Amigos



Capítulo 6 – Amigos





Sirius estava jogado num dos sofás da sala comunal da Grifinória. Tiago e Remo estavam na aula de Aritmancia; Pedro havia sumido – provavelmente na cozinha do castelo, convencendo os elfos-domésticos a lhe fazerem um lanchinho da tarde. Sirius Black pensava na aula anterior. A professora de Defesa contra as Artes das Trevas lhe dissera para conversar com Lílian Evans e Frank Longbottom, para que chegassem a um acordo. Ao contrário do que ele imaginara, ela não fora contra o desenvolvimento do assunto, apesar de aquilo dizer respeito à família dela.



O rapaz pegou o recorte de jornal mais uma vez. O Ministério da Magia dizia que tudo não passava de boatos. Se era assim, então porque os pais de Helen e Tiago tinham ido visitar seu pai durante as férias? Mas Tiago não sabia desse detalhe e Black tinha conhecimento de que os amigos vinham estranhando seu comportamento desde que voltaram a Hogwarts. Por isso decidira que naquela noite iria contar tudo o que sabia sobre o assunto para os outros marotos, só precisava pensar num local realmente seguro para isso.



- Black, cadê o Tiago? – uma voz doce de menina chamou-o.



Ele olhou para o grupinho de garotas do sexto ano que acabava de entrar no salão comunal; Lílian à frente todas. Sirius reparou que Julianne o olhava e quando ela percebeu que ele havia notado, deu uma risadinha nervosa, virando logo o rosto para conversar com a amiga Patty.



- Black...



- Desculpe, Evans... – e dobrou o recorte guardando-o no bolso em seguida. – O Tiago está na aula da Profª. Vector.



Ela fez cara de decepcionada. E então Sirius pensou que aquele podia ser um bom momento para conversarem sobre a aula de DCAT.



- Ah, Evans, senta aqui. – apontando a poltrona logo em frente a sua.



Ela estranhou, mas não fez objeção. Raramente conversava com os garotos sem que Tiago estivesse por perto. Talvez aquela fosse uma forma de quebrar o gelo.



- O que houve, Black?



- Bem, vocês já tiveram aula de DCAT hoje, não é?



- Tivemos, sim. A primeira aula do dia. Por que você tá me perguntando isso?



- É que parece que nós dois tivemos a mesma idéia sobre a tal pesquisa a ser desenvolvida nessa aula.



Ela ficou séria de repente:



- Você também vai fazer uma pesquisa relacionada com trouxas? – ela jogou verde.



- Essa pesquisa não vai ser exatamente sobre trouxas, não é, Evans?



- Onde você está querendo chegar, Black? – Lílian começava a dar mostras de irritação.



- Aqui. – e tirou o recorte de jornal do bolso. – Acredito que você tenha esquecido isso aqui depois do almoço. Pois eu também fiquei muito interessado no assunto.



Lílian estava boquiaberta. Como pudera ser tão imprudente?



- Me dá isso! – ela tentou apanhar o jornal das mão de Sirius.



- É todo seu. Eu já decorei o que está escrito aí. – o olhando firme para ela. – Acho que nós precisamos ter uma conversa séria sobre isso.



- Não tem nada pra ser conversado. E acho bom você não comentar isso com a Helen, ou eu...



- Ou você... Não pense que eu sou como a Melissa Jones, Evans. Eu não costumo ligar muito para a estética... – disse Black sarcástico como sempre.



- Isso não diz respeito à você. – e ela ia saindo quando ele a segurou forte pelo braço. – Ai, você está me machucando.



- Olha aqui, se o fato de meu pai ser do Departamento de Ocultamento do Mundo Mágico não é o bastante para eu estar interessado, eu não sei o que pode estar motivando você. Afinal, para uma amizade recém-começada, você e a Silver andam grudadas demais, não acha? – e então ele largou o braço da garota, que a essa hora já tinha um hematoma. – E então, vai conversar comigo ou não?



Lílian fechou os olhos, enquanto massageava a região dolorida. Ela voltou a sentar-se na poltrona que Sirius havia lhe indicado.



- Bem, eu... o Frankie... nós achamos que... eu não devia estar contando nada a você.



