamos — disse Moody, destrancando a porta dos fundos com a varinha.


Todos saíram para o belo gramado do jardim de tio Válter.


— Noite clara — resmungou Moody, seu olho mágico esquadrinhando o céu. — Teria sido melhor se houvesse umas nuvens. Certo, você... — falou o bruxo para Harry com rispidez — vamos voar em formação cerrada. Tonks irá à sua frente, mantenha-se colado à cauda dela. Lupin vai cobrir você por baixo. Eu vou atrás. O resto ficará circulando em volta. Não saiam da formação para nada, entenderam? Se um de nós for morto...


- Morto?! – Exclamou Derek Wilkins, um sonserino do terceiro ano – isso pode acontecer?


- Tudo pode acontecer na guerra, menino – rosnou Olho-Tonto – pena eu não ter ensinado nada no ano passado. 


— E isso pode acontecer? — perguntou Harry apreensivo, mas Moody não lhe deu atenção.


—... os outros continuarão voando, não parem, não dispersem. Se nos eliminarem e você sobreviver, Harry, há uma guarda recuada de prontidão para assumir, continue a voar para oeste e ela irá se reunir a você.


— Pare de ser tão animador, Olho-Tonto, ele vai pensar que não estamos levando isto a sério — disse Tonks, enquanto prendia o malão de Harry e a gaiola de Edwiges aos arreios que trazia pendurados à vassoura.


— Estou só contando ao garoto qual é o plano — rosnou Moody. — Nossa missão é entregá-lo ileso na sede, e se morrermos na tentativa...


— Ninguém vai morrer — disse Kingsley Shacklebolt com sua voz grave e calmante.


Kingsley franziu a testa, preocupado. Ao seu lado, Fudge e Umbridge o encaravam, o ministro incrédulo, a professora desconfiada.


Fudge não conseguia acreditar que um de seus melhores aurores estivesse ao lado de Dumbledore. Aquele livro parecia estar cheio de informações sem sentido.


Umbridge, ao contrário, sabia que havia informações reais naquele livro; como o ataque de dementadores; ela mesma os mandara, para garantir que Potter fosse expulso. Então, a traição de Shacklebolt devia ser verdade, também.


— Montem as vassouras, esse é o primeiro sinal! — comandou Lupin, apontando para o céu.


No alto, a uma grande distância, uma chuva de faíscas vermelhas brilhara entre as estrelas. Harry identificou-as imediatamente como faíscas produzidas por uma varinha. Passou a perna direita por cima da Firebolt, segurou com firmeza a empunhadura e sentiu-a vibrar muito de leve, como se estivesse tão ansiosa quanto ele para ganhar novamente os ares.


— Segundo sinal, vamos! — disse Lupin em voz alta ao ver mais faíscas, desta vez verdes, explodirem lá no alto.


Harry deu um forte impulso. O ar fresco da noite passava veloz por seus cabelos enquanto os jardins cuidados da Rua dos Alfeneiros iam ficando para trás, reduzidos a uma colcha de retalhos verde-escuros e pretos, e todos os pensamentos sobre a audiência no Ministério desapareceram de sua mente como se uma lufada de vento os tivesse varrido dali. Ele teve a sensação de que seu coração ia explodir de prazer; estava voando outra vez, voando para longe da Rua dos Alfeneiros, como passara imaginando o verão inteiro, estava voltando para casa... por uns poucos e gloriosos minutos, todos os seus problemas pareceram ir recuando até desaparecer, insignificantes no vasto céu estrelado.


- Você vai embora da casa dos trouxas? – indagou Luna Lovegood – não vamos ver mais sobre o periquito esquiador?


Os colegas de Luna deram risadas.


- Idiotas – resmungou uma colega de Luna, com pena.


- Tudo bem – disse Luna – sei que alguns estão rindo com maldade, mas sei também que alguns estão rindo porque gostaram do que eu disse.


A colega sorriu. Luna não era nem um pouco ingênua. 


