Verdades e mentiras



...atravessar o tenebroso corredor e adentrar este salão fora apenas a introdução de algo que está por vir... Vejo agora apenas agitação, tristeza, estardalhaço das pessoas. Apesar de nada ter sido decidido; de uma coisa eu sei: hoje não teremos boas notícias... Espero que os outros fiquem bem em casa na nossa ausência... Prefiro ficar calado aqui... Vou tentar assistir daqui mesmo, sentado no meu banco, ao lado da minha mãe. Pelo menos nela eu posso confiar... para sempre..


Muitas pessoas se acomodavam naquela sala particularmente tenebrosa. As paredes não possuíam qualquer tipo de adorno, eram de pedra sólida, na qual o som de várias vozes ecoava. O lugar era mal iluminado por archotes rústicos.


Aquele ambiente sugeria ser algum tipo de lugar subterrâneo, como se fosse uma masmorra. A atmosfera do lugar era hostil. A sala, apesar de não ser muito grande, possuía um teto alto de uma pedra escura. Era possível sentir um cheiro de mofo, o qual deixava algumas pessoas nauseadas. No centro da sala havia uma cadeira com correntes nos braços.


Havia filas e mais filas de bancos, que subiam em níveis escalonados ao redor da sala, formando uma espécie de arquibancada. Parte dela estava desocupada, era a parte que ficava ligeiramente às costas da cadeira ao centro. A outra parte era ocupada pelo júri e outras pessoas.


As pessoas ainda se acomodavam nos bancos...


Frio...


Um garoto, que aparentava ter uns dez anos de idade, estava sentado em uma das fileiras mais baixas e perto da cadeira com correntes; havia uma mureta que protegia a certa distância a platéia do centro da sala. Aqueles olhos azuis claros eletrizantes observavam com atenção um senhor de cabelos brancos e muito curtos sentado em um banco não muito longe de onde ele estava. O homem trajava vestes púrpuras compridas com detalhes em fios de ouro e um chapéu de mesma cor.


O menino assumira uma expressão séria, contudo, de preocupação em seu rosto levemente pálido. Os passos desviaram sua atenção para uma porta de carvalho ao fim da sala.


... terrível frio...


A porta se abriu de supetão e entraram dois vultos encapuzados carregando um homem magro e alto de aparência doentia. Seus cabelos que antes deveriam ser vermelho fogo, agora estavam mortos e desgrenhados sobre um rosto sem emoções. Ele não parecia estar preocupado em usar argumentos para o soltarem.


Soltem-no... estão sugando sua vida!...


As criaturas encapuzadas largaram o homem naquela cadeira ao centro da sala. As correntes estremeceram e prenderam seus braços; forçando-o a encarar o senhor que estivera sendo observado pelo menino.


Aquele homem, antes até bonito, agora parecia à beira da loucura. Não mais havia brilho em seus olhos.


O garoto retornou a encarar o bruxo de vestes púrpuras. Cutucou uma mulher ao seu lado. Esta possuía cabelos muito negros que lhe caíam pelas costas, malcuidados, quando antes eram presos em um coque com elegância. Seu rosto parecia até esculpido: nariz reto, malares altos e olhos escuros. O menino sussurrou em suplício para a mãe:


- Mãe... Por favor, façam parar com isso...


- Por favor, não fale nada até isso acabar... Agora não é hora para reclamar...


- O senhor – começou a falar o bruxo de cabelos brancos, logo após um momento de silêncio, onde as pessoas prendiam o ar ao fitar aquele homem sentado no centro da sala. Sua voz era grave e trêmula, porém ainda possuía um aspecto de superioridade. –... foi escoltado até aqui pelos dementadores de Azkaban...


- Audiência do dia três de novembro, para a apuração de violações ao Estatuto Internacional de Sigilo e ao Decreto da Ilegalidade e Proibição das Maldições Imperdoáveis, cometidas por Percival Dumbledore, residente da Rua Harriebel, número vinte e sete, Mould-on-the-Wold – continuou o senhor, ajeitando-se na cadeira, onde estava sentado, que era levemente mais elevada do que as demais de sua fileira.


“Inquiridores: Demetrio Osório Wiggler, ministro da Magia; Marco Senor Fudge, chefe do Departamento de Execução das Leis da Magia; Rogério Orlando, subsecretário sênior do ministro...”


... oras!, ele teve seu motivo...


Os olhos azuis vivos, fixos em Percival, transmitiam desalento e procuravam desesperadamente retornar vida ao corpo do homem entregue às correntes.


- Testemunha de defesa: Kendra Dumbledore...


Não posso perdê-lo... não quero perdê-lo...


A mulher que estava sentada ao lado do garoto assentiu com a cabeça ao ouvir o inquiridor pronunciar seu nome. Ficou lívida ao olhar para seu marido naquela situação. Era como se a culpa se tornasse, aos poucos, parte de sua essência...


Muitos dos bruxos que estavam atrás do senhor usavam vestimentas cor de ameixa com um W bordado em fio de prata do lado esquerdo do peito, eram da Suprema Corte dos Bruxos. Sussurravam entre si, mantendo o ar de primazia.


