O Chapéu Seletor



O restante da viagem foi um período de crescente ansiedade para as duas, que começaram a conversar sem parar assim que os quatro garotos saíram da cabine, elas falavam do que haviam sabido de Hogwarts e se surpreenderam ao saber que ambas queriam ficar na Grifnória. Quando apareceu o carrinho de lanches, Sheeba comprou com muita culpa alguns bolinhos e dois sapos de chocolate... ela gastava com muito cuidado o dinheiro de sua bolsa anual de estudante e não sabia se aqueles seis sicles lhe fariam falta.
    Elas trocaram suas vestes e viram ansiosas que o trem parava assim que anoiteceu. Uma voz chamou do corredor:
- Alunos do primeiro ano! Deixem sua bagagem e venham comigo! – Sheeba saiu e viu um homem muito grande com uma lanterna na mão. Instintivamente ela e Lilian se deram as mãos, ela já falara para Lilian de seu dom e Lilian não tivera medo, o que era muito bom... ela via que Lilian era uma menina boa e doce, e desejou que fossem amigas para sempre. Foram conduzidos para a beira de um lago e entraram em barcos, que não pareciam muito atraentes naquele ambiente noturno, a lua estava minguante e havia muito pouca luz, mas Sheeba julgou ver um bando de corujas cortar o céu... havia muitos alunos, mas não divisou nenhum dos que já havia visto.
Estava esfriando rapidamente, ela via a água do lago turva com um certo receio... então apareceu um imenso castelo que ela contemplou boquiaberta. Era a coisa mais fascinante e bela que já vira na vida... muitas torres negras a cortar o céu, cheias de janelas e janelinhas iluminadas...ela amou aquele castelo no primeiro minuto que o viu, e lembrou-se de sua casa e principalmente do lugar onde dormia, uma minúscula água furtada que era quente demais no verão e insuportavelmente fria no inverno... mas era a única menina na casa, portanto, a única que tinha um quarto só seu. Sacudiu a cabeça para espantar os pensamentos sobre a sua casa quando os barcos chegaram ao seu destino.
Foi só entrarem no grande saguão iluminado e quente para explodirem comentários baixinhos sobre a escola, risinhos espoucavam daqui e dali quando uma mulher alta e magra, que usava o cabelo preto muito bem preso e uns óculos quadrados apareceu e disse:
-    Boa noite, eu sou a Professora Minerva McGonnagal. – ela explicou algumas coisas que Sheeba procurou entender repetindo baixinho, então as portas do grande salão abriram-se e eles entraram, os rostos fascinados demais para dizer qualquer coisa.
Em poucos minutos, começou a cerimônia de seleção. Sheeba sentia a ansiedade aumentar... olhou para a mesa dos professores e acenou para o professor Dumbledore, sentado bem no centro... era o primeiro ano dele como diretor da escola.  Ele sorriu e piscou um olho para ela. O chapéu seletor começou então a cantar e ela prestou atenção na música, que falava dos fundadores e de toda a magia que estava ali...

“Venham venham,
aprendam, ensinem
como tantos que aqui passaram
desde os quatro grandes
que Hogwarts fundaram.
Eu escolhi um por um
Vi suas personalidades
Porque você pode esconder
O que diz ou o que faz
Mas de mim não escapa o que
Você pode desejar
Pois eu sou um chapéu
Que tem o dom de pensar
Será você um Corvinal?
Inteligente como a bela Rovena?
Com o olhar do Corvo
E a sabedoria da águia?
Quem sabe ambicioso
Como astucioso Salazar
Se sorrateiro como cobra desliza,
Sua casa será Sonserina.
Se é a paciente como a amiga Helga
Se seu bom humor a todos encanta
Saltitante como um texugo  
Estarás bem na Lufa Lufa...
E finalmente se a coragem é seu dom
Se tem caráter e valentia
Como Godric, o grande Leão
Grifnória é a casa do seu coração.
Confiem em mim...