— Tudo à esquerda, tudo à esquerda, tem um trouxa olhando para o céu! — gritou Moody às costas de Harry. Tonks deu uma guinada e o garoto a acompanhou, observando o malão balançar violentamente sob a vassoura da bruxa. — Precisamos ganhar mais altura... subam mais quatrocentos metros!


Com o frio e a velocidade da subida, os olhos de Harry se encheram de água; ele não conseguia ver nada no solo, exceto os minúsculos pontinhos de luz que eram os faróis dos carros e os lampiões. Duas luzinhas talvez pertencessem ao carro do tio Válter... neste momento, os Dursley estariam voltando para a casa vazia, enfurecidos por causa do concurso inexistente... e Harry soltou uma gargalhada só de pensar na cena, embora sua voz fosse abafada pela agitação das vestes dos bruxos, o rangido das correias que prendiam o malão e a gaiola, e o ruído do vento ao passar em grande velocidade por seus ouvidos. Ele não se sentia vivo assim fazia um mês, nem tão feliz.


- Ele é igual ao James – sussurrou Remo, sorridente – no céu se sente em casa.


— Rumar para o sul! — gritou Olho-Tonto. — Cidade à frente!


Eles viraram para a direita a fim de evitar sobrevoar a cintilante teia de luzes lá embaixo.


— Rumar para sudeste e continuar subindo, há umas nuvens baixas à frente que podem nos esconder! — gritou Moody.


Harry ficou aliviado de ouvi-la reclamar; suas mãos estavam ficando dormentes na empunhadura da vassoura. Desejou ter se lembrado de vestir um casaco; estava começando a tremer de frio.


Eles alteravam o curso a intervalos, segundo as instruções de Olho-Tonto. Harry conservava os olhos semicerrados para se proteger do vento gelado que começava a fazer suas orelhas arderem; só se lembrava de sentir tanto frio assim montando uma vassoura uma vez, na vida, durante uma partida de Quadribol contra Lufa-Lufa, no terceiro ano de escola, que se realizara debaixo de um temporal. A guarda voava ao redor dele, continuamente, como gigantescas aves de rapina. Harry perdeu a noção de tempo. Ficou imaginando quantos minutos fazia que estavam voando, parecia no mínimo uma hora.


— Dobrar para sudeste! — berrou Moody. — Queremos evitar a estrada!


Harry agora estava tão congelado que pensou, saudoso, no aconchego seco do interior dos carros que passavam lá embaixo, depois, ainda mais saudoso, numa viagem de Flu; talvez fosse desconfortável ficar rodopiando por lareiras, mas pelo menos nas chamas era quentinho... Kingsley rodeou-o em um mergulho, a careca e o brinco reluzindo ao luar... agora Emmeline Vance apareceu à sua direita, a varinha na mão, a cabeça virando para a esquerda e a direita... depois ela também mergulhou por cima dele e foi substituída por Estúrgio Podmore...


- Anda logo – sussurrou Draco – acaba essa enrolação.


- Que foi, Draco? – indagou Pansy.


- Quero saber logo onde é esse quartel-general.


Assim, posso imediatamente mandar uma carta para o meu pai, explicando em detalhes como chegar lá.


— Devíamos retroceder um pouco, para nos certificar de que não estamos sendo seguidos! — gritou Moody.


— VOCÊ FICOU DOIDO, OLHO-TONTO? — berrou Tonks à frente. — Estamos congelados nas vassouras! Se continuarmos a nos desviar da rota, só vamos chegar na semana que vem! Além do mais, já estamos quase chegando!


— Hora de iniciar a descida! — ouviu-se a voz de Lupin. — Siga Tonks, Harry!


— Finalmente – sussurrou Draco, ansioso.


Ele não estava sozinho. Outros filhos de Comensais da Morte estavam silenciosamente ansiosos para saber onde era aquele quartel-general, e contar aos pais.


Theodore Nott pensava discretamente no que fazer. Supunha que devesse contar ao pai, ou poderia sofrer consequências. 


O garoto seguiu a bruxa em um mergulho. Estavam rumando para a maior coleção de luzes que ele já vira, uma vasta massa irregular que se entrecruzava, onde brilhavam linhas e redes entremeadas por espaços muito negros.