- Lílian, eu não estou querendo atrapalhar vocês. Pelo contrário, acho que nós podemos nos ajudar. Estava pensando em propor parceria a você e ao Longbottom. Não sei se você sabe, mas o pai de Tiago também está envolvido nessa história.



A garota ruiva olhou assustada para ele. Mas em poucos segundos seu rosto aparentava uma segurança incomum:



- Bem, você queria saber porque eu e Helen ficamos amigas tão de repente, não é?



Ele fez que sim com a cabeça:



- Pois eu lhe conto se você prometer me responder uma pergunta depois, Black.



- Eu respondo. E não me chame de Black. Me chame de Sirius, Lílian. – e deu aquele sorriso de derreter qualquer coração gelado. Ela retribuiu.








“Todos os anos eu vou sozinha de Londres para o Surrey, onde eu moro. Eu faço a viagem de trem, é bem perto, e como meus pais trabalham o dia inteiro, não dá pra eles me buscarem. Naquele dia, como sempre, eu tinha pedido a ajuda de Tiago para embarcar meu malão, então a gente se despediu e eu entrei no trem. Mas logo que o trem começou a andar eu ouvi uma voz conhecida, de uma vizinha. Normal, porque muita gente vem do Surrey para Londres para fazer compras, essas coisas. Eu fiquei olhando para a entrada do vagão para ver se ela ia entrar, mas em vez dela, apareceu um rapaz...”

- Cameron...



“Exatamente. Imagina a minha cara de espanto, ver Cameron Silver vestido exatamente como um trouxa e ainda por cima no mesmo trem que eu. Eu nem sabia que ele morava no Surrey. Mas ele não me viu. E atrás dele entraram a Sra. Figg e por fim a Helen. Quando eu vi ela tive um daqueles pensamentos básicos: ‘Que foi que eu fiz pra merecer este castigo?’ e foi justamente ela quem me viu primeiro. Ela ficou me encarando e me deixou muito incomodada com isso. Eu sabia da fama de encrenqueira dela, mas na verdade tínhamos uma convivência pacífica nas aulas que dividíamos com a Sonserina. Praticamente só nos cumprimentávamos...”



Sirius ouvia Lílian com atenção. Ela continuou:



“Então a Sra. Figg me notou e veio conversar comigo. Cameron e Helen vieram junto. E, para minha surpresa, nenhum deles falou um A sobre Hogwarts, como se nenhum deles fosse bruxo. Eu ainda estava meio chocada com a possibilidade de a Sra. Figg ser uma bruxa, mas depois lembrei que a mãe de Helen era trouxa e que a Sra. Figg podia ser uma tia trouxa, por que não?”



O rapaz concordou com a cabeça, não queria interromper a narrativa.



“Fomos conversando até chegar na estação do Surrey. Onde o Sr. Silver estava esperando, acompanhado pelo meu pai. Meu pai nunca foi me buscar, achei aquilo estranhíssimo. Então nós seis entramos no carro e a Sra Figg começou a perguntar por Hogwarts. Disse que não costumava comentar assuntos do mundo mágico na frente de trouxas, por isso não tinha falado nada no trem. Contou que era bruxa, e que os sobrinhos, assim como o irmão, o Sr. Silver, iam passar as férias na casa dela. E que isso seria muito bom porque eu e Helen poderíamos fazer companhia uma a outra. Depois a Helen me confessou que achou a idéia da tia tão absurda quanto eu.”



- Então, não foi no trem que vocês viraram amigas?



- Não. – ela continuou: “Isso aconteceu cerca de uma semana depois. Minha mãe a Sra. Figg sempre se deram muito bem, e naquele dia mamãe teve a idéia de chamar ela e os parentes para jantar conosco. Eu tentei arranjar um outro programa pra não ter que participar, mas a maioria da minhas amigas trouxas iam sair com os namorados, e as outras estavam viajando. Tive que ficar. O jantar ocorreu normal, sem qualquer comentário sobre bruxos e etc, porque minha irmã Petúnia estava presente. E ela tem verdadeira aversão a qualquer coisa que não seja ‘normal’... quero dizer, o normal dos trouxas. Ela poderia ser uma sonserina ao contrário: em vez de odiar trouxas, ela odeia bruxos.”