- As acusações são as seguintes:


“Percival, de livre e espontânea vontade, utilizou magia na presença de adolescentes trouxas. E, para ser mais exato, os torturou através da maldição imperdoável Cruciatus na Rua Saint Thomas, às dez horas e trinta e quatro minutos da noite do dia dezoito de julho. Assim, o senhor violou o parágrafo E do Regulamento Internacional dos Bruxos que proíbe o uso de qualquer maldição, e também à Seção 13 do Estatuto de Sigilo da Confederação Internacional dos Bruxos.”


“O senhor é Percival Dumbledore, da Rua Harriebel, número vinte e sete, Mould-on-the-Wold, correto?”, perguntou o bruxo lançando um olhar penetrante a Percival.


-... sou... – respondeu uma voz rouca.


- O senhor nega os fatos?


-... não... – Percival lançou um olhar assustado a um dos dementadores que estava perto da porta e abaixou novamente a cabeça.


Não... Por quê?!


- O senhor tinha plena consciência de seus atos? – continuou o inquiridor, ignorando a surpresa de alguns ao seu redor.


-... sim...


Por favor...


- Portanto está afirmando que foi intencional o uso da maldição Cruciatus? – o bruxo folheava uns papéis, os quais deveriam ter o histórico de Percival.


-... sim... eu estava... ciente dos meus atos – apesar de enfraquecido, a resposta foi direta e firme.


- E ainda assim o senhor cometeu a infração?


-... sim... senhor – acrescentou.


- Com todas estas acusações, ao senhor Percival poderá ser sentenciada prisão perpétua em Azkaban, está ciente disso? Está ciente das conseqüências de seus atos, inclusive?


Percival hesitara e isso indicara sua fraqueza em continuar; entrementes, a resposta foi afirmativa.


Vários bruxos pertos do inquiridor começaram a cochichar assustados com a resposta de Percival, que poderia dar um fim àquele julgamento. Contudo, um dentre os bruxos da Suprema Corte, que antes observava atentamente ao homem ao centro do tribunal, adiantou-se a falar:


- Creio que nada passe de algo minuciosamente planejado. Por ser o chefe do Departamento de Execução das Leis da Magia, tenho o direito de dirigir-lhe uma pergunta bem clara e direta: por quais motivos uma pessoa iria se acusar pondo em risco a própria vida, e desestruturando a própria família? O que o senhor está procurando esconder? Pretende apostar na nossa clemência?


Percival não respondeu imediatamente, não esperava uma pergunta daquelas. Sua mente raciocinava para tentar produzir algo que rebatesse a acusação de Marco Fudge.


Kendra também se inquietava em seu lugar, entrava em conflito: defender ou não seu marido?


- Eu... não vejo problemas em alguém se sentir culpado pelo que fez... – a voz rouca vinda de Percival retornou a soar. – Acredito que a maioria presente já deve ter se arrependido de algum erro cometido...


A mão de Kendra estendeu-se no ar.


- Fale, então, Sra. Kendra Dumbledore – disse o Ministro, dirigindo-se a bruxa.


- Creio que todo bruxo tem seus direitos e seus deveres. É direito de alguém errar, como é direito de alguém se arrepender...


- A senhora apóia o cárcere de seu marido? – indagou o mesmo bruxo que tentara desmascarar Percival.


O garoto virou-se para a mãe, apertando sua mão firmemente. Seu olhar transmitia todos seus sentimentos, um suplício para que ela fizesse o que, no fundo, também queria, defender Percival, mesmo sabendo que nada mais adiantaria.


- O senhor, em hipótese alguma, ver-me-á proferindo tais palavras. Por mais que seja contra meus princípios, sinto-me isenta de tomar qualquer decisão pelo meu marido, apoiar-lhe-ei na esperança de que ele esteja tranqüilo de si mesmo. Custa-me muito dizer que se é ele quem escolhe, não posso interferir – Kendra calou-se, então; e o mesmo fez Fudge.


- Portanto, não há nada em defesa de Percival – confirmou o inquiridor.


Por um momento, todos permaneceram em silêncio. Era óbvio que após as palavras do réu e de Kendra já não teria retrocesso. Um bruxo alto e forte aproximou-se do juiz e disse:


- Sr. Wiggler, ele está se acusando de quase ter cometido homicídio... Acho que não precisamos continuar, precisamos? Ele merece o cárcere em Azkaban.


Cada palavra foi atentamente registrada pelo cérebro do garoto, embora não quisesse acreditar no que seus sentidos lhe informavam. Uma voz urgia do fundo de seu peito e seus batimentos cardíacos tinham acelerado. Fechou os olhos como se esperasse o pior.


- Concordo com você Rogério, é melhor o encerramento desse julgamento. Percival já possui a cela com o seu nome – concluiu o Ministro voltando-se para o bruxo aprisionado naquela cadeira; antes, lançando um rápido olhar em seu filho, que estava de cabeça baixa. – Ele é novo demais para estar aqui – comentou com um canto da boca com Rogério.


- Ele é filho de Percival... Tem o direito de saber o que está acontecendo.


- Fim de acusações. Ninguém a favor da absolvição do réu... – continuou Demétrio, enquanto Kendra se segurava para não se manifestar. – A decisão cabe à Suprema Corte – disse, virando-se para trás, dirigindo as palavras para os bruxos bem-arrumados as suas costas. Um leve sorriso transpareceu em seu rosto enrugado.


