O menino da varíola de dragão

O menino da varíola de dragão



Na medida do possível, todos foram se adaptando àquela casa. Eles haviam limitado o contato com as pessoas ao seu redor e os novos momentos se passavam reservados no interior daquele chalé. As lembranças de Mould-on-the-Wold nunca deixaram suas mentes e, por vezes, imaginavam como teria sido se nada tivesse acontecido de ruim, não teriam que mentir e omitir. A nova imagem da família parecia ter feito com que os próprios vizinhos, com um tempo, também não tentassem se comunicar muito com eles; Batilda não retornou... e meses se passaram...


 


- Para trás Alvo! – disse Kendra. – Não vá, Aberforth!


O semblante de Ariana mudara... estava sentada no chão e encostada à parede da sala. Encarava os três parentes com uma mistura de sentimentos depreciativos e, entretanto, transparecia medo. Evitava o contato a qualquer um.


- Ari, escute minha voz... Sou sua mãe. Venha comigo. Vamos, dê-me um abraço! – disse Kendra gentilmente se aproximando da filha.


Ariana encolheu-se. Um vaso, equilibrado em cima da mesa, estourou repentinamente. Manteve-se séria; seu olhar, apreensivo, analisava a mãe. Não... Não era a mesma menina...


- Filha, vamos... um abraço.


- SAIA DAQUI!  – berrou de forma estridente.


Aberforth estava lívido. De fato era o que mais se preocupava com estas mudanças de sua irmã. Tentava fazer algo para assistir sua mãe, não via meio de realiza-lo...


 - Ari, acalme-se, não há nada aqui... Venha com a gente... Venha... – suplicou Aberforth tentando a aproximação.


A garota apertou os joelhos contra si e abaixou a cabeça.


- Faça parar! Não quero mais isso! Saiam! Saiam! – sua voz saía abafada por detrás de toda aquela proteção. – Parem!


O medo alterara seu tom de voz, que agora soava assustado.


- Eu não consigo... não posso fazer... não sei – dizia. – Por favor, não me machuquem porque não consigo! Por favor...


- Ariana, acalme-se, não iremos machucá-la – pediu Kendra tentando se aproximar.


- NÃO! Não chegue... PERTO! – fez com que o ambiente estremecesse.


- Ari, sou eu: Aberforth! Eu te amo, Ari!


- Não minta! Você vai tentar me forçar a fazer aquela pedrinha flutuar! Eu não sei! – sacudia freneticamente o dedo em algum direção sem sentido.


- Não estou mentindo, nem vou forçá-la... Venha para cá, Ari. Venha... Vou contar uma história... Descanse um pouco conosco.


Enquanto ele se aproximava devagarinho, a sala estremeceu novamente. Alvo observava a ação do irmão, mas tinha o pressentimento de que seria em vão, e sua suposição confirmou-se quando a menina fez o garoto tombar para trás.


- EU DISSE NÃO!


- Ele é seu irmão, não faria mal a você, filha.


Não houve resposta.


- Ariana, olhe para mim – pediu Aberforth que já se pusera de pé.


A vidraça da janela sobre Ariana estourou, e os cacos espalharam-se pelo chão.


- NÃO ME MACHUQUEM!


- Não fizemos nada – disse Aberforth, que havia se afastado para não ser atingido pelos fragmentos de vidro.


- Não! MANDE-OS PARAREM! PAREM! ESTÃO ME MACHUCANDO!


Ela colocou a mão na cabeça a apertou os olhos, como se algo a perturbasse em seu outro mundo. Bateu os pés no chão, nervosa, e acabou os ferindo ao ter a pele perfurada por cacos. Permaneceu falando sozinha com provavelmente alguém que via em sua mente.


- Ariana! – chamou forte a voz de Aberforth. – Olhe para mim! – disse com certo tom de autoritarismo.


A menina levantou o olhar para o irmão, segundos depois estava debulhando-se em lágrimas. Aberforth foi ao encontro dela e a abraçou com ternura. Ela continuou soluçando, olhava suas próprias mãos sangrando. O garoto a carregou para longe daqueles cacos de vidro.


- Acalme-se, Ari...


Longe do olhar de Ariana, a mãe brandiu a varinha de leve e o vidro espatifado se juntou novamente, retornando ao lugar em que deveria estar. Em momentos como aquele, a mãe não poderia usar magia diante da filha. Caso o fizesse, Ariana poderia retornar àquela espécie de transe. Foi até a cozinha pegar alguma coisa para limpar os ferimentos da filha.


Retornou com uma pinça, um pano, e um pequeno balde com água e sabão. Como uma cirurgiã, retirou rapidamente os fragmentos de vidro que perfuravam a sola do pé de Ariana, que nem ao menos reclamou. Molhou, então, o pano na água com sabão.


- Pode arder um pouco...


Alvo aproximou-se e voluntariou-se a limpar os ferimentos no lugar da mãe. Ele sentia que ela havia, enfim, voltado ao normal... Simplesmente, não conseguia ajudar quando ela tinha um daqueles ataques... Muito menos conseguia esquecê-los...


Alvo acordou daquela lembrança em sua cama. O alívio veio quando percebeu ser apenas um pesadelo, apesar de ter, de fato, ocorrido fazia alguns dias, e por mais que fosse um sonho; ele ainda ouvia seus gritos.


Levantou-se, sabendo que não retornaria a dormir e pegou seus óculos em cima da escrivaninha, ajeitando-os no nariz. Desceu as escadas, viu que ninguém tinha acordado ainda, ficou sozinho na sala, sentado em uma poltrona remendada.


Desde os dez anos de idade, já apresentava algumas falhas na visão, denominada pelos trouxas de miopia e que possivelmente fora herdada dos antepassados de sua parte materna, que não possuíam poderes mágicos. Comprara seus óculos logo após a prisão de seu pai.


Em momento algum dos dias que passaram desde sua mudança, ele esqueceu-se de seu pai. Nove meses já haviam se passado, e nem sequer uma notícia sobre Percival. O destino mostrava que era necessário superar aquele acontecimento, pois, como dissera sua mãe: viver do passado não é a melhor saída para a realidade.


Enquanto isso... perdia as esperanças quanto a cura dos ataques de Ariana...


Foi até a cozinha e aproveitou para deixar a mesa com o café da manhã pronto. Alvo sentou-se à cabeceira da mesa, voltando-se aos pensamentos; seu corpo permaneceu ali enquanto a mente viajou até a Hogwarts que fantasiava a partir das histórias de sua mãe.