Sirius se espantou com o comentário:



- E como é que vocês conseguem conviver?



- Ah, eu nem ligo. Petúnia é tão tapada que não vale a pena brigar com ela... Além do mais, ela morre de medo que eu jogue algum feitiço nela! – Lílian riu deliciada. Adorava aprontar com a irmã.- E foi justamente por causa de Petúnia que eu e Helen nos tornamos amigas. Depois do jantar, minha mãe e a Sra. Figg foram para a cozinha preparar o café – e fofocar, como qualquer mulher. Papai, o Sr. Figg e o Sr. Silver ficaram na sala discutindo futebol. Na verdade, mais o meu pai e o de Helen, porque Monsieur Bernard não gosta muito de esportes trouxas. – o rapaz tentou imaginar o que seria o tal futebol, mas não conseguiu.

“Cameron foi embora dizendo que tinha que ligar para a Annie, mas acho que na verdade ele foi visitá-la com Pó de Flu. Eu, Helen e Petúnia sobramos; ela estava absolutamente calada. Não lembro bem como começou, mas eu e minha irmã começamos a brigar. Isso na sala de jantar e quando eu mandei um prato na cabeça dela, ela veio com um de seus comentários típicos: ‘Eu não poderia esperar nada melhor de uma anormal como você.’ Eu já estou acostumada com isso, mas a Helen pareceu transtornada. Mais ou menos da mesma forma que ela fica quando alguém fala mal de trouxas aqui na escola. E quando eu percebi ela já estava com a varinha apontada pra minha irmã. Eu achei o máximo, né? Se eu tentasse fazer aquilo meus pais me matariam, mas você a conhece... – Lílian ria sozinha.



- Eu devia ter imaginado.



“Bom, ela levou uma bronca tremenda dos adultos todos, mas acho que eles já estão acostumados com ela. A Sra. Figg pediu mil desculpas pra minha mãe e tal. Mas aquilo acabou unindo a gente. E o mais engraçado é que raramente a gente falava de magia. Ela era como qualquer uma das minhas amigas trouxas. E, bem, ela também me ajudou com o Tiago...” – Lílian ficou vermelha.



- É, eu me lembro, ela convenceu a Sra. Figg a te levar naquele jantar, né?



- Exato! Bom, mas acho que agora tá na sua vez de responder a minha pergunta.



- Claro! Vá em frente, mocinha! – Sirius sorria. Depois daquela conversa ele tinha certeza de que Tiago tinha encontrado a garota perfeita para ele.



Mas antes que a garota fizesse sua pergunta, eles ouviram um barulho vindo de fora da torre, mais exatamente de onde ficava o retrato da mulher gorda.








Em frente a entrada da Grifinória, Helen Silver e Severo Snape discutiam aos berros:



- Eu vou entrar, e não vai ser você e nem essa velha gorducha que vão me fazer desistir.



- Você não vai entrar. Quantas vezes eu preciso dizer que só os alunos da Grifinória estão autorizados a entrar aí.



- Não tem nada a ver. Tendo a senha qualquer um pode entrar onde quiser neste castelo!!



- E você tem a senha por um acaso?



- Eu não, mas eu sei que você tem! E você vai me falar!

- Não vou falar coisíssima nenhuma! E vou tirar 50 pontos da sua casa se você tentar entrar a força!



- Não em faça rir, Snape! Você, descontar 50 pontos da sua própria casa? No dia em que isso acontecer eu quebro a minha varinha!



- Ei, ei, o que é que está acontecendo aqui? – liderados por Frank Longbottom, uma multidão de curiosos saía pelo retrato da mulher gorda.



Sirius largara Lílian atrás daquele amontoado de gente e ia avançando multidão adentro. Do corredor que dava na torre da Grifinória, os alunos do 7º ano voltavam da aula de Aritmancia, entre eles Tiago e Remo. Mas Helen parecia não notar o burburinho. Olhava furiosa para o namorado, e foi num tom de voz mais baixo, porém muito mais irritado que ela começou a dizer:



- Quem lhe deu o direito?



- De me intrometer? Eu sou monitor, é meu dever acabar com...



- Não se faça de desentendido, seu, seu falso!