- Quem é a favor de inocentar o réu de todas as imputações? – perguntou o bruxo chefe do Departamento de Execuções das Leis da Magia.


O garoto estendeu a mão antes de levantar a cabeça e abrir os olhos.  Quando o fez, observou não ser o único, alguns outros poucos bruxos da platéia levantaram os braços, sob o olhar de um espantado Ministro da Magia. Kendra repreendeu-o com o olhar.


Não posso... Simplesmente não posso deixá-lo ir...


- Quem é a favor da condenação? – perguntou novamente Marco.


Praticamente todos os bruxos elevaram as mãos. Kendra esboçou reação, estava em estado de choque.


Era uma atmosfera de tensão. A platéia observava Percival, assombrada. Os bruxos e bruxas que haviam votado com intuito de inocentar Percival, agora soluçavam como Kendra.


Por um instante, os olhos de filho e pai se encontraram, antes que o segundo abaixasse a cabeça, totalmente entregue ao destino. Tudo estava perdido... Uma lágrima escorreu pelo seu rosto pálido e comprido. Não possuía mais o brilho. Tentou se recompor a tempo de ainda ver um último sorriso no rosto do pai, por debaixo das trevas que o cobriam sorrateiramente.


- Percival Dumbledore, o senhor está condenado à prisão perpétua em Azkaban! – disse o inquisidor encerrando aquele julgamento.


Os dois dementadores, que estavam parados junto à porta, encaminharam-se para o centro da sala. As correntes soltaram Percival, que foi cada vez enfraquecendo mais.


- Não! Dementadores não! Não! – suplicava. Estava claro que estava fora de si, à beira da loucura.


- Levem-no!


- Desculpe-me! A culpa é minha! Não! Não me deixe só! Eles pagarão! Parem com isso, irão matá-la! Não! Não!


Ele continuou berrando, até que sua voz mirrou e enfim foi arrastado pelos vultos para fora daquele tribunal, desaparecendo pela porta.


O menino ainda ficou olhando-o, entristecido... Seu pai se fora de sua vida...


 


“Percival! O que houve?”, indagou Kendra para um Percival suado e ofegante que havia acabado de entrar na sala.


“Erro... acabo de cometer o maior erro da minha vida...”, disse cabisbaixo.


“O que você fez?!”


“Eu... eu... fui atrás daqueles malditos trouxas! Ah! Eles pagaram pelo que fizeram! Pagaram sim!”, respondeu ríspido com uma ligeira mudança no comportamento. “Apenas a maldição Cruciatus estava a nível deles! Somente então eles iriam sentir na pele o que Ariana sentiu! Ah! Minha filha... tiveram o que tanto mereceram!”


Por um instante o ambiente ficou tenso. Kendra ainda fitava o marido, quando passos interromperam o que estava prestes a dizer.


“Pai? Você me chamou?”, perguntou uma menina mirradinha que entrava na sala, coçando os olhos por ter acabado de acordar.


“Ariana, durma mais um pouco... Você precisa descansar... Vem com a mamãe, vem...”, mãe e filha desapareceram pela porta de um quarto, sendo que minutos depois a mãe retornava sozinha, trancando a porta. “Sabe o que isso significa, Percival? Azkaban!”


“Você sabe muito bem o que fizeram com Ariana! Ela agora está tendo pesadelos todas as noites, não descansa quase nunca. Ela já teve dois acessos de magia que acabaram destruindo a nossa cozinha! Eu fiz o que devia ter sido feito... Tudo por causa daqueles... Daqueles...”


“Acalme-se, Percival. Temos de dar um jeito...”


“Você não entende? Ariana não será mais a mesma depois daquilo! Eu podia ter matado aqueles trouxas repugnantes... REPUGNANTES!”


“Arriscou nossas vidas!”


“Não... já tomei minha decisão...”, Percival hesitou por um momento, seus olhos se encheram de lágrimas. “Ouça... deixarei que eles me levem... é o único jeito...”


“Não vai não! Você tem três filhos para cuidar! E eu?... como vou sustentar a família sem você?”


“Kendra... não há mais volta... Entenda. É a única maneira...”, Percival enxugou as lágrimas e encarou a mulher novamente. “Você sabe muito bem que eles torturaram nossa filha por causa daquela mágica rústica dela... Lembro-me bem daquele dia em que estavam olhando-a fazer uma pedra flutuar... Deixei aquilo passar... poderia ter modificado a memória deles na mesma hora... eu falhei inúmeras vezes em cumprir meu dever como pai.”


“Acharam que aquilo era uma aberração e, no entanto, queriam mais... Eu não estava aqui no dia em que ocorreu a tragédia. Segundo Aberforth, ele a deixou um instante sozinha no parquinho para pegar uma de suas bonecas, que gostava da areia, do céu, do sol, da felicidade... ela estava brincando, inocente... quando retornou, Ariana havia sumido.”


Percival tomou fôlego para continuar, a história parecia entristecê-lo a cada palavra:


“Lembre-se que ela contou com muita dificuldade, e foi para Aberforth, que os garotos ficaram irritados quando ela não pode fazer os mesmos ‘truques de mágica’ que havia feito anteriormente... e então começaram a torturá-la... Sem o ‘espetáculo’, logo se esqueceram do entretenimento e voltaram a tratá-la como uma aberração... decidiram acabar com a aberração... Nunca mais fez magia nenhuma por livre e espontânea vontade...”