Apenas quando sua mãe entrou na cozinha que teve de retornar à realidade.


- Algum motivo para isso? – sorriu ao ver a mesa arrumada.


- Não. Eu achei melhor poupar seu trabalho – respondeu retribuindo o sorriso. – Acordei mais cedo e, já que não consegui voltar a dormir, desci e fiquei aí na sala; preferi, então, deixar o café pronto para vocês.


Meia hora depois, todos já se encontravam apreciando a refeição matinal silenciosa. Contudo, o silêncio teve seu fim devido a um pio e batidas na janela da cozinha: uma coruja marrom bicava a vidraça na esperança de entrar no cômodo. A ave trazia consigo uma carta.


Alvo adiantou-se para abrir passagem à ave, que deixou a carta em suas próprias mãos e logo saía por onde entrou. Estava endereçada a ele. Teve certeza do que se tratava quando a revirou e viu o selo vermelho carregando o emblema de Hogwarts. Não tardou a enviar uma carta-resposta. Como queria que seu pai estivesse vivendo aquele com ele...


Passou a tarde terminando a leitura de um livro sobre a revolta dos duendes irlandeses, acomodado em uma confortável poltrona na sala de estar ao lado da lareira. Escutava a chuva castigar o vidro das janelas de seu quarto e acalmava-se com o som dos trovões que iluminavam as densas nuvens que escondiam o sol. Apreciava-a inexplicavelmente e admirava a beleza das descargas elétricas entre as nuvens e o solo.


A noite chegou gélida; a chuva já havia amenizado. Ainda encontra-se sentando no mesmo ambiente iluminado pela luz dos lampiões da rua que entrava pela vidraça da janela. O livro descansava no colo e os olhos estavam fechados em uma meditação.


A corpulenta Kendra adentrou a sala seguida pelos seus outros dois filhos, que se sentaram no chão, e se alojou perto deles e Alvo. Abriu o livro empoeirado.


- Qual história quer, Ariana, querida? – perguntou gentilmente.


- O que acha, Abe? – a menina virou-se para o irmão.


- Bodalhão, o Bode Resmungão – respondeu sem hesitar.


- E você, Al? – perguntou a menina para o outro irmão.


- O Conto dos Três Irmãos.


- Não... Sendo assim, vou contar outra que Ariana não conhece. Contudo, Aberforth e Alvo já conhecem – e sorriu –, o Bruxo e o Caldeirão Saltitante.


- Era uma vez um velho bruxo muito bondoso que usava a magia com generosidade e sabedoria para beneficiar seus vizinhos. Em vez de revelar a verdadeira fonte do seu poder, ele fingia que suas poções, amuletos e antídotos saíam prontos de um pequeno caldeirão que ele chamava de sua panela da sorte. De muitos quilômetros ao redor, as pessoas vinham lhe trazer seus problemas, e o bruxo, prazerosamente, dava uma mexida na panelinha e resolvia tudo.


- Eu gostaria de ter esta panela... – comentou Ariana dócil.


- Esse bruxo muito querido viveu até uma idade avançada e, ao morrer, deixou todos os seus bens para o único filho. O rapaz, porém, tinha uma natureza bem diferente da do bom pai. Na sua opinião, quem não sabia fazer mágicas não valia nada, e eles muitas vezes discordara do hábito que o pai tinha de ajudar os vizinhos com sua magia. – hesitou por instante. – Quando o velho morreu, o jovem encontrou escondido no fundo da velha panela um embrulhinho com o seu nome. Abriu- na expectativa de ver ouro, mas, em lugar disso, encontrou uma pantufa grossa e macia, pequena demais para ele e sem par. Dentro dela, um pedaço de pergaminho trazia a seguinte frase: “Afetuosamente, meu filho, na esperança de que você jamais precise usá-la”.


“O filho amaldiçoou a caduquice do pai e atirou a pantufa no caldeirão, decidindo que passaria a usá-lo como lixeira... Naquela mesma noite, uma camponesa bateu à porta da casa.”


“Minha neta pareceu com uma infestação de verrugas, meu senhor. O seu pai costumava preparar um cataplasma especial naquela panela velha, disse a senhora. Mas o filho do bruxo exclamou para que ela saísse de lá e indagou: que me importam as verrugas da sua pirralha? E bateu a porta na cara da velha.”


- Que mané! – disse Aberforth deitando-se no chão.


- Na mesma hora, ele ouviu clangores e rumores que vinham da cozinha. O bruxo acendeu sua varinha e abriu a porta, e ali, para seu espanto, viu que brotara um pé de latão na velha panela do pai, e o objeto pulava no meio da cozinha fazendo uma zoada assustadora no piso de pedra. O bruxo se aproximou admirado, mas recuou ligeiro quando viu que a superfície da panela estava inteiramente coberta de verrugas.


“Objeto nojento! Ele exclamou, e, com feitiços, tentou primeiro fazer desaparecer o caldeirão, depois limpá-lo e, por fim, expulsá-lo de casa. Nenhum dos feitiços, porém, fez efeito, e ele não pôde impedir o caldeirão de segui-lo saltitante para fora da cozinha, e depois de subir com ele para o quarto, alternando batidas surdas e estridentes a cada degrau da escada de madeira.”


- ARGH! – exclamou Ariana. – Quem o mandou não ajudar à senhora?


Aberforth sorriu.


- O bruxo não conseguiu dormir a noite toda por causa das batidas da velha panela verrugosa ao lado de sua cama, e, na manhã seguinte, a panela insistiu em acompanhá-lo, aos saltos, à mesa do café-da-manhã. Plem, plem, plem fazia o pé de latão, e o bruxo ainda nem começara o seu mingau de aveia quando ouviu outra batida na porta; havia um velho parado na soleira.


“O velho explicou sobre uma velha jumenta dele que perdeu-se ou foi roubada, e sem ela não poderia levar os produtos ao mercado e a família passaria fome hoje à noite. O outro apenas bradou, antes de bater a porta na cara do velho: com fome estou eu agora!”


“Plem, plem, plem fez o caldeirão no chão com aquele seu único pé de latão, mas agora o estrépito se misturava aos zurros de um jumento e aos gemidos humanos de fome que vinham de suas profundezas. Todos os seus poderes mágicos não conseguiram calar a panela verrugosa, que o seguiu saltitando o dia todo, zurrando e gemendo e clangorando, aonde quer que ele fosse ou o que quer que fizesse. Mas, naquela noite, uma jovem mulher  soluçando bateu em sua porta dizendo que seu filhinho estava gravemente ferido; a mulher mal acabara de explicar e o bruxo bateu a porta na sua cara, e a panela começou a derramar lágrimas.”