- Quê? – ele olhou perplexo para a namorada. - Helen você tá ficando doida?



Ao comentário de Frank algumas vocês murmuraram “E ele ainda tinha alguma duvida?”, “Isso tá na cara, você não acha?” e “Demorou para descobrir, hein?”.



- Você não tinha o direito... – e vendo Sirius se colocar ao lado do colega de casa. – Ah, lógico, eu já tô entendendo tudo! É geral, isso, não é? Primeiro foi Sirius Black, agora você. Só que nenhum de vocês de o direito de se intrometer na minha vida, ouviu?



- Você tá falando da pesquisa de DCAT, Silver? – Sirius estava sério; nem reparou quando Longbottom olhou para ele desconfiado.



- E do que mais? Esse é um assunto de família, acho bom vocês ficarem afastados...



- Ei, o que é que a Silver tem a ver com nosso projeto de DCAT, Sirius? Eu achei que fosse sobre trouxas... – Tiago não estava entendendo nada, assim como Remo a seu lado.



- Ora, ora... Quer dizer então que você sai fazendo escolhas e nem comunica aos seus parceiros, Black. Mas eu já esperava isso de alguém como você. Se os pais de Tiago não quiseram contar nada a ele, quem é você para ter esse atrevimento? Mas você não se preocupa se alguém se machucar, não é? Tudo para inflar ainda mais seu ego!



A essa altura Tiago encarava Sirius boquiaberto exigindo explicações. Ele só fez um sinal, pedindo para que esperasse.



- Mas o que me espanta é você, Frank, - ela encarava o namorado com desprezo – depois do tanto que lhe pedi para que não remexesse nessa história...



O rapaz tentou explicar:



- Mas você não percebe que eu estou querendo ajudar? Que eu estou querendo te proteger?



- Eu não preciso que ninguém me proteja. E o que você quer não é me proteger. Você quer é começar essa estúpida carreira de auror, e que história poderia ser melhor do que essa, não é?



Ele olhava para ela incrédulo. Não podia ser verdade o que ele estava ouvindo.



- Pois eu tenho uma coisa para lhe contar, Longbottom. Ser auror não é algo bonitinho e feliz, não. Para ganhar respeito você vai ter que matar, e vai se machucar, e vai machucar as pessoas a sua volta. Eu não quero ser usada como desculpa para toda essa podridão...



- Helen, ele não fez por mal... – Lílian, com muito esforço, conseguira chegar a frente daquela multidão.



Helen mordeu os lábios e, numa reação inesperada – todos achavam que ela fosse dizer poucas e boas para a amiga –, ela saiu correndo.



- Eu vou atrás dela. – disse Longbottom.



- Não. – Sirius o segurou. – Ela está nervosa. Você podem chegar a brigar de verdade. Eu falo com ela. Ela já não gosta de mim mesmo, não vai mudar em nada. Lílian vai te contar a conversa que tivemos agora a pouco. Tiago, assim que eu voltar, precisamos conversar, ok?



- Assim, que você voltar, não? Você vai me explicar isso agora.



- Tiago, agora não dá! Remo... – ele pediu algo com o olhar.



Remo entregou a Sirius um pedaço de pergaminho muito bem enrolado e Sirius saiu correndo pelo mesmo corredor que Helen atravessara a pouco. Tomando cuidado para que ninguém o estivesse vendo, ele abriu o pergaminho. O mapa do maroto indicava que Helen estava no andar de baixo, mais especificamente na sala de Transfiguração, que a esta hora estava vazia. A sala estava na penumbra, e Sirius mal conseguia distinguir a sombra das carteiras. As cortinas estavam todas fechadas, deixando o ar bastante abafado:



- Helen, eu sei que você está aqui! – ele ouviu uma fungada ressoar no fundo da sala. – Lumus!



Ela realmente estava lá, ao lado do armário da Professora McGonagall:



- Vai embora, Black!



- Não até você me ouvir.



Ela tapou os ouvidos. Ele chegou junto dela, acendeu uma vela que estava próxima com a varinha e forçou-a a ouvir.



- Quer dizer que todos nós merecemos ouvir as verdades que Helen Silver tem a dizer, menos a amiguinha dela, Lílian Evans?