“Culpo-me pelas horas em que ela mudava sua personalidade e se tornava agressiva... O trauma que aqueles garotos causaram a transformou... Jovens bruxos possuem oscilações de magia e, entrementes, ela vai tentar guardar a mágica só pra si... e quando estiver enfraquecida, será como retornar àquele dia, seria reviver aquele momento! Não consegue manter a magia oculta... isso é muito além do que um bruxo é capaz, ainda mais uma criança...”


Calou-se e abaixou a cabeça. A mão de Kendra atingiu o rosto do marido, que se manteve imóvel; no entanto, ela rompeu-se em lágrimas.


“E a nossa família?!”, suplicou.


“Não vou e nem posso arriscar expor Ariana... Se o Ministério souber da sua condição, no mínimo vão querer interná-la no St. Mungus, já que é muito perigosa para o Estatuto Internacional de Sigilo. Terei que me entregar... Sem reclamações... sem discussões... Sem suas intervenções... a não ser que prefira perder a filha inclusive.”


Kendra ajoelhou-se no chão, com os olhos cheios d’água. A linha de raciocínio de Percival estava correta, contudo, aceitar sua separação do marido seria como sua morte. Uma coruja entrou pela janelinha da cozinha e sobrevoou o local dando uma volta completa no ar, deixando cair uma carta diante de Percival, antes de sair pelo mesmo lugar por onde entrou. O bruxo a apanhou e começou a ler.


 “Começou... Será dia três de novembro...”


Kendra soltou um soluço, não poderia segurar o choro... não mais.


“Eu não... não poderei ver Alvo completar seus onze anos... Não o acompanharei até a estação de trem para Hogwarts ano que vem!”, Percival havia voltado a si e debulhou-se em lágrimas.


Mal eles sabiam que seu filho mais velho estava escutando toda a conversa... E agora estava sentado naquele banco desconfortável daquele tribunal inóspito, encarando a porta pela qual seu próprio pai havia sido retirado do recinto... Em sua memória, encontrava-se fresca e lúcida cada palavra enunciada naquele dia...


- Alvo... vamos – chamou-lhe a voz de sua mãe.


- Não... há... mais volta... não é?


- Não – respondeu sem emoções.


Ele a seguiu sem dar mais nenhuma palavra. Corredor tenebroso. Elevador. Átrio. Lareira. Foi tudo o que percebeu passar, até que as chamas verdes crepitantes engoliram os dois e aterrissaram em sua casa.


Trancou-se em seu quarto. Tentava esquecer aquele acontecimento, mas era algo forte demais para conter dentro de si... Ele chorou... Solitário, como preferia ficar... Queria aquele momento só para ele...


Alvo Dumbledore era um garoto diferente dos demais. Não era de desafiar alguém, preferindo ao poder da palavra. Seus pensamentos eram arcanos e revelados apenas aos seus mais próximos e, ainda assim, quando os considerava dignos de saber. Preferia guardar seus sentimentos para si, inclusive. Quase nunca chorava.


Todavia, não pôde suportar e o que se passava em sua mente era muito mais do que um garoto de dez anos costuma pensar.


- COMO É QUE É? POR QUÊ?!


A voz, inconfundivelmente, vinha de Aberforth. Ele, apesar de ser anos mais novo que Alvo, ambos eram muito parecidos: compartilhavam dos mesmos cabelos acaju, olhos azul-elétricos e feições finas. No entanto, ele e Alvo possuíam temperamentos distintos e sempre acabavam se desentendendo.


Diferente do irmão mais velho, Aberforth possuía personalidade explosiva. Possivelmente iria preferir usar os punhos ao invés da razão. Havia horas em que ele se tornava frio e grosseiro, isso normalmente acontecia porque algo estava realmente o perturbando. Queria sempre saber sobre os fatos, a verdade, e, quando esta não era dita, mudava de humor.


Por vezes se tornava intolerante, impaciente; contudo, nesses momentos ele assumia uma posição honesta, revelando o que se passava em sua mente.


Algo inegável sobre os dois, que tinham em comum, era o amor pela irmã caçula: Ariana. Era o único integrante louro da família, com um rosto delicado, lábios finos e nariz levemente arrebitado. Ela era o tesouro da família. Sua meiguice e inocência eram características marcantes, mas a sua inteligência destacava-se dentre todos os seus atributos.


Quem passava a maior parte do tempo ao lado de Ariana era Aberforth, seu protetor. Procurava sempre agradá-la e, nos momentos difíceis, acalmar sua tempestade. O seu amor fraterno era sua coberta e ele era o único a quem ela deixava transparecer suas percepções e sentimentos, caso algo acontecesse de errado.


Quando não estava com Ariana, encontrava-se ao lado de dois bodes que se tornaram seus animais de estimação e, por vezes, entravam no quintal da casa por uma fenda na cerca. Assim surgira a fama de anti-social de Aberforth, que pouco se importava quanto a isso.


Alvo deduziu que sua mãe havia contado o que acontecera no tribunal e, como óbvia reação, Aberforth berrava contrariado. Mirou a parede ainda entristecido.


- COMO ELE PÔDE IR?! – retumbou novamente a voz do irmão.


