Onde a Vida Começa

Onde a Vida Começa



Mal podia respirar. Senti um solavanco no abdômen e percebi que não estava mais naquela rua lotada. Minha visão no momento imediato em que nossas mãos se encontraram nos levou rapidamente a um vale rodeado por uma densa floresta. Entreolhamo-nos assustados, sem fazer qualquer movimento brusco. Um homem alto saiu da floresta e caminhava pomposamente em nossa direção, e ainda assim não conseguíamos nos afastar daquilo. Sua barba era comprida e tão cheia que se misturava aos seus cabelos emaranhados. Suas roupas precisavam conhecer a água. Ele caminhava cada vez mais depressa em nossa direção com doninhas penduradas por grossas cordas envoltas em seu pescoço. Ouvia nossa respiração ficar mais audível a cada passo que ele dava, mas nos mantínhamos no mesmo lugar, esperando aquele homem nos alcançar sem saber o motivo.


- O que estão fazendo aqui vocês três? – Disse ele, com uma voz que definitivamente não se encaixava no perfil que eu havia composto a ele – Vocês sabem que a floresta é perigosa. Muito perigoso este lugar. – Enquanto falava, ele olhava em volta, analisando o lugar. De repente, se inclinou em nossa direção, e parou demoradamente em Harry, sorriu, e então se tornou etéreo ao prestar atenção no voo de alguma criatura branquíssima, destacada no céu nublado. – Ah, Bicuço! Se houver algo orgulhoso no mundo, nenhum supera o hipogrifo. Mas é um animal muito nobre, e Bicuço é bem sensível. Mas você o conhece Harry, já esteve com ele.


Francamente, não fazia ideia a quem ou a que ele se referia exatamente. A única coisa que eu lera sobre hipogrifos foi exatamente o que ele mencionara, ou seja, eles dão aos outros o respeito que dão a eles. O homem deu um longo assobio e então pôs as mãos para trás, admirando o pouso da criatura que era uma mistura de pássaro e cavalo. Este repousou suas grandes asas no gramado depois de se inclinar e receber uma doninha jogada pelo homenzarrão. Logo se foi em direção à floresta, sumindo por entre as folhagens.


- Sabe Harry, é bom que você tenha voltado com Rony e Hermione. Mas o que há com vocês? – Continuou ele, virando-se a nós. Por precaução, demos um modesto passo para trás, e obviamente ele havia percebido. Mesmo assim, continuou nos olhando docemente – Bom, pelo que sabemos, Riddle continua não regulando bem, sabe? Acho que são os nervos. – Disse o homem, e sorriu com timidez, quando na verdade parecia querer chorar, e cessou ao ver nossas expressões sérias e um pouco temerosas. – Ora! Vocês sabem, com essa história do Primeiro-ministro ser um comensal. E estarmos cercados deles. Na verdade, a ideia deles parece ser montar alguma coisa que derrube Dumbledore. Um grande homem o Dumbledore. Disse-me “Hagrid, cuide do Bicuço”. Só Dumbledore deve saber o porquê – E desta vez, ele riu significativamente, deixando cair algumas lagrimas entre o som do seu riso – Tudo bem, agora o que vocês estão fazendo aqui? Devem fazer o que Dumbledore disse. Não se demorem. Estamos perdendo muitos ainda – E novamente tornou-se etéreo, fechando os olhos e apreciando o vento forte que se seguia em nós.


Enquanto ficamos parados na tensão do desconhecido, Rony enrijeceu-se e fez menção de perguntar algo a Hagrid, mas desistiu quando este se virou de súbito, pondo a mão no bolso. Sorriu a Rony, entregando um pedregulho.


- Desculpe-nos senhor, mas que lugar é este? – Disse Rony, ainda assustado, mas incapaz de conter a curiosidade, guardando o pedregulho mínimo no bolso esquerdo, enquanto apalpava o bolso oposto, onde provavelmente deveria estar seu rato.


- “Senhor”? Se eu não o conhecesse, pensaria que você está falando sério Rony – E só então Hagrid riu abertamente, como se não fizesse isso há tempos. Mas novamente cessou quando nos viu sérios – Bom, vocês não deveriam estar aqui. Voldemort sabe que vocês podem vir aqui atrás de mim. Rony, cuide bem deste pedaço de pedra. Foi tudo o que restou da Pedra Filosofal. Eu deixaria com Fofo, mas vocês sabem o quanto ele é amistoso demais. Nosso amigo alquimista não pode mais ficar com ela. Mas sei que vocês cuidarão bem – E deu uma piscadela a Harry.