- Me deixa em paz, Black! – as lágrimas começaram a surgir no rosto da menina.



- Eu não posso te deixar em paz, porque, querendo ou não, existe algo que nos une por hora. E pode ter certeza, isso me desagrada tanto quanto a você. Só que esta maldita história entre trouxas e bruxos não se limita a família Silver, ouviu? Meu pai também está enfrentando problemas por causa disso. O pai de Tiago tem acompanhado seu pai em viagens misteriosas... E como você mesma disse, aurores podem ferir as pessoas a seu redor, e eu acho que meu amigo deveria pelo menos saber porque o pai dele se meteu numa loucura dessas!



Ela chorava ainda mais...



- Que você não concorde com isso eu até entendo, garota! Mas você não pode ficar ditando como as pessoas devem agir. Não pode ir arrumando encrenca a torto e direito, falar o que bem entende e não ouvir o que os outros têm a dizer depois.



Ela estava sentada no chão e Black ajoelhado em sua frente segurando os braços da garota, mas ela parou de resistir e deixou os braços caírem, entregando-se a tristeza que sentia. E foi numa voz quase inaudível que ela respondeu:

- Eu não fui procurar encrenca, não dessa vez. É que, quando vi vocês, eu me lembrei do papel que encontrei em cima da mesa da minha tia, e me subiu um ódio... Que eu esqueci o que tinha me levado até ali... – ela voltou a cair no choro.



“Droga!, por que elas tem sempre que chorar?”, ele pensou enquanto puxava o corpo da garota para si, envolvendo-a num abraço morno e reconfortante. Ela chorava baixinho, aninhada nos braços dele. Sirius começou a acariciar os cabelos dela, enquanto sentia as lágrimas da garota empaparem sua camiseta. Aos poucos ela foi se acalmando. E foi com estranheza que ele ouviu ela dizer baixinho no seu ouvido “Obrigada!”



- Está mais calma? – ele a afastou delicadamente.



Ela acenou com a cabeça que sim.



- Você disse que não foi até lá para brigar. Então o que você foi fazer?



- Eu-eu tinha que mostrar isso para Lílian. – disse ela mostrando um envelope e o choro ameaçou voltar. Sirius limpou duas lágrimas que escorriam pela face da menina.



- Quer que eu entregue a ela?



- Não. Eu tenho que fazer isso pessoalmente. - e começou a se levantar. – Você chama ela para mim?



Ele confirmou com a cabeça. Então os dois se levantaram. Sirius apagou a vela e reacendeu a ponta da varinha. Estavam quase fora da sala quando Helen parou:



- O que foi?



- Você não quer saber o que tem aqui?



- Não. Não me diz respeito. Vamos!



Mas ela continuava parada:



- Talvez, talvez você possa me ajudar. – ela olhou para ele suplicante.



- Talvez... – ele deu de ombros.



- Sirius, - ela o estava chamando pelo primeiro nome -, converse com Tiago. Ela vai precisar muito dele.



Ele esperava ela contar. Não a apressou com perguntas...



- O pai de Lílian, ele foi...



Sirius não esperou a menina terminar:



- Assassinado... – e agora ele também parecia desolado.






O pai de Helen havia mandando uma carta semelhante a Dumbledore, por isso, quando as duas garotas, acompanhadas por Tiago Potter, entraram no escritório do diretor, tudo já estava preparado para a partida de Lílian. Arabella Figg ficou encarregada de acompanhar a garota na viagem, que seria feita por meio de Pó de Flu, direto da lareira do Três Vassouras, em Hogsmead. Assim, naquele mesmo final de tarde a ruivinha da Grifinória partia de Hogwarts para sua casa no Surrey. Sirius achou melhor esperar mais um dia antes de abrir o jogo com os colegas de quarto. Tiago estava muito abalado; além disso, encontrara a ocasião perfeita para conversarem sem o perigo de serem ouvidos. No dia seguinte seria noite de lua cheia e, como sempre, os amigos iriam para a Casa dos Gritos. Lupin só precisaria pedir a Madame Pomfrey que o levasse mais cedo, alegando alguma indisposição antecipada ou coisa parecida.