Continuaram voando cada vez mais baixo, até Harry poder distinguir os faróis de cada carro, os lampiões, as chaminés e as antenas de televisão. Ele queria muito chegar ao chão, embora tivesse certeza de que alguém precisaria descongelá-lo da vassoura.


— Aqui vamos nós! — avisou Tonks, e alguns segundos depois ela pousou.


Harry tocou o solo logo em seguida e desmontou em um trecho de grama alta, no centro de uma pequena praça. Tonks já estava desafivelando o malão.


Tiritando de frio, o garoto olhou para os lados. Ao seu redor, as fachadas das casas cobertas de fuligem não pareciam convidativas; algumas tinham janelas quebradas que refletiam opacamente a luz dos lampiões, a pintura estava descascando em muitas das portas e havia montes de lixo na entrada das casas.


— Onde estamos? — perguntou Harry, mas Lupin disse baixinho:


— Em um instante.


Anda logo – murmurou Draco, eufórico.


Moody vasculhava sua capa, as mãos recurvadas insensíveis de frio.


— Achei — murmurou, erguendo bem no alto um objeto que parecia um isqueiro de prata e acionando-o.


A luz do lampião mais próximo apagou; ele não parou de acionar o isqueiro até todas as lâmpadas da praça estarem apagadas, restando apenas a luz de uma janela, protegida por cortinas, e a lua crescente no céu.


— Pedi-o emprestado a Dumbledore — grunhiu Moody, embolsando o desiluminador. — Isto cuidará de qualquer trouxa que esteja espiando pela janela, entende? Agora vamos logo.


Ele tomou Harry pelo braço e o conduziu para longe do gramado, atravessou a rua e subiu a calçada; Lupin e Tonks o seguiram, carregando o malão do garoto, o restante da guarda, empunhava suas varinhas, flanqueando os quatro.


De uma janela do primeiro andar próxima, vinha um som abafado de música.


Um cheiro acre de lixo podre desprendia-se de uma pilha de sacas estufadas de lixo logo à entrada do portão quebrado.


Hermione se debruçou na frente dos amigos.


- Agora vão revelar a localização da sede – sussurrou ela, tão baixo que os amigos tiveram de ler seus lábios.


- Mas o Dumbledore é o Fiel do Segredo – disse Rony – eles não vão poder revelar para mais ninguém.


- E se Malfoy decidir ir até lá? E se outro filho de Comensais da Morte decidirem invadir o lugar atrás de alguma coisa?


Harry tentou não se preocupar com isso. Esperava que os membros da Ordem impedissem aquilo de acontecer.


— Tome — murmurou Moody, empurrando um pedaço de pergaminho em direção à mão desiludida de Harry, e aproximou sua varinha acesa para iluminar o que estava escrito. — Leia depressa e decore.


Harry olhou para o pedaço de pergaminho. A caligrafia fina lhe era vagamente familiar. Ele leu:


A sede da Ordem da Fênix encontra-se no largo Grimmauld, número doze, Londres.


 


Draco sorria de orelha a orelha, lançando olhares furtivos a Crabbe, Goyle e Nott, enquanto Cornélio Fudge se levantava.


- Então, é lá que fica essa tal Ordem da Fênix! Já ouvi o bastante! Vou reunir um batalhão de aurores para inspecionar esse lugar!


Mas Dumbledore sorriu calmamente.


- Receio que isso não seja possível.


- Como não? Sou o Ministro da Magia, e agora que sei onde a sede dessa Ordem fica, exijo saber exatamente o que estão tramando!


- Deixe-me explicar, Cornélio, e aos alunos, também – os olhos de Dumbledore faiscaram em direção à mesa da Sonserina – O largo Grimmauld é protegido por vários feitiços, incluindo o Feitiço Fidelius.


Fudge engoliu em seco. Já ouvira aquele feitiço em algum lugar.


- Fidelius, Fidelius; eu já ouvi falar...