Olhei para Rony, e este olhou para Harry, que estava aturdido, olhando seriamente para o alto homem. Quando Harry emitiu algum som indistinto, sentimos uma pressão nos tornozelos, e o alto homem dissolveu-se em uma forte névoa, enquanto éramos empurrados mais uma vez para um dia nublado, uma rua barulhenta, e rostos confusos sobre o que acabara de acontecer.


Afastamo-nos uns dos outros ainda com olhos fixados e perplexos pela sensação do qual havia roubado nossa atenção. Pumpks afagou seu espesso rabo molhado pelo líquido azul dos scones de Rony nos meus tornozelos sob a calça jeans. Olhei para baixo e minha visão ficou embaçada, de modo que cambaleei pesarosamente, me apoiando em Neville. Seu olhar preocupado detinha o olhar de Gina, atordoada para conter Harry e o Rony, quando ambos procuravam algo para se apoiar também.


- Obrigada – Agradeci olhando para Neville, que sabiamente manteve sua varinha firme na sua mão livre - Vocês estão bem? – Perguntei, enquanto eu mesma sentia que meu estômago não estava mais no lugar correspondente.


- O que aconteceu? – Murmurou Gina, depois de perceber que alguns curiosos nos olhavam. – Vocês parecem em transe, ou sei lá. Harry? Você está bem?


Ao contrário de mim e Rony, Harry estava tão pálido que se podia temer o contraste dos seus olhos verdes e sua pele. Estava molhado de suor e seus cabelos exibiam este efeito, de maneira tal como pétalas murcham ante o excesso de umidade. Harry parecia muito pior que Rony e eu.


Esforcei-me a ficar em pé sozinha, para que Neville pudesse acudir Harry. Pus minhas mãos no rosto para enxugá-lo e encostei-me na mesma parede na qual Rony apoiou uma de suas mãos. Este se debruçou alguns centímetros para apoiar a outra mão na sua perna. Respirava pesadamente, e piscou várias vezes até perceber que era eu quem estava ao seu lado. Desviou seu olhar para Harry. Quando o amigo tendeu a cair mais uma vez, foi segurado por Gina.


- Obrigado – Olhou Harry a Gina e a Neville. Com os olhos marejados, não se punha a piscar, mas mal conseguia sustentar o peso da sua cabeça, pois esta pendia todas as vezes em que Harry tentava se colocar em pé. Gina, com cuidado, segurou o rosto do garoto com as duas mãos, enxugando-o com a suas palmas, e depois franziu as sobrancelhas a ele com tristeza.


- O que houve com você, Harry? – Ela sussurrou. Talvez apenas eu tenha ouvido aquilo, em meio ao balburdio da rua, da situação, ou da nossa confusão interna. Harry apenas olhou para Rony, depois para mim e Neville. Mas não disse nada.


- Cara, não entendi nada sobre o que aconteceu. Achei que tivéssemos aparatado, mas isso não é possível, não faz sentido! Não foi nossa intenção! – Após um profundo inspirar, Rony acrescentou veemente - E de jeito nenhum fiz alguma chave de portal com aqueles scones! – Dizia, enquanto tentava enxugar seu rosto molhado na manga do seu suéter, lançando um olhar de desprezo aos scones azuis espalhados pelo chão – Vocês viram o mesmo que eu vi?


- O que vocês viram? – Disse Gina, ajudando Harry a permanecer em pé – Vocês não estão mais assustados que nós. Estão se sentindo bem? O que viram?! – Percebendo que eu ficara calada, Gina certificou-se de que Harry poderia ficar em pé olhando-o atentamente e então o deixou com Neville. Só depois se dirigiu a mim.


- Hermione, você está bem? – Disse Gina, colocando as costas de suas mãos sobre minha testa e pescoço – Céus! Está tão fria! – Continuou ela – Temos que ir a algum hospital ou... Ou... Melhor, vamos ao Sr. Terrence. Será que ele ainda mora por aqui?