O relógio correu devagar e quando, finalmente, o marcou cinco horas da tarde na última aula da terça-feira - depois de uma sonolenta aula de História da Magia -, Remo Lupin se dirigiu à ala hospitalar do castelo. Tiago, Pedro e Sirius subiram para a torre da Grifinória; se Remo não aparecesse em meia hora era porque tinha conseguido convencer a enfermeira.



E ele conseguira. Pouco antes das seis estavam todos reunidos. Teriam cerca de duas horas antes que a lua apontasse no céu e eles todos adquirissem suas formas de cervo, rato, cachorro e lobo. Dentro da casa, Sirius olhava para a expressão desolada de Tiago.



- Bom, será que finalmente vamos saber o que Sirius Black tanto esconde? – a voz de Tiago era amarga.



Sirius olhou para Lupin, que o encorajou com o olhar, e então o batedor da Grifinória começou a relatar todas as suas observações desde o jantar na casa dos Potter. Contou aos amigos sobre a conversa entre a Sra. Figg e seu marido, de como desconfiava que Helen soubesse mais do que os tios imaginavam e como essas suspeitas se confirmaram após o escândalo que a garota dera no dia anterior. Contou como encontrou o pedaço de jornal e como aquilo lhe deu idéia de por que seu pai poderia estar envolvido.



- Mas ainda existem peças que não se encaixam...



- Como o papel do meu pai nessa história toda... – Tiago tinha o queixo apoiado nas mãos e o semblante pensativo.



- ... ou o papel do Sr. Figg. – completou Remo, que parecia ter esquecido a triste sina que o aguardava em menos de uma hora.



O terror estava estampado no rosto de Rabicho:



- Mas só estão matando trouxas, não é? Ainda não atacaram nenhum bruxo.



- Por enquanto não, Rabicho, mas se meu raciocínio estiver certo – Aluado tinha a testa franzida -, isso não deve demorar muito para acontecer. Você teve curiosidade de olhar jornais trouxas publicados antes da morte de Marianne Silver, Almofadinhas?



- Na verdade, eu só achei o jornal ontem, e, com tudo que aconteceu... – ele olhou para Tiago, que mordia os lábios, de olhos fechados. – Mas você está achando que eles já matavam trouxas antes?



Remo confirmou com a cabeça e continuou a dedução:



- Bem, essa é uma possibilidade. Talvez já estivessem acontecendo esses desaparecimentos – ele evitava usar a palavra assassinato. – Só que os bruxos só começaram a notá-los depois que uma trouxa de forte presença no mundo mágico sumiu. E se eles já estão atacando trouxas ligados a bruxos, porque então não poderiam atacar os próprios bruxos?



- Durante as férias meu pai comentou que a fobia entre bruxos e trouxas anda aumentando assustadoramente. Isso foi antes de eu ir para casa do Pontas, então eu não tinha feito qualquer ligação entre os dois casos. – Sirius comentou. - Parece que há alguns grupos radicais dispostos a cortar qualquer tipo de relação com o mundo trouxa.



Os quatro rapazes demonstravam seu nervosismo em pequenas atitudes. Pedro mordia a própria gravata, provavelmente tentando disfarçar os dentes rangendo; Remo não parava de apertar as próprias mãos e morder os lábios; Tiago continuava com o queixo apoiado na mão e a testa visivelmente franzida, como quando procurava o pomo-de-ouro num jogo de quadribol; e Sirius andava de um lado para o outro, apertando com força o mapa do maroto que estava em suas mão. Por sorte tinham lançado um feitiço de resistência e durabilidade no pergaminho, ou ele já teria esfarelado de tanto que o rapaz o amassava.



- Sirius, você trouxe o tal recorte de jornal? – Remo parecia ter pensado em alguma coisa.



Sirius confirmou com a cabeça e tirou o papel dobrado do bolso da calça; por sorte, Lílian não tinha ficado com ele.



- Hmmm... Causa mortis desconhecida... Droga, eu imaginei que pudéssemos descobrir alguma coisa através do tipo de magia usado. – Remo estava frustrado. Mas em compensação, Tiago parecia ter finalmente encontrado seu “pomo-de-ouro”.



- Mas é lógico! Como eu não pensei nisso antes?