“Embora, pelo resto da semana, nenhum outro aldeão tivesse vindo à cabana do bruxo buscar ajuda, a panela o manteve informado dos seus muitos males. Em poucos dias ela não estava apenas zurrando, gemendo, transbordando, pulando e brotando verrugas, mas também engasgando e tendo ânsias de vômitos, chorando como um bebê, ganindo feito um cão e cuspindo queijo estragado, leite azedo e uma praga de lesmas vorazes...”


- É porque este cara é uma anta! Será que não entendeu o que era pra fazer? – comentou Aberforth a risadas.


- E como ele dormia? – perguntou Ariana.


- Não deveria dormir, não é mesmo? – respondeu Kendra parando por mais um instante antes de continuar. – Por fim, não agüentou mais, fugindo noite adentro, com a panela em seu encalço, gritando para que todos trouxessem os problemas até ele e ele os resolveria. E, com detestável panela ainda a persegui-lo saltitante, ele correu pela rua principal lançando feitiços para todos os lados.


“Dentro de uma casa, as verrugas da garotinha desapareceram enquanto ela dormia; a jumenta perdida foi trazida de um urzal distante e suavemente deixada em seu estábulo; o bebê doente foi umedecido com ditamno e acordou bom e rosado. Em todas as casas em que havia doença e tristeza, o bruxo fez o melhor que pôde, e gradualmente a panela ao seu lado parou de gemer e ter ânsias de vômito, e sossegou, reluzente e limpa.”


“Ela arrotou o pé de pantufa que ele havia jogado em seu fundo, e permitiu que o bruxo o calçasse em seu pé de latão. Juntos, eles regressaram à casa, os passos da panela finalmente abafados. Mas, daquele dia em diante, o bruxo passou a ajudar os aldeões exatamente como fazia seu pai, antes dele, para que a panela não descalçasse a pantufa e recomeçasse a saltitar.”


-... e fim.


- Algumas partes desgostosas... como aquela do vômito! – Ariana fez uma careta.


- Mais uma história em que, através da benevolência do senhor para com seus vizinhos não-mágicos, Beedle demonstra a saudável relação harmônica entre bruxos e os humanos ordinários.


- Ou seja, não dê esperanças a um caldeirão amaldiçoado! – disse Aberforth ironicamente e calou-se sob o olhar da mãe.


- Claro que isso foi um modo do velho bruxo testar a humanidade de seu filho. A mensagem que passa aqui é bem clara e objetiva: nunca seja egoísta consigo, seus atos vêm seguidos de consequências, ou seja...


-... se você ajuda pessoas, cultiva o bem, as consequências serão positivas para você, se você é realmente egoísta, pode acabar provando o próprio veneno. – completou Alvo, interrompendo a mãe.


- Bem... Agora, está na hora de dormir. Aberforth e Ariana, para a cama! – disse a mãe se levantado e, depois que os dois havia se retirado para seus quartos, dirigiu-se para Alvo. – Alvo, semana que vem iremos ao Beco Diagonal, certo?


- Corretíssimo – concordou com um sorriso. – Bem... Acho que está na hora de dormir também... Boa noite, mãe. – Sabia o objetivo daquele conto. Talvez ajudasse Ariana ao instiga-la a pensar nos indivíduos não-mágicos como iguais e esquecer um pouco seu tormento.


E se retirou, subindo as escadas.


 


 


O dia de sua visita ao Beco Diagonal fora muito esperado.


Utilizaram a lareira de casa para chegar ao Caldeirão Furado. Passaram pelo barman e se encaminharam, sem mais demoras, para uma porta ao fim do bar, entrando em um beco. Pouco se impressionou quando a mãe bateu nos tijolos da parede adiante e eles se moveram para os lados, abrindo um buraco e formando um arco, a entrada para uma movimentada rua.


Caminhou por aquela rua de paralelepípedos e logo se deparou com o majestoso banco bruxo, que era levemente inclinado para o lado.


Na entrada do lugar, de cada lado de um portão de bronze, encontravam-se seres atarracados com expressão séria. Seus pés e mãos eram muitos compridos e possuíam uma barbicha em ponta. Entraram na construção e ao final de um curto saguão encontrava-se outro portão, só que desta vez de prata, onde reluziam alguns dizeres de alerta aos gananciosos e possíveis ladrões.


As portas se abriram para um imenso salão de mármore, onde duendes caminhavam para todos os lados carregando pilhas e pilhas de pergaminhos. Muitos estavam sentados sobre bancos altos, concentrados na escrita. Ao final do cômodo havia um duende de aparência mais velha; possuía o mais comprido nariz e o aspecto mais rude de todos. Ficou observando-os enquanto sua mãe conversava com o duende-ancião. O silencio era quebrado regularmente por palavras que soavam estranhas, provenientes do gargulês – língua nativa dos duendes – e surgiu um desejo de poder se comunicar a eles no mesmo dialeto.


- Alvo! – chamou a mãe.


O garoto foi ao encontro de Kendra. Os dois acompanharam outro duende de aparência cansada e idosa. Os três mergulharam em um cenário cavernoso, até estarem, praticamente, no subterrâneo. Entraram em um carrinho preso a um trilho muito parecido a um trilho de trem. O duende se acomodou em um banco à frente e o carrinho deu partida avançando pela caverna rapidamente. Havia uma espécie de plataforma em cada lado e várias portas sem maçanetas – provavelmente os cofres – que passavam velozes por eles enquanto avançavam na quase escuridão capaz de causar calafrios.


O carrinho parou com um tranco e Alvo foi o primeiro a saltar. Estava diante do cofre de número 588. Ao duende abrir o cofre, notou o pouco de dinheiro que dispunha: algumas pilhas de moedas de prata e outras de moedas de ouro de onde a bruxa pegou o que precisava.


Em pouco tempo estavam de volta à superfície, encarando a movimentada rua novamente, e Gringotes atrás dos dois. Rumaram até a última loja, estreita e de aspecto antigo, chegava a ser feia. Na porta estavam destacadas letras de ouro que diziam Olivaras: Artesão de Varinhas de Qualidade desde 382 a.C.