- Expliquei ao senhor naquele dia, Ministro, no Três Vassouras – disse Flitwick – Fidelius é um encantamento extremamente complexo, que esconde um segredo em uma pessoa, o Fiel do Segredo. Somente o Fiel pode revelar esse segredo a outros, e estes a quem ele revela não podem revelá-lo a terceiros.


Fudge pareceu murchar como um balão.


- Explicando em miúdos – continuou Dumbledore – o livro revelou a você a localização da sede da Ordem da Fênix, mas você não pode revelar a outros. Tampouco os alunos.


Terminadas as explicações, os alunos começaram um burburinho, enquanto os professores tentavam, a todo custo, restabelecer a ordem.


Mas Draco Malfoy não participava das discussões; estava calado e frustrado.


Por um instante, pensou que teria a chance de obter informações valiosas para o pai, informações que poderiam ajudá-lo a desmantelar a resistência aos Comensais da Morte.


Aquela Ordem da Fênix era uma organização anti-Voldemort, tinha certeza disso. E agora, sabia a localização da sede, mas não podia contar a ninguém.


Crabbe e Goyle, como de costume, pareciam não ter entendido nada.


Theodore Nott sentia-se aliviado de não ter de contar ao pai sobre a sede da ordem anti-Voldemort. Preferia não se meter naquilo, se pudesse evitar. Não sabia se deveria se tornar Comensal da Morte, se queria ser um.


Do outro lado, Harry e os amigos discutiam à volta.


- Se a sede foi revelada, também vão revelar os planos da Ordem.


- Talvez não – disse Hermione – o livro é narrado do seu ponto de vista. E nem você nem nós sabemos muito dos planos da Ordem.


- Então – Rony riu – o máximo que vão mostrar é a nossa faxina no largo Grimmauld.


- E Almofadinhas?! – sussurrou Hermione, preocupada – Fudge vai saber sobre ele...


- Mas talvez ele acredite que Almofadinhas é inocente... – começou Harry.


- E Fudge alguma vez acreditou na verdade? – sussurrou ela, agressivamente – Mas uma coisa não faz sentido.


- O quê?


- Dumbledore é o Fiel do Segredo da sede. Só ele poderia revelar a localização. Mas esse livro revelou à escola inteira.


- Então – disse Rony – você acha que Dumbledore fez esse livro, para fazer o Fudge acreditar nele?


- Mas seria muito arriscado... revelar tudo à escola inteira... não acho que ele faria isso.


- Quem vai ler o próximo capítulo? – disse Tonks.


Imediatamente, Hermione ergueu sua mão bem-treinada. O garoto sorriu, sabendo que acharia melhor que os amigos lessem.


Mas, então, a lembrança do que viria a seguir lhe veio à cabeça. O ataque de dementadores já fora ruim o bastante, agora, a escola o ouviria se descontrolar com os amigos...


Mas Hermione já estava lendo: 


Capítulo 04: Largo Grimmauld, número doze.


~~
Olá! Sei que estou muitíssimo atrasado, mas é que eu fiquei um bom tempo sem um bom computador. Os próximos capítulos devem demorar menos. Espero que as reações estejam agradando aos leitores. E quem já viu Animais Fantásticos? Vou ver na segunda. 

 

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Comentários (4)

  • Gabriel Lovegood Longbottom

    anisoso pelos proximos capitulos da fic e parta saber quem mandou o livro para Umbridge... Embora tenha algumas ideias kkkk

    2016-11-28
  • Mary Riddle Potter

    Fiquei com saudades dessa fic, está ótimo o capítulo :3 Fui ver AFEOH e amei!!

    2016-11-23
  • Sonhadora Dixon

    Você postou!!! Já tinha desistido achando que você teria abandonado de vez a fanfic! Felizmente não foi isso o que aconteceu! Estou super ansiosa por mais capítulos essa fanfic arrasa!

    2016-11-20
  • Sonhadora Dixon

    Você postou!!! Já tinha desistido achando que você teria abandonado de vez a fanfic! Felizmente não foi isso o que aconteceu! Estou super ansiosa por mais capítulos essa fanfic arrasa!

    2016-11-20
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