Os outros três voltaram-se para Tiago, esperando que ele contasse logo que era tão óbvio:



- Meu pai... Meu pai está tentando descobrir o tipo de magia usado para matar estes trouxas... Meu pai é um alquimista, o trabalho dele é pesquisar feitiços, poções, antídotos. Com certeza ele foi chamado pelo Ministério para dar um parecer sobre o caso. O pai de Helen é auror, não é? Deve ter ido junto para garantir a segurança dele e do Sr. Figg. Ou então, se ele estiver envolvido nas investigações, para dar detalhes do caso, de como as vítimas foram encontradas...



Aquela conversa sobre vítimas e assassinatos começava a deixar Rabicho enjoado; mais um pouco e ele começaria a colocar o jantar, comido às pressas, goela a fora. Remo e Sirius, no entanto, olhavam-se radiantes de alegria. Estavam conseguindo desvendar aquele mistério!

- Está bem, Pontas! O trabalho de seu pai só pode ser esse. Mas agora pense no Sr. Figg. – Remo tentava conduzir o raciocínio do amigo. – No que é que ele trabalha?

- Eu não consigo me lembrar... Sei que ele é francês...

- Ele não trabalhava em Gringottes, Pontas? – Sirius lembrava-se que a Sra. Figg tinha comentado qualquer coisa a esse respeito no dia do jantar.

- Trabalha. Mas eu não consigo lembrar fazendo o quê. – ele desanimou outra vez.

- Tudo bem. Já tivemos alguns avanços hoje. Acho que deveríamos distribuir o trabalho entre nós quatro, para agilizar o processo – Remo propôs.

- Peraí, esse é o trabalho de DCAT deles, Aluado! – Pedro resmungou. - Nós vamos acumular dois trabalhos desse jeito!



Sirius olhou incrédulo para a figura redonda do amigo:



- Como é que é? Acho que eu não entendi... Você tá reclamando de ajudar a gente? Rabicho, quantas vezes você recebeu nota às custas de um trabalho feito por um de nós três?



- Mas isso vai dar trabalho...



- É lógico que vai dar trabalho! – Tiago tinha se irritado. – Se não fosse dar trabalho nós não precisaríamos de ajuda.



Rabicho emburrou num canto. Remo tentou consertar:



- A gente dá um jeito. Eu e a Bonnie combinamos de fazer a pesquisa sobre magia negra. Vou tentar dar um jeito de estudar feitiços proibidos, especialmente os fatais...



- Quê? Você não vai fazer comigo? – Rabicho tinha os olhos arregalados em cima de Aluado.



- Ah, Rabicho, se liga! E o Aluado ia dispensar a companhia da gatinha da Bonnie Kudrow para fazer o trabalho para você? – Sirius descontou a má-vontade do colega.



- Eu não tive como negar o pedido dela... – Remo tentava se desculpar.



- Bom, parece que o Rabicho vai ter que fazer o trabalho com a Winslet. Porque eu duvido que a Sarah e a Melissa já não tenham combinado de fazer juntas... – a raiva de Tiago tinha passado.

Rabicho olhava o chão desesperado:



- Não pode ser! Aquela garota é uma megera. Já viram a fúria com que ela arremessa a goles nas partidas de quadribol? - os outros três riram. – Ela só não é pior que a Silver...



- E por falar em Silver... – Tiago lançou um olhar maroto para Sirius. – Vai, confessa, teu interesse na baixinha vai além de desvendar esse mistério, não é?



- Ficou doido, Tiago? Vocês sabem muito bem qual é meu tipo de mulher...



- Julianne Andrews? – Remo piscou para o colega.



- Também. Mas os verdadeiros monumentos da escola estão na Corvinal.



- Claire Brightman?



- Nicole Ormond?



Tiago e Remo arriscavam nomes; Rabicho continuava emburrado.



- Não, essas já deram pro gasto! (Por que ele tem que ser tão safado?!)



Ultimamente eu ando apreciando as qualidades da ex-futura-cunhada do Aluado: Carol Stuart!



- Ei, lembrei! – Tiago deu um pulo.



- Da Carol? E quem consegue se esquecer daquela garota?



- Não, Almofadinhas! Lembrei o que o Sr. Figg faz em Gringottes. Ele é tradutor!