Alvo voltou seu olhar para a paisagem lá fora através do vidro embaçado da janela de seu quarto.


 


“Ariana... O que houve? Ariana! Olhe para mim!”, soou a voz de Aberforth.


Não houve resposta. Aquela garota pequenina estava encolhida no canto de um quarto, ligeiramente atrás da cama. Estava com o rosto coberto pelos próprios braços apoiados nos joelhos. Quieta demais, e havia algo de estranho em sua presença.


“Ariana, o que houve?”, retornou a perguntar seu irmão.


“Não...”, ouviu-se uma voz que vinha de trás de toda aquela muralha psicológica que construíra contra qualquer um.


“Ariana... Você não está bem... Venha cá comigo.”, o irmão se aproximava amigavelmente com um sorriso de verdadeira bondade no rosto.


Ariana se encolheu mais um pouco.


“Ariana, conte para mim... Conte para mim o que aconteceu...”


Ela balançou a cabeça negativamente.


“Por que não?”, Aberforth tentava achar argumentos para poder convencer sua irmã a contar a verdade.


“Não”, foi a resposta dela. “Alvo...”


Apontou para o rapaz que estava à porta que estava entreaberta. Ele fitava os dois irmãos com muita aflição.


“Alvo... Saia...”


Nem chegou a responder, continuou o encarando com aqueles brilhantes olhos azuis, que davam certo aspecto culto a ele.


“Saia. Ariana não o quer aqui... Então, por favor.”, falou irônico Aberforth se levantando e encarando o irmão.


Alvo retribuiu o olhar fuzilador e logo se retirara sem dar uma palavra se quer. Encostou a porta ao sair. Chegou apenas a ouvir:


“Estou com medo deles, Abe... eles me perseguem...”


E tudo imergiu em escuridão... Alvo contemplava o teto de seu próprio quarto, relembrando a época em que os acessos mágicos de sua irmã se iniciaram. A partir daquela data, o costumeiro sorriso desaparecera de seu rosto delicado, restando apenas apatia.


Queria poder apagar a cena da prisão de seu pai de sua mente... Contudo, aquilo era impossível. Suas lembranças de cada momento que passou com o pai, agora pareciam morrer. Agora não passavam de meros sonhos um dia realizados, não mais... A imagem do rosto magro, pálido e doentio do pai, o qual chamava pelo seu nome, permaneceu intacta em sua mente e, às vezes, parecia se materializar diante do rapaz.


A figura de Percival foi seguida de alguns soluços baixos e choramingo. Após algum tempo que percebera não ser sua imaginação. Os sons vinham, de fato, do quarto ao lado do seu: o quarto de seus pais; cuja porta estava encostada.


Kendra se sentia culpada por tudo o que estava acontecendo em sua casa. Deveria chorar não apenas pela perda do marido, mas por um novo fardo: cumprir a promessa de proteger Ariana de tudo e todos diante de qualquer situação; e teria de fazê-lo sozinha.


- Mãe... Por que você está chorando? – perguntara Ariana com inocência.


Kendra sorriu, limpando os olhos com seus dedos longos. Sua filha estava sentada em seu colo, enquanto Alvo, ao seu lado. Aberforth estava sentado no chão a observando. A bruxa estivera contando um dos Contos de Beedle, o bardo para seus filhos.


- Estas histórias, Ari, trazem lembranças... E por mais que estas lembranças sejam boas, a saudade arrebate-me. Lembro-me dos meus pais, sinto muito a falta deles. Mas é a lei da vida: um dia todos têm seu descanso, seja merecido ou não...


- Só as mulheres choram, Ari – disse Aberforth.


- Não, Aberforth. Qualquer ser humano chora – Kendra adiantou-se para interromper o filho.


- Papai não chora – teimou.


- Seu pai chora sim. Você tem que entender que a vida é uma lição, onde temos a chance de ser felizes, de amar uns aos outros, de necessitar uns dos outros. Talvez seja um pouco complicado para entender; no entanto, a incompletude é a conseqüência do viver, é um sentimento natural de se ter. Sentir-se incompleto é importante em uma pessoa, só assim ela pode entender o amor, a amizade e a saudade. Quando entes queridos se vão, as pessoas normalmente choram. Derramando lágrimas que uma pessoa vê sua necessidade da outra e, assim, vive. Algum dia você o entenderá...


Sua mãe estava certa. Pois o que ele sentia naquele momento era exatamente o puro e natural sentimento de incompletude; um peso enorme que o esmagava, mas o colocava no lugar, na realidade. O mesmo estava acontecendo com ela; contudo, desta vez não eram apenas saudades.


 


 


Durante o jantar os olhos acinzentados, com um belo brilho azulado, decaíam sobre o prato de comida intacto. Ariana – que, diferente dos irmãos, era mais baixa do que a normal estatura de sua idade – era capaz de sentir o sofrimento das pessoas e, muitas vezes, compartilhava a dor, silenciosa, mesmo que involuntariamente. No momento em que tudo se resumia em pesar e tristeza, seu ânimo diminuía e perdia o apetite.


Suas olheiras, então, aumentavam, e a graciosa parecia ter falecido. Sua saúde não era das melhores, e isso a fragilizava. Aliás, aumentava os riscos de ímpetos mágicos, que poderiam debilita-la mais ainda.


