DESPERTAR DE UM PESADELO



Como há muito tempo não ocorria, Harry acordou sentindo a dor lancinante em sua cicatriz. Ofegou de medo e massageou o local, enquanto a figura de Voldemort de frente para o homem que não sabia  quem era permanecia gravada em sua mente... Voldemort... ele estava de volta, agora ele sabia...  muito tempo quieto, estava articulando mais uma vez uma forma de alcançá-lo. “Black, eu quero Black” ‒ Harry ouviu mentalmente e puxou as cobertas, sabia que era Sirius... a maldição... deviam ser vampiros, eles queriam Sirius, o que havia em Sirius para despertar tanta ira, tanto ódio neles?
    Sua cicatriz seguia doendo, ele sentia as lágrimas involuntárias que a dor trouxera aos seus olhos escorrendo pela sua face...precisava falar com Sirius, agora, além dele, ainda havia Sheeba e o bebê... levantou-se, sentando na cama, ninguém acordara com seu grito. Lá fora, um temporal era um péssimo presságio. Harry deitou-se, ainda com a mão sobre a testa, e deixou-se ficar, tremendo, até que a dor passasse.

    Em Hogsmeade, Sirius despertou no mesmo momento que Harry, agarrando-se violentamente a Sheeba, abraçando-a instintivamente, como se a mulher pudesse protegê-lo dos pressentimentos horríveis que o sonho despertava. Puxou-a para junto dele, e viu que ela estava acordada quando ela virou-se encarando-o em silêncio.
    Ele mergulhou o rosto nos cabelos dela e começou a chorar. Não chorava de medo. Chorava de dor, e ela sabia disto. Uma dor muito mais antiga que as dores de Azkaban, a dor de quem perdeu alguém muito querido, muito cedo, e depois sofreu uma terrível decepção. Ela passou as mãos pelos cabelos dele, amando-o naquele momento mais que nunca. Ele a encarou.
    ‒ Sirius, você está fugindo disso há quase vinte e três anos. É hora de encarar. Seu irmão não está enterrado em Devonshire, como você gosta de acreditar, como seus pais gostavam de mentir para si mesmos... Sirius, eu te disse que isso ia acontecer... eu disse que você não ia poder fugir para sempre... Eu avisei a você mil vezes que chegaria o dia que você teria que admitir... ‒ Sirius a abraçou com força.
    ‒ Não podia ser em outra hora? Não podia ser de outra forma? Sheeba, não pode ser verdade... não pode ser... eu nunca o havia visto desta forma. Eu estive lá várias vezes  procurando...
    ‒ John te avisou que ele estava lá... Sirius, é preciso que você encare... Caius tornou-se um vampiro! ‒ Sirius levantou-se bruscamente da cama, e vestiu-se.
    ‒ Não, Sheeba, não pode ser... não meu irmão. ‒ Sirius tomou a varinha e dirigiu-se para fora do quarto.
    ‒ Você não vai...?
    ‒ Vou. Só há um meio de saber se meu irmão está ou não enterrado em Devonshire. ‒ Sirius desaparatou antes mesmo que Sheeba pudesse impedi-lo.

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    Sirius aparatou em frente a três túmulos em um cemitério em Devonshire. Quem visse de longe a figura alta e sinistra do bruxo, parado às três da madrugada no meio do cemitério, com certeza teria muito medo. Ele encarava a sepultura que seria de seu irmão, entre a de sua mãe e a de seu pai. Um grande anjo de mármore negro a enfeitava, olhando para o céu. Na lápide apenas algumas inscrições, abaixo da data da suposta morte:

“Caius Black, o filho ‒ Nosso bem amado anjo”

    Também em Devonshire chovia, gotas grossas de chuva caiam pesadamente ensopando seus cabelos e vestes. Sirius olhava indiferente as gotas imensas de chuva caírem sobre o anjo, sobre a lápide, sobre o túmulo negro de seu irmão. Com um movimento de varinha, afastou a pedra que cobria o túmulo, e fez com que um grande caixão, a essa altura destruído, emergisse lentamente da terra. Ele andou até a beira da sepultura, e olhou dentro do que seria o caixão, apenas para constatar que ali havia apenas pedras.
    Um raio cortou o céu, o trovão abafou o grito desesperado de Sirius Black.

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    Sheeba o esperava sentada na sala, viu quando ele aparatou do lado de fora, e serenamente o trouxe para dentro. Ela sentou-se em uma cadeira, e deixou que ele , ajoelhado, abraçasse suas pernas e desse vazão à dor que o cortava ao meio. Ele na verdade sabia disso pelo menos há vinte anos... só não quisera pensar no assunto. Sirius estava molhado de chuva, seus cabelos ensopados molhavam o colo dela, que o acariciava, enquanto ele, mudo, deixava-se ficar, as lágrimas descendo silenciosas pela face molhada.
    ‒ Eu nunca quis acreditar que meu irmão mudara de lado... eu sempre preferi pensar que ele morrera como um herói, sem se deixar vampirizar. Mas eu acho que eu sempre soube que não era verdade... Há dezessete anos atrás, quando me formei em Hogwarts,  John me disse que ele estava em Nova Iorque, que ele não havia morrido e que estava subindo rapidamente na hierarquia dos vampiros, eu quase briguei com ele... só mantive a amizade por causa da irmandade, afinal, meu pai e o pai de John, meu avô e o avô dele, há seis gerações pelo menos, eram como amigos... John é mais velho que eu... tem a idade de Caius... eles foram amigos... como pude deixar de acreditar em John?
    ‒ Você quis acreditar em seu sangue, meu amor.
    ‒ Eu errei. Eu preferi esquecer tudo, eu preferi me concentrar em lutar contra Voldemort... depois veio Azkaban, agora, quando eu achava que tudo ia ficar bem, Caius volta, ele me quer, Sheeba, ele quer cumprir a maldição... Ninguém vai tocar no meu filho, Sheeba, ninguém. Eu mato Caius e qualquer outro vampiro que se aproximar de você ou de meu filho.  E ele quer entregar Harry a Voldemort.
    ‒ Ele não vai conseguir, Sirius.
    ‒ Prometa-me uma coisa, Sheeba, prometa-me que se um vampiro me pegar você vai me matar sem piedade, antes que eu mate alguém... ‒ Ele levantou o rosto encarando a  mulher, sério ‒ se a maldição se cumprir, eu quero que você pelo menos salve a minha alma... prometa. ‒ uma lágrima rolou silenciosa pela face de Sheeba.
    ‒ Prometo. Agora vamos dormir, Sirius.
    Ela trocou as vestes dele e os dois deitaram-se abraçados na cama, mudos, com o coração oprimido demais para poder dormir.

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