Entrou na loja e deparou-se com um lugar mal-iluminado, porém nada semelhante aos cofres de Gringotes. Olhou as várias e várias prateleiras que começavam logo após uma escrivaninha próxima à entrada e subiam até o teto. Caixinhas pretas estavam nelas empilhadas; eram cobertas por uma crosta de poeira. Era possível sentir um cheiro forte de mofo, conferindo, além de tudo, um aspecto de mal-cuidado.


Um senhor levemente curvado aproximou-se dos dois. Seus bigodes e cabelos acinzentados não apresentavam vida; não obstante, seus olhos eram de um cinza melancólico, grandes e destacados, ainda mais pelos óculos de fundo de garrafa que usava. Sua voz, por outro lado, demonstrava firmeza e sabedoria ao se apresentar como Olivaras.


-... e vejo que vieram para comprar a varinha do jovem rapaz – completou com um rápido aceno de cabeça na direção de Alvo. – Você, meu jovem... possui um ar de sabedoria e. mais do que isso... curiosidade... Sabe de que são feitas as varinhas?


Sinceramente, Alvo nunca pensara antes sobre as varinhas, e isso lhe rendeu uma breve aula do senhor bruxo, que finalizou o assunto abruptamente, perguntando qual era o braço da varinha e imediatamente pondo-se a tirar as medidas.  Em seguida começou a oferecer distintas varinhas para teste e, após algumas tentativas, um calor perpassou pelo seu corpo e da ponta da varinha saíram faíscas.


Ébano, cordas de coração de dragão, vinte e oito centímetros, rígida... ela me escolheu... riu consigo.


Enquanto pagava pela varinha sua mãe já o esperava do lado de fora para que pudessem comprar suas vestes. De todas as lojas, o que realmente o chamou a atenção foi a Floreios e Borrões, imensa livraria na qual perdeu boa parte de seu tempo desfrutando dos livros os quais o administrador deixou-o ver. Sua mãe havia comprado os livros didáticos de segunda mão, pois após a prisão de Percival, a situação financeira estava cada vez mais complicada; e como havia lhe interessado a biblioteca, Kendra deixou-o lá para terminar o resto das compras.


Quando retornou, empurrava um carrinho com as compras onde, no topo, estava um recipiente que continha um sapo vivo – desculpou-se por não ter dinheiro suficiente para uma coruja. Alvo deixou a livraria com intuito de retornar algum outro dia lá, quando pudesse.


 


 


Alvo passou o resto das férias lendo os livros que usaria naquele seu primeiro ano em Hogwarts. Sabia na teoria quase todos os feitiços e até já os praticara, conseguindo, em relativamente pouco tempo, dominar boa parte deles. Pouco falara com seu irmão ou sua irmã durante aqueles dias que se seguiram, parecia isolado do mundo no instante em que lia incansavelmente as páginas manchadas de seus livros.


Particularmente, olhava com distinto interesse ao intitulado História da Magia. O nome da autora – Batilda Bagshot – era o mesmo de sua vizinha que tentara dar-lhes boas vindas no segundo dia de sua estadia em Godric’s Hollow.


Nos últimos dias, Aberforth comportara-se de forma grosseira em relação a Alvo. O irmão deduziu que era um sintoma de sua impaciência, já que teria de esperar mais três anos para ir à Hogwarts. Ariana, felizmente, não sofreu de mais nenhum acesso de magia desde então.


A cada dia que se passava, Alvo começava a sonhar acordado com a escola. Seus pais uma vez comentaram sobre as quatro casas; Percival fora da Grifinória, enquanto sua mãe, da Corvinal.


“Um bruxo depende, principalmente, de suas escolhas, do caminho que escolher trilhar. De cada casa saíram bruxos famosos e influentes; apenas a ganância por poder, que acaba convergindo para as artes das trevas, é capaz de corromper um bruxo. Por exemplo, mesmo que a Sonserina apresente seu passado negro de mentes malignas, não é motivo para que todos sigam este mesmo caminho, ocorre somente por causa das más influências que a maioria recebe.”


E agora estava sentado na cadeira antiga de seu quarto, observando sua ampulheta. Seu malão já se encontrava arrumado; faltavam algumas horas para o embarque no Expresso de Hogwarts. Era incrível como conseguia enxergar cada grão de areia cair lentamente...


Mais cedo sua mãe tivera uma conversa com ele sobre a reportagem de Percival – que fora noticiada pelo menos umas três vezes no Profeta Diário – e o provável efeito sobre as várias famílias cujos filhos cursam Hogwarts, principalmente as de sangue trouxa. “Fomos julgados anti-trouxas precipitadamente... mas quantas injustiças não são feitas e devemos, por motivos superiores, suprimir?


Quando você entrar em Hogwarts, inegavelmente, seu nome revelará que você é parente de Percival. Isso pode causar reações em muitas pessoas e, contudo, será um obstáculo que, acredito, você conseguirá superar, apesar de não poder negar os fatos e, em hipótese alguma, dizer os verdadeiros motivos. Entendeu-me, filho?


A prateleira de seu quarto tinha vários livros, todos envelhecidos pelo tempo e, no entanto, bem-cuidados. Sua mãe que lhe repassara a maioria, alguns de até mil e tantas páginas. Seu zelo por todos era devido ao que representavam: conhecimento e anos de estudos e pesquisas, assim como a imaginação que muitos detinham grafada em suas páginas. “Quando um autor escreve um livro, ele deixa suas próprias impressões e conceitos e é isso que dão a cada livro um toque distinto”, dizia Kendra.


Tantos autores... faria qualquer coisa para poder conversar com pessoas ilustres, trocar ideias e aprender sobre as diversas coisas que existem no mundo da magia... ah! se ele pudesse...


A porta abriu-se e Ariana entrou, com seu passo macio e seu sorriso meigo e gentil. Seu olhar recaiu sobre o malão, e então perguntou:


- Você já vai, não é?


- Sim.


- Para a escola bruxa Hogwarts?


- Sim – confirmou novamente Alvo.


- E você volta quando?


- Natal, ou então somente daqui a um ano.


- Tanto tempo assim? – Ariana abaixou o olhar para o chão, entristecida.


- Desculpe-me, Ariana... – disse aproximando-se da irmã e ajoelhando-se em sua frente para poder olhar em seus olhos –... mas é minha chance de começar a minha vida de verdade... mamãe e Aberforth estarão aqui.