- Eu estou bem, Gina – Disse, colocando as mãos nos bolsos, a fim de puxar um lencinho bordado que minha mãe costumava colocar nos meus bolsos. “Para imprevistos”, ela dizia. Esteve sempre certa – Aliás, gostaria de um copo d’água. Estou com muita sede.


- Neste caso, é melhor lhe arranjar um bom pedaço de chocolate. Meu pai diz que chocolate nunca é demais numa situação infeliz – Disse Neville, com a voz meio abafada por carregar Harry – E não estamos longe da Truques & Tretas, será melhor que eles se recuperem primeiro, Gina – abaixando a cabeça, Neville se virou sob Harry aos seus ombros, e começou a andar – O que você acha?


- Claro que sim – balançando a cabeça, Gina concordou – Enquanto vocês vão à frente, irei procurar o Sr. Terrence. O que aconteceu aqui não foi qualquer coisa – Ela fez um coque alto, de qualquer jeito, e estão se abaixou para carregar Pumpks, que ainda estava sentado quieto aos meus pés. Este protestou, mas logo se acomodou nos braços da dona – Encontrarei vocês daqui a pouco. Nenhum de vocês três está nada bem.


Ela iniciou sua caminhada rapidamente na direção oposta, enquanto seguíamos a passos lentos, seguindo Neville. Por uns segundos, Neville quase tropeçou com Harry aos seus ombros, pois seus sapatos haviam ficado presos na fenda dos paralelepípedos da rua movimentada.


Então, segurando Harry pelo tronco, Rony pôde apoiar o amigo enquanto desviava da multidão que esbarrava no nosso grupo, pois ainda caminhávamos lentamente em comparação aos demais. Estávamos andando rumo a uma grande loja colorida e lotada. Ao chegarmos mais perto, um forte cheiro cítrico-floral me aqueceu, fazendo-me sorrir involuntariamente. Lembrei-me imediatamente de um perfume que minha mãe costumava usar após o banho. Senti saudades.


Apesar de estar cheia de pessoas barulhentas, alegres e sorridentes, a loja ainda acomodava mesinhas dispostas em círculo, no fundo da loja. Era repleta de decoração infanto-juvenil, mas agregava tanto adultos quanto crianças. Todos compartilhavam uma atmosfera hospitaleira, e não pareciam querer deixar a loja tão cedo. Em cada prolongado balcão, entre pirulitos que giravam e bombons das mais diversas cores, Neville nos assentou em uma mesa azul celeste, próximo ao balcão de chocolates. Disse que compraria alguns e voltaria em breve, desaparecendo entre um grupo de adolescentes que soltavam bolhas pelas orelhas e riam descompassadamente.


Olhei para Harry, preocupada em relação a sua aparência e ausência de respostas. Perguntei-lhe se estava melhor mas ele apenas sacudiu a cabeça e olhou  para uma janela próxima. Rony suspirou alto e olhou para mim, apoiando os cotovelos na mesa.


- Como você se sente? – Perguntou-me, e sinceramente compreendi que foi de coração.


- Estou me sentido... Como se estivesse sendo “completada”, ou sei lá. Não estou sendo racional, eu sei, mas eu não consigo achar mais nada que faça sentido neste lugar. É estranho pensar que aquilo foi um sonho, porque senti que estávamos exatamente onde deveríamos estar. Eu sinto que fui uma parte de mim que voltou. Mas francamente, não entendo mais nada nesse lugar! Olha só, eles estão comendo doces e suas orelhas estão repletas de bolhas de sabão! – Disse, apontado discretamente ao grupo de adolescentes – Olhem, não tenho certeza se vocês viram o mesmo que eu, só que durante este meio tempo, parece que estou sendo forçada a lembrar de um sonho incrível que tive há anos, no entanto eu sei que jamais o sonhei.


- É a mesma sensação que eu tenho – Disse Harry, pela primeira vez, levantando os olhos para mim. Sua voz era espessa, e seu olhar estava sério. Como se ainda quisesse ser convencido de que aquilo acontecera.


- Você percebeu a maneira que Rubeus te olhava, Harry? E você viu o estado dele? Ele sempre foi um aventureiro, mas não o imaginaria com hipogrifos...


- Óbvio! Ele tem uma criação exótica de animais, de grindlows à leviatãs! E apesar disso, não foi a maneira que ele me olhava que me intrigou. Eu ainda estou processando a visão em si.