- E no que isso ajuda? – Pedrinho resolveu abrir a bico outra vez.



Mas a conclusão final saiu das bocas de Aluado e Almofadinhas quase que ao mesmo tempo:



- Ele traduz feitiços em outras línguas!








Helen finalmente aceitara conversar com Longbottom. Já fazia quase uma semana que haviam brigado.



- Você não entende que está brigando por uma bobeira?



- Não é uma bobeira, Frankie. Tem pessoas morrendo e você vai acabar sendo uma delas se não parar com essa mania de detetive. – ela não olhava para ele; encarava o chão, bastante triste.



- Helen, eu vou te dizer isso mais uma vez. Fingir que não tem nada acontecendo não vai proteger ninguém.



- Eu não quero que ninguém finja. Só não quero que ninguém que eu ame se envolva nessa sujeira toda. Já basta perder minha mãe. Não preciso perder mais ninguém.



- Eu não vou abrir mão. E você sabe que pode ajudar...



- Eu ajudo melhor mantendo você longe disso tudo. E se isso significa manter você longe de mim, então eu prefiro assim.



- Eu não acredito que você quer terminar tudo pelo seu medo idiota. Eu não vou desistir por causa de uma chantagenzinha boba como essa.



Ela estava perplexa. Ela jamais pensara em chantagem. Só não queria sentir toda aquela culpa outra vez. Porque ela sabia que a morte do pai de Lílian era culpa de seu pai. Sabia que aquela morte havia sido um aviso, para que Henry Silver parasse de se intrometer. E se eles descobrissem tudo o que ela sabia, começariam a tirar as pessoas que ela amava. Por isso ela nunca ia contar a ninguém. A ninguém.



- Então... Acaba assim?



- A decisão é sua? Você sabe que eu não quero terminar.



Ela se levantou da mesa da biblioteca. Estavam só eles dois naquele canto escondido. Frank acompanhou-a com o olhar até a menina sair. Ela não olhou para trás.






- Eu me esqueci do gato. – Sirius se deu um tapa na testa.



Ele, Remo e Pedro estavam na Aula de Trato das Criaturas Mágicas. Tiago matara aula para ficar com Lílian, que tinha acabado de voltar para o castelo após uma semana em casa.



- Gato? Que gato? Ficou doido? Tem uma esfinge na tua frente e você tá vendo um gato? – Pedro achou que Sirius andava contrabandeando cerveja amanteigada do Três Vassouras.



- Não, estúpido. Tô falando do shadowcat da Silver. Eu lembro claramente do tio dela falando que eles precisavam do gato. Foi por isso que levaram ela para o Norte.



- Cê não esquece esse assunto nunca, não?



Sirius olhou feio para o colega de casa. Os três falavam aos cochichos.



- Vou ter que concordar com Pedrinho, Sirius. Vai com calma! Além do mais, a Lílian voltou hoje e o Tiago ficou de conversar com ela sobre o assunto. Vocês iam fazer a pesquisa em conjunto, não é? – Sirius confirmou, ainda emburrado pelo corte dos amigos. – Quem sabe ela e o Longbottom não sabem de algo sobre o gato?








Lílian ainda não falara uma palavra desde que Tiago a encontrara na sala comunal aquela manhã. Ele respeitou o silêncio dela; não conseguia imaginar qual seria sua atitude se seu pai tivesse morrido. De repente, ela se desencostou do peito dele parou, costas eretas, narizes a um palmo de distância um do outro. Ela tirou-lhe os óculos, devagar, sem sair um centímetro daquela posição; então pôs-se a encará-lo. Mas seus olhos não tinha ternura ou tristeza. Tiago sentia que ela estava apreensiva, e sem pensar no que estava dizendo:



- Fique tranqüila! Ninguém vai me tirar de você!



Os olhos verde-esmeralda expressavam gratidão. O rapaz não pensou em mais nada. Chegou os lábios bem próximos dos dela e deu-lhe um beijo terno e morno, que pareceu livrar a menina de toda a tristeza que ela carregava na alma. Depois os dois se deixaram ficar ali, naquela poltrona, os cabelos vermelhos de Lílian desarrumados sobre o peito de Tiago. Não precisavam pensar em nada.

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