A pior notícia chegou pela manhã do dia seguinte, junto com o Profeta Diário. Kendra recolheu-o e deixou-o em cima da mesa, onde Alvo ainda tomava seu café da manhã.


O rapaz aproveitou para folhear o jornal e ver se havia alguma novidade. Mal avançara algumas páginas e algo chamou total atenção: uma notícia sobre a prisão de seu pai. Havia uma enorme foto de Percival Dumbledore sendo arrastado para fora do tribunal pelos dementadores, em que parecia berrar sem sair som algum. E ao lado estava o artigo:


 


O residente da Rua Harriebel, número trinta e sete, Mould-on-the-Wold – bairro conhecido por conter grande número de moradores bruxos –, Percival Dumbledore foi condenado a cárcere na manhã do dia três de novembro, ontem, após comparecer a uma audiência na presença da Suprema Corte dos Bruxos e sob julgamento do Ministro da Magia, Demétrio Osório Wiggler.


Segundo o ocorrido, Percival torturara adolescentes trouxas por livre e espontânea vontade por meio da maldição imperdiável, não neganda ao júri. “Ele assentiu todas as imputações. Respondeu de modo frio e consciente. Ele realmente se entregou às mãos dos guardas de Azkaban. Apesar de ter havido um mal-entendido entre sua mulher e o chefe do Departamento de Execução das Leis da Magia”, informou o subsecretário sênior do Ministro, Rogério Orlando.


Contudo, Marco Fudge omitiu parte da conversa, afirmando que Percival fora condenado devidamente, e, por estar ocupado demais, preferiu não entrar em mais detalhes. Houve apenas um homem que comentou uma curta discussão entre Sr. Fudge e Kendra Dumbledore, mulher do réu.


“Ele nunca foi um homem realmente sano. Sempre me pareceu um pouco perturbado das idéias”, depôs um vizinho de Percival.


Segundo os dados do Ministério, consta ser o julgamento mais breve que já houve.


“Ato consciente, foi o dele.”, comentou um dos bruxos da Suprema Corte. “Pelo menos ele teve a honestidade de se entregar, sem ao menos usar qualquer argumento para tentar provar sua inocência. Não, foi um dos mais honestos que vi. Ele só pareceu entristecer ao ver que sua própria mulher não o defendeu das acusações.”


Alguns outros bruxos da Suprema Corte depuseram sobre o que aconteceu no tribunal, e todos chegaram a dizer que ninguém elevou a voz para inocentar o réu; e, na hora da votação para condenação ou absolvição, poucos foram os bruxos que estenderam suas mãos. Dentre eles estava seu filho mais velho e que foi um dos atos mais conscientes já tomados, apesar de parecer novo demais para comparecer a tal audiência.


Após a audiência, Percival foi levado para Azkaban sob pena de prisão perpétua e vigia dos dementadores.


 


Alvo parou a leitura, atordoado. Notou outra foto no rodapé da página: ele e sua mãe imóveis e em silêncio, focados ao centro do salão, onde se encontrava o homem, como se vissem algo além daquilo e não se importassem. Atirou o jornal, já amassado, em cima da mesa.


Sua mãe logo retornava, perguntando se havia algo de novo no Profeta e observou o olhar aturdido de Alvo. O rapaz balançou negativamente a cabeça, mas não como resposta, ele não se conformava com nada.


Kendra folheou-o devagarinho até parar bruscamente na foto de seu marido. Não pensou duas vezes ao jogá-lo na lareira acesa.


- Não! – disse por fim, contemplando as chamas lambendo as páginas. – Precisamos nos mudar... – e fechou as cortinas da cozinha, logo se dirigindo para a sala onde fez o mesmo.


- É melhor chamar Aberforth. Faz esse favor para mim, Alvo? Ariana ainda está dormindo, tente não fazer barulho. Teremos uma pequena reunião.


- O que é? – perguntou ao chegar à sala, após descer as escadas sorrateiramente, e deparar-se com sua mãe séria e pensativa.


- Aberforth, sente-se no sofá... terá que tentar criar uma versão desta história de modo mais simples, resumido e que convença Ariana. Ela já tem problemas demais para entender a realidade que agora estamos vivendo...


A mulher deu alguns passos enquanto hesitava e então continuou:


- Devo-lhes informar que não poderemos mais ficar aqui em Mould-on-the-Wold.


- Por quê?! – exaltou-se Aberforth


- É o único jeito. Seu pai uma vez conversou sobre isso comigo, sobre o problema da mídia. Esta não está nos favorecendo. A notícia de hoje no Profeta Diário, como Alvo já sabe, sobre o julgamento... bem, isso não será mais nosso segredo. Se continuarmos aqui, provavelmente os vizinhos irão começar a bater em nossas portas, querendo saber mais da história. Talvez sejamos alvo de preconceitos. Não sei a reação exata, e prefiro não saber! Sei apenas que nossa reputação piorará por aqui...


- Mas como assim? De repente? – indagou Aberforth.


- Terei de resolver isto sozinha. Mas, antes, preciso esclarecer algo com vocês: Ariana tem se comportando muito instável por causa de algo que aconteceu há alguns meses. Tornou-se claro, fora um trauma deixado por aqueles garotos que, conforme você mesmo descobriu, Aberforth, a molestaram. Não sei por quanto tempo isso irá durar...