- Bom, a visão inteira foi uma loucura, mas não consigo dar um sentido a ela. Apenas será mais uma visão como muitas antes...


- Espere aí Rony, você também tem tido visões?


- Esperem aí vocês dois! – Disse, afastando-me um pouco da mesa – Vocês conhecem aquele homem da visão? E vocês também tem visões?


- Há quanto tempo? – Dissemos os três juntos.


- Há 10 meses, desde o meu aniversário em setembro – Disse, com simplicidade, buscando um elástico de cabelo na minha bolsa – Mas achei que fossem sonhos. Minha mãe me levava no psicólogo, e ele me receitou alguns remédios, e, muito embora as visões continuassem, disse a minha mãe que não os tinha mais.


Os dois me olharam confusos, e fiquei meio ruborizada pelo modo como me encaravam. Senti-me débil por uns instantes, até Rony perguntar o que era um “pseucólgo”. Expliquei-lo sem o corrigir.


- Enfim – Ele disse, depois da minha explicação careta – tenho esse tipo de visão há algumas semanas, talvez meses. É como se meu subconsciente estivesse me forçando a lembrar de coisas que nunca vivi.


- Isto é exatamente o que estou sentindo – Disse Harry, olhando de esguelha a Rony – Mas ainda pesam em mim todos os dias algumas coisas. É como se eu estivesse perdendo parte da minha vida. Como se eu tivesse que fazer alguma coisa que deixei de fazer. É como se eu estivesse vivendo errado. Tenho essas visões há alguns dias.


- Por isso você não pôde ir conosco à Côte d’Azur semana passada? Era esse “mal-estar” a que seu pai estava se referindo quando mandou Edwiges? – Perguntou Rony.


- Bom... Sim - Harry disse - Mas hoje foi muito mais forte e real. Vocês lembram quando Rubeus mencionou “comensal”? – Rony e eu fizemos sinal afirmativo, e praticamente me debrucei sobre a mesa, pois as pessoas pareciam mais barulhentas a cada minuto – Eu senti uma forte dor de cabeça, e algo perpassar na minha testa...


Harry passou a mão esquerda na testa, lentamente. Arregalou seus olhos e engoliu em seco. Olhou para mim, com uma evidente tensão na sua expressão. Ele levantou seu cabelo da fronte, exibindo uma pequena marca em forma de raio. Estava vermelha e inchada. Parecia ter sido feita recentemente.


- Que merda é essa, Harry?! – Rony o olhou preocupado, debruçando-se também sobre a mesa.


- Eu juro que não sei – Ele nos olhou, perplexo. Relaxando seu corpo sobre a cadeira, Rony e eu também nos afastamos da mesa, deixando ainda muitas dúvidas no ar - Mas fica mas dolorido a cada minuto.


- Precisamos saber o que está acontecendo – Eu disse, tomando as rédeas da situação - Nada foi coincidência. Nós três estamos tendo visões, Harry está mais aturdido de que qualquer um de nós, e ainda ganhou um arranhão de graça – Comecei a enumerar os acontecimentos – e por favor, alguém pode me dizer quem era aquele homem?


- Rubeus Hagrid – Disse Rony, percebendo que Harry olhava para baixo, voltando ao seu estado de segundo plano – Ele cuida da reserva de animais raros e exóticos de toda a história do Ministério da Magia. Algo de família. Seu pai foi um senhor meio bravo, mas a personalidade dele serviu para que ele preservasse as mais diferentes espécies de animais. Algumas pessoas ainda queriam comprar a reserva dos Hagrid, mas o Sr. Hagrid sempre foi arisco, e jamais se rendeu. Dizem que aquela floresta vale uma fortuna. Mas Rubeus nunca faria negócio com ela. Ele tem prazer naqueles monstros. De qualquer maneira, é um excelente amigo – Continuou Rony, estourando com o indicador algumas bolhas que apareciam no ar, e assumiam várias formas quando estouradas, antes de desaparecerem – Fizemos amizade com ele quando meu irmão Gui encontrou um dragão polonês nas suas explorações, e por serem raros, apenas o doou a Hagrid. Poderíamos tê-lo vendido, mas não somos assim. Algumas coisas a gente só sente que não se devem fazer – Ele terminou de falar, quando Gina se aproximou deslumbrante com uma garrafinha azul-marinho, sacudindo na sua mão livre de Pumpks. Rony pôs a mão no bolso, talvez estivesse acalmando seu rato.