- Sentirei sua falta do mesmo jeito, Al... – manteve a cabeça baixa.


- Ari, manterei contato através de cartas. Prometo, estarei aqui no Natal para nós passarmos juntos essa época, O.k.?


- O tempo aqui passará mais devagar do que o seu lá... você vai esquecer seus problemas e...


- Não vou me esquecer de você! A minha família é o que mais importa pra mim! – interrompeu Alvo com firmeza na voz.


- E se... – uma lágrima pingou no chão.


- Calma, Ariana... Voltaremos a nos ver. Isso não é um adeus.


Dumbledore tinha um carinho especial por sua irmã. Tão pequena e tão inteligente, era como se o visse refletido em um espelho, onde o seu outro eu fosse feminino. Contudo, quem realmente cuidava dela era Aberforth, quanto a isso nunca pode negar.


O abraço pareceu durar uma eternidade, enfim, a voz de Kendra chamou a irmã que teve que quebrar aquele momento de ternura familiar para atender ao chamado, deixando Dumbledore sozinho em seus pensamentos.


Será que não dei a atenção devida à Ariana?...


 


 


Às dez horas, Alvo já se encontrava na sala com o malão ligeiramente ao leu lado. Poucos minutos depois, Kendra apareceu ao pé da escada, trajava vestes simples. Ela foi à cozinha enquanto Alvo despedia-se dos irmãos. Alvo abraçou Aberforth e fez votos para que ficasse bem em casa. Ariana voltara a chorar e Aberforth foi ampará-la.


- Se cuida – disse Aberforth, que até o momento não havia lhe dito nada, e abriu um leve sorriso travesso.


Aquele momento que se seguiu foi algo tão transitivo, em que se via deixando sua própria casa para um novo começo, indo para um novo lugar, onde aprenderia coisas novas, conheceria novas pessoas, nunca deveria se esquecer dos que deixou em Godric’s Hollow e esperava encontrá-los saudáveis quando retornasse.


Tudo pareceu acontecer em questão de instantes. Deixara a calma do vilarejo bruxo. Estava em meio à confusão da agitada Londres. Trouxas apressados, outros despreocupados.


Seguiu sua mãe por entre as ruas. Empurrava um carrinho com seu malão. Viu-se diante a uma bela construção: a estação ferroviária denominada King’s Cross. Kendra retirou do bolso um bilhete e o entregou a Alvo que, após lê-lo, o guardou cuidadosamente no bolso. “Plataforma nove e meio”, repetiu para si.


Era incrível que simples trouxas pudessem ter construído algo tão belo quanto aquele lugar. Já estavam chegando perto das plataformas, procuraram agir como simples humanos – haviam até se vestido como eles para não desdenharem. Kendra acelerou o passo quando estavam entre as plataformas nove e dez, olhou de leve para os lados, e disse rapidamente:


- Vá em direção a barreira entre as plataformas nove e dez, não se preocupe com a colisão e... vá!


Alvo estava bem perto já da barreira, deu apenas um impulso para dentro. O que deveria ser um encontrão doloroso, não ocorreu; ao invés disso, ele atravessou-a e saiu em outra plataforma onde uma locomotiva de aspecto antigo. Na entrada havia uma placa anunciando: “Plataforma 9½”.


Logo, sua mãe atravessara a barreira, aparecendo atrás dele.


- Nada mal, não? – perguntou com um sorriso.


Alvo não estava impressionado com a mágica da pilastra, para ele aquilo fora algo tão natural, apesar de nunca antes ter tentado, no mundo da magia aprendeu a nunca a se comover com as coisas que acontecem misteriosamente.


Alvo voltou-se para a mãe, beijou-a no rosto e abraçou-a, como muitos outros alunos faziam.


- Boa sorte e... ah! Tome isso – disse a bruxa, retirando do bolso um saquinho e o entregando ao garoto. – Você pode precisar de um pouco de dinheiro.


O garoto agradeceu e a mãe o viu entrando no trem, antes de desaparecer pela pilastra. Instantes depois, o motor do Expresso roncou e o trem pôs-se a se locomover.


Caminhou pelos corredores, olhando distraidamente para os compartimentos, até encontrar um quase vazio, havia apenas uma pessoa que estava com a cabeça encostada no vidro da janela; um suspiro indicou sua tristeza. Abriu a porta da cabine devagarinho e, antes mesmo de perguntar se poderia ficar ali, o outro fora mais rápido:


- Vai fazer o mesmo que os outros?


- Outros?


-... fazer cara de nojo e ir embora? Ou antes vai dizer o quanto sou horrível?! – a voz do garoto saiu alta e clara, apesar de um pouco trêmula. Não se virou para encarar Alvo.


- Por que eu faria isso? – perguntou calmamente, olhando para o garoto por através de seus óculos.


- Pelo mesmo motivo dos outros!


- E qual foi o motivo?


O garoto virou-se para Alvo. Havia marcas e cortes fundos em seu rosto verdoso. Poderia assustar a qualquer um, mas Alvo não vacilou, não mudou a expressão.


- Ainda não entendo o motivo...


- Como não? Foi a primeira coisa que notaram... Meu rosto! – parecia cansado, seus olhos lacrimejavam.


- Não vejo nada demais – e sorriu.


 Empurrou sua bagagem em um canto, deixou a gaiola com seu sapo em cima do banco da locomotiva e sentou-se de fronte para o garoto.


- Parece-me varí...


- Varíola de dragão, isso mesmo – completou o outro, interrompendo-o – e a fase de contágio já passou... só estas terríveis marcas que ficaram.


- Entendo. Li sobre doenças mágicas e algumas são realmente complicadas de se lidar... Pelo visto ficaram apenas as marcas, nada para se preocupar – e sorriu.


- Obrigado – agradeceu o outro corando. – Ah... bem... Meu nome é Elifas Doge, prazer – disse, então, estendendo a mão.


- Prazer. Chamo-me Alvo Dumbledore – e apertou a mão de Elifas educadamente.


No entanto, o outro, ao ouvir o nome do colega, estremeceu de leve e se ajeitou no próprio banco, um pouco desdenhoso. Ganhou coragem somente ao sentir a bondade nos olhos de Dumbledore.


- Então... É o seu primeiro ano também? – perguntou Elifas iniciando um novo assunto.


- Sim.


- E está nervoso?


- Acho que todos devem estar... a melhor palavra para descrever, acho, seria ansiedade.