Estou pensando há quase mil anos
Não é agora que vou me enganar.”


O Chapéu seletor calou-se e  a seleção começou... ela foi a terceira a ser chamada.
-    Amapoulos! – ela foi andando na direção do banquinho, pensando resoluta: “Ele vai me pôr na Grifnória... é a casa do Professor Dumbledore.” Sentou-se procurando sorrir e viu o salão sumir da sua frente, sendo substituído pela escuridão:
“Ora ora ora... o que temos aqui... Toque de Prometeu!” – disse uma vozinha dentro da sua cabeça – “Há noventa e oito anos não vejo uma como você, menina...Você quer aprender sobre o futuro?” “Quero, quero!” – Sheeba pensou... era o que ela mais queria, aprender sobre seu dom – “Só as partes alegres ou tudo?” – “Tudo, lógico!” – “Então, você vai para CORVINAL!” anunciou o chapéu deixando-a perplexa. Ela foi andando tão devagar na direção da mesa da Corvinal que quase esbarrou em quem vinha para sentar-se no banquinho:
-    Ei, anime-se, quem sabe não estudamos juntos na Corvinal? – uma voz de menino chamou sua atenção e ela virou-se para ver o garoto odioso que soltara a bomba no trem rindo antes do chapéu pousar sobre sua cabeça. Ela bufou ao ver que ele ficara na Grifnória e seguiu seu caminho até a mesa, sentando-se onde foi indicado. “Há males que vem para o bem... já pensou estudar com esse moleque chato? Deve ser no mínimo horrível... tomara que esse monstro acabe expulso!” – ela pensou olhando para a mesa da Grifnória onde o garoto fora sentar-se. Uma mulher parou ao lado dela e disse:
-    Sheeba Amapoulos?
-    Sim – ela disse olhando para a mulher, que era baixa e magra e tinha um par de luvas nas mãos.
-    Meu nome é Viviane Lake, eu sou chefe da Corvinal e professora de adivinhação... estas são luvas isolantes, infelizmente você vai ter que usá-las o tempo todo, inclusive durante as aulas... faz parte de seu treinamento. Você não perderá o tato com elas, pode ficar tranqüila.
Sheeba olhou o par de luvas... era muito ruim para um dia só... para completar, Lilian acabara de ser selecionada também para a Grifnória. Ela estava agora completamente só. Pegou o par de luvas sentindo-se mais triste que nunca em sua vida: eram de um couro grosso e acamurçado, e feias como luvas de operário de obras.
- Não se preocupe... eu já passei por isso – disse a professora – em breve elas serão suas amigas... essas luvas vão te poupar muitos aborrecimentos. – Sheeba olhou a professora, ela mesma tinha mãos enluvadas, e calçou as luvas, que ficaram largas. Mas assim que ela abootou-as, ajustaram-se perfeitamente, como se fossem uma segunda pele, realmente não perdia totalmente o tato, mas era como ter as mãos forradas por um couro grosso. – experimente as luvas – disse a professora – toque em alguém.
    Sheeba obedientemente tocou no menino que estava ao seu lado e pela primeira vez na vida, não sentiu nada. Houve um breve lampejo, mas a imagem não chegou a formar-se... não viu nada sobre ele. Era uma bênção. Agora, de certa forma, podia tocar em quem quisesse. E subitamente ficou com medo, porque toda sua vida soubera quem era ou não confiável só por um toque... naquele momento, perdia sua única arma contra o mundo hostil. De forma meio forçada, obrigou-se a rir para a professora.