- Olá. Sr. Terrence disse que cada um deve tomar um gole, e se não se sentirem melhor, devemos ir até ele – Disse Gina, sorridente – Onde está Neville?


- Na fila, por chocolates. E desta vez, isso aí tem gosto de que? De terra? – Disse Rony, apanhando a garrafinha, e cheirando a tampa aberta.


- Não seja mal-agradecido Rony – Disse ela, puxando um puff ao lado de Harry- Ele nunca receitou algo que nos fizesse passar mal – Ela soltou o gato laranja sob a mesa, e este, como de praxe, enrolou-se nos meus tornozelos.


Após uma demorada olhada em Harry, Gina estendeu sua mão e levantou os cabelos da testa de Harry, surpresa com a área vermelha. Harry a olhou rapidamente e afastou seu rosto das mãos de Gina, protegendo também do julgamento da garota.


- Sabe Harry, quando você abaixou a cabeça quando eu cheguei na loja, você mesmo se denunciou – Disse ela, trocando seu puff por uma cadeira com encosto almofadado – Agora, podem me dizer o que aconteceu naquela hora?


Ela olhou para mim, diretamente. Talvez soubesse que os outros dois não dariam qualquer informação.


Tentei ser convincente e prática no acontecido, sendo corrigida vez por outra por Rony, que se calava quando eu detalhava com exatidão o que ela havia imprudentemente corrigido. Gina ouvia atentamente, e levou a mão à boca quando mencionei a palavra “comensal”.


- Comensal? Tem certeza Hermione? – Ela disse, voltando-se ao frasco azul-marinho, abrindo-o e entregando a Harry.


- Por que? O que você sabe sobre isso? – Desdenhou Rony, com um meio-sorriso.


- Só o que mamãe mencionou outro dia – Vociferou Gina, já aborrecida com Rony. Concordei plenamente - Ela havia tido um pesadelo. Nele Fred e George estavam em perigo. Pessoas corriam de um lago para o outro, desesperadas. Ela disse que era aos arredores de Hogwarts, e que gritavam algo sobre Comensais da Morte estarem atacando a escola...


- Quando ela lhe contou isso? – Rony perguntou, incrédulo.


- Ela não contou, ouvi atrás da porta. Ela falava com papai – Gina acrescentou, como se esta atitude fosse costumeira da sua parte. Enquanto ela me oferecia um gole do líquido da garrafinha azul-marinho depois de ter feito Harry tomar, Rony tentava inutilmente dá-lhe uma lição de moral sobre ouvir conversas alheias. Ela o ignorou por completo – Mamãe usou o abaffiato, mas eu bloqueei quando a vi entrar na sala de chá com uma expressão esquisita.


- Abaffiato? – Perguntei, inocente.


-Sim, um feitiço que impede ouvir com clareza. Na verdade, você precisa conhecer muitos outros eficientes – Ela disse a mim, convidativa sobre a auto-confiança que conhecer feitiços traz. Aceitei. Lógico. – Mas não se preocupe, depois de falarmos com Dumbledore, tudo irá se resolver.


- Você conseguiu descobrir o que eram os Comensais da Morte, Gina? – Disse Rony, fazendo-a voltar ao pesadelo antes mencionado.


- Ah sim, bom, depois mamãe pareceu preocupada, a voz dela estava trêmula. Ela disse que estes Comensais aparatavam sem parar, e lançavam maldições imperdoáveis em qualquer um – Gina quase sussurrou esta parte, fazendo-me curvar novamente sobre a mesa.


Ela parou de falar quando Neville se aproximou, e involuntariamente disfarcei, amarrando meu cabelo tão desajeitada quanto o coque de Gina.


- Então Harry – Gina falou meigamente, fazendo Rony revirar os olhos – se sente melhor?


- Sim, muito obrigada – Disse Harry, esboçando um pequeno sorriso – Talvez alguém deva dizer a Neville que não precisamos dos chocolates – Continuou ele, se levantando. Num gesto rápido, Gina o segurou pelo pulso, e o fez sentar novamente, nos convencendo de que ainda precisávamos comer algo para “tirar nossas caras feias de fome”, apontado para Neville que estava próximo, com as mãos ocupadas por uma bandeja de bebidas e chocolates, detido pela fila dos caramelos.