- Digo nervoso com as nossas primeiras impressões... como alunos, mesmo.


- Eu diria que nem sempre é o que conta... Eu, por exemplo, já dei uma lida nos livros desse ano. Sei o básico para se iniciar o meu primeiro ano. Então, sinto-me bem preparado, estou apenas ansioso para que cheguemos lá.


- Tentei fazer o mesmo... mas sempre acabava me distraindo. Mal espero para que as aulas se iniciem. Meus pais me ensinaram alguns feitiços básicos que, espero, me ajudem. O que mais comentam, além do Quadribol, é a questão das casas... Tem ideia de onde você irá?


- Na qual eu for escolhido – e riu. – Eu não sei ao certo em qual irei. Acho que isso não faz diferença.


- Meu pai gosta da Grifinória; minha mãe, no entanto, foi da Lufa-Lufa.  Eles acham que todas as casas, exceto a Sonserina, são boas opções. Isso por causa do passado negro daquela casa, sabe?


- É... a Sonserina ficou com esta característica... Mas, mesmo assim, só não se deixar influenciar pelas artes das trevas, como minha mãe mesmo diz.


Elifas assentiu com a cabeça.


- Sabe jogar Quadribol? – perguntou Alvo.


- Não, apenas torço, e você?


- O mesmo. Não sou do tipo esportivo. Não jogo por falta de tempo e nem tenho habilidades para isso, mas eu costumava ver os jogos. Torcia pela União de Puddlemere. Ultimamente, não tenho assistido a nenhum jogo.


- Eu torço pelo Montrose Magpies... Mas me considero um péssimo torcedor, não me importo mesmo com Quadribol – e coçou a cabeça.


Um estrondo retumbante silenciou os dois.


O céu já estava escuro, apesar de ainda ser manhã. Relâmpagos cortavam os céus em um incrível show de luzes acompanhado, em questão de milésimos de segundos, pelos trovões. Acompanharam a chuva começar a cair, densa, na paisagem campestre lá fora. A janela, aos poucos, ia se embaçando.


A paisagem deveria ser bonita se não estivesse em contraste com aquele céu negro. Dumbledore ficou admirando a chuva por bastante tempo, relembrando momentos do passado.


- Vamos chegar ao castelo encharcados – comentou Elifas com o olhar preso ao céu.


- Provavelmente – concordou Alvo. – De qualquer forma... gosto da chuva.


- Ah, mas só quando se está em casa!


- Querem algo, queridos? – perguntou uma voz dócil da porta da cabine.


Uma senhora, não tão idosa quanto aparentava, empurrava um carrinho com montes de doces pelo corredor da locomotiva. Expressava um bondoso sorriso e indicou com a cabeça os doces do carrinho. Elifas comprou alguns bocados e oferece a Alvo, que negou a generosidade, a fome havia desaparecido.


Mais um clarão iluminou a paisagem.


- Mal espero para chegar à Hogwarts... Meus pais só me contaram histórias sobre a escola nas férias! – disse Elifas quebrando o silêncio.


- Hogwarts...


A porta da cabine foi aberta novamente revelando uma bela garota morena de olhos escuros. Ela já estava com as vestes de Hogwarts e carregava um livro grosso e pesado debaixo do braço.


- Posso ficar nesta cabine? Na outra não me deixaram um segundo em paz. Esta parece mais... quieta... calma – sua voz era forte, talvez possuísse um tom de esnobismo, porém quebrado pela educação calculada.


- Claro, fique à vontade – disse Alvo, retirando a gaiola com seu sapo de cima do banco, acomodando-a em outro lugar do compartimento e a garota ali se sentou.


Olhou de Alvo para Elifas, demorando mais no segundo. Provavelmente foram as feridas cicatrizadas e tom verdoso, de certo modo, marcados em seu rosto, conferindo-lhe aquele tom assustador. Pareceu receosa ao prosseguir.


- Sou Hesper Starkey, prazer – cumprimentou-os brevemente, desviando lentamente o olhar de Elifas. – Vou para meu primeiro ano em Hogwarts.


- Alvo Dumbledore. E ambos somos calouros – disse Alvo.


- E eu sou Elifas Doge – cumprimentou Elifas encarando Hesper da mesma forma.


Hesper desta vez demorou-se com o olhar em Alvo e inspirou fundo, como se diante dela estivessem dois esquizofrênicos.


- O que é isso no seu rosto? Uma praga? – perguntou Hesper sem demoras, voltando-se para Elifas.


- Varíola de dragão.


- Interessante... Espero que o contágio tenha acabado...


- Não há mais contágio – disse o outro de forma brusca.


-... não quero acabar doente logo no início de meu primeiro ano – disse Hesper ignorando Elifas. – Se não se importam, eu gostaria de continuar lendo o livro de História da Magia.


- Ah, está em que capítulo? – perguntou Alvo curioso.


- Quinquagésimo sexto – disse cheia de si.


- Interessante... Eu, no caso, já o terminei de ler faz uma semana, achei fantástico – disse sorrindo, a garota desinflou. – Tenho praticado alguns feitiços, inclusive.


Hesper avaliou-o com o olhar. Voltou sua atenção, então, para o exemplar igual ao de Alvo sobre a História da Magia – embora esse fosse novo – desaparecendo por detrás do livro. Elifas Doge olhou para Alvo o que pareceu ao garoto que a presença da garota lhe causasse irritação, e, enfim, retornou a olhar para a paisagem lá fora.


 O silêncio reinou por bastante tempo, até que Hesper abaixou o livro e o descansou no colo. Virou-se para Alvo, então, e perguntou:


-... falando nisso – começou como se não houvesse interrupções desde a última coisa que falara –... você que leu o livro de História de Magia, por que os vampiros medievais mudaram de hábitos com o passar dos anos?


- Creio que, pelo que o livro informa, eles se viram em perigo de extinção quando os bruxos encontraram um modo de combatê-los. Portanto, tiveram de se tornar mais humanos ou acabariam morrendo. Diminuíram a quantidade de sangue humano ingerido e passaram a se tornar mais pacíficos. Ainda assim, muitos são brutais e continuam assassinando pessoas.


- Entendo. É... você deve ter realmente lido o livro – disse a outra. – Sabe... Espero ir para a Corvinal.


- É uma boa opção – comentou Elifas.


- Claro que é! A casa das mentes brilhantes!