- O QUE?! – berrou. – Você disse que aquilo era algo temporário e para ficar de olho nela! Disse que acontece normalmente com bruxos da nossa idade!


- Aberforth, acalme-se e escute ou irá acordar Ariana! – Kendra estava séria e seu olhar mudara totalmente. – Com todos os bruxos jovens ocorrem alguns descontroles de magia, como isso também acontece com você às vezes. Todavia, não da forma como tem sidos os de Ariana.


- Percival demorou a descobrir a verdadeira causa – continuou, após breve hesitação. – E agiu de modo impensado...


- Como você pode dizer “impensado”, Kendra?! – vociferou Aberforth, pela primeira vez pronunciando o nome de sua mãe, de modo ofensivo a bruxa.


- Não é hora de falar, é hora de escutar. Espero que você pelo menos use o respeito com o qual foi criado diante de sua mãe. Você não entende o quanto a decisão foi precipitada, ele deveria ter nos consultado antes! Isso que nos levou a atual situação.


“Portanto, agora que estamos expostos à mídia e propensos a receber visitas inoportunas. Ariana precisa ser tratada com amor, carinho e calma; porém, ela terá que ficar em sigilo, pelo menos, até quando isso durar... Ela tem expelido magia em excesso algumas vezes; vocês viram o estrago que isso causou ao quarto dela, deteriorou boa parte dos móveis. Se o Ministério souber da condição de Ariana, podem tirá-la de nós para sempre!”


“Nego-me a deixá-la nas mãos de um desconhecido. Teremos que nos mudar não só para nossa proteção... mas para a da Ariana.”


- E para aonde iremos? – indagou Alvo como se a explicação toda fosse óbvia e apenas essa questão importasse.


- Algum lugar longe de trouxas. Ariana não pode entrar em contato com eles, qualquer reação pode ser prejudicial; segundo porque ela é um risco de quebra de algumas leis do sigilo bruxo.


A bruxa fechou os olhos e, quando os abriu novamente, parecia estar prestes a chorar.


- Espero que um dia ela se recupere... O meu receio é ela não poder ir para Hogwarts... – colocou as mãos no rosto e deixou transbordar sua emoção.


Aberforth foi amparar a mãe, enquanto Alvo continuava parado ali, pensativo. O irmão parecia ter mudado de opinião rapidamente, e aqueles atos equiparavam-se a um pedido de desculpas por ter desrespeitado sua mãe.


- Calma mãe... – consolava Aberforth. – Alvo! Levanta e vem me ajudar a nossa mãe! Vê se faz alguma coisa na vida por ela!


O irmão seguiu a ordem, não por ter sido proferida por Aberforth, mas por não querer sua mãe em depressão.


- Mãe, quando nós nos mudaremos? – perguntou Aberforth, quando a mãe já havia parado de derramar lágrimas.


- O mais cedo o possível, Abe... Seria até bom nós sairmos daqui amanhã pela manhã, mas, creio que isso não será possível...


- Então temos que já ir arrumando a mala! – Aberforth se levantou, rumando para as escadas.


- E, Abe, tente convencer Ari que será um lugar melhor onde moraremos. Provavelmente terei que me ausentar pelo resto deste dia – e pôs-se de pé. – Godric’s Hollow também é um povoado bruxo; poderá, pois, ser lá que encontraremos o nosso lar. Percival deixou-nos este um imóvel comprado recentemente, mas cuja existência eu desconhecia. Terei de providenciar nossa entrada naquele lugar. Vão arrumando as suas coisas, conforme for... – não chegou a terminar a frase, rumou até a cozinha, desaparecendo pela porta. Segundos depois, Alvo escutou um estalo alto; sua mãe havia aparatado.


 


 


Três dias já haviam se passado, e Kendra esperava os filhos guardarem as últimas coisas que tinham para guardar dentro de sua bolsinha de mão, que possuía um feitiço ampliando seu interior. Nos momentos em que se mantivera ausente nos dias anteriores, estivera resolvendo negócios sobre um chalé baldio no vilarejo bruxo.


- Está na hora.


Pouco tempo depois e todos já se encontravam no andar térreo. Seria um adeus àquele lar, e início de uma vida mais reservada.


- Estão todos prontos? – esperou todos afirmarem e prosseguiu: – Primeiramente, Ariana, não saia de perto de mim em hipótese alguma! Todos permaneçam em silêncio e não ousem olhar para trás. Tentarei fazer algo rápida e discretamente: irei levar um de cada vez para uma orla que há perto de Godric’s Hollow. Primeiro irei com Alvo, depois Aberforth e Ariana. Prontos? Estão com suas coisas em mãos? – olhou uma última vez para o hall de entrada e prosseguiu. – Então, venha, Alvo. Segure forte a minha mão e a sua mala, você sentirá uma sensação diferente de qualquer uma que tenha provado até hoje.


A mãe estendeu a mão para o garoto que a apertou com força e, com a outra mão, apertava uma pequena mala de viagem. Kendra pediu para que fechasse os olhos, assim como fez. Inspirou fundo e, com um estalo, os dois desapareceram. Mas o que intrigou o rapaz fora a sensação, como se algo tivesse colocado um gancho em seu umbigo e puxado com força para o vácuo.