- Por mim, tudo bem – Prontamente aceitou Rony – E depois – Tomando um rápido gole da garrafinha – Perdemos a cerimônia de Hogwarts. Então, tanto faz.


Apesar de ter sido a primeira a pegar a garrafinha, fui a última a realmente tomar do líquido. Certifiquei-me que os outros dois haviam tomado, prestando atenção a diminuição do conteúdo, e porque ambos continuaram vivos, tomei um gole considerável, com toda a sanidade que me restou.


O líquido refrescou meus lábios no instante que o engoli. Não tinha sabor. Era como não ter nada na boca, e ao mesmo tempo ter aberto os lábios para “tomar” uma rajada de vento gélido. Pisquei longamente, e minhas pernas relaxaram. Foi como estar no último dia de aula: uma sensação de dever cumprido, alívio e férias.


- Aqui estão os chocolates. Como estamos meio confusos, resolvi trazer uns mashmallows untados, geralmente todos gostam dessa bebida. E olha só Rony – Sorriu Neville, pondo a bandeja no centro da mesa, e puxando para si o puff que antes era de Gina – Trouxe scones. Então, o que houve agora há pouco? Vocês se sentem melhor?


Rony sorriu embaraçado, agradeceu e pegou um bolinho. Harry serviu-se de uma modesta parte de chocolate, enquanto Gina guardava o pequeno frasco azul-marinho no bolso de seu suéter.


Diante de uma mesa doce, e com pessoas amigáveis, o único ponto contra era de que eu estava sem graça demais para avançar sobre o mashmallow untado, que parecia ser delicioso, pago por um garoto no qual causei um prejuízo anterior de desconheço valor.


Enquanto os garotos falavam a Neville sobre a visão, Gina pareceu ter percebido o que se passava comigo, então balançou sua varinha acima de um dos copos. Este apresentou uma cobertura rosa, depois foi absolvida pela espuma da bebida.


- Tome Hermione, você não vai conseguir parar de beber. E se sentirá mais confortável também – Depois de piscar para mim, fez o mesmo com um copo para si, e tomou a bebida, voltando-se a conversa dos garotos.


Pumpks agarrou-se na barra do meu jeans. Olhei para ele, com uma cara pidona, tirei um pedaço de scone, e ofereci ao gato, que cheirou por um demorado instante, para só depois aceitar.


- Você também está com fome – Eu disse baixinho para o gato laranja, por debaixo da mesa – Eu sei que sim Bichento – E o gato ronronou, se achegando a mim.


Quando levantei o rosto, Rony olhava para mim, desconfiado. Não entendi o que se passava, apenas fiz como Gina, ignorei-o. Estava o achando antipático demais para discutir o que ele estava olhando. Ele então tirou um pedaço do scone que eu havia tirado para Pumpks, e este arrepiou os pelos ao ver Rony oferecendo-o um pedaço do doce. Rony estendeu o braço para tocar a cabeça de Pumpks, e este, permaneceu parado. Um instante depois, o gato de rendeu e chegou mais perto do garoto, aceitando o bolinho e o afago.


Eu admirava a cena, aturdida. Rony era bobo às vezes, mas naquele momento quase me irritei (ou quem sabe estava com inveja) pelo contraste feito da sua conquista da confiança de Pumpks. Ele segurou firme seu rato no bolso enquanto afagava o gato, que piscava em agradecimento. Quando dei por mim, encarava o garoto intermitentemente sem sequer piscar. E infelizmente, ou infelizmente, ele ergueu os olhos enquanto eu olhava o topo dos seus cabelos ruivos. E por debaixo da mesa, não paramos de nos olhar durante os talvez dois segundos mais longos da minha vida.


E pela primeira vez, Rony me encarou. Olhou de verdade, demoradamente. E foi neste momento que minha vida parou. E foi neste momento que eu realmente comecei a viver.


Um coque vermelho surgiu debaixo da mesa, quebrando o momento.


- O que vocês estão fazendo? – Gina descontraída soltou no ar.


- Ah... Pumpks está com fome – Respondi de qualquer jeito, enquanto concertava minha postura na cadeira. Rony apenas abaixou os olhos e enfiou uma grande quantidade de chocolate na boca.


Mas penso que Gina não estava se referindo exatamente a Pumpks.

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