- Que eu saiba, muitos bruxos ilustres também saíram das demais casas – disse Dumbledore. – Fizeram realmente sucesso em suas profissões. Por isso, creio que não depende da casa, mas sim de você.


- Talvez, e minha opinião mantém-se inalterada... espero ir para a Corvinal.


- Por quê? Seus pais foram da Corvinal? – perguntou Elifas parecendo interessado.


- Não, foram sonserinos...


- O quê?! – exclamou Elifas indignado. – Por que, então, quer ir para a Corvinal?


- Não suporto a Sonserina. Mesmo que meus pais tentaram fazer minha cabeça, não tenho vontade alguma de ir para lá. Não nasci para agradar os outros... sigo meus princípios.


- Concordo com você – Elifas se ajeitou no banco e soltando um grande bocejo. – Este frio dá sono...


- Hesper, você deve ter alguma ambição especial na Corvinal, não é mesmo? – perguntou Alvo olhando-a através dos óculos com uma expressão curiosa no rosto.


A garota não respondeu, retribuiu o olhar e sorriu brevemente. Seus dentes certos davam a impressão de terem sido tratados um por um. Lábios finos e rosados destacando a sua bela palidez, enquanto o seus cabelos presos em um coque na cabeça completavam sua presença.


Uma ambição... é isso que a justifica. No entanto, é difícil perceber seus verdadeiros sentimentos. Pode até se demostrar de forma rude; não posso dizer que tenha gostado do modo como tratou Elifas. Ah, não! Não posso... e mesmo assim,  ela é perspicaz...


Ela desviou a atenção, novamente, para o livro de História da Magia.


- Quem sabe você também não vá para a Corvinal? – disse enquanto seus olhos iam da direita para a esquerda.


Durante o resto da viagem, Alvo e Elifas discutiram sobre diversos assuntos, até sobre acontecimentos no Ministério – contudo, o garoto ainda não havia comentado sobre o assunto da tortura de trouxas por Percival, e Alvo preferia que ficasse por isso mesmo –, enquanto Hesper estava compenetrada em sua leitura.


 


Era tarde, Alvo até já havia trocado as vestes, quando uma voz masculina anunciou que em pouco tempo estariam chegando à estação de Hogsmead.


Alvo perguntou-se o que seria Hogsmead, nunca ninguém comentara isso com ele, ou talvez tivessem esquecido. Hesper logo se prontificou a responder: era um vilarejo bruxo perto de Hogwarts, onde apenas alunos do terceiro ano à diante teriam permissão para visitar regularmente.


Com um solavanco, a locomotiva parou. Os alunos começaram a se amontoar nos corredores para descerem na plataforma de Hogsmead; suas bagagens seriam levadas à Hogwarts.


Quando todos estavam agrupados debaixo de um telhado rústico feito para proteger os passageiros da chuva, que ainda caía grossa no chão formando poças e mais poças d’água; uma voz trovejante sobrepôs-se a balbúrdia dos alunos:


- Alunos do primeiro ano! Calouros! Novatos! Por favor, venham até aqui!


Um homem de estatura mediana e muito calvo – a ponto de só lhe restarem o cabelo acima das orelhas – tomou a frente de alguns estudantes, dando prosseguimento à chamada para se reunirem a ele. Balançava um lampião de um lado para o outro com objetivo de chamar a atenção de todos.


- Sigam-me rápido para não tomarmos tanta chuva! – disse.


- Quanto tempo, Juggleheart! Como vai a vida? – perguntou-lhe um aluno que aparentava estar no último ano.


- Muito boa, Daves, muito obrigado, mas preciso correr, sabe? A chuva está impiedosa hoje! – acenou brevemente com a mão livre para o garoto, que seguiu com o resto do grupo de alunos por outro caminho.


Os alunos do primeiro ano seguiram Juggleheart por uma estrada estreita, adentrando uma floresta de árvores suficientemente densas para não serem atingidos pela chuva.


Só pararam ao avistar um imenso lago negro e, à margem, havia uma flotilha de barcos, aparentemente preparados especialmente para eles. Do outro lado do lago, encontrava-se o grandioso castelo. Parecia flutuar iluminado sobre uma rocha... um sonho realizado.


A chuva caía forte, e eles tiveram de enfrentá-la. De quatro em quatro, os alunos se acomodaram nos barcos que deram uma súbita partida em direção ao castelo. Alvo acompanhou a imagem refletida do castelo no lago se distorcer com as gotas de chuva, até assim esta magnífico.


Todos, a este ponto, já estava encharcados. Ao alcançarem a margem oposta, correram para a proteção do castelo. Agruparam-se todos na escadaria principal.


Antes mesmo de Juggleheart os alcançar, as portas haviam sido abertas. Um senhor mirrado e calvo desceu alguns degraus em direção aos alunos e disse alta e claramente:


- Justo, venha para cá! Aí na chuva acabará pegando uma doença! Está um frio cortante!


Juggleheart adiantou-se para entrar no castelo.


- Vai lá se arrumar rápido que eu levo os estudantes – disse o bruxo mirrado.


- Obrigado, Prof. Dippet – agradeceu o outro passando pelo professor e sumindo por uma porta.


- Muito bem... Alunos, sigam-me – disse Prof. Dippet, virando-se para os alunos.


Acompanharam o professor para o interior do castelo. As paredes eram e pedra e iluminada por archotes flamejantes. O teto era muito alto e vidraças estavam espalhadas dispostas paralelamente umas as outras nas paredes detalhadas. Logo adiante crescia uma grande escadaria de mármore. Alvo esquecera-se da voz do professor orientando-os para dentro de uma sala vazia ao lado do saguão, admirava o castelo.


Havia uma grande porta à direita, de onde vinham burburinhos e vozes; o professor, contudo, indicava outra sala para se agruparem.


- Sejam bem-vindos à Hogwarts. – disse quebrando o silêncio. – Começará, dentro de poucos minutos, o banquete do início do ano letivo. Mas, antes da bem-servida refeição, terão que ser selecionados para suas casas. A Seleção é uma cerimônia muito importante, pois, enquanto estiverem aqui, as casas para as quais vocês foram designados servirão como sua moradia. Vocês estudarão com os alunos de sua casa, e poderão passar o tempo em seus salões comunais.