Quando percebeu, aterrissara em terra fria; estavam do meio de uma clareira com árvores altas e densas. Sua mãe pediu para que continuasse ali e já havia sumido de novo, o deixando lá sozinho. Logo ela retornava com Aberforth e Ariana.


A menina olhou para o ambiente e sorriu de leve.


- Ar puro... – murmurou.


Era incrível como aquela floresta não lhe incutia medo, como aconteceria a qualquer outra criança pequena que tivesse de passar por ali.


- Ariana, agora fique parada por um instante – sua mãe estendeu um manto longo e cobriu a garota, que desapareceu. - Agora... Vamos. Sigam-me.


Ela os encaminhou para fora daquele lugar por uma trilha sob escuridão aterradora. Ariana puxava a saia da mãe e era acompanhada de perto por Aberforth, que parecia adivinhar onde a criança estava.


 Incrível isso tudo... Linda natureza.


Alvo observava o local e viu que a trilha saía em uma pequena estrada. Seguiram a mãe por bastante tempo que os levou para mais outra estrada e depois outra, onde já havia chalés em ambos os lados. Até a mãe parar diante de um que era particularmente um dos mais antigos, porém, com aparência aconchegante.


- A casa se encontra em boas condições para alguém morar... E...  Chegamos. – caminhou até a porta, tocou com a varinha na maçaneta e a porta abriu. Esperou todos entrarem para tornar a trancar a porta.


Caminhou até Ariana e bateu com a varinha novamente em sua cabeça, e logo aquela sensação tornou a ocorrer no corpo da menina, só que em sentido contrário, aos poucos ela voltou a assumir sua coloração natural.


Kendra abriu as janelas para deixar o vento entrar. Virou-se para todos e disse.


- Os quartos se encontram no andar de cima, são três quartos. Creio que Aberforth pode dividir um dos quartos com Ariana.


- Certo – de fato, o garoto não fazia objeção e até preferia dormir junto à irmã ao irmão. – Mas... E os... bodes? – perguntou Aberforth.


- Desculpe-me, filho. Eles ficaram no devido lugar deles, que é em Mould-on-the-Wold. Será melhor para eles, e para nós, que teremos menos despesas.


Aberforth abaixou a cabeça e ficou muito calado, embora parecesse querer protestar, sabia que não era o momento certo para isso.


Alvo subiu para seu quarto. Era um lugar bem simples, com ar confortavelmente aceitável; uma cama de solteiro estava encostada no canto do quarto, ao lado de uma janela com vidraça quebrada. Do lado direito havia uma escrivaninha com aspecto antigo e verniz descascando, mas, com magia seria possível restaurar. Não se importou muito com o estado do quarto. Sentou-se em uma cadeira ao lado da escrivaninha, e esta rangeu.


Abriu sua mala, retirou seus livros e os empilhou cuidadosamente em cima da escrivaninha... Muitos livros. O primeiro deles se intitulava: Vampiros da Antiguidade; o qual estava com uma página cuidadosamente marcada.


Ao cair da tarde, o vento se intensificou e o clima amenizou, trazendo uma noite mais gélida. Kendra aproveitou para acender a lareira da casa, onde se sentou com os filhos para se aquecer e poder conversar sobre como seria, basicamente, o dia-a-dia deles naquele novo lar.


- Há um pequeno comércio no centro de Godric’s Hollow, onde posso fazer compras básicas, não precisando ir com tal freqüência ao Beco Diagonal como o fazia. Nestes próximos dias, teremos que arrumar um pouco a casa, e conto com a boa disposição e ajuda de vocês – disse com um sorriso. – Agora que estamos todos juntos, quero que todos venham até aqui e me dêem um abraço.


Todos foram à Kendra e se abraçaram em conjunto, o que demonstrava que apesar do acontecimento, a família continuava firme e forte.


 


 


No dia seguinte, tiveram uma surpresa, enquanto tomavam o café da manhã, ao baterem à porta. Kendra hesitou em se levantar à mesa e atender à pessoa. Procurou olhar por entre as cortinas da janela quem era o visitante, mas não era possível vê-lo da cozinha. Ao abrir a porta, deparou-se com uma senhora sorridente, que tinha em mãos um tabuleiro com três bolos com aspecto delicioso. Ela cumprimentou gentilmente.


- Olá! – endireitou-se na ponta dos pés e elevou a voz: – Que vocês sejam bem-vindos à Godric’s Hollow! Observei ontem sua chaminé acesa e deduzi que eram novos moradores... Vim dar as boas-vindas a vocês! – era uma senhora um pouco mais baixa que Kendra, com poucas rugas no rosto, que era redondo e amigável. – Meu nome é Batilda Bagshot... Trouxe algumas uns bolos de caldeirão aqui... Achei bom vir para conhecer os novos vizinhos. Aceitam alguns?


Kendra fitou-a como se estivesse analisando algo. Seu olhar pedia desculpas; todavia, apenas sorriu e balançou a cabeça negativamente. Seu próximo ato foi bater a porta diante àquela senhora. Retornou a cozinha, sem mesmo hesitar em pedir desculpas.


Alvo olhou-a sagazmente, escutara cada palavra. Quando a mãe percebeu o filho, comentou em voz baixa:


- Não... Ariana deve descansar... Não é mesmo, Ari?

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