    Tornou a prestar atenção na cerimônia, já havia algumas meninas e meninos selecionados para sua casa, mas o garoto que acabara de sentar-se no banquinho, um louro magricelo com cara de tédio chamado Malfoy, foi para a Sonserina... pelo que ela sabia das casas, a Sonserina era a mais perigosa, achou estranho que o menino moreno e tímido que entrara com ela no trem (era Atlantis o nome dele?) tivesse sido selecionado para a Sonserina. Agora, o menino gordo ia para a Grifnória, e atrás dele o menino de óculos. Engraçado, os quatro que haviam estado na cabine mais cedo estavam todos na Grifnória. O menino do cabelo oleoso sentou-se no banquinho (Snape... quase é Snake, esse garoto deve ser mesmo uma cobra) e foi para a Sonserina. Seguiu–o uma garota chamada Trelawney, desengonçada e de óculos e um garoto muito bonito louro de olhos azuis de sobrenome Valmont, que foram selecionados para a Corvinal. A garota sentou-se ao seu lado e começou a tagarelar sobre vidência perguntando como era ter o Toque de Prometeu... era a pergunta mágica que deixava Sheeba extremamente mal humorada:
-    É chato. Se pudesse escolher, não saberia de nada – ela disse, cortando o assunto.
Naquele instante o último aluno foi selecionado e o diretor da escola, que por acaso era Dumbledore, começou a falar sobre o ano letivo sério. Ele fez um breve discurso e em seguida ela viu maravilhada os pratos encherem-se de comida... nunca vira tanta comida, e o que era melhor: não precisava pagar por ela, era tão pobre que se acostumara a ter um grande amor por coisas gratuitas. Comendo até esqueceu da garota magrela que continuava tagarelando ao seu lado sobre vidência. Em seguida, a monitora chefe da Corvinal alinhou os alunos do primeiro ano e conduziu-os à sala comunal da casa, que ficava no andar térreo, atrás de uma escada. Ela fugiu brevemente e deu boa noite a Lilian, que ia subindo as escadas.
- Amanhã a gente se fala! – ela acenou para Lilian, que acenou de volta sorrindo. Voltou ao fim da fila da Corvinal e viu que a monitora parara em frente a uma armadura reluzente e prateada.
-    Aprendam a senha para nunca ficarem presos – disse a monitora – Esse é Sir Astolphus – a armadura fez uma reverência, para espanto de Sheeba – ele é o guardião de nossa sala comunal. A senha deste semestre é Alma de águia. “Alma de águia” – repetiu Sheeba para si mesma baixinho.
A armadura deu um passo para o lado e empurrou uma porta escondida na pedra, que abriu-se para que os alunos passassem. A sala comunal da Corvinal era circular e  cheirava a madeira, tinha uma grande lareira e nenhuma janela, porém suas paredes eram cobertas de quadros, todos retratando bruxos e bruxas. A monitora prosseguiu:
- Meu nome é Clara... estes quadros todos foram pintados pela bela Rowena, eles retratam os primeiros discípulos da casa Corvinal,  – ela estancou diante do quadro de uma mulher de cabelos negros e olhos azuis, vestida de azul com as mãos enluvadas. Sheeba viu com espanto que ela tinha próximo ao pescoço uma marca em forma de foice como a dela – esta é nossa fundadora, Rowena Ravenclaw. – a mulher mexeu-se e sorriu no quadro.
Haviam dois corredores que saíam do fundo dos salão, e a monitora disse: Rapazes, sigam à direita com Milo – um rapaz ruivo do sétimo ano acenou para eles – e meninas, venham comigo.
    Sheeba seguiu pelo corredor com as outras, chegaram a um quarto com uma inscrição na porta: “Alunas do primeiro ano” – elas entraram e Sheeba viu sua bagagem depositada ao pé de uma cama alta e grande, que fazia a cama de sua casa parecer um catre, uma cama de grades de ferro próxima à janela. Sheeba chegou perto da janela e viu que ela dava para um campo largo, que acabava numa floresta. A Floresta proibida, à beira dela havia uma cabana, tudo iluminado pela fraca lua minguante. Sem falar uma palavra com suas companheiras de quarto, ela trocou de roupa e deitou-se depois de depositar as luvas ao lado da cama, na mesa de cabeceira. Encolheu-se ao sentir seus pés gelados sob a coberta, como acontecia quando estava nervosa.

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