“São quatro casas: Grifinória, Sonserina, Lufa-Lufa e Corvinal. Cada casa tem sua história, e cada uma gerou vários bruxos muito conhecidos e extraordinários. O livro Hogwarts: uma história conta a verdadeira história sobre os fundadores de Hogwarts e a origem dos nomes, portanto, a quem se interessar, o livro está disponível em nossa biblioteca. Enquanto estiverem aqui, seus acertos e trabalho duro renderão pontos para suas casas, assim como seus erros a farão perder. Ao término de um ano levito, realizamos uma cerimônia de encerramento e fazemos a apuração dos pontos de cada casa. Ganhará um troféu a que obtiver mais pontos, é claro.”


Hesitou por um instante, passando os olhos pelos alunos presentes.


- A cerimônia será iniciada daqui a alguns minutos. Esperem e aproveitem para se arrumarem. Retorno logo – e saiu a passos lentos e calmos.


Os alunos conversavam agitados aqui e lá. Alvo, no entanto, manteve-se calado; o mesmo fez Elifas. Deixou ser devorado pela ansiedade. Havia certa distância entre eles dois e o resto dos alunos. Muitos olhavam Elifas com nojo e desprezo. Dumbledore mal percebeu que era o único perto de seu colega. Hesper sumira entre os demais presentes.


Em pouco tempo, Prof. Dippet estava de volta e pediu para todos o seguirem. Ele os encaminhou para a grade porta que os separava dos barulhos e vozes entusiasmadas. As portas foram abertas, revelando um imenso salão.


Quatro mesas compridas ocupavam quase todo o salão e, sentados nelas, alunos e alunas de todas as idades, que antes deveriam estar conversando, haviam se silenciado para observar os novos estudantes.


O ambiente era iluminado por velas suspensas no ar por magia e archotes presos às paredes. Seres transparentes – Alvo nunca vira nenhum fantasma em sua vida, mas imaginou que o fossem – flutuavam por através das mesas, contudo, com o olhar fixo nos recém-chegados. Muitos dos calouros recuavam ao ver as figuras pálidas e translúcidas se aproximando, que queriam enxergá-los de perto. Uma garota soltou um grito quando um dos fantasmas a cumprimentou cordialmente; esse sorriu sem graça e retornou para perto dos outros.


Ao final do salão, uma mesa não tão comprida como as outras estava disposta perpendicularmente em relação às demais. Nela estavam sentados os bruxos mais velhos.


Sentado em uma cadeira de espaldar alto ao centro da mesa, estava um bruxo sério de aspecto inteligente e nobre. Seus cabelos muito negros caíam-lhe pelos ombros e ele alisava sua barbicha em ponta enquanto avaliava os alunos com aqueles olhos negros e penetrantes, talvez até mais do que os azul-elétricos de Alvo.


Acompanharam o Prof. Dippet por entre as mesas até que ele pediu para que parassem e colocou um banquinho à frente, entre a mesa dos professores e os novatos. Alvo mirava o bruxo ao centro com interesse, deveria ser o diretor. Por um instante, os olhares se encontraram e Alvo sentiu uma frieza vinda daquele bruxo, fora a primeira pessoa a lhe causar um calafrio.


Prof. Dippet retornou com um chapéu velho e remendando, com um rasgo perto da aba e o depositou em cima do baquinho. O chapéu deu um estremeção antes do rasgo se abrir como uma boca e começar a falar.


Alvo percebera que o Chapéu havia começado a cantar, mas não se importou com a música sobre os quatro fundadores, sua imaginação estava muito além.


Havia um professor logo na ponta da mesa com aspecto frágil, era magro e baixo. Ao seu lado estava uma professora esbelta, com ar jovem e imponente; trajava vestes vinho e um chapéu pontudo onde haviam sido costuradas rosas. Do seu outro lado, havia um bruxo de aspecto robusto, já não parecia tão jovem: deixara a barba e os bigodes crescerem comportadamente. Seu olhar recaiu, novamente, sobre o bruxo de barba em ponta. Havia uma cadeira vazia, ligeiramente ao lado do diretor; deveria ser o lugar do Prof. Dippet.


O chapéu já havia parado de cantar. Prof. Dippet abrira um longo pergaminho e tomara a frente dos alunos. Hesitou por um tempo, passando os olhos pelos nomes dos alunos, e, então, segurou o chapéu, erguendo-o no ar, e chamou aluno por aluno. A primeira era uma menina com cabelo até os ombros encaminhou-se trêmula até o banquinho. Dippet colocou o chapéu em sua cabeça e o rasgo perto à aba se abriu. Ele disse calmamente:


- Nervosa? Não, não há porque estar nervosa... Corvinal!


A menina exclamou de felicidade e correu para uma mesa onde os estudantes trajavam vestes com detalhes azuis, para perto de uma garota muito parecida com ela, mas com aspecto mais velho. E assim foi até Elifas Doge, que ao ser chamado passou por Alvo nervosíssimo, enquanto muitos comentavam de sua aparência. O chapéu foi colocado e...


- Grifinória!


O garoto urrou de felicidade e correu em direção à mesa onde o aplaudiam de pé, naquele instante a aparência dele foi o que menos importou para sua casa. E a voz chamou:


- Dumbledore, Alvo!


Alguns cochicharam atrás do rapaz que caminhou despreocupado em direção ao banquinho e se sentou. O professor colocou o chapéu em sua cabeça e ele resmungou aos seus ouvidos:


- Hum... Mente difícil... Esbanja inteligência, rapaz, e não só isso... Calmo e educado... Grandes ambições. Suas ideias são geniais quando comparada às de muitos que passaram por aqui... pode se tornar um grande bruxo... Entretanto, onde colocá-lo?... A grande nobreza e coragem preponderam... Portanto, não me resta outra opção a não ser... Grifinória! – anunciou finalmente.


Dumbledore levantou-se com um sorriso perpetuado em seu rosto e foi até a mesma mesa que Elifas. Como haviam feito antes com Elifas, aplaudiram-no. Sentou-se ao lado de seu amigo – sim, achou correto afirmar que fizera seu primeiro amigo na escola.


- Sou um grifinório! – Elifas exclamou para si mesmo.


Dumbledore sorriu; havida dado o primeiro passo. Sabia que, no fundo, seu pai ficaria feliz por ele ter sido selecionado para a mesma casa que fora sua estadia.


Grifinória...

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Comentários (1)

  • Neuzimar de Faria

    Olá, Inominável! Parabéns, começou muito bem! Espero que continue, gostaria muito de conhecer sua versão sobre a vida de um personagem tão complexo quanto o Dumbledore. Vá em frente!

    2012